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Document 62005CJ0024

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 22 de Junho de 2006.
    August Storck KG contra Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).
    Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Marca comunitária - Artigo 7.º, n.os 1, alínea b), e 3, do Regulamento (CE) n.º 40/94 - Motivo absoluto de recusa de registo - Marca tridimensional - Forma tridimensional de um rebuçado de cor castanha clara - Carácter distintivo.
    Processo C-24/05 P.

    Colectânea de Jurisprudência 2006 I-05677

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2006:421

    Processo C‑24/05 P

    August Storck KG

    contra

    Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

    «Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Artigo 7.°, n.os 1, alínea b), e 3, do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Motivo absoluto de recusa de registo – Marca tridimensional – Forma tridimensional de um rebuçado de cor castanha clara – Carácter distintivo»

    Conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer apresentadas em 23 de Março de 2006 

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 22 de Junho de 2006 

    Sumário do acórdão

    1.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas desprovidas de carácter distintivo

    [Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea b)]

    2.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas desprovidas de carácter distintivo

    (Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 3)

    3.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas desprovidas de carácter distintivo

    (Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 3)

    1.     Os critérios de apreciação do carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, das marcas tridimensionais constituídas pela forma do próprio produto não são diferentes dos critérios aplicáveis às outras categorias de marcas. No entanto, no âmbito da aplicação desses critérios, a percepção do público interessado não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional, constituída pela forma do próprio produto, e no caso de uma marca nominativa ou figurativa, que consiste num sinal independente do aspecto dos produtos que designa. Com efeito, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando‑se na sua forma ou no seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, podendo, por isso, tornar‑se mais difícil provar o carácter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa.

    Nestas condições, só não é desprovida de carácter distintivo na acepção desta disposição uma marca que, de forma significativa, diverge da norma ou dos hábitos do sector e, por essa razão, é susceptível de cumprir a sua função essencial de origem.

    (cf. n.os 24‑26)

    2.     O carácter distintivo de uma marca referido no artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, pode ser adquirido em consequência da utilização dessa marca conjugada com uma marca registada. Por conseguinte, uma marca tridimensional pode eventualmente adquirir carácter distintivo através da utilização, mesmo que seja utilizada juntamente com outra marca nominativa ou figurativa.

    Todavia, por essência, uma marca tridimensional não se confunde com a sua representação gráfica bidimensional. Consequentemente, quando figura uma imagem do produto na embalagem, os consumidores não são confrontados com a própria marca, enquanto marca constituída pela forma tridimensional do produto. Porém, não deve excluir‑se que a representação bidimensional dessa marca possa eventualmente facilitar o conhecimento da marca pelo público pertinente quando permite a percepção dos elementos essenciais da forma tridimensional do produto.

    Por outro lado, no que diz respeito à aquisição de carácter distintivo através da utilização, a identificação do produto ou do serviço pelos meios interessados como proveniente de uma empresa determinada deve ser levada a cabo graças à utilização da marca enquanto tal.

    Assim, não é qualquer utilização da marca, nem, por maioria de razão, a utilização de uma representação bidimensional de uma marca tridimensional, que constitui necessariamente uma sua utilização enquanto marca.

    (cf. n.os 57‑62)

    3.     Por conseguinte, para se apreciar se uma marca adquiriu carácter distintivo através da respectiva utilização, na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, há que levar em conta todas as circunstâncias em que o público pertinente é confrontado com essa marca. É o caso não só do momento em que é tomada a decisão de compra, mas também de momentos anteriores, por exemplo através da publicidade, e no momento em que o produto é consumido.

    Por essa razão, é quando prepara e faz a sua escolha entre diferentes produtos da categoria em causa que o consumidor médio presta mais atenção, de modo que a questão de saber se o consumidor médio é ou não confrontado com a marca no momento da compra reveste‑se de particular importância para efeitos de determinar se essa marca adquiriu carácter distintivo através da respectiva utilização.

    (cf. n.os 71, 72)




    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    22 de Junho de 2006 (*)

    «Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Artigo 7.°, n.os 1, alínea b), e 3, do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Motivo absoluto de recusa de registo – Marca tridimensional – Forma tridimensional de um rebuçado de cor castanha clara – Carácter distintivo»

    No processo C‑24/05 P,

    que tem por objecto um recurso nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 24 de Janeiro de 2005,

    August Storck KG, com sede em Berlim (Alemanha), representada por I. Rohr, H. Wrage‑Molkenthin e T. Reher, Rechtsanwälte,

    recorrente,

    sendo a outra parte no processo:

    Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por G. Schneider, na qualidade de agente,

    recorrido em primeira instância,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: P. Jann, presidente de secção, N. Colneric, J. N. Cunha Rodrigues, M. Ilešič (relator) e E. Levits, juízes,

    advogado‑geral: D. Ruiz‑Jarabo Colomer,

    secretário: B. Fülöp, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 16 de Fevereiro de 2006,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 23 de Março de 2006,

    profere o presente

    Acórdão

    1       Através do seu recurso, a August Storck KG pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Quarta Secção) de 10 de Novembro de 2004, Storck/IHMI (Forma de um rebuçado) (T‑396/02, ainda não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao seu recurso de anulação da decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 14 de Outubro de 2002 (processo R 187/2001‑4) (a seguir «decisão impugnada»), que recusou o registo de uma marca tridimensional constituída pela forma de um rebuçado de cor castanha clara.

     Quadro jurídico

    2       O Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), dispõe, no artigo 7.°, intitulado «Motivos absolutos de recusa»:

    «1.      Será recusado o registo:

    […]

    b)      De marcas desprovidas de carácter distintivo;

    […]»

    3.      As alíneas b), c) e d) do n.° 1 não são aplicáveis se, na sequência da utilização da marca, esta tiver adquirido um carácter distintivo para os produtos ou serviços para os quais foi pedido o registo.»

    3       O artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94, intitulado «Fundamentação das decisões», dispõe:

    «As decisões do [IHMI] serão fundamentadas. Essas decisões só se podem basear em motivos a respeito dos quais as partes tenham podido pronunciar‑se.»

    4       O artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, intitulado «Exame oficioso dos factos», esclarece, no n.° 1:

    «No decurso do processo, o [IHMI] procederá ao exame oficioso dos factos; contudo, num processo respeitante a motivos relativos de recusa do registo, o exame limitar‑se‑á às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes.»

     Antecedentes do litígio

    5       Em 30 de Março de 1998, a recorrente apresentou no IHMI, nos termos do Regulamento n.° 40/94, um pedido de registo como marca comunitária de uma marca tridimensional que representa um rebuçado de cor castanha clara, a seguir reproduzida:

           Image not found Image not found        Image not found Image not found        Image not found Image not found

    6       Os produtos para os quais o registo foi pedido são «doçarias» e pertencem à classe 30 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional de Produtos e Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, na versão revista e alterada.

    7       Por decisão de 25 de Janeiro de 2001, o examinador indeferiu o pedido pelo facto de a marca pedida não ter carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, e de não o ter adquirido através da utilização, na acepção do n.° 3 do mesmo artigo.

    8       Na decisão impugnada, a Quarta Câmara de Recurso do IHMI confirmou a decisão do examinador. No essencial, considerou que a conjugação de forma e de cor constitutiva da marca pedida não permitia, intrinsecamente, fornecer indicações quanto à origem dos produtos em causa, concretamente, as doçarias. Além disso, considerou que os dados apresentados pela recorrente não provavam que essa marca tinha adquirido um carácter distintivo em relação, designadamente, aos rebuçados de caramelo, depois da utilização que dela tinha sido feita.

     Tramitação do processo no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

    9       A recorrente interpôs recurso no Tribunal de Primeira Instância assente em quatro fundamentos, destinado a obter a anulação da decisão impugnada.

    10     Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, o Tribunal de Primeira Instância declarou, nos n.os 39 a 45 do acórdão recorrido, que a Câmara de Recurso tinha concluído correctamente que a marca pedida não tinha carácter distintivo, na acepção dessa disposição, pelas seguintes razões:

    «39      No caso em apreço, a Câmara de Recurso considerou, com razão que, tratando‑se de produtos de consumo largamente difundidos, como os que estão em causa no presente processo, ‘o consumidor não dará muita atenção à forma e à cor das doçarias’ e que, assim, ‘é improvável que a escolha do consumidor seja ditada pela forma do rebuçado’ (n.° 12 da decisão impugnada).

    40      Além disso, a Câmara de Recurso demonstrou de modo bastante que nenhuma das características de forma da referida marca, vistas isoladamente ou de forma combinada, possuem carácter distintivo. A esse respeito, considerou, em primeiro lugar, que ‘a forma em questão, quase redonda, fazendo lembrar um círculo […], é uma forma geométrica de base’ e que o consumidor médio ‘está habituado a encontrar doçarias, incluindo rebuçados, de forma redonda (circular, oval, elíptica ou cilíndrica)’. No que concerne, de seguida, às bordas superiores arqueadas do rebuçado, considerou que ‘os rebuçados têm formas arqueadas, seja qual for a sua configuração’, por razões funcionais. Finalmente, no que diz respeito à cavidade circular no centro do rebuçado e à sua face interior chata, a Câmara de Recurso concluiu, que ‘estes elementos não alteram substancialmente a impressão de conjunto produzida pela forma’ e que, consequentemente, ‘é improvável que o consumidor em causa esteja atento a essas duas características ao ponto de as apreender como se estas lhe [indicassem] uma determinada origem comercial’ (n.° 13 da decisão impugnada).

    41      Quanto à cor do produto em causa, a saber, o castanho ou diferentes tons deste, a Câmara de Recurso observou igualmente que se tratava de uma ‘cor usual para os rebuçados’ (n.° 13 da decisão impugnada). Com efeito, há que constatar que o público visado está habituado à presença desta cor para doçarias.

    42      Por conseguinte, a forma tridimensional cujo registo foi solicitado constitui uma forma geométrica de base que figura entre as formas que vêm naturalmente à mente do consumidor para produtos de consumo corrente, tais como rebuçados.

    43      Nestas condições, improcede o argumento da recorrente baseado na existência de diferenças alegadamente consideráveis entre a forma e a cor da marca solicitada e as das outras doçarias.

    44      À luz do que ficou dito, há que considerar que a marca tridimensional solicitada é constituída por uma combinação de elementos de apresentação que vêm naturalmente à mente e são típicos dos produtos em questão. Com efeito, a forma em causa não se diferencia substancialmente de certas formas de base dos produtos em questão, que são comummente utilizadas no comércio, aparecendo antes como uma variante das mesmas. Não sendo as diferenças alegadas facilmente perceptíveis, daqui resulta que a forma em causa não se distingue suficientemente das outras formas comummente utilizadas para os rebuçados e não permitirá ao público visado distinguir de forma imediata e segura os rebuçados da recorrente dos que têm outra origem comercial.

    45      Logo, a marca solicitada não permite, tal como um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado a apercebe, individualizar os produtos em questão e distingui‑los dos que têm outra origem comercial. Assim sendo, é desprovida de carácter distintivo em relação a esses produtos.»

    11     Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, o Tribunal de Primeira Instância declarou, nos n.os 61 a 67 do acórdão recorrido, que a Câmara de Recurso não tinha cometido qualquer erro de direito ao considerar que a recorrente não tinha demonstrado que a marca pedida tinha adquirido um carácter distintivo através da utilização que dela tinha sido feita, pelas seguintes razões:

    «61      Em primeiro lugar, os argumentos da recorrente baseados nos dados sobre o volume de vendas e sobre os elevados custos publicitários suportados para promover o rebuçado de caramelo ‘Werther’s Original’ (‘Werther’s Echte’) não são susceptíveis de demonstrar que a marca solicitada adquiriu carácter distintivo após o uso que dela foi feita.

    62      Com efeito, se é certo que a Câmara de Recuso reconheceu que o volume de negócios e os dados relativos aos custos publicitários comprovavam que o tipo de rebuçado em causa estava largamente difundido no mercado, ela considerou, todavia, que essas informações não constituíam a prova, que era, não obstante, essencial, de que o sinal solicitado é utilizado enquanto marca tridimensional para designar os rebuçados da recorrente (n.° 16 da decisão impugnada).

    63      Nos n.os 17 a 21 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso justificou essa apreciação da seguinte forma:

    ‘17.      A requerente apresentou amostras das suas saquetas em plástico que servem de acondicionamento aos rebuçados, sustentando que a forma que nelas se encontra reproduzida constitui uma 'indicação central e um ponto de referência' para o consumidor. Segundo afirma, esse uso é a prova de que a forma é objecto de publicidade enquanto marca do produto e que é nesse sentido que a mesma é apercebida pelo consumidor. A Câmara de Recurso vê‑se obrigada a refutar este ponto de vista. Com efeito, existe uma discrepância entre as declarações da requerente e a forma como os rebuçados aparecem globalmente na saqueta.

    18.      Se é correcto que os rebuçados de forma castanha tal como a requerente os apresentou aparecem no acondicionamento, há, contudo, que examinar a finalidade dessa reprodução. Não se pode tratar de uma análise abstracta. Pelo contrário, há que ter em vista a forma provável como o consumidor médio apreende a reprodução dos rebuçados tal como ela figura no acondicionamento.

    19.      Ora, confrontado com uma saqueta de rebuçados da requerente, o consumidor em questão apercebe‑se, em primeiro lugar, do nome 'Werther’s Original' que, escrito em letras grandes, ocupa praticamente metade da saqueta e está envolto por elementos adicionais como um pequeno sinal oval com o nome 'Storck' e o desenho de uma pequena aldeia debaixo do qual se pode ler 'Traditional Werther’s Quality' [qualidade do Werther tradicional]. A metade inferior da saqueta mostra uma fotografia a cores que representa cerca de quinze rebuçados em desordem e a legenda: 'The classic candy made with real butter and fresh cream' [o rebuçado clássico de manteiga e natas frescas].

    20.      De acordo com as declarações da requerente, esta ilustração corresponde à marca tridimensional cujo registo solicitou. Ora, a Câmara de Recurso contesta o mérito desta posição. A forma como os rebuçados são apresentados na saqueta não é conforme à maneira tradicional de apresentar uma marca de um produto. Afigura‑se‑lhe que a finalidade dessa representação é (antes) a de ilustrar o conteúdo da saqueta. Com efeito, contrariamente às alegações da recorrente, a saqueta não mostra uma forma, mas uma imagem realista de um monte de rebuçados não embalados. Note‑se que esta representação não visa realçar as características que a requerente considera que conferem à marca um carácter distintivo (a cavidade central, a face inferior chata e as bordas arqueadas). É por essa razão que a Câmara de Recurso considera que há uma discrepância entre a maneira como os rebuçados são representados na embalagem e a alegação segundo a qual essa representação é uma marca tridimensional e é apercebida como tal pelo consumidor médio. A apreciação da Câmara de Recurso leva‑a antes a considerar provável que o consumidor veja a imagem dos rebuçados unicamente como uma ilustração do conteúdo da saqueta. Ilustrar as embalagens de uma forma atraente para mostrar o aspecto do produto ou as possibilidades de o servir é um procedimento largamente difundido na indústria dos produtos alimentares, estando nesta incluída a indústria das doçarias, e é ditado mais pelo marketing dos produtos do que pela preocupação de identificar os produtos através das marcas. A Câmara de Recurso considera, assim, que a imagem não preenche a função de uma marca, mas serve unicamente para ilustrar o produto. A frase que acompanha a imagem, a saber, 'The classic candy made with real butter and fresh cream', confirma ainda que essa será a percepção provável de um comprador de rebuçados razoavelmente atento. Com efeito, a frase e a imagem completam‑se: a frase descreve a natureza dos rebuçados e a imagem mostra‑os. A Câmara de Recurso concede à requerente que um produto pode ter várias marcas ao mesmo tempo. O que não impede, na sua opinião, com base no aspecto das saquetas que servem de acondicionamento aos rebuçados da requerente, que a reprodução dos rebuçados nestas últimas não seja conforme à reprodução de uma marca.

    21.      Em resultado das considerações anteriormente desenvolvidas, é forçoso concluir que o volume de negócios e os dados numéricos sobre os custos publicitários apresentados a título de prova demonstram certamente que os rebuçados 'Werther’s' são colocados à venda no mercado, mas não que a sua forma tenha sido utilizada como marca […]’

    64      Não há que pôr em causa as considerações precedentes. O material publicitário apresentado pela recorrente não contém qualquer prova do uso da marca tal como foi solicitada. Com efeito, em todas as imagens apresentadas, a representação da forma e da cor reivindicadas é acompanhada de sinais nominativos e figurativos. Por conseguinte, esse material não pode constituir prova de que o público interessado apreende a marca solicitada, enquanto tal e independentemente das marcas nominativas e figurativas de que a mesma está acompanhada na publicidade e no momento da venda dos produtos, como indicando a origem comercial dos produtos […] em questão […]

    65      Por outro lado, há que referir que a própria recorrente indica na sua petição que o rebuçado em questão não é vendido avulso, mas dentro de uma saqueta de acondicionamento em que cada rebuçado é, além disso, embalado separadamente. Daqui resulta que, no momento da decisão de compra, o consumidor médio não é directamente confrontado com a forma do rebuçado em questão de modo que lhe permita atribuir a esta uma função de indicador de origem.

    66      A mesma conclusão se impõe, em segundo lugar, quanto às sondagens submetidas pela recorrente à apreciação da Câmara de Recurso para demonstrar o carácter distintivo da marca solicitada adquirido pelo uso. Com efeito, resulta claramente do n.° 21, in fine, da decisão impugnada, que o conhecimento do rebuçado comercializado pela recorrente, enquanto marca, não foi demonstrado com base na forma em causa, mas com base na sua denominação ‘Werther’s’.»

    12     Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao recurso e condenou a recorrente nas despesas.

     O presente recurso

    13     No seu recurso, em apoio do qual invoca quatro fundamentos, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

    –       anular o acórdão recorrido;

    –       a título principal, proferir uma decisão definitiva, julgando procedentes os pedidos formulados em primeira instância;

    –       a título subsidiário, ordenar que o processo baixe ao Tribunal de Primeira Instância;

    –       condenar o IHMI nas despesas.

    14     O IHMI pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao recurso e que condene a recorrente nas despesas.

     Quanto ao primeiro fundamento

     Argumentos das partes

    15     No primeiro fundamento, que se divide em duas partes, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

    16     Em primeiro lugar, no n.° 44 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância sujeitou erradamente o carácter distintivo da marca pedida à condição de essa marca se distinguir substancialmente das apresentações de rebuçados comummente utilizadas no comércio e, consequentemente, impôs requisitos mais estritos para as marcas tridimensionais do que para as marcas nominativas ou figurativas.

    17     O Tribunal de Primeira Instância também exigiu erradamente que a marca pedida se distinguisse substancialmente das marcas semelhantes que eventualmente existissem no sector das doçarias.

    18     Segundo a recorrente, a circunstância de ser possível uma confusão com produtos de proveniência diferente só é pertinente no âmbito de uma oposição baseada no risco de confusão da marca pedida com uma marca anterior.

    19     Em segundo lugar, a Câmara de Recurso e o Tribunal de Primeira Instância não procuraram saber se a marca pedida tem por si própria, independentemente das apresentações de rebuçados semelhantes existentes no mercado, um mínimo carácter distintivo. Segundo a recorrente, se o Tribunal de Primeira Instância o tivesse feito, teria concluído que a referida marca não é desprovida de carácter distintivo.

    20     A este respeito, a recorrente contesta a afirmação do Tribunal de Primeira Instância, no n.° 39 do acórdão recorrido, segundo a qual é improvável que a escolha do consumidor seja ditada pela forma do rebuçado. Contesta igualmente a afirmação do Tribunal de Primeira Instância, no n.° 42 do mesmo acórdão, segundo a qual a forma cujo registo de marca foi pedido constitui uma forma geométrica de base.

    21     O IHMI responde, em primeiro lugar, que de modo algum o Tribunal de Primeira Instância sujeitou a marca pedida a critérios mais estritos do que os exigidos para as marcas nominativas ou figurativas, antes tendo aplicado a jurisprudência assente segundo a qual é necessário que a forma do produto cujo registo de marca é pedido se distinga de modo significativo do que é normal ou habitual no sector relevante.

    22     Em segundo lugar, a alegação de que o Tribunal de Primeira Instância deveria ter concluído que a marca pedida tem carácter distintivo destina‑se a impugnar a matéria de facto e, por conseguinte, é inadmissível no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância.

     Apreciação do Tribunal de Justiça

    23     Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, resulta de jurisprudência consolidada que o carácter distintivo de uma marca, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, deve ser apreciado, por um lado, relativamente aos produtos ou aos serviços para os quais o registo foi pedido e, por outro, em relação à percepção que deles tem o público interessado constituído pelo consumidor médio desses produtos ou serviços, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., nomeadamente, acórdãos de 29 de Abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, Colect., p. I‑5089, n.° 35, e de 12 de Janeiro de 2006, Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, C‑173/04 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 25).

    24     Segundo jurisprudência também consolidada, os critérios de apreciação do carácter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela forma do próprio produto não são diferentes dos critérios aplicáveis às outras categorias de marcas (acórdãos Henkel/IHMI, já referido, n.° 38; de 7 de Outubro de 2004, Mag Instrument/IHMI, C‑136/02 P, Colect., p. I‑9165, n.° 30, e Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, já referido, n.° 27).

    25     No entanto, no âmbito da aplicação desses critérios, a percepção do público interessado não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional, constituída pela forma do próprio produto, e no caso de uma marca nominativa ou figurativa, que consiste num sinal independente do aspecto dos produtos que designa. Com efeito, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando‑se na sua forma ou no seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, podendo, por isso, tornar‑se mais difícil provar o carácter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa (v., nomeadamente, acórdãos, já referidos, Henkel/IHMI, n.° 38; Mag Instrument/IHMI, n.° 30, e Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, n.° 28).

    26     Nestas condições, só não é desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 uma marca que, de forma significativa, diverge da norma ou dos hábitos do sector e, por essa razão, é susceptível de cumprir a sua função essencial de origem (v., nomeadamente, acórdãos, já referidos, Henkel/IHMI, n.° 39; Mag Instrument/IHMI, n.° 31, e Deutsche SiSi Werke/IHMI, n.° 31).

    27     Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância decidiu bem ao levar em conta as formas e cores das embalagens de rebuçados comummente utilizadas no comércio para apreciar se a marca pedida tem ou não carácter distintivo.

    28     No n.° 44 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância declarou que a forma de rebuçado em causa «não se diferencia substancialmente de certas formas de base dos produtos em questão, que são comummente utilizadas no comércio». Na medida em que a exigência de uma diferença substancial vai além da simples diferença significativa exigida pela jurisprudência citada no n.° 26 do presente acórdão, o Tribunal de Primeira Instância teria cometido um erro de direito se tivesse sujeitado o reconhecimento do carácter distintivo da marca pedida à observância de tal exigência.

    29     Todavia, não é o caso. Com efeito, resulta do mesmo número do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância se baseou na constatação de que a marca pedida é constituída por uma combinação de elementos de apresentação que vêm naturalmente à mente e são típicos dos produtos em questão, que aparece como uma variante de certas formas de base comummente utilizadas no sector das doçarias e que, não sendo as diferenças alegadas facilmente perceptíveis, a marca em causa não se distingue suficientemente das outras formas comummente utilizadas para os rebuçados e não permite ao público visado distinguir de forma imediata e segura os rebuçados da recorrente dos que têm outra origem comercial.

    30     Com estas considerações, o Tribunal de Primeira Instância demonstrou que a marca pedida não difere de modo significativo da norma ou dos hábitos do sector das doçarias. Por conseguinte, não cometeu qualquer erro de direito ao concluir que a referida marca não tem carácter distintivo.

    31     Quanto à alegação da recorrente segundo a qual o Tribunal de Primeira Instância exigiu que a marca pedida se distinguisse substancialmente das marcas semelhantes eventualmente existentes nos sector das doçarias, assenta numa leitura errada do acórdão recorrido, não tendo o Tribunal de Primeira Instância de modo algum procurado saber se outras marcas utilizadas para esse tipo de produtos eram idênticas ou semelhantes à marca pedida.

    32     Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

    33     Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, por um lado, como resulta do n.° 27 do presente acórdão, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu qualquer erro de direito ao tomar em consideração as formas de rebuçados normalmente utilizadas no comércio para apreciar se a marca pedida tem ou não carácter distintivo.

    34     Por outro lado, na medida em que, nessa parte do primeiro fundamento, critica o Tribunal de Primeira Instância por ter concluído que a marca pedida não tem carácter distintivo, a recorrente pretende, na realidade, que o Tribunal de Justiça substitua a apreciação da matéria de facto feita pelo Tribunal de Primeira Instância pela sua própria apreciação.

    35     Com efeito, as considerações do Tribunal de Primeira Instância que constam dos n.os 39 a 42 do acórdão recorrido, segundo as quais, por um lado, o nível de atenção do consumidor médio em relação à forma e à cor das doçarias não é elevado e, por outro, a forma tridimensional pela qual é constituída a marca pedida é uma forma geométrica de base, são apreciações de natureza factual (v, neste sentido, respectivamente, acórdãos, já referidos, Henkel/IHMI, n.° 56, e Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, n.° 47).

    36     Ora, como decorre dos artigos 255.°, n.° 1, CE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância é limitado às questões de direito. O Tribunal de Primeira Instância é, portanto, o único competente para apurar e apreciar os factos pertinentes bem como para apreciar os elementos de prova. A apreciação destes factos e elementos de prova não constitui, portanto, excepto em caso de desvirtuação dos mesmos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (v., nomeadamente, acórdãos de 19 de Setembro de 2002, DKV/IHMI, C‑104/00 P, Colect., p I‑7561, n.° 22, e Deutsche SiSi Werke/IHMI, já referido, n.° 35).

    37     Não tendo sido alegada, no caso em apreço, nenhuma desvirtuação dos factos e elementos de prova apresentados ao Tribunal de Primeira Instância, há que julgar a segunda parte do primeiro fundamento em parte improcedente e em parte inadmissível e, por conseguinte, julgar esse fundamento improcedente na íntegra.

     Quanto aos segundo e terceiro fundamentos

     Argumentos das partes

    38     Nos segundo e terceiro fundamentos, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou, respectivamente, o artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, nos termos do qual o IHMI procede ao exame oficioso dos factos, e o artigo 73.° do mesmo regulamento, nos termos do qual as decisões do IHMI só podem basear‑se em fundamentos sobre os quais as partes tenham tido oportunidade de se pronunciar.

    39     Por um lado, o artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 obriga o IHMI a instruir por si próprio os factos nos quais tencione basear a sua decisão. Assim, ao não apresentar, como deveria ter feito, exemplos concretos de rebuçados de aspecto alegadamente idêntico à marca pedida, cuja existência tinha invocado para concluir pelo carácter «usual» da referida marca, a Câmara de Recurso privou a recorrente da possibilidade de contestar a pertinência desses exemplos.

    40     Ao aceitar essas alegações infundadas da Câmara de Recurso, no n.° 40 do acórdão recorrido, e ao desenvolver ele próprio afirmações semelhantes sem as basear em factos susceptíveis de verificação, nos n.os 41 e 42 do mesmo acórdão, o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94.

    41     Por outro lado, não tendo a Câmara de Recurso apresentado embalagens de rebuçados supostamente semelhantes à marca pedida, a recorrente não pôde, em nenhuma fase do processo, tomar posição sobre essa matéria e, por conseguinte, ficou impedida de demonstrar que esses rebuçados, na realidade, apresentavam diferenças decisivas da marca pedida. Assim, foi violado o seu direito de audiência.

    42     Ao aceitar as alegações da Câmara de Recurso sobre as quais a recorrente não pôde pronunciar‑se e ao basear a sua própria decisão nessas alegações, o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94.

    43     O IHMI alega que, uma vez que a recorrente suscitou pela primeira vez no Tribunal de Justiça a questão da violação dos artigos 73.° e 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, os segundo e terceiro fundamentos devem ser julgados inadmissíveis.

    44     Acrescenta que o terceiro fundamento invocado pela recorrente é infundado na medida em que acusa o Tribunal de Primeira Instância de ter violado os seus direitos de defesa, uma vez que as conclusões da Câmara de Recurso contestadas pela recorrente estiveram no centro da discussão na referida Câmara e foram de novo contestadas pela recorrente no Tribunal de Primeira Instância.

     Apreciação do Tribunal de Justiça

    45     Há que recordar que permitir que uma parte invoque no Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos que não invocou no Tribunal de Primeira Instância equivaleria a permitir‑lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência em segunda instância é limitada, um litígio com um objecto mais lato do que o submetido ao Tribunal de Primeira Instância. No âmbito de um recurso em segunda instância, a competência do Tribunal de Justiça encontra‑se limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância (v., nomeadamente, acórdão de 11 de Novembro de 2004, Ramondín e o./Comissão, C‑186/02 P e C‑188/02 P, Colect., p. I‑10653, n.° 60).

    46     No caso em apreço, a recorrente não alegou no Tribunal de Primeira Instância que a Câmara de Recurso violou os artigos 73.° e 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 ao não apresentar exemplos de rebuçados idênticos ou semelhantes aos comercializados pela recorrente.

    47     Por conseguinte, na medida em que criticam o Tribunal de Primeira Instância por não ter anulado a decisão impugnada por essas razões, os segundo e terceiro fundamentos constituem fundamentos invocados pela primeira vez no âmbito do recurso da decisão do Tribunal de Primeira Instância e devem, consequentemente, ser julgados inadmissíveis.

    48     Na medida em que criticam o Tribunal de Primeira Instância por, através da suas próprias afirmações infundadas, ter igualmente violado os artigos 73.° e 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, os referidos fundamentos são improcedentes. Com efeito, a observância dessas disposições impõe‑se no âmbito da análise dos pedidos de registo pelos órgãos do IHMI, mas já não no âmbito do processo no Tribunal de Primeira Instância, que se rege pelo Estatuto do Tribunal de Justiça e pelo Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

    49     De resto, a recorrente teve a possibilidade de contestar no Tribunal de Primeira Instância a afirmação da Câmara de Recurso segundo a qual a forma de rebuçado em causa não se distingue de modo significativo de numerosas embalagens comummente utilizadas no mercado das doçarias, de modo que os seus direitos de defesa, nomeadamente o direito de audiência, foram respeitados por esse Tribunal.

    50     Assim, há que julgar os segundo e terceiro fundamentos parcialmente inadmissíveis e parcialmente improcedentes.

     Quanto ao quarto fundamento

     Argumentos das partes

    51     No quarto fundamento, que se divide em duas partes, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 ao submeter a prova de que a marca pedida adquiriu carácter distintivo pela respectiva utilização a exigências erradas.

    52     Em primeiro lugar, no n.° 64 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a prova da utilização de uma marca tridimensional não pode ser feita por documentos como as embalagens dos produtos para os quais o registo dessa marca foi pedido ou através de material publicitário relativo a esses produtos, quando aparecem nesses documentos, para além da referida marca, outras marcas nominativas ou figurativas. Assim, considerou que uma marca constituída pela forma tridimensional do produto em causa não pode adquirir carácter distintivo se for acompanhada de uma marca nominativa ou figurativa.

    53     Esta análise não corresponde à percepção que o consumidor médio tem das marcas. O facto de figurarem simultaneamente várias marcas num produto não impede esse consumidor de ter uma percepção de cada uma delas como um indicador da respectiva proveniência, podendo mesmo essas marcas reforçar‑se mutuamente, contribuindo o conhecimento de umas para o das outras. Além disso, na medida em que é da própria natureza de uma marca tridimensional ser utilizada simultaneamente com outras marcas nominativas ou figurativas, a análise do Tribunal de Primeira Instância levaria a que essa utilização de uma marca tridimensional nunca pudesse ser provada, o que seria contrário à intenção do legislador comunitário.

    54     Em segundo lugar, o Tribunal de Primeira Instância errou, por um lado, ao confirmar, no n.° 64 do acórdão recorrido, a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a representação da marca pedida na embalagem em que são vendidos os rebuçados em causa tem unicamente por finalidade ilustrar o conteúdo da embalagem e, por outro, ao considerar, no n.° 65 do mesmo acórdão, que, sendo os referidos rebuçados vendidos numa embalagem, o consumidor não é directamente confrontado com a marca pedida quando decide comprar. Com efeito, a referida marca é reproduzida nas embalagens de acondicionamento e, tratando‑se ao mesmo tempo do próprio produto, a sua reprodução é não só uma informação sobre o conteúdo da embalagem, mas também uma indicação quanto à proveniência do produto.

    55     Em terceiro lugar, o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 65 do acórdão recorrido, errou ao levar unicamente em consideração a percepção do consumidor médio no momento em que decide comprar. De facto, para determinar em que medida esse consumidor reconhece a marca, seria necessário levar em conta a forma como ele é confrontado não só no momento em que decide comprar, mas também antes desse momento, por exemplo através da publicidade, e no momento em que o produto é consumido.

    56     Segundo o IHMI, de modo algum a Câmara de Recurso e o Tribunal de Primeira Instância exigiram que os elementos de prova que demonstram a utilização de uma marca tridimensional respeitem a essa única marca, mas observaram, correctamente, que o material publicitário apresentado não continha nenhuma prova da utilização da marca tal como foi requerida. Em particular, como é referido no n.° 63 do acórdão recorrido, a Câmara de Recurso concluiu que não era possível discernir no material publicitário as características específicas da forma do rebuçado e que a representação dos rebuçados na embalagem apresentada como prova não estava em conformidade com a representação de uma marca. Do mesmo modo, no n.° 64 do referido acórdão, o Tribunal de Primeira Instância referiu que a natureza da representação da forma do rebuçado na embalagem é de tal forma pouco clara e disfarçada por diversos outros sinais que o consumidor não pode apreendê‑la como uma representação da marca pedida.

     Apreciação do Tribunal de Justiça

    57     Relativamente às primeira e segunda partes do quarto fundamento, o Tribunal de Justiça já declarou, no acórdão de 7 de Julho de 2005, Nestlé (C‑353/03, Colect. p. I‑6135), que o carácter distintivo de uma marca referido no artigo 3.°, n.° 3, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), pode ser adquirido em consequência da utilização dessa marca conjugada com uma marca registada.

    58     O mesmo se diga relativamente ao carácter distintivo adquirido pela utilização na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, sendo esta disposição e o artigo 3.°, n.° 3, da Directiva 89/104, no essencial, idênticos.

    59     Por conseguinte, uma marca tridimensional pode eventualmente adquirir carácter distintivo através da utilização, mesmo que seja utilizada juntamente com outra marca nominativa ou figurativa. É o que acontece quando a marca é constituída pela forma do produto ou da sua embalagem e que estes são sistematicamente revestidos de uma marca nominativa com a qual são comercializados.

    60     Todavia, há que salientar que decorre da sua essência que uma marca tridimensional não se confunde com a sua representação gráfica bidimensional. Consequentemente, quando, como no caso em apreço, figura uma imagem do produto na embalagem, os consumidores não são confrontados com a própria marca, enquanto marca constituída pela forma tridimensional do produto. Porém, não deve excluir‑se que a representação bidimensional dessa marca possa eventualmente facilitar o conhecimento da marca pelo público pertinente quando permite a percepção dos elementos essenciais da forma tridimensional do produto.

    61     Por outro lado, há que recordar que, no que diz respeito à aquisição de carácter distintivo através da utilização, a identificação do produto ou do serviço pelos meios interessados como proveniente de uma empresa determinada deve ser levada a cabo graças à utilização da marca enquanto tal (acórdãos de 18 de Junho de 2002, Philips, C‑299/99, Colect., p. I‑5475, n.° 64, e Nestlé, já referido, n.° 26). A expressão «uso da marca enquanto tal» deve, assim, ser entendida no sentido de que apenas se refere ao uso da marca para efeitos da identificação do produto ou do serviço pelos meios interessados como proveniente de uma empresa determinada (acórdão Nestlé, já referido, n.° 29).

    62     Assim, não é qualquer utilização da marca, nem, por maioria de razão, a utilização de uma representação bidimensional de uma marca tridimensional, que constitui necessariamente uma sua utilização enquanto marca.

    63     No caso em apreço, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu nenhum erro de direito.

    64     Por um lado, nos n.os 63 e 64 do acórdão recorrido, fazendo suas as apreciações da Câmara de Recurso, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a forma como os rebuçados são representados – uma imagem de um monte de uma quinzena de rebuçados – nas saquetas em que a recorrente os comercializa não está em conformidade com a representação de uma marca uma vez que, nomeadamente, essa representação não mostra a forma de rebuçado cujo registo foi pedido enquanto marca, mas sim uma imagem realista de um monte de rebuçados, e não pretende realçar as características que a recorrente considera que conferem à marca pedida carácter distintivo (a cavidade central, a face inferior chata e as bordas arqueadas), de modo que há uma discrepância entre a representação dos rebuçados nas saquetas e a marca tridimensional cujo registo foi pedido.

    65     Trata‑se de uma apreciação de natureza factual que, salvo em caso de desvirtuação dos factos, não alegada no caso vertente, não é susceptível de fiscalização no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância.

    66     Por outro lado, em nada resulta dos mesmos números do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância tenha excluído por princípio a possibilidade de uma marca tridimensional constituída pela forma do produto em causa adquirir carácter distintivo através da utilização quando é utilizada juntamente com uma marca nominativa ou figurativa.

    67     Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância fez expressamente suas as considerações da Câmara de Recurso que constam dos n.os 17 a 21 da decisão impugnada. Ora, no n.° 20 dessa decisão, a Câmara de Recurso admitiu que um produto pode ostentar várias marcas ao mesmo tempo.

    68     No n.° 64 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância limitou‑se a declarar que, tendo em conta as suas características, as saquetas utilizadas para comercializar os produtos da recorrente não são susceptíveis de fazer prova de que a marca pedida é apreendida como uma indicação da origem dos referidos produtos. Trata‑se igualmente de uma apreciação de natureza factual que, salvo em caso de desvirtuação, não pode ser objecto de fiscalização em sede de recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância.

    69     Consequentemente, as primeira e segunda partes do quarto fundamento são improcedentes.

    70     Relativamente à terceira parte desse fundamento, há que recordar que, mesmo não tendo uma marca ab initio carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, pode adquiri‑lo, relativamente aos produtos ou serviços reivindicados, na sequência do seu uso, em conformidade com o n.° 3 do mesmo artigo. Este carácter distintivo pode ser adquirido, designadamente, após um processo normal de familiarização do público em causa (acórdãos de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑3793, n.° 67, e Mag Instrument/IHMI, já referido, n.° 47).

    71     Por conseguinte, para se apreciar se uma marca adquiriu carácter distintivo através da respectiva utilização, há que levar em conta todas as circunstâncias em que o público pertinente é confrontado com essa marca. É o caso não só do momento em que é tomada a decisão de compra, mas também de momentos anteriores, por exemplo através da publicidade, e no momento em que o produto é consumido.

    72     Por essa razão, é quando prepara e faz a sua escolha entre diferentes produtos da categoria em causa que o consumidor médio presta mais atenção (v., neste sentido, acórdão de 12 de Janeiro de 2006, Ruiz‑Picasso e o./IHMI, C‑361/04 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 41), de modo que a questão de saber se o consumidor médio é ou não confrontado com a marca no momento da compra reveste‑se de particular importância para efeitos de determinar se essa marca adquiriu carácter distintivo através da respectiva utilização.

    73     No caso em apreço, de modo nenhum decorre do n.° 65 do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância apenas levou em consideração o momento da decisão de compra para apreciar se a marca pedida adquiriu carácter distintivo através da utilização que dela foi feita.

    74     No âmbito do segundo fundamento invocado em primeira instância, a recorrente alegou essencialmente que a marca pedida é posta em evidência em todas as embalagens dos seus rebuçados e contestou a afirmação em contrário da Câmara de Recurso. Nos n.os 63 a 65 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância refutou essa argumentação observando que, quando vê uma das suas embalagens, o consumidor médio não é directamente confrontado com a forma de rebuçado cujo registo foi pedido enquanto marca tridimensional. Assim, o Tribunal de Primeira Instância colocou‑se logicamente no próprio momento da compra.

    75     Todavia, há que observar que, no n.° 66 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância analisou as sondagens apresentadas pela recorrente para demonstrar o grau de notoriedade da marca. Ora, essas sondagens não distinguem entre as circunstâncias em que os consumidores foram confrontados com a marca. O Tribunal de Primeira Instância considerou que as sondagens apresentadas não constituíam prova de que a marca pedida era conhecida.

    76     Nestas circunstâncias, a terceira parte do quarto fundamento também é improcedente e, consequentemente, esse fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra.

    77     Sendo todos os fundamentos invocados pela recorrente improcedentes, há que negar provimento ao recurso.

     Quanto às despesas

    78     Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.° do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o IHMI pedido a condenação da recorrente e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

    1)      É negado provimento ao recurso.

    2)      A August Storck KG é condenada nas despesas.

    Assinaturas


    * Língua do processo: alemão.

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