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Document 62000CO0479

    Despacho do presidente do Tribunal de 11 de Abril de 2001.
    Comissão das Comunidades Europeias contra Gerot Pharmazeutika GmbH.
    Processo C-479/00 P (R).

    Colectânea de Jurisprudência 2001 I-03121

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2001:224

    62000O0479

    Despacho do presidente do Tribunal de 11 de Abril de 2001. - Comissão das Comunidades Europeias contra Gerot Pharmazeutika GmbH. - Processo C-479/00 P (R).

    Colectânea da Jurisprudência 2001 página I-03121


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Parte decisória

    Palavras-chave


    1. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Fundamentos - Apreciação errada dos factos - Inadmissibilidade - Fiscalização pelo Tribunal de Justiça da apreciação dos elementos de prova submetidos ao Tribunal de Primeira Instância - Exclusão excepto em caso de desnaturação

    (Artigo 225.° CE; Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 51.° )

    2. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Admissibilidade - Apreciação em relação ao litígio objecto da instância

    [Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 49.° ]

    3. Aproximação das legislações - Especialidades farmacêuticas - Autorização de colocação no mercado - Avaliação dos medicamentos - Apreciação da sua nocividade e da sua eficácia - Exame em relação de reciprocidade - Carácter evolutivo

    (Directivas do Conselho 65/65, artigo 5.° , e 75/318, anexo)

    4. Aproximação das legislações - Especialidades farmacêuticas - Autorização de colocação no mercado - Revogação da autorização - Poder de apreciação das autoridades comunitárias - Fiscalização jurisdicional - Limites

    (Directivas do Conselho 65/65, artigo 11.° , e 75/319, artigos 13.° e 14.° )

    Sumário


    1. Só o Tribunal de Primeira Instância é competente, por um lado, para apurar os factos, salvo nos casos em que a inexactidão material das suas conclusões resulte das peças do processo que lhe foram submetidas, e, por outro, para apreciar esses factos. A apreciação dos factos não constitui, portanto, excepto em caso de desnaturação dos elementos que lhe foram submetidos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.

    ( cf. n.o 45 )

    2. As condições de admissibilidade dos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância fixadas pelo artigo 49.° do Estatuto do Tribunal de Justiça são apreciadas relativamente ao litígio objecto da instância e a ele só. A circunstância de os fundamentos de um despacho do Tribunal de Primeira Instância que se tornou definitivo serem idênticos aos de um despacho objecto de recurso não impede que o autor deste recurso conteste esses fundamentos.

    ( cf. n.o 48 )

    3. Segundo o artigo 5.° da Directiva 65/65 relativa às especialidades farmacêuticas, a avaliação de qualquer medicamento reporta-se à sua eficácia, à sua inocuidade e à sua qualidade. O respeito destas três condições visa proteger a saúde pública. Com efeito, a própria noção de protecção da saúde pública implica que o medicamento em causa não só não seja nocivo como também seja eficaz. O grau de nocividade que a autoridade competente pode considerar aceitável depende assim dos benefícios que o medicamento é suposto oferecer. Com efeito, como resulta dos sétimo e oitavo considerandos da Directiva 75/318 relativa às normas e protocolos analíticos, tóxico-farmacológicos e clínicos em matéria de ensaios de especialidades farmacêuticas, as noções de «nocividade» e de «efeito terapêutico» só podem ser examinadas em relação de reciprocidade. Deste modo, as razões que conduziram uma autoridade competente a manter a autorização de colocação no mercado de um medicamento, apesar da existência de certos efeitos nocivos, podem desaparecer se essa autoridade considerar que os benefícios que justificavam tal autorização, a saber, a existência de um efeito terapêutico, deixaram de se produzir. Com efeito, resulta da introdução do anexo da Directiva 75/318, modificada pela Directiva 91/507, que todos os dados ou informações novos serão transmitidos às autoridades competentes após a emissão da autorização de colocação no mercado «por forma a monitorizar a avaliação risco/benefício».

    ( cf. n.os 57, 60 )

    4. Qualquer decisão de revogação de uma autorização de colocação no mercado, adoptada em aplicação do procedimento previsto nos artigos 13.° e 14.° da Directiva 75/319 relativa às especialidades farmacêuticas, deve respeitar as condições materiais exigidas pelo artigo 11.° da Directiva 65/65, condições estas relativas à eficácia, à segurança e à qualidade do medicamento. Este tipo de decisão é, portanto, o resultado de apreciações complexas do domínio médico-farmacológico. Em princípio, tais apreciações são objecto de fiscalização jurisdicional restrita. Com efeito, quando uma autoridade comunitária é chamada, no quadro da sua missão, a efectuar avaliações complexas, goza por este motivo de um amplo poder de apreciação, cujo exercício está sujeito a uma fiscalização jurisdicional limitada, que implica que o juiz comunitário não pode substituir pela sua apreciação dos factos a apreciação levada a cabo pela referida autoridade. Assim, este último limita-se, nesse caso, a examinar a materialidade dos factos e as qualificações jurídicas que essa autoridade daí deduz e, em especial, se a acção desta última não está viciada de erro manifesto ou de desvio de poder, ou ainda se a mesma autoridade não ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação.

    ( cf. n.os 80-81 )

    Partes


    No processo C-479/00 P(R),

    Comissão das Comunidades Europeias, representada por H. Støvlbæk, M. Shotter e K. Fitch, na qualidade de agentes, assistidos por B. Wägenbaur, avocat, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    recorrente,

    apoiada por

    República Francesa, representada por G. de Bergues e R. Loosli-Surrans, na qualidade de agentes,

    interveniente no presente recurso,

    que tem por objecto um recurso do despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 31 de Outubro de 2000, Gerot Pharmazeutika/Comissão (T-132/00 R, Colect., p. II-3635), em que se pede a anulação desse despacho,

    sendo a outra parte no processo:

    Gerot Pharmazeutika GmbH, com sede em Viena (Áustria), representada por K. Grigkar, Rechtsanwalt, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    recorrente em primeira instância,

    O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    ouvida a advogada-geral C. Stix-Hackl,

    profere o presente

    Despacho

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 27 de Dezembro de 2000, a Comissão das Comunidades Europeias interpôs, nos termos do artigo 225.° CE e 50.° , segundo parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, recurso do despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Outubro de 2000, Gerot Pharmazeutika/Comissão (T-132/00 R, Colect., p. II-3635, a seguir «despacho impugnado»), pelo qual este suspendeu a execução da decisão C(2000) 452 da Comissão, de 9 de Março de 2000, relativa à revogação das autorizações de colocação no mercado de medicamentos para uso humano que contenham a seguinte substância: «fentermina» (a seguir «decisão impugnada»).

    2 Por articulados entrados na Secretaria em 1 de Fevereiro de 2001, Gerot Pharmazeutika GmbH (a seguir «Gerot»), sociedade recorrente em primeira instância, apresentou as suas observações escritas ao Tribunal de Justiça.

    3 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 29 de Janeiro de 2001, a República Francesa pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão.

    4 Nos termos dos artigos 37.° , primeiro e quarto parágrafos, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça e 93.° , n.os 1 e 2, do Regulamento de Processo, há que deferir o pedido de intervenção da República Francesa no presente processo.

    5 Esta última apresentou as suas alegações em 19 de Fevereiro de 2001.

    6 Foram ouvidas as observações orais das partes em 7 de Março de 2001.

    Enquadramento jurídico

    7 Em 26 de Janeiro de 1965, o Conselho adoptou a Directiva 65/65/CEE relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO 1965, 22, p. 369; EE 13 F1 p. 18). Esta directiva foi modificada por diversas vezes, nomeadamente, pelas Directivas 89/341/CEE do Conselho, de 3 de Maio de 1989 (JO L 142, p. 11), e 93/39/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993 (JO L 214, p. 22, a seguir «Directiva 65/65»). O artigo 3.° desta directiva estabelece o princípio segundo o qual nenhuma especialidade farmacêutica pode ser colocada no mercado de um Estado-Membro sem que uma autorização tenha sido previamente concedida pela autoridade competente deste Estado-Membro, nos termos da referida directiva, ou sem que uma autorização tenha sido concedida em conformidade com o Regulamento (CEE) n.° 2309/93 do Conselho, de 22 de Julho de 1993, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e fiscalização de medicamentos de uso humano e veterinário e institui uma Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos (JO L 214, p. 1).

    8 O artigo 4.° da Directiva 65/65 determina, nomeadamente, que, tendo em vista a concessão da autorização de colocação no mercado (a seguir «ACM») prevista no artigo 3.° , o responsável por essa colocação apresentará à autoridade competente do Estado-Membro o respectivo pedido.

    9 De acordo com o artigo 5.° da Directiva 65/65:

    «A autorização prevista no artigo 3.° será recusada quando, após verificação das informações e documentos enumerados no artigo 4.° , se revelar que a especialidade é nociva em condições normais de emprego, ou que falta o efeito terapêutico da especialidade ou está insuficientemente comprovado pelo requerente, ou que a especialidade não tem a composição qualitativa e quantitativa declarada.

    A autorização será igualmente recusada se a documentação e as informações apresentadas em apoio do pedido não estiverem conformes com o disposto no artigo 4.° »

    10 O artigo 10.° da Directiva 65/65 dispõe que a autorização será válida por um período de cinco anos, renovável por períodos quinquenais, após exame, pela autoridade competente, de um processo que contenha, designadamente, o estado dos dados de farmacovigilância e as demais informações pertinentes para a fiscalização do medicamento.

    11 O artigo 11.° , primeiro parágrafo, da Directiva 65/65 prevê:

    «As autoridades competentes dos Estados-Membros suspenderão ou revogarão a autorização de colocação no mercado, quando se revelar que a especialidade farmacêutica é nociva nas condições normais de emprego ou que falta o efeito terapêutico ou, por fim, que a especialidade não tem a composição quantitativa e qualitativa declarada. O efeito terapêutico falta quando se apurar que a especialidade farmacêutica não permite obter resultados terapêuticos.»

    12 De acordo com o artigo 21.° da Directiva 65/65, a ACM apenas pode ser recusada, suspensa ou revogada pelas razões enumeradas nesta directiva.

    13 A Directiva 75/318/CEE do Conselho, de 20 de Maio de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às normas e protocolos analíticos, tóxico-farmacológicos e clínicos em matéria de ensaios de especialidades farmacêuticas (JO L 147, p. 1; EE 13 F4 p. 80), modificada pela Directiva 89/341 (a seguir «Directiva 75/318»), impõe aos Estados-Membros, no seu artigo 1.° , primeiro parágrafo, que adoptem todas as medidas apropriadas para que as informações e os documentos que devem ser juntos ao pedido de ACM de um medicamento, por força do artigo 4.° , segundo parágrafo, pontos 3, 4, 6, 7 e 8, da Directiva 65/65, sejam apresentados pelos interessados, em conformidade com o anexo da Directiva 75/318.

    14 Os sétimo e oitavo considerandos desta última estão formulados como segue:

    «Considerando que as noções de nocividade e de efeito terapêutico constantes do artigo 5 .° da Directiva 65/65/CEE não podem ser examinadas senão em relação recíproca e apenas têm um significado relativo, apreciado em função do progresso da ciência e tendo em conta o destino da especialidade farmacêutica; que dos documentos e informações que devem ser juntos ao pedido de autorização de colocação no mercado deve sobressair a eficácia terapêutica em relação aos riscos potenciais; que, se tal não for o caso, o pedido deve ser rejeitado;

    Considerando que a apreciação da nocividade e do efeito terapêutico pode evoluir em virtude de novas descobertas, e que as normas e protocolos devem ser adaptados periodicamente ao progresso científico.»

    15 A Segunda Directiva 75/319/CEE do Conselho, de 20 de Maio de 1975, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO L 147, p. 13; EE 13 F4 p. 92), na redacção dada pela Directiva 93/39 (a seguir «Directiva 75/319»), estabelece um conjunto de procedimentos de arbitragem perante o Comité das Especialidades Farmacêuticas (a seguir «CEF») da Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos. Este procedimento será utilizado quando um Estado-Membro considere, no quadro do processo de reconhecimento mútuo das ACM nacionais previsto no artigo 9.° da Directiva 75/319, que há razões para supor que a autorização de um medicamento pode constituir um risco para a saúde pública (artigo 10.° da referida directiva), em caso de decisões divergentes relativamente à concessão, à suspensão ou à revogação das autorizações nacionais (artigo 11.° ), em casos específicos em que esteja envolvido o interesse comunitário (artigo 12.° ), bem como em caso de modificações de autorizações harmonizadas (artigos 15.° , 15.° -A e 15.° -B).

    16 O artigo 12.° da Directiva 75/319 dispõe que os Estados-Membros podem, nomeadamente, em casos particulares em que esteja envolvido o interesse comunitário, submeter a questão ao CEF, com vista à aplicação do procedimento previsto no artigo 13.° da mesma directiva, antes que seja tomada uma decisão sobre o pedido, a suspensão, a revogação da ACM ou sobre qualquer outra alteração, eventualmente necessária, dos termos desta, nomeadamente, para atender às informações obtidas no âmbito da farmacovigilância prevista no capítulo V A da Directiva 75/319.

    17 Nos termos do artigo 15.° -A da Directiva 75/319:

    «1. Caso um Estado-Membro considere necessário, para proteger a saúde pública, alterar os termos de uma autorização de introdução no mercado concedida em conformidade com o disposto no presente capítulo, suspendê-la ou revogá-la, submeterá de imediato a questão ao comité, a fim de que sejam aplicados os procedimentos previstos nos artigos 13.° e 14.°

    2. Sem prejuízo do disposto no artigo 12.° , em casos excepcionais em que seja necessária uma acção urgente para proteger a saúde pública e até ser tomada uma decisão definitiva, qualquer Estado-Membro pode suspender a comercialização no mercado e a utilização do medicamento em questão no seu território. Deve notificar a Comissão e os outros Estados-Membros, o mais tardar no dia útil seguinte, dos motivos dessa medida.»

    18 O artigo 13.° da Directiva 75/319 descreve o desenrolar do procedimento perante o CEF. O seu artigo 14.° estabelece os passos a seguir após recepção pela Comissão do parecer do CEF. O n.° 1, terceiro parágrafo, desta disposição precisa que, «[c]aso, a título excepcional, o projecto de decisão [da Comissão] não corresponda ao parecer da agência, a Comissão deve fundamentar pormenorizadamente num anexo os motivos de quaisquer divergências.»

    Matéria de facto e tramitação processual

    19 A Gerot é titular de uma ACM de um medicamento que contém fentermina conhecido pelo nome de Adipex-Retard-Kapseln. Os factos na origem do recurso estão expostos no despacho impugnado, como segue:

    «9 Em 17 de Maio de 1995, a República Federal da Alemanha submeteu uma questão ao CEF, de acordo com o artigo 12.° da Directiva 75/319, na redacção dada pela Directiva 93/39, em que referia as suas preocupações relativamente aos redutores de apetite, entre os quais se incluem medicamentos contendo fentermina, susceptíveis de provocar grave hipertensão arterial pulmonar.

    10 O procedimento assim iniciado conduziu à adopção da decisão C(96) 3608 da Comissão, de 9 de Dezembro de 1996 [a seguir decisão de 9 de Dezembro de 1996], baseada nos n.os 1 e 2 do artigo 14.° da Directiva 75/319, que obriga os Estados-Membros a alterarem determinadas informações clínicas que deviam constar das autorizações nacionais de colocação no mercado dos medicamentos em causa.

    11 Por carta de 7 de Novembro de 1997, dirigida ao presidente do CEF, o Ministério dos Assuntos Sociais, da Saúde Pública e do Ambiente belga exprimiu, designadamente, a sua preocupação quanto à existência de uma relação de causa e efeito entre as disfunções da válvula cardíaca e a ingestão de medicamentos contendo fentermina. Solicitou, em consequência, ao CEF, nos termos dos artigos 13.° e 15.° -A da Directiva 75/319, que emitisse um parecer fundamentado sobre os referidos medicamentos.

    12 Em 31 de Agosto de 1999, o CEF emitiu o seu parecer sobre os medicamentos contendo fentermina. Chegou à conclusão de que, apesar de as preocupações manifestadas pelo ministério belga não serem totalmente de excluir, não existiam elementos que as apoiassem. Concluiu, contudo, que os medicamentos contendo fentermina apresentavam uma relação benefícios/riscos desfavorável e recomendou que fossem revogadas as autorizações de colocação no mercado dos referidos medicamentos.

    13 Com base neste parecer, a Comissão preparou um projecto de decisão que foi, nomeadamente, transmitido à requerente em Janeiro de 2000. Em 9 de Março de 2000, a Comissão adoptou a decisão relativa à revogação das autorizações de colocação no mercado de medicamentos para uso humano que contenham a seguinte substância: fentermina [...]. O artigo 2.° da decisão impugnada faz referência às apreciações feitas pelo CEF nesse parecer. O artigo 3.° determina que os Estados-Membros revoguem as autorizações de colocação no mercado de todos os medicamentos enumerados no anexo I da decisão impugnada, no prazo de 30 dias após a data de notificação da referida decisão.»

    20 Por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 17 de Maio de 2000, a Gerot interpôs no Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 230.° , quarto parágrafo, CE, recurso de anulação da decisão impugnada e, a título subsidiário, de anulação da decisão impugnada na medida em que implica a revogação da ACM do seu medicamento contendo fentermina.

    21 Por requerimento separado, entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância no mesmo dia, a Gerot apresentou um pedido de suspensão de execução da decisão impugnada, bem como um pedido fundado no n.° 2 do artigo 105.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, no sentido de o pedido de suspensão da execução ser decidido com urgência.

    22 Em 14 de Julho de 2000, o presidente do Tribunal de Primeira Instância deferiu o pedido baseado no n.° 2 do artigo 105.° do seu Regulamento de Processo e ordenou a suspensão da execução da decisão impugnada até à prolação do despacho final no processo de medidas provisórias.

    23 Além da decisão impugnada, a Comissão adoptou igualmente, em 9 de Março de 2000, duas outras decisões respeitantes à revogação das ACM dos medicamentos para uso humano que contenham anfepramona [C(2000) 453] bem como as substâncias «clobenzorex», «fenbutrazato», «fenproporex», «mazindol», «mefenorex», «norpseudoefedrina», «fenemetrazina», «fendimetrazina» e «propilexedrina» [C(2000) 608]. Todas estas decisões respeitam a medicamentos destinados ao tratamento da obesidade, que já eram visados na decisão de 9 de Dezembro de 1996, e seguem-se a uma reavaliação destes mesmos medicamentos a título do artigo 15.° -A da Directiva 75/319, que havia sido pedida por dois Estados-Membros. O procedimento de avaliação levou à emissão de diversos pareceres do CEF, adoptados pela quase unanimidade dos seus membros, recomendando a revogação das ACM de todos estes medicamentos por razões muito semelhantes. As decisões de 9 de Março de 2000 da Comissão baseiam-se nestes pareceres.

    24 As três decisões mencionadas no número anterior foram objecto de nove pedidos de medidas provisórias. Por despacho de 28 de Junho de 2000, Artegodan/Comissão (T-74/00 R, Colect., p. II-2583), o presidente do Tribunal de Primeira Instância pronunciou-se acerca de um destes pedidos e ordenou a suspensão da execução da decisão C(2000) 453 no que respeita à Artegodan GmbH. Não foi interposto qualquer recurso deste despacho. O presidente do Tribunal de Primeira Instância pronunciou-se acerca dos oito outros pedidos de medidas provisórias, por despacho de 19 de Outubro de 2000, Trenker/Comissão (T-141/00 R, Colect., p. II-3313), e por sete outros despachos de 31 de Outubro de 2000, Bruno Farmaceutici e o./Comissão (T-76/00 R, Colect., p. II-3557), Schuck/Comissão (T-83/00 R II, Colect., p. II-3585), Hänseler/Comissão (T-83/00 R I, Colect., p. II-3563), Roussel e Roussel Diamant/Comissão (T-84/00 R, Colect., p. II-3591), Roussel e Roussel Iberica/Comissão (T-85/00 R, Colect., p. II-3613), Cambridge Healthcare Supplies/Comissão (T-137/00 R, Colect., p. II-3653), bem como pelo despacho impugnado. Estes oito despachos, que foram objecto de recursos interpostos pela Comissão, bem como o despacho Artegodan/Comissão, já referido, baseiam-se em fundamentos quase idênticos.

    O despacho impugnado

    25 Pelo despacho impugnado, o presidente do Tribunal de Primeira Instância deferiu o pedido da Gerot e decretou a suspensão da execução da decisão impugnada no que se refere a esta última.

    26 O juiz das medidas provisórias considerou que a condição relativa ao fumus boni juris se encontrava satisfeita no caso vertente. A este respeito, expôs, no n.° 30 do despacho impugnado, as considerações seguintes:

    «30 No que se refere ao fumus boni juris, há que concluir que os fundamentos suscitados pela requerente não parecem, à primeira vista, totalmente desprovidos de fundamento. Por um lado, verifica-se, designadamente, que a competência da Comissão para adoptar a decisão impugnada está condicionada pela natureza da decisão de 9 de Dezembro de 1996, a qual está sujeita a discussão. Por outro lado, a Comissão não carreou elementos convincentes susceptíveis de explicar, à luz do princípio da proporcionalidade, a razão pela qual esta última decisão e a decisão impugnada conduzem a resultados diametralmente opostos. Os fundamentos apresentados pela requerente merecem, pois, ser objecto de uma análise aprofundada que ultrapassa, contudo, de facto e de direito, o âmbito do presente processo de medidas provisórias.»

    27 No que respeita à urgência, o juiz das medidas provisórias concluiu que o prejuízo que poderia resultar da execução imediata da decisão impugnada apresenta carácter grave e irreparável. Para chegar a esta conclusão, baseou-se nas considerações seguintes:

    «37 No caso vertente, a execução imediata da decisão impugnada implica a total retirada do mercado dos medicamentos referidos no artigo 1.° da decisão. Em consequência, implica também a exclusão dos referidos medicamentos das listas do comércio farmacêutico e a sua supressão das listas de medicamentos que servem de base às práticas de conselho e de prescrição da Ordem dos Médicos. Além disso, se a execução da decisão impugnada não for suspensa, os medicamentos de substituição tomarão muito provavelmente o lugar dos medicamentos retirados. Ora, note-se que a confiança dos consumidores, dos médicos e dos farmacêuticos num medicamento é particularmente sensível às declarações de que tal medicamento é perigoso para a saúde do paciente. Ainda que tais declarações sejam posteriormente refutadas, é muitas vezes impossível restaurar a confiança no produto retirado, salvo em casos particulares, a saber, quando as qualidades do medicamento sejam particularmente apreciadas pelos utilizadores e quando não exista produto de substituição perfeito, ou se o fabricante gozar de uma reputação excepcionalmente boa, de tal forma que seja impossível afirmar-se que já não poderá reconquistar as partes de mercado que detinha antes de ter sido retirado. Contudo, tais casos particulares não se verificam no caso vertente.

    38 Além disso, em caso de anulação pelo Tribunal da decisão impugnada, autorizando, assim, a requerente a comercializar de novo o seu medicamento, o prejuízo financeiro por ela sofrido em consequência da diminuição das vendas resultante de uma perda de confiança no medicamento não pode, na realidade, ser quantificado de forma suficientemente completa para efeitos de reparação.»

    28 No que respeita à ponderação dos interesses, o juiz das medidas provisórias concluiu que ela pende, no caso vertente, a favor da suspensão da execução da decisão impugnada, baseando-se nas considerações seguintes:

    «43 Com efeito, parece muito provável que a execução da decisão impugnada tenha por consequência a perda definitiva, para a requerente, da sua posição no mercado, ainda que o Tribunal anule a decisão impugnada.

    44 Contra os interesses comerciais da requerente, a Comissão invoca que a suspensão da execução da decisão impugnada pode afectar a saúde pública. Cabe sublinhar a este respeito que, em princípio, às exigências relacionadas com a protecção da saúde pública deve incontestavelmente ser atribuída uma importância preponderante relativamente às considerações económicas (despacho [do Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 1996,] Reino Unido/Comissão, [C-180/96 R, Colect., p. I-3903,] n.° 93; acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Julho de 1997, Affish, C-183/95, Colect., p. I-4315, n.° 43; despacho do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, Infrisa/Comissão, T-136/95, Colect., p. II-3301, n.° 58; e despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Junho de 1999, Alpharma/Conselho, T-70/99 R, Colect., p. II-2027, n.° 152).

    45 Note-se, contudo, que, neste âmbito, a referência à protecção da saúde pública não pode, por si só, excluir o exame das circunstâncias do caso vertente e, designadamente, dos factos com ele relacionados.

    46 No caso vertente, a Comissão provou, de forma suficiente, existirem incertezas quanto aos riscos associados aos medicamentos contendo fentermina, apesar de tais riscos serem ligeiros. Contudo, sendo que a decisão de 9 de Dezembro de 1996 e a decisão impugnada se fundam em elementos de facto perfeitamente idênticos, divergem fundamentalmente as medidas adoptadas pela Comissão, em 1996 e em 2000, para a protecção da saúde pública relativamente a tais riscos. Nestas circunstâncias, a Comissão estava obrigada a demonstrar que as medidas de protecção contidas na decisão de 9 de Dezembro de 1996 se revelaram insuficientes para a protecção da saúde pública, de tal forma que as medidas de protecção que adoptou pela decisão impugnada não são manifestamente desproporcionadas. Contudo, a Comissão não conseguiu fazer tal prova.

    47 Além disso, observe-se que o facto de os riscos para a saúde, que determinaram a adopção da decisão impugnada, terem já sido tomados em consideração na decisão da Comissão de 9 de Dezembro de 1996 e terem conduzido à alteração das informações obrigatórias relativas aos medicamentos prescritos por receita indica que a execução da decisão impugnada não é urgente.»

    O presente recurso

    Argumentação das partes

    29 A Comissão invoca sete fundamentos em apoio do seu recurso.

    30 Pelo seu primeiro fundamento, a Comissão, apoiada pelo Governo francês, acusa o juiz das medidas provisórias de não ter aplicado correctamente, ou mesmo de nem sequer ter aplicado, o princípio da precaução no quadro da ponderação dos interesses que efectuou. Este princípio significa que a Comissão pode tomar medidas de protecção sem ter de esperar que a realidade e a gravidade de tais riscos sejam plenamente demonstradas (acórdão de 5 de Maio de 1998, National Farmers' Union e o., C-157/96, Colect., p. I-2211, n.° 63).

    31 O segundo fundamento baseia-se num desconhecimento da natureza da decisão impugnada e do processo que conduziu à sua adopção.

    32 A Comissão alega que, quando adopta uma medida de protecção da saúde pública em matéria de medicamentos, o processo científico do exame dos riscos não é assegurado por si própria, sendo antes levado a cabo por peritos científicos, a saber, os membros do CEF. É com base neste exame que a Comissão adopta, então, a sua decisão política (decisão dita de «gestão de riscos»), ponderando o resultado do exame dos riscos com outros factores a ter em conta. A ausência de referência ao parecer científico do CEF no despacho impugnado revela uma incompreensão fundamental do procedimento que conduziu à adopção da decisão impugnada.

    33 Ora, segundo a Comissão, a razão pela qual adoptou, em 9 de Março de 2000, uma decisão diferente da de 9 de Dezembro de 1996 está directamente ligada ao parecer final do CEF, de 31 de Agosto de 1999. Alega que a fundamentação da decisão impugnada se refere ao facto de o CEF ter entendido que o efeito terapêutico dos medicamentos que contenham fentermina é inexistente no tratamento da obesidade, avaliado com base nos conhecimentos científicos acumulados ao longo dos últimos anos e nas recomendações médicas em vigor.

    34 Entre a adopção da decisão de 9 de Dezembro de 1996 e a da decisão impugnada, as orientações relativas à eficácia terapêutica dos medicamentos destinados ao tratamento da obesidade, bem como as directivas médicas respeitantes ao tratamento desta, mudaram e esta mudança levou o CEF a alterar a sua apreciação científica. Estas orientações representam uma mudança fundamental da opinião do mundo científico quanto à forma de tratar a obesidade. Ao não ter em conta este factor essencial e ao concentrar-se exclusivamente na identidade dos dados em que se baseiam as duas decisões acima mencionadas, o juiz das medidas provisórias cometeu um erro material no que respeita ao exame da ponderação dos interesses. Também não decorre do despacho impugnado que o juiz das medidas provisórias tenha tomado em conta o facto de que a decisão impugnada criou um nível de protecção da saúde mais elevado do que o que resulta da decisão de 9 de Dezembro de 1996.

    35 O Governo francês subscreve, no essencial, esta argumentação, alegando que o juiz das medidas provisórias desnaturou o conteúdo da decisão impugnada na acepção do acórdão de 27 de Janeiro de 2000, DIR International Film e o./Comissão (C-164/98 P, Colect., p. I-447, n.os 48 e 49). Tal desnaturação resulta de uma leitura parcial da referida decisão. O juiz das medidas provisórias não teve em consideração o anexo II desta, na medida em que não assinalou que o CEF examinou dados científicos complementares, posteriores a 1996, e omitiu o facto de que, segundo o CEF, os medicamentos que contêm fentermina não apresentam a eficácia exigida.

    36 Pelo seu terceiro fundamento, a Comissão critica o despacho impugnado por este se situar «fora dos limites do exame jurídico». Alega que o juiz das medidas provisórias cometeu um erro de direito ao substituir-se, na apreciação da questão do nível apropriado de protecção da saúde pública, à instância competente para exercer o seu poder discricionário nesta matéria, a saber, a Comissão. O Governo francês subscreve, no essencial, este fundamento, recordando que o Tribunal de Justiça já declarou, no acórdão de 21 de Janeiro de 1999, Upjohn (C-120/97, Colect., p. I-223, n.os 33 e 34), que o juiz só pode efectuar uma fiscalização jurisdicional limitada em matéria de apreciações complexas do domínio médico-farmacológico.

    37 O quarto fundamento baseia-se em violação dos critérios da ponderação dos interesses. O juiz das medidas provisórias cometeu um erro de direito ao não proceder correctamente à ponderação dos interesses em causa, na medida em que apenas examinou e teve em consideração o prejuízo económico que sofreria a empresa que pediu a suspensão da decisão impugnada, sem levar correctamente em conta a gravidade e o carácter irreparável dos prejuízos sofridos pelos doentes tratados com o medicamento em causa. O juiz das medidas provisórias não deu prioridade à protecção da saúde pública exigida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, não obstante ter sido constatada a existência de riscos para a saúde humana pelos peritos científicos reunidos no seio do CEF.

    38 O quinto fundamento respeita a um erro de direito quanto ao alcance do ónus da prova que cabe à Comissão. O juiz das medidas provisórias partiu da hipótese segundo a qual a Comissão, assistida pelo CEF, tem, por si só, condições para demonstrar a ausência de eficácia terapêutica de um medicamento ou que este é perigoso em condições de utilização normais. A este respeito, a Comissão recorda que o fornecimento de dados sobre a segurança e a eficácia terapêutica de um medicamento depende largamente dos titulares de ACM e que não lhe cabe a ela nem ao CEF realizar ensaios clínicos. A abordagem do juiz das medidas provisórias relativamente ao ónus da prova impediria a Comissão de reconsiderar as suas decisões respeitantes às ACM, salvo se surgiram novos dados sobre a matéria.

    39 O sexto fundamento baseia-se em erros materiais respeitantes à conclusão, retirada no n.° 51 do despacho impugnado, segundo a qual, embora existam incertezas no que toca aos riscos associados aos medicamentos que contenham fentermina, tais riscos para a saúde são «ligeiros». Resulta claramente do processo submetido ao Tribunal de Primeira Instância que os riscos associados aos referidos medicamentos, nomeadamente, os riscos acrescidos de hipertensão arterial pulmonar primitiva e de valvulopatias cardíacas, não são «ligeiros». O juiz das medidas provisórias substituiu a apreciação do CEF pela sua própria apreciação.

    40 O sétimo fundamento baseia-se na ausência de fundamentação do despacho impugnado no que respeita à apreciação do presidente do Tribunal de Primeira Instância relativa ao carácter alegadamente ligeiro dos riscos associados aos medicamentos que contenham fentermina. Segundo a Comissão, não foi dada qualquer explicação, no n.° 46 ou em qualquer outro do despacho impugnado, de natureza a permitir compreender as razões dessa apreciação.

    41 A Gerot alega que, no que toca às situações relativamente às quais a Comissão dispõe de um poder de apreciação, esta última tem o dever específico de fundamentar, dever este que não foi respeitado no caso vertente. A decisão de 9 de Dezembro de 1996, na medida em que mencionava a existência de riscos «possíveis», constituiu um alerta suficientemente importante, de natureza a satisfazer as exigências do princípio da precaução.

    42 Segundo a Gerot, a Comissão refere-se apenas a incertezas, mas, atendendo ao facto de que, em 1996, esta última já tinha tido em consideração essas incertezas, cabia-lhe fundamentar mais detalhadamente a decisão impugnada. Além disso, a Gerot alega, por um lado, que o relatório de avaliação da fentermina já tinha indicado que não existiam riscos significativos novos relativamente à decisão de 9 de Dezembro de 1996 e, por outro, que as apreciações da Comissão respeitantes aos riscos invocados por esta última não são partilhados por um certo número de especialistas.

    43 A Gerot invoca, ainda, o facto de o processo que conduziu à adopção da decisão impugnada se ter desenrolado num período de 28 meses, para sustentar que, nestas condições, a Comissão não pode pretender que é urgente decretar a revogação da ACM do medicamento em causa.

    Apreciação

    44 Deve recordar-se que, segundo os artigos 225.° CE e 51.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância está limitado às questões de direito e deve assentar em fundamentos de incompetência do Tribunal de Primeira Instância, irregularidades processuais perante o Tribunal de Primeira Instância que prejudiquem os interesses da parte recorrente ou em violação do direito comunitário por este último.

    45 Só o Tribunal de Primeira Instância é competente, por um lado, para apurar os factos, salvo nos casos em que a inexactidão material das suas conclusões resulte das peças do processo que lhe foram submetidas, e, por outro, para apreciar esses factos. A apreciação dos factos não constitui, portanto, excepto em caso de desnaturação dos elementos que lhe foram submetidos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (v., nomeadamente, acórdão de 11 de Fevereiro de 1999, Antillean Rice Mills e o./Comissão, C-390/95 P, Colect., p. I-769, n.° 29).

    46 Atendendo a todas estas considerações, há que examinar os fundamentos do presente recurso.

    47 A título liminar, tratando-se de uma questão de ordem pública, há que apreciar oficiosamente se o recurso não é inadmissível por desrespeito da autoridade do caso julgado que resulta do despacho Artegodan/Comissão, já referido, uma vez que um fundamento desta natureza já foi invocado no quadro do processo Comissão/Trenker [C-459/00 P(R)], julgado por despacho na mesma data (Colect. 2001, p. I-2823).

    48 A este respeito, basta recordar que as condições de admissibilidade dos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância fixadas pelo artigo 49.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça são apreciadas relativamente ao litígio objecto da instância e a ele só. A circunstância de os fundamentos de um despacho do Tribunal de Primeira Instância que se tornou definitivo serem idênticos aos de um despacho objecto de recurso não impede que o autor deste recurso conteste esses fundamentos (v., no que respeita a um acórdão do Tribunal de Primeira Instância que considerou procedente uma excepção de ilegalidade de um acto regulamentar, acórdão de 5 de Outubro de 2000, Conselho/Chvatal e o., C-432/98 P e C-433/98 P, Colect., p. I-8535, n.° 22).

    49 Resulta destas considerações que o presente recurso é admissível.

    50 Desde logo, há que examinar o fundamento baseado na desnaturação do conteúdo da decisão impugnada.

    51 A este respeito, resulta da fundamentação do despacho impugnado relativa quer ao fumus boni juris quer à ponderação dos interesses que as considerações seguintes se revestiram de carácter determinante no raciocínio do juiz das medidas provisórias:

    - «[...] a Comissão não carreou elementos convincentes susceptíveis de explicar, à luz do princípio da proporcionalidade, a razão pela qual [a decisão de 9 de Dezembro de 1996] e a decisão impugnada conduzem a resultados diametralmente opostos» (n.° 30);

    - «[...] sendo que a decisão de 9 de Dezembro de 1996 e a decisão impugnada se fundam em elementos de facto perfeitamente idênticos, divergem fundamentalmente as medidas adoptadas pela Comissão, em 1996 e em 2000, para a protecção da saúde pública relativamente a tais riscos. Nestas circunstâncias, a Comissão estava obrigada a demonstrar que as medidas de protecção contidas na decisão de 9 de Dezembro de 1996 se revelaram insuficientes para a protecção da saúde pública, de tal forma que as medidas de protecção que adoptou pela decisão impugnada não são manifestamente desproporcionadas» (n.° 46);

    - «[...] os riscos para a saúde, que determinaram a adopção da decisão impugnada, terem já sido tomados em consideração na decisão da Comissão de 9 de Dezembro de 1996 e terem conduzido à alteração das informações obrigatórias relativas aos medicamentos prescritos por receita» (n.° 47).

    52 Deve concluir-se que estas apreciações não assentam numa análise, nem sequer sumária, da fundamentação da decisão impugnada tal como esta figura no anexo II desta última, para o qual remete o seu artigo 2.°

    53 O anexo II da decisão impugnada, que retoma as conclusões científicas do CEF a fim de indicar as razões que conduziram às revogações das ACM dos medicamentos enumerados no anexo I desta decisão, contém, desde logo, uma análise da eficácia destes medicamentos. Nela se conclui que «o efeito terapêutico dos medicamentos que contenham fentermina é inexistente no tratamento da obesidade, avaliado com base nos conhecimentos científicos acumulados ao longo dos últimos anos e nas recomendações médicas em vigor».

    54 Para chegar a esta conclusão, o anexo II precisa que «[a] recuperação de peso é rápida após interrupção do tratamento e nenhum estudo controlado prova que um efeito limitado a curto prazo tenha uma influência clínica a longo prazo sobre o peso ou que dele resulte qualquer benefício clínico relevante no quadro de um programa de tratamento da obesidade». É igualmente referido que «[o] risco de toxicomania e de dependência torna impossível a utilização da fentermina como tratamento a longo prazo» e que «as reivindicações segundo as quais [a fentermina] poderia facilitar ou melhorar as estratégias a longo prazo, quando utilizada como complemento, não foram sustentadas por provas adequadas».

    55 Segundo o referido anexo II, uma eficácia terapêutica no tratamento da obesidade necessita de uma perda de peso significativa e duradoura, durante, pelo menos, um ano. É igualmente precisado que «[e]sta observação, baseada numa acumulação de conhecimentos científicos adquiridos ao longo de anos, figura nas recomendações médicas em vigor. A mesma reflecte-se na Note for Guidance on Clinical Investigation of Drugs Used in Weight Control - directrizes sobre os estudos de medicamentos utilizados para o controlo do peso - (CPMP/EWP/281/96). Está igualmente expressa em directrizes actuais, por exemplo, na directriz escocesa (1996), numa directriz do Royal College of Physicians (1998) e numa outra da American Society for Clinical Nutrition (1998)».

    56 Deve sublinhar-se a importância desta fundamentação relativamente ao objecto da decisão impugnada e à luz do direito aplicável em matéria de avaliação de medicamentos.

    57 A este respeito, deve recordar-se que, segundo o artigo 5.° da Directiva 65/65, a avaliação de qualquer medicamento se reporta à sua eficácia, à sua inocuidade e à sua qualidade. O respeito destas três condições visa proteger a saúde pública. Com efeito, a própria noção de protecção da saúde pública implica que o medicamento em causa não só não seja nocivo como também seja eficaz. Como precisam as notas dos artigos 10.° , n.° 1, da Directiva 75/319 e 7.° -A da Directiva 65/65, «a expressão risco para a saúde pública refere-se à eficácia, à qualidade e à segurança do medicamento».

    58 A importância associada à eficácia do medicamento, que está na base da decisão impugnada, tem a ver com o facto de o artigo 1.° , n.° 2, primeiro parágrafo, da Directiva 65/65 ter adoptado, para definir a noção de medicamento, o critério chamado de «apresentação». Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, este critério tem por finalidade abranger não apenas os medicamentos que tenham um verdadeiro efeito terapêutico ou medicinal mas também os produtos que não sejam suficientemente eficazes, ou que não tenham o efeito que a sua apresentação permitiria esperar, a fim de proteger os consumidores não apenas dos medicamentos nocivos ou tóxicos como tais mas também de diversos produtos utilizados em vez dos remédios adequados (v., por último, acórdão de 28 de Outubro de 1992, Ter Voort, C-219/91, Colect., p. I-5485, n.° 16).

    59 Consequentemente, como resulta dos próprios termos do artigo 11.° da Directiva 65/65, a autoridade competente é obrigada a revogar ou a suspender uma ACM não apenas quando o medicamento parece ser nocivo ou não possuir a qualidade declarada mas também quando se revele ineficaz.

    60 O grau de nocividade que a autoridade competente pode considerar aceitável depende assim dos benefícios que o medicamento é suposto oferecer. Com efeito, como resulta dos sétimo e oitavo considerandos da Directiva 75/318, as noções de «nocividade» e de «efeito terapêutico» só podem ser examinadas em relação de reciprocidade. Deste modo, as razões que conduziram uma autoridade competente a manter a ACM de um medicamento, apesar da existência de certos efeitos nocivos, podem desaparecer se essa autoridade considerar que os benefícios que justificavam tal autorização, a saber, a existência de um efeito terapêutico, deixaram de se produzir. Com efeito, resulta da introdução do anexo da Directiva 75/318, modificada pela Directiva 91/507/CEE da Comissão, de 19 de Julho de 1991 (JO L 270, p. 32), que todos os dados ou informações novos serão transmitidos às autoridades competentes após a emissão da ACM «por forma a monitorizar a avaliação risco/benefício».

    61 Impõe-se concluir que, nas suas apreciações respeitantes ao fumus boni juris e à ponderação dos interesses, o despacho impugnado não faz qualquer referência às considerações que figuram na fundamentação da decisão impugnada no que respeita à mudança dos critérios científicos de avaliação dos medicamentos destinados ao tratamento da obesidade e à ausência de efeito terapêutico dos medicamentos que contenham fentermina.

    62 Ora, essa mudança surge, segundo os próprios termos da decisão impugnada, como um elemento determinante na avaliação dos referidos medicamentos pelo CEF e pela Comissão.

    63 Além disso, em razão desta omissão, os riscos mencionados nos n.os 51 e 52 do despacho impugnado respeitam apenas à nocividade do medicamento considerado isoladamente, sem que esta seja relacionada com a inexistência de efeito terapêutico do mesmo medicamento.

    64 Resulta do que precede que, na medida em que revela uma ausência de tomada em consideração dos aspectos essenciais da fundamentação da decisão impugnada e, portanto, uma desnaturação do conteúdo desta, o despacho impugnado está viciado de um erro de direito.

    65 Por conseguinte, sem que seja necessário decidir dos outros fundamentos do presente recurso, deve julgar-se este procedente e anular o despacho impugnado.

    66 Nos termos do artigo 54.° , primeiro parágrafo, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, quando o recurso for procedente, o Tribunal de Justiça anulará a decisão do Tribunal de Primeira Instância. Pode, neste caso, julgar ele próprio directamente o litígio se o mesmo estiver em condições de ser julgado, sem remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância para julgamento. Uma vez que o processo está em condições de ser julgado, há que decidir definitivamente do pedido de medidas provisórias.

    Quanto ao pedido de medidas provisórias

    Quanto ao fumus boni juris

    67 A Gerot invoca diversos fundamentos para justificar, à primeira vista, a concessão da suspensão solicitada.

    68 Em primeiro lugar, alega que a Comissão não era competente para adoptar a decisão impugnada. O artigo 15.° -A da Directiva 75/319 não constitui uma base jurídica válida para o procedimento adoptado no caso vertente. Este artigo não permite a um Estado-Membro instaurar o procedimento previsto nos artigos 13.° e 14.° da mesma directiva, a não ser quando se trate de ACM concedidas nos termos do respectivo capítulo III. Ora, a Gerot alega que as autorizações em causa são autorizações nacionais e não autorizações concedidas nos termos do referido capítulo.

    69 Segundo a Comissão, a decisão de 9 de Dezembro de 1996 constitui uma ACM concedida de acordo com as disposições do capítulo III da Directiva 75/319. Acrescenta que a mesma foi adoptada com base no artigo 12.° da Directiva 75/319 e conduziu à harmonização das ACM dos medicamentos aí enumerados, entre os quais figura o medicamento produzido pela Gerot. A Comissão salienta que a referida decisão modifica de forma substancial, a título do direito comunitário, as ACM nacionais, de tal forma que, após o termo do prazo fixado no seu artigo 3.° , não é autorizada a colocação no mercado dos medicamentos em causa, salvo se da sua apresentação constarem as informações clínicas definidas naquela decisão.

    70 No quadro da apreciação do fumus boni juris dos pedidos de suspensão de execução, não cabe ao juiz das medidas provisórias pronunciar-se a título definitivo acerca da interpretação das disposições aplicáveis ao litígio.

    71 Uma vez feita esta ressalva, por um lado, impõe-se reconhecer que, embora a decisão de 9 de Dezembro de 1996 não tenha precedido a emissão das ACM nacionais, não se pode inferir dessa circunstância que os Estados-Membros dispunham, após a adopção daquela, de uma liberdade absoluta no que respeita à manutenção dessas ACM nacionais, com risco de reduzir a nada a harmonização levada a cabo pela referida decisão. À primeira vista, a tese da Gerot privaria de efeito útil as decisões da Comissão respeitantes a ACM já emitidas, adoptadas segundo o procedimento previsto nos artigos 13.° e 14.° da Directiva 75/319.

    72 Daqui resulta que os argumentos invocados pela Gerot não parecem demonstrar, numa primeira análise, que a Comissão não era competente para adoptar a decisão impugnada.

    73 Em segundo lugar, a Gerot alega que a decisão impugnada devia ser fundamentada de forma precisa, o que, segundo a mesma, não acontece no caso vertente. Em contrapartida, a Comissão alega que a referida decisão está suficientemente fundamentada.

    74 A este respeito, deve salientar-se que a Gerot se limita a invocar, de forma geral, uma falta de fundamentação da decisão impugnada, sem indicar de maneira precisa as razões pelas quais considera que a Comissão não satisfez o dever de fundamentar previsto no artigo 253.° CE. Por este motivo, não permite que o juiz das medidas provisórias aprecie o alcance e o mérito do fundamento assim invocado.

    75 Além disso, por um lado, importa concluir igualmente que, segundo o artigo 14.° da Directiva 75/319, só no caso excepcional de o projecto de decisão da Comissão não estar em conformidade com o parecer do CEF é que a Comissão deve explicar em detalhe as razões das diferenças existentes entre a sua decisão e o referido parecer. Por outro lado, os elementos deste, que são retomados no anexo II da decisão impugnada, contêm, à primeira vista, uma explicação suficiente das razões que levaram a Comissão a decidir a revogação da ACM.

    76 Nestas condições, sem prejuízo da análise a efectuar pelo juiz que decide sobre o mérito, deve concluir-se que a decisão impugnada não parece, à primeira vista, viciada de falta de fundamentação.

    77 Em terceiro lugar, a Gerot alega que a Comissão cometeu um desvio de poder ao basear a decisão impugnada no artigo 15.° -A da Directiva 75/319. Deste modo, a referida decisão infringe o artigo 11.° da Directiva 65/65, o qual fixa as condições que devem estar reunidas para a revogação de uma ACM. Segundo ela, quando a Comissão ordena aos Estados-Membros que revoguem uma ACM nos termos do artigo 14.° da Directiva 75/319, esta instituição deve respeitar as condições de revogação enunciadas no artigo 11.° da Directiva 65/65. No caso vertente, era necessário provar ou que os medicamentos contendo fentermina são nocivos, ou que não têm qualquer efeito terapêutico ou ainda que não possuem a composição qualitativa e quantitativa declarada. Contudo, o parecer do CEF, cujos elementos foram retomados pela Comissão a título de fundamentação da decisão impugnada, não menciona qualquer conclusão relativa a essas exigências.

    78 Refutando estes argumentos, a Comissão alega que o anexo II da decisão impugnada se refere aos critérios materiais visados no artigo 11.° da Directiva 65/65, que respeitam à eficácia e à segurança do medicamento. Por outro lado, as razões pelas quais a revogação de uma ACM em vigor se pode verificar são idênticas às da recusa em conceder uma nova autorização. A Comissão alega igualmente estar prevista uma análise da relação benefícios/riscos no quadro da emissão de uma ACM de medicamentos, daqui decorrendo que essa análise também é possível aquando da revogação da mesma autorização. Além disso, segundo a Comissão, o emprego da fentermina comporta riscos. Tal resulta da decisão de 9 de Dezembro de 1996 bem como das conclusões científicas em que o CEF se apoiou. Acrescenta que este último demonstrou claramente que os medicamentos que contêm fentermina carecem do efeito terapêutico necessário e que aquele comité tinha o direito de se basear em linhas directrizes para proceder a uma análise da relação benefícios/riscos, no que respeita à referida substância, à luz do progresso da ciência.

    79 Deve concluir-se que a fundamentação da decisão impugnada, que faz seu o parecer do CEF, por um lado, deixa claramente transparecer que esta decisão se baseia na ausência de eficácia terapêutica dos medicamentos que contenham fentermina e, por outro, contém uma análise quer da eficácia quer da segurança destes medicamentos.

    80 Deve sublinhar-se, além disso, que os argumentos da Gerot recordados no n.° 77 do presente despacho respeitam igualmente à forma como a Comissão utilizou a margem de apreciação de que dispõe para apreciar a necessidade de uma medida de revogação de uma ACM. Com efeito, é dado assente que qualquer decisão de revogação de uma ACM, adoptada em aplicação do procedimento previsto nos artigos 13.° e 14.° da Directiva 75/319, deve respeitar as condições materiais exigidas pelo artigo 11.° da Directiva 65/65, condições estas relativas à eficácia, à segurança e à qualidade do medicamento. Este tipo de decisão é, portanto, o resultado de apreciações complexas do domínio médico-farmacológico.

    81 Em princípio, tais apreciações são objecto de fiscalização jurisdicional restrita. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que quando uma autoridade comunitária é chamada, no quadro da sua missão, a efectuar avaliações complexas, goza por este motivo de um amplo poder de apreciação, cujo exercício está sujeito a uma fiscalização jurisdicional limitada, que implica que o juiz comunitário não pode substituir pela sua apreciação dos factos a apreciação levada a cabo pela referida autoridade. Assim, este último limita-se, nesse caso, a examinar a materialidade dos factos e as qualificações jurídicas que essa autoridade daí deduz e, em especial, se a acção desta última não está viciada de erro manifesto ou de desvio de poder, ou ainda se a mesma autoridade não ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação (v., no que respeita à revogação da ACM de um medicamento, acórdão Upjohn, já referido, n.° 34).

    82 No caso vertente, não parece, à primeira vista, que a decisão impugnada, baseada no parecer do CEF, esteja viciada de erro manifesto ou de desvio de poder, nem que a Comissão tenha manifestamente excedido os limites do seu poder de apreciação.

    83 Resulta do que precede que, sem prejuízo das apreciações a efectuar no âmbito do exame do recurso quanto ao mérito, os fundamentos articulados pela Gerot no quadro do pedido de medidas provisórias não se sobrepõem, findo um primeiro exame, aos invocados pela Comissão em apoio da legalidade da decisão impugnada.

    84 Contudo, na medida em que os argumentos invocados pela Gerot não parecem desprovidos de qualquer fundamento, a suspensão solicitada não pode ser rejeitada findo o exame do fumus boni juris, sem que sejam igualmente examinadas a urgência invocada e a ponderação dos interesses em jogo.

    Quanto à urgência e à ponderação dos interesses

    85 A Gerot alega que, se a execução da decisão impugnada não for suspensa, sofrerá um prejuízo grave e irreparável.

    86 Alega que a revogação da ACM do medicamento conhecido pelo nome de Adipex-Retard-Kapseln acarretaria uma grave perda de confiança dos consumidores, dos médicos e dos farmacêuticos naquele medicamento. Esta perda de confiança aumentaria em função da duração do período em que o medicamento estivesse retirado do mercado ou não pudesse ser comercializado.

    87 A Comissão alega que a condição relativa à urgência não está preenchida.

    88 Segundo ela, a Gerot não teve em conta o facto de que o ónus da prova cabe àquela sociedade. Com efeito, esta última não invocou qualquer circunstância que permitisse determinar, por um lado, se a revogação da ACM é susceptível de lhe provocar qualquer prejuízo e, sendo caso disso, a natureza do prejuízo, e, por outro, se este é irreparável. A Comissão alega, além disso, que um prejuízo de ordem puramente pecuniária não pode ser visto como irreparável e que, por este motivo, a condição relativa à urgência não está satisfeita.

    89 Resulta de jurisprudência constante que o carácter urgente de um pedido de suspensão de execução deve ser apreciado em relação com a necessidade existente de decidir provisoriamente a fim de evitar que um prejuízo grave e irreparável seja provocado à parte que solicita a suspensão. A este respeito, basta que esse prejuízo seja previsível com um grau de probabilidade suficiente, especialmente quando a ocorrência do prejuízo depende da verificação de um conjunto de factores [v., por exemplo, despachos de 29 de Junho de 1993, Alemanha/Conselho, C-280/93 R, Colect., p. I-3667, n.os 22 e 34, e de 14 de Dezembro de 1999, HFB e o./Comissão, C-335/99 P(R), Colect., p. I-8705, n.° 67].

    90 No caso vertente, a execução imediata da decisão impugnada implica a retirada completa do mercado dos medicamentos visados pelo artigo 1.° desta decisão. Por este motivo, se a execução não for suspensa, é provável que medicamentos de substituição, cuja existência é reconhecida pelas partes, sejam prescritos em vez dos medicamentos retirados enquanto decorrer o processo relativo ao mérito.

    91 Por conseguinte, existe o risco de, após uma eventual anulação da decisão impugnada, ser difícil para a Gerot recuperar as quotas de mercado que detinha antes da execução da decisão impugnada.

    92 Contudo, a Gerot limita-se a invocar dificuldades na recuperação das quotas de mercado, nomeadamente, em virtude de uma eventual perda de confiança nos medicamentos em causa, mas não demonstrou, de forma alguma, que obstáculos de natureza estrutural ou jurídica impediriam os médicos de voltar a prescrever tais medicamentos e a Gerot de reconquistar uma fracção apreciável dessas quotas de mercado, após a implementação, nomeadamente, de medidas apropriadas de publicidade junto dos médicos.

    93 De resto, o prejuízo alegado é de ordem puramente financeira e, em princípio, um prejuízo puramente pecuniário não pode ser visto como irreparável ou mesmo dificilmente reparável, uma vez que pode ser objecto de posterior compensação financeira (despacho de 3 de Julho de 1984, De Compte/Parlamento, 141/84 R, Recueil, p. 2575, n.° 4).

    94 Cabe, porém, ao juiz das medidas provisórias examinar as circunstâncias próprias de cada caso concreto (despacho De Compte/Parlamento, já referido, n.° 4).

    95 A este respeito, deve sublinhar-se que a Gerot não apresentou o menor elemento de prova relativo à sua situação financeira, ao seu volume de negócios ou às vendas do medicamento contendo fentermina visado pela decisão impugnada.

    96 Além disso, há que ter em conta a circunstância de a Gerot operar num mercado, o dos medicamentos para uso humano, altamente regulamentado.

    97 Ora, num sector que requer frequentemente investimentos importantes e onde as autoridades competentes podem ser levadas a intervir rapidamente quando surgem riscos para a saúde pública, por razões que nem sempre são previsíveis para as empresas em causa, cabe a estas últimas, sob pena de ter de suportar elas próprias o prejuízo resultante de uma intervenção daquela natureza, precaver-se contra as respectivas consequências através de uma política apropriada.

    98 A decisão de 9 de Dezembro de 1996, que, de resto, não foi impugnada pela Gerot, salientava já a existência de efeitos nocivos relativamente aos medicamentos que contenham fentermina. Nestas circunstâncias, a possibilidade de adopção de uma decisão de revogação ou de suspensão da ACM, de que a Gerot era titular, devia ser tida em conta entre os riscos que esta última teria, em princípio, de suportar desde que o CEF havia sido consultado por um Estado-Membro, por este considerar que a alteração dos termos da ACM ou que a sua suspensão ou a sua revogação eram necessárias à protecção da saúde pública.

    99 Em qualquer dos casos, mesmo admitindo que se dê como suficientemente provada a existência de um risco irreparável ou dificilmente reparável na sequência da aplicação da decisão impugnada enquanto decorre o processo relativo ao mérito, o interesse da Gerot em obter a suspensão da execução da decisão impugnada não pode, no caso vertente, prevalecer sobre o interesse que apresenta para a Comunidade a revogação imediata das ACM de que aquela era titular, com o objectivo de protecção da saúde pública.

    100 A este respeito, importa recordar que, em princípio, deve incontestavelmente reconhecer-se às exigências ligadas à protecção da saúde pública carácter preponderante relativamente às considerações económicas (despacho Reino Unido/Comissão, já referido, n.° 93).

    101 No caso vertente, está provado que o parecer do CEF, referido pela decisão impugnada, sublinha, no que respeita aos efeitos sobre o sistema nervoso central, que os medicamentos em causa têm «efeitos graves, como reacções psicóticas ou uma psicose, uma depressão e convulsões» e que o risco de toxicomania e de dependência é «bem conhecido». Sublinha igualmente que «o perfil de segurança dos medicamentos que contenham fentermina coloca problemas em termos de risco de hipertensão arterial pulmonar primitiva e de outros efeitos indesejáveis graves cardio-vasculares [...]». Estas considerações confirmam as apreciações já levadas a cabo quanto à segurança desse medicamento, em 1996.

    102 Foi na sequência das apreciações do CEF, segundo as quais o efeito terapêutico dos medicamentos que contenham fentermina é inexistente no tratamento da obesidade, que a Comissão, baseando-se no parecer do referido comité, concluiu que a relação benefícios/riscos era desfavorável.

    103 Sem prejuízo das apreciações a efectuar no quadro do processo sobre o mérito, o juiz das medidas provisórias não pode, na ausência de indícios de erro manifesto ou de desvio de poder, substituir pelas suas próprias apreciações as do CEF, que são o resultado de um procedimento aprofundado e contraditório que o conduziu a recomendar a revogação das ACM dos medicamentos que contenham fentermina.

    104 Ora, tendo em conta as referidas apreciações, parece que a concessão da suspensão da execução da decisão impugnada é de natureza a fazer incorrer os utilizadores destes medicamentos em riscos sérios e a causar, em termos de saúde pública, danos que não podem ser reparados em caso de rejeição posterior do recurso sobre o mérito.

    105 Resulta do conjunto do que precede que o pedido de medidas provisórias deve ser indeferido.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    decide:

    1) O despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 31 de Outubro de 2000, Gerot Pharmazeutika/Comissão (T-132/00 R, Colect., p. II-3635), é anulado.

    2) O pedido de medidas provisórias é indeferido.

    3) Reserva-se para final a decisão quanto às despesas.

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