COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 13.10.2022
COM(2022) 518 final
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
Garantir a aplicação da legislação da UE para que a Europa concretize os compromissos assumidos
Garantir a aplicação da legislação da UE para quea Europa concretize os compromissos assumidosGarantir a aplicação da legislação da UE para quea Europa concretize os compromissos assumidos
I.INTRODUÇÃO
A União Europeia é uma comunidade assente no primado do direito, tendo por base valores comuns partilhados pelos Estados-Membros. A aplicação e o cumprimento da legislação da UE, bem como o respeito pelo Estado de direito, encontram-se no âmago da sua existência. A legislação constitui a melhor forma de a UE proporcionar aos cidadãos, às empresas e ao nosso ambiente os benefícios a ela inerentes. O princípio do primado do direito em que assenta a legislação da UE tem por base o princípio da igualdade perante os Tratados. Tal garante a igualdade dos direitos aplicáveis a todos em todo o território da UE, o que significa que todas as disposições da legislação da UE devem ter a mesma aceção e ser aplicadas de forma idêntica em todos os Estados-Membros. A legislação é o fundamento que permite à UE tirar o maior partido possível do mercado interno, impulsionando a nossa transição para uma Europa mais ecológica e mais digital, para além de proteger e promover os nossos valores, uma cooperação judicial eficaz e a segurança da nossa União. Trata-se da razão pela qual o sistema assente em normas constitui um vetor essencial da posição da UE, tanto a nível europeu como mundial, sendo um requisito sine qua non para a equidade, a democracia e o respeito pelos direitos fundamentais. A Comissão manifesta o seu empenho em redobrar esforços para promover e defender os direitos humanos, as liberdades fundamentais e o Estado de direito. As principais vertentes de trabalho, como os relatórios anuais sobre o Estado de direito, o Plano de Ação para a Democracia Europeia e a nova estratégia para a aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da UE («Carta»), articulam-se entre si no âmbito de uma importante intensificação dos trabalhos para reforçar as bases jurídicas e democráticas da UE.
Assegurar o cumprimento da legislação da UE é fundamental para alcançar este objetivo. Trata-se de uma das missões fulcrais da Comissão, instituição à qual os Tratados da UE atribuem o papel de «guardiã dos Tratados» e, em termos mais latos, da legislação da UE. Este papel fundamental confere à Comissão a responsabilidade primordial por velar pela aplicação da legislação. Uma das principais formas de desempenhar este papel consiste em colaborar com os Estados-Membros, bem como em acompanhar a transposição e aplicação da legislação da UE por parte destes últimos. A presente comunicação expõe em maior pormenor a forma como a Comissão desempenha esta função à medida que a legislação da UE é elaborada, objeto de transposição para o direito nacional, aplicada e cumprida na prática. Do mesmo modo que a Comissão coloca a ênfase em proteger o Estado de direito, evitando que surjam problemas, a melhor forma de garantir o cumprimento da legislação consiste em evitar que ocorram infrações a esta última. A cooperação quotidiana entre a Comissão e os Estados‑Membros é essencial para assegurar o seu cumprimento em tempo útil. No entanto, em última análise, os procedimentos de infração, nomeadamente a possibilidade de intentar ações contra os Estados-Membros perante o Tribunal de Justiça da União Europeia («Tribunal de Justiça») são, muitas vezes, necessários para dirimir essas infrações à legislação da UE.
A aplicação eficaz permite que os cidadãos e as empresas da UE possam beneficiar, o mais rapidamente possível, das normas acordadas em comum, para além de poderem contar com o respeito permanente dos seus direitos fundamentais, independentemente do local onde vivam ou trabalhem na UE. Trata-se do motivo pelo qual a Comissão apoia os Estados‑Membros de forma precoce no processo de integração das normas da UE no seu ordenamento jurídico, de forma a garantir a transposição correta da legislação da UE e a sua devida aplicação desde o início. Tal explica também por que razão o número de procedimentos de infração não constitui forçosamente, por si só, um bom parâmetro para aferir os esforços desenvolvidos pela Comissão para fazer cumprir a legislação, os quais visam evitar a ocorrência de infrações e, se for caso disso, pôr termo às mesmas o mais rapidamente possível.
Para além da Comissão e dos governos nacionais, outros intervenientes também desempenham um papel fundamental na aplicação eficaz da legislação da UE. Alguns assumem um papel formal, como os tribunais nacionais, as autoridades nacionais responsáveis pela concorrência ou pela regulamentação ou as autoridades competentes, como as autoridades de defesa dos consumidores ou as autoridades independentes de controlo da proteção de dados. A sociedade civil e os particulares também contribuem para chamar a atenção para eventuais infrações e para a necessidade de lhes dar resposta.
A presente comunicação descreve a forma como a Comissão aprofundou e desenvolveu os seus trabalhos de controlo da aplicação da legislação, a fim de garantir que esta seja respeitada de forma idêntica em todos os Estados-Membros e maximizar os benefícios concretos que esses trabalhos de execução e aplicação da legislação asseguram para os cidadãos da UE na sua vida quotidiana.
II.TIRAR PARTIDO DOS BENEFÍCIOS DA LEGISLAÇÃO DA UE
Os cidadãos e as empresas necessitam que as normas da UE acordadas em comum sejam rápida e corretamente implementadas ou transpostas para o direito nacional e plenamente aplicadas pelos Estados-Membros. A aplicação das normas da UE é essencial para a execução das políticas da União e está indissociavelmente ligado à elaboração das mesmas. A legislação da UE é submetida a um processo minucioso de avaliação da legislação nacional e da UE em vigor, de consulta do público e de avaliação do respetivo impacto a nível ambiental, social e económico. A sua adoção resulta de um processo legislativo inclusivo e transparente em que participam o Parlamento Europeu e o Conselho, para que os responsáveis e decisores políticos possam manifestar a sua opinião sobre a forma como a legislação em vias de discussão será aplicada na prática. Para que os atos adotados produzam os efeitos esperados, é necessário que sejam aplicados em todos os Estados-Membros de forma integral, correta, idêntica e em tempo útil.
Permitir aos cidadãos trabalhar e exercer atividades profissionais em qualquer parte da UE
As normas da UE em matéria de reconhecimento das qualificações profissionais facilitam a prestação de serviços por parte dos profissionais em todo território da UE, garantindo simultaneamente uma melhor proteção dos consumidores. No entanto, os Estados-Membros aplicaram estas normas de forma incoerente, sendo os procedimentos aplicáveis aos trabalhadores por conta de outrem e por conta própria mais onerosos em alguns Estados-Membros do que noutros. Na sequência dos procedimentos de infração, os Estados-Membros alteraram a sua legislação, de molde a garantir que os cidadãos e as empresas possam beneficiar das vantagens inerentes a essas normas. Além disso, após a cooperação no âmbito do grupo de trabalho para o cumprimento das normas do mercado único, os Estados-Membros retiraram 217 atividades profissionais da lista correspondente para as quais era necessário proceder a um controlo prévio, facilitando assim a prestação desses serviços pelos trabalhadores nos referidos Estados-Membros.
A melhor coordenação dos sistemas nacionais de segurança social dos Estados-Membros também ajuda os cidadãos a exercerem de forma eficaz o seu direito à livre circulação. A fim de proteger a livre circulação dos trabalhadores e assegurar a coordenação dos sistemas de segurança social, a Comissão lançou procedimentos contra dois Estados-Membros por concederem montantes mais baixos de prestações familiares aos cidadãos da UE que neles trabalham, quando os seus filhos vivem num Estado-Membro onde o custo de vida é considerado inferior. Numa dessas instâncias, a posição da Comissão já havia sido confirmada pelo Tribunal de Justiça que determinou que a adaptação das prestações familiares em função do país de residência das crianças beneficiárias é ilegal.
O mecanismo de cooperação SOLVIT para a resolução de problemas transfronteiras permite identificar numa fase mais precoce as eventuais infrações à legislação da UE e pode proporcionar um mecanismo de recurso imediato às empresas ou pessoas afetadas. Aborda os problemas práticos e os obstáculos com que as pessoas se deparam quando trabalham, residem ou exercem atividades empresariais noutros Estados-Membros. As autoridades nacionais que fazem parte da rede SOLVIT colaboram entre si na aplicação das normas da UE e recorrem de forma alargada à assistência e aos conhecimentos especializados disponibilizados pela Comissão. Os centros SOLVIT a nível nacional não só encontram soluções para inúmeras situações individuais, como contribuem também para identificar e resolver problemas estruturais relacionados com a aplicação da legislação da UE.
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A não conformidade tem um impacto adverso. Pode significar que a proteção dos direitos fundamentais seja adiada ou assuma uma dimensão mais restrita, comprometendo direitos como a igualdade de tratamento e a livre circulação. Pode perpetuar os encargos que recaem sobre os cidadãos e as empresas. Pode significar que os danos ambientais passam a assumir uma natureza duradoura. Pode significar que a defesa dos consumidores ou dos trabalhadores ou a proteção dos requerentes de asilo é reduzida ou protelada. O impacto assume particular importância para as pessoas que trabalham ou se deslocam a nível transfronteiras, ou que atravessam as fronteiras para outros fins
, que devem adaptar-se a normas distintas consoante a forma como a legislação da UE é aplicada. A aplicação incorreta das normas da UE também distorce a concorrência no mercado único, comprometendo a igualdade das condições de concorrência para as empresas em toda a UE.
Nos casos em que os Estados-Membros infringem as normas da UE ao introduzirem ou tolerarem obstáculos no mercado único a fim de criarem vantagens para as empresas nacionais, os ganhos potenciais assumem geralmente uma natureza a curto prazo, ao passo que o impacto duradouro nas empresas pode ser muito mais prejudicial, tornando muito mais difícil que todas as empresas tirem partido das oportunidades propiciadas pelo mercado único.
Custos de uma aplicação incorreta ou incompleta das normas
Os obstáculos existentes no mercado único devem-se, em muitos casos, à aplicação incorreta ou incompleta dos Tratados e da legislação da UE. As PME e as empresas em fase de arranque são particularmente afetadas, pois são as primeiras a ressentir-se do impacto dos encargos administrativos e de qualquer tipo de complexidade, nomeadamente quando transpõem as fronteiras para exercer atividades no mercado único. A aplicação incorreta das regras compromete também as economias de escala proporcionadas pelo mercado único, o que afeta os interesses dos consumidores de forma adversa. A incoerência das normas prejudica, em especial, as regiões transfronteiras
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Uma aplicação robusta das regras da concorrência é essencial para que as empresas e os consumidores tirem partido das vantagens do mercado único. A aplicação incorreta dessas regras compromete a igualdade das condições de concorrência para as empresas, pelo que os consumidores podem defrontar-se com preços mais altos e um leque de escolha mais restrito.
A aplicação da política e da legislação da UE no domínio do ambiente não só é essencial para assegurar um ambiente saudável, como proporciona também novas oportunidades em termos de crescimento económico, emprego e competitividade. A plena aplicação da legislação da UE no domínio do ambiente permitirá também à economia europeia realizar poupanças correspondentes a cerca de 55 mil milhões de EUR por ano no domínio da saúde e em termos de custos diretos para o ambiente.
Vantagens que advirão de uma rápida aplicação das novas regras fiscais da UE
As novas regras do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicáveis ao comércio eletrónico entraram em vigor em 2021 no quadro dos trabalhos destinados a assegurar a igualdade das condições de concorrência e a simplificar as regras em matéria de IVA. Os vendedores em linha podem doravante inscrever-se num portal eletrónico («balcão único») e cumprir todas as suas obrigações em matéria de IVA para vendas em todo o território da UE. A Comissão forneceu apoio e orientações sobre as novas regras aplicáveis tanto aos Estados-Membros como às partes interessadas afetadas. Isto contribuiu para uma aplicação harmoniosa das novas regras em matéria de IVA relativas ao comércio eletrónico, para a cobrança de 8,8 mil milhões de EUR de receitas do IVA através do novo portal, incluindo 700 milhões de EUR em novas receitas de IVA
, e para a inscrição de 100 000 vendedores em linha na plataforma eletrónica.
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A aplicação integral e coerente das normas da UE pelos Estados-Membros é importante para assegurar a segurança jurídica e a confiança das pessoas e das empresas nas instituições nacionais e na UE em geral. Tal é particularmente válido no que diz respeito aos nossos valores comuns, aos direitos fundamentais, ao Estado de direito, às quatro liberdades fundamentais da UE e ao funcionamento do mercado único. Se aspirarmos a uma União da Igualdade, é fundamental que a igualdade e a não discriminação sejam respeitadas em todo o território da UE e que os cidadãos possam beneficiar de um grau idêntico de proteção dos seus direitos, independentemente do local onde residam na UE.
Proteger a cidadania da UE
Os regimes de concessão de cidadania a investidores (ou «passaporte dourado») em alguns Estados-Membros têm vindo a suscitar vivas preocupações nos últimos anos. A concessão sistemática da nacionalidade de um Estado-Membro e, por conseguinte, da cidadania da UE, em contrapartida do pagamento de um montante predeterminado e sem que haja qualquer ligação genuína com esse Estado-Membro, infringe o conceito de cidadania da UE, bem como o princípio da cooperação leal. Suscita também graves riscos em matéria de segurança, branqueamento de capitais, evasão fiscal e corrupção. A fim de defender com firmeza a posição segundo a qual a cidadania da UE não está à venda e que qualquer regime existente de concessão de cidadania a investidores deve ser revogado sem demora, a Comissão deu início a procedimentos de infração sem precedentes contra dois Estados‑Membros, tendo remetido um deles para o Tribunal de Justiça em última análise. Além disso, a Comissão estabeleceu contactos com outros Estados-Membros que, entretanto, aboliram os seus regimes de concessão de cidadania a investidores.
Defender a igualdade e a não discriminação
O respeito da dignidade humana e da igualdade são valores fundamentais da UE, consagrados no artigo 2.º do Tratado da União Europeia. Estes valores não são meras normas éticas, mas direitos fundamentais consagrados na Carta e constituem princípios gerais do direito da UE. A Comissão tomou medidas para proteger os direitos das pessoas LGBTIQ e, em última instância, intentou uma ação contra um Estado-Membro perante o Tribunal de Justiça cuja legislação nacional discrimina as pessoas com base na sua orientação sexual ou identidade de género.
No que respeita à igualdade de género e, mais concretamente, no domínio da segurança social, a Comissão tomou medidas contra um Estado-Membro pelo facto da sua legislação sobre pensões de reforma estabelecer uma discriminação indireta em relação às mulheres no cálculo do período necessário de contribuições para obter direito a uma pensão.
Defender a liberdade dos meios de comunicação social
Uma sociedade digital aberta, democrática e sustentável assenta no princípio da garantia da liberdade dos meios de comunicação social e da liberdade de expressão. Os fornecedores de serviços de comunicação social devem dispor de acesso ao mercado em condições não discriminatórias, proporcionadas e objetivamente justificadas, a fim de estarem em condições de exercer as suas atividades de forma livre e independente em todo o território da União Europeia. A Comissão intentou uma ação contra um Estado-Membro perante o Tribunal de Justiça pela não observância das regras do mercado interno em matéria de telecomunicações e por não respeitar a liberdade de expressão consagrada na Carta.
Apoiar a migração legal e a igualdade de tratamento dos nacionais de países terceiros
Paralelamente, a possibilidade de atrair talentos de países terceiros permite enriquecer a nossa sociedade e reverte em benefício das nossas economias. As normas da UE preveem condições comuns de entrada e residência para determinadas categorias de nacionais oriundos de países terceiros, bem como a igualdade de tratamento destas pessoas face aos cidadãos da UE em vários domínios. A Comissão tomou medidas contra vários Estados‑Membros por introduzirem obstáculos injustificados que impedem os nacionais de países terceiros de terem acesso a um emprego e de desenvolver atividades por contra própria. A Comissão lançou igualmente procedimentos de infração a respeito dos encargos excessivos impostos no âmbito da tramitação das autorizações de residência na UE. Consequentemente, vários Estados-Membros alteraram a sua legislação nacional a fim de assegurarem a sua conformidade com a legislação da UE, sendo doravante mais fácil e atraente para os nacionais de países terceiros qualificados residir e trabalhar na Europa.
Combater o discurso de ódio racista e xenófobo e os crimes de ódio
O discurso de ódio e os crimes de ódio não só prejudicam as pessoas afetadas e a sociedade em geral, como põem também em causa os valores que se encontram no âmago da UE. Para assegurar a observância na prática destes últimos, é fundamental intensificar a aplicação da Decisão-quadro de 2008 relativa à luta contra o discurso de ódio e os crimes de ódio. A Comissão manifesta a sua firme determinação em garantir uma criminalização eficaz do discurso de ódio e dos crimes de ódio e esta estratégia permitiu-lhe realizar progressos significativos quanto à sua aplicação em todos os Estados-Membros. A este respeito, a sua intenção de avançar com procedimentos de infração, sempre que tal se revela necessário, foi reiterada no seu Plano de Ação da UE contra o Racismo. Na sequência de uma série de procedimentos de infração iniciados entre 2020 e 2021, diversos Estados-Membros iniciaram diligências para alterar a sua legislação ou já adotaram novas alterações legislativas. Por exemplo, as alterações já adotadas num Estado-Membro reforçam a criminalização e a ação penal contra o discurso de ódio e os crimes de ódio e melhoram a proteção das minorias contra esses crimes.
Unir forças para combater o terrorismo
Os atos de terrorismo constituem uma das infrações mais graves às liberdades fundamentais em que assenta a União Os atentados terroristas cometidos nos Estados-Membros da UE salientaram claramente a necessidade de a polícia e os procuradores públicos disporem de melhores instrumentos para prevenir e combater as infrações terroristas. A diretiva de 2017 relativa à luta contra o terrorismo constitui a pedra angular das medidas adotadas pelos Estados-Membros no domínio do direito penal para combater o terrorismo e constitui um vetor essencial do quadro da União de Segurança da UE. A Comissão deu início a procedimentos contra vários Estados-Membros com vista a assegurar a existência das condições jurídicas que permitam às autoridades nacionais cooperarem entre si e procederem ao intercâmbio de informações sobre ameaças terroristas.
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III.EXECUÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO DA UE: UM TRABALHO COMUM
A Comissão supervisiona o respeito da legislação da UE pelos Estados-Membros e recorre a uma série de instrumentos para promover e fazer cumprir a sua correta aplicação, nomeadamente por meio dos procedimentos de infração. Todavia, no intuito de assegurar a sua aplicação e o seu cumprimento na prática de forma eficaz, é necessário que diversos outros intervenientes também desempenhem o papel que lhes incumbe. A conformidade pressupõe, em primeiro lugar, uma estreita cooperação e colaboração com os Estados‑Membros e com autoridades especializadas, como as autoridades responsáveis pela defesa dos consumidores ou pela proteção de dados, as autoridades da concorrência e regulamentares, as ONG, as empresas e o público. Para poder funcionar eficazmente, o sistema depende tanto do pleno empenhamento das autoridades nacionais responsáveis pela correta aplicação da legislação, como de medidas destinadas a assegurar a sua conformidade e a participação dos cidadãos, da sociedade civil, das empresas e de outros intervenientes na identificação de infrações potenciais.
Os tribunais nacionais constituem tribunais da UE quando aplicam o direito da União e desempenham um papel particularmente importante na cadeia de controlo do cumprimento da legislação. Sempre que os direitos dos cidadãos ou das empresas da UE sejam afetados a nível nacional, estes devem dispor de acesso a vias de recurso nacionais rápidas e eficazes, em conformidade com o princípio da tutela jurisdicional efetiva. Trata-se da razão pela qual os tribunais devem ser independentes, imparciais e estabelecidos por lei.
Ao mesmo tempo, os tribunais dos Estados-Membros têm o direito (e, por vezes, o dever) de remeter questões para o Tribunal de Justiça se desconhecerem a melhor forma de interpretar ou aplicar o direito da UE. Este diálogo mediante a apresentação de um pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça é essencial para a aplicação homogénea do direito da UE, com base no princípio do primado do direito da União, e para a defesa dos direitos dos cidadãos. A Comissão recorre sistematicamente ao seu direito de apresentar observações em todos os procedimentos de reenvio prejudicial perante o Tribunal de Justiça. Se o Tribunal de Justiça identificar uma infração ao direito da UE, o órgão jurisdicional de reenvio tem a obrigação de dirimir a mesma no caso concreto que foi submetido à sua apreciação.
Além disso, a Comissão não só controla o cumprimento do acórdão por parte do Estado‑Membro em causa, como vela também por uma aplicação idêntica da jurisprudência estabelecida pelo Tribunal de Justiça por parte dos demais Estados-Membros. O aumento do número de decisões prejudiciais ao longo do tempo, bem como as intervenções da Comissão nestes processos, contribuíram assim de forma importante para uma melhor observância do direito da UE nos Estados-Membros. Além disso, a Comissão lançou procedimentos de infração por violações dos princípios de autonomia, primado, eficácia e aplicação uniforme do direito da União, bem como pela não observância da autoridade do Tribunal de Justiça.
A Comissão aplica a estratégia de formação judiciária europeia para garantir que os profissionais da justiça, como os juízes, os procuradores, os advogados e outras profissões envolvidas na administração da justiça, conheçam o direito e os instrumentos de cooperação judiciária da UE e disponham das competências adequadas para defender o Estado de direito e aplicar de forma correta e coerente a legislação da UE no seu país.
Promover a execução das normas da UE em matéria de fiscalidade através da intervenção em decisões prejudiciais
No domínio da fiscalidade, as decisões prejudiciais são um meio essencial para a Comissão assegurar a correta aplicação do direito da UE.
No caso da fiscalidade direta, as decisões prejudiciais incidem sobre obstáculos transfronteiras concretos à liberdade de circulação, resultantes dos sistemas nacionais de tributação. Por exemplo, o Tribunal de Justiça declarou, num acórdão prejudicial, que os cidadãos que doavam dinheiro a uma instituição de beneficência noutro Estado-Membro devem beneficiar do mesmo desagravamento fiscal que aquele aplicável quando efetuam uma doação a uma instituição de beneficência comparável no seu próprio Estado‑Membro.
No caso da fiscalidade indireta, as decisões prejudiciais seguidas de um diálogo entre a Comissão e os Estados-Membros levaram estes últimos a alterar a sua legislação. Foi o caso de um Estado-Membro relativamente à utilização de veículos com chapas de matrícula estrangeiras e de outro Estado-Membro no que respeita às condições restritivas das regras em matéria de IVA.
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Os parlamentos nacionais também têm um papel importante a desempenhar neste contexto, a saber, colaborar com os governos nacionais na adoção de leis para assegurar a transposição das diretivas da UE e aplicar determinados regulamentos através do direito nacional. A Comissão decidiu dar provas de firmeza perante a não transposição de diretivas, tirando pleno partido do potencial das disposições previstas no artigo 260.º, n.º 3, do TFUE introduzido pelo Tratado de Lisboa, ou seja, quando os Estados-Membros não transpõem as diretivas no prazo previsto para o efeito, lança automaticamente procedimentos contra os mesmos e solicita sistematicamente ao Tribunal de Justiça que lhes imponha sanções financeiras. Esta abordagem revelou-se frutífera e o número de processos pela não comunicação de informações em matéria de transposição que a Comissão teve de intentar perante o Tribunal de Justiça diminuiu em mais de metade desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. Não obstante, o número de procedimentos de infração iniciados devido ao facto de os Estados‑Membros não terem comunicado as suas medidas de transposição à Comissão no prazo fixado nas diretivas da UE continua a ser elevado. Os legisladores nacionais têm um papel importante a desempenhar no intuito de garantir que a transposição seja realizada de forma atempada e integral: quando notificam as medidas de transposição à Comissão, os Estados-Membros devem explicar de forma clara e transparente a forma como foi assegurada a transposição de cada disposição de uma diretiva.
Entre os outros organismos essenciais com um papel importante a desempenhar com vista a assegurar o cumprimento da legislação da UE figuram os organismos setoriais de regulamentação, de inspeção e de controlo, as autoridades de supervisão nacionais e regionais, os procuradores e os provedores de justiça nacionais, bem como os organismos de promoção da igualdade. No intuito de garantir o cumprimento do direito da União, a Comissão vela nomeadamente por que as autoridades nacionais disponham de recursos suficientes e estejam em condições de desempenhar as suas funções, analisando os conflitos de interesses, a independência e o nível de efetivos dessas autoridades. A Comissão também apoia ativamente os esforços de execução por parte dos Estados-Membros, fornecendo-lhes apoio técnico e financeiro, bem como conhecimentos especializados para efeitos das reformas estruturais, para além de programas de formação especializados. Por exemplo, a Comissão concedeu subvenções às autoridades nacionais de controlo da proteção de dados no intuito de apoiar os seus trabalhos destinados a assegurar o cumprimento do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados. Lançou igualmente procedimentos de infração contra os Estados‑Membros a fim de assegurar que estas autoridades sejam independentes e disponham dos poderes necessários para sancionar eventuais infrações a esse regulamento.
Algumas iniciativas específicas da UE, tais como os mecanismos de recurso transfronteiras (por exemplo, a rede SOLVIT), o processo europeu para ações de pequeno montante ou a plataforma europeia de resolução de litígios em linha também foram úteis. No setor financeiro, as três autoridades europeias de supervisão estão habilitadas a proceder a uma avaliação das autoridades nacionais competentes, a fim de avaliar a convergência das disposições nacionais adotadas em aplicação do direito da União. São igualmente competentes para realizar inquéritos e adotar medidas se as autoridades nacionais competentes não cumprirem as obrigações que lhes incumbem por força do direito da UE. Tal contribui para assegurar a aplicação coerente e eficaz da legislação da UE no setor financeiro.
O papel desempenhado pelos Centros Europeus do Consumidor com vista a assegurar o cumprimento do direito no domínio da defesa dos consumidores
Os Centros Europeus do Consumidor desempenham um papel fundamental a nível da deteção e adoção de medidas contra eventuais infrações generalizadas à legislação no domínio da defesa dos consumidores. Tomaram nomeadamente medidas destinadas a garantir que os sistemas de reserva de alojamento em linha estão isentos de quaisquer técnicas de manipulação como, por exemplo, a dissimulação do pagamento, pelo estabelecimento, de comissões para figurar no topo da classificação, o exercício de pressões indevidas sobre os utilizadores para que concluam a transação o mais rapidamente possível ou o anúncio de descontos que induzem em erro.
Em 2020, na sequência de um diálogo com a Comissão e as autoridades nacionais, as principais plataformas de reservas de alojamento alteraram a forma como apresentam as ofertas, os descontos e os preços aos consumidores, para que os utilizadores possam fazer comparações com conhecimento de causa, em conformidade com os requisitos estabelecidos pela legislação da UE no domínio da defesa dos consumidores. Doravante, evitam apresentar uma proposta como sendo limitada no tempo, se o mesmo preço continuar a estar disponível ulteriormente, e clarificam a forma como os resultados são classificados. Um diálogo do mesmo teor permitiu, em 2022, que um grande mercado em linha procedesse à harmonização das suas práticas de anulação das reservas com as normas da UE em matéria de defesa dos consumidores. Deste modo, os consumidores poderão cancelar a subscrição de serviços premium com muito mais facilidade do que anteriormente, necessitando apenas de clicar duas vezes num «botão de cancelamento» bem visível e claro.
Formação das PME no domínio da legislação relativa à proteção dos consumidores
O projeto «Consumer Law Ready» é um programa de formação instituído à escala da UE sobre a legislação relativa à proteção dos consumidores e destina-se às pequenas e médias empresas. Em cada Estado-Membro é designado um formador principal para prestar formação a intermediários que, por sua vez, formam em seguida as PME. Esta iniciativa contribuirá para reduzir as infrações e para melhor conhecer o funcionamento da legislação da UE relativa à proteção dos consumidores.
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IV.CUMPRIMENTO INTELIGENTE — PREVENIR AS INFRAÇÕES À LEGISLAÇÃO DA UE DESDE O INÍCIO
A fim de antecipar as infrações e evitar a sua ocorrência, a Comissão já toma em consideração as questões associadas à correspondente aplicação e cumprimento quando elabora as propostas legislativas da UE. As estratégias de execução elaboradas pela Comissão em cooperação com as administrações nacionais ajudam a identificar os principais desafios que os Estados-Membros enfrentam na transposição e aplicação da legislação da UE e definem os instrumentos utilizados pela Comissão para apoiar o respetivo cumprimento.
Contribuir para a preparação dos Estados-Membros no domínio da execução
O regulamento relativo à avaliação das tecnologias da saúde visa melhorar o acesso dos doentes da UE a tecnologias inovadoras no domínio da saúde, nomeadamente no que diz respeito aos medicamentos e dispositivos médicos. A Comissão publicou um plano evolutivo para apoiar as autoridades nacionais, os criadores de tecnologias de saúde e as partes interessadas na aplicação desta legislação a partir da sua entrada em vigor em 2025.
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Para evitar interpretações divergentes a respeito da legislação da UE recentemente adotada e promover um entendimento comum das normas vigentes, a Comissão fornece orientações práticas aos Estados-Membros, às empresas, às partes interessadas e ao público sobre a forma de compreender e aplicar aspetos específicos da legislação da UE.
Estas orientações podem, por exemplo, assumir a forma de orientações sobre a interpretação e a aplicação do direito da UE ou de «Perguntas mais frequentes» publicadas em linha, tendo sido elaboradas em todos os grandes domínios de intervenção. A Comissão utiliza orientações, nomeadamente, para acompanhar os Estados-Membros no processo de transposição das diretivas e de aplicação dos regulamentos, aplicação essa que se inicia em princípio após a adoção de um ato, bem como para consolidar a jurisprudência do Tribunal de Justiça.
Orientações da Comissão para facilitar a aplicação prática da legislação
As orientações da Comissão sobre a aplicação do artigo 17.º da Diretiva Direitos de Autor apoiam a aplicação coerente das novas regras relativas às plataformas de partilha de conteúdos em todos os Estados-Membros. Estas orientações constituem um documento prático destinado a clarificar a situação dos utilizadores e dos titulares de direitos sobre o que pode ser carregado ou não sem o consentimento do titular dos direitos de autor e os casos em que é possível solicitar às plataformas que suprimam ou reexaminem conteúdos carregados pelos utilizadores.
Na sequência da adoção do pacote Mobilidade, a Comissão publicou documentos de orientação sob a forma de «Perguntas e Respostas» e notas de orientação sobre a interpretação de vários conjuntos de novas regras relativas, nomeadamente, aos tempos de condução, ao destacamento de condutores, aos tacógrafos inteligentes e à obrigação de regresso dos veículos ao centro operacional, a fim de ajudar as partes interessadas a aplicar corretamente essas regras e os Estados-Membros a proceder à sua transposição e a assegurar a sua aplicação de forma coerente.
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A Comissão também recorre a um vasto leque de outros instrumentos de concertação, como os comités, as redes, os grupos de peritos e os seminários, para promover a execução eficaz da legislação da UE em todos os domínios de intervenção. Estas instâncias permitem aos Estados-Membros partilhar as suas boas práticas e debater os problemas enfrentados na aplicação da legislação da UE. A Comissão pode assim identificar dificuldades de execução numa fase precoce e encontrar eventuais soluções, incluindo a utilização de ferramentas informáticas para apoiar uma execução mais eficiente e eficaz. O grupo de trabalho para o cumprimento das regras do mercado único, criado na sequência das conclusões do Conselho Europeu sobre a política industrial em 2020, constitui um fórum fundamental para melhorar a aplicação e o cumprimento da legislação. Uma vertente essencial dos seus trabalhos consiste em analisar os obstáculos que entravam a aplicação das normas relativas ao mercado único e em conceber soluções concretas do ponto de vista prático.
Prevenir os obstáculos no âmbito do mercado único antes da sua ocorrência
Nos termos da Diretiva Transparência no Mercado Interno, os Estados-Membros devem notificar à Comissão os seus projetos de regulamentações técnicas nacionais antes dos mesmos serem adotados, a fim de evitar a criação de obstáculos ao mercado único. Este mecanismo de notificação deu origem a práticas positivas em termos de intercâmbio de informações, diálogo e cooperação entre os Estados-Membros e a Comissão, bem como entre os próprios Estados-Membros. Permite igualmente proceder à partilha de boas práticas para resolver problemas correntes no domínio da regulamentação técnica, nomeadamente em setores recentemente regulamentados, como os serviços digitais e as novas tecnologias. Tal permitiu não só evitar a adoção de novas normas que infringem a legislação da UE, como contribuiu também para a aplicação do princípio do reconhecimento mútuo.
No domínio dos serviços, o procedimento de notificação ao abrigo da Diretiva Serviços
visa evitar a criação de obstáculos regulamentares injustificados no âmbito do mercado único. A Comissão incentiva ativamente a transparência das medidas tomadas pelos Estados-Membros em matéria de serviços e envida esforços contínuos no sentido de aumentar a eficiência desse procedimento de notificação.
A Diretiva Teste de Proporcionalidade é outro instrumento que impede a criação de novos entraves ao mercado único de serviços profissionais. Qualquer nova regulamentação nacional das atividades profissionais deve ser objeto de uma avaliação aprofundada, devendo ser apresentados elementos que comprovem a sua proporcionalidade antes da respetiva adoção.
Colaborar com os Estados-Membros para melhorar a aplicação da legislação
O grupo de peritos WADEX foi criado para assistir a Comissão na aplicação da Diretiva Acessibilidade da Web e servir de fórum para o intercâmbio de boas práticas e experiências no domínio da acessibilidade dos sítios Web entre os Estados-Membros. Em 2020-2022, realizaram-se seminários em linha numa base mensal. Estes permitiram assegurar que os Estados-Membros seguissem uma abordagem comum e apresentassem em tempo útil e de forma eficaz os seus primeiros relatórios sobre a monitorização dos sítios Web e das aplicações móveis. De acordo com estes relatórios, os Estados-Membros testaram mais de 10 000 sítios Web e 300 aplicações móveis durante este período. Este exercício contribuiu para uma maior sensibilização e para uma melhor acessibilidade dos conteúdos em linha do setor público nos sítios Web e nas aplicações móveis.
Utilizar ferramentas informáticas para facilitar o cumprimento e a aplicação da legislação
O Sistema de Informação do Mercado Interno (IMI) é uma ferramenta informática em linha que facilita a cooperação administrativa no domínio da legislação relativa ao mercado único para as administrações públicas dos Estados-Membros. Esta ferramenta pode ajudar as pessoas e as empresas que exercem atividades transfronteiras. É respeitadora do ambiente, segura e multilingue. Reduz os encargos administrativos e presta apoio em 19 domínios de intervenção.
Pode ser adaptada de forma a apoiar objetivos específicos. Por exemplo, em 2022, foram lançados três novos módulos da Comissão para facilitar a aplicação transfronteiras das novas regras introduzidas pelo pacote Mobilidade, nomeadamente no que se refere ao destacamento de condutores, ao regresso de um condutor e ao regresso de um veículo. Além disso, criou-se uma nova interface pública ligada ao IMI para facilitar a apresentação de declarações de destacamento por parte dos transportadores rodoviários às autoridades competentes dos Estados-Membros onde os seus condutores são destacados. Os transportadores rodoviários de toda a Europa podem doravante apresentar a sua declaração de destacamento totalmente em linha de uma forma muito simples, poupando tempo e dinheiro. Desde o lançamento desta interface, o número de declarações de destacamento apresentadas excedeu 10 milhões.
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Para além dos comités e dos grupos de peritos, a Comissão organiza também reuniões bilaterais com os Estados-Membros para analisar a conformidade num dado domínio de intervenção específico. Estas reuniões de conformidade permitem à Comissão e ao Estado‑Membro em causa analisar todos os procedimentos de infração, bem como as fases pré-contenciosas EU Pilot em curso nesse domínio específico. Revelaram-se úteis para identificar e resolver questões transversais, para além de permitirem poupar tempo mediante a análise de vários casos no âmbito de uma única reunião e contribuírem para desenvolver a compreensão mútua entre as autoridades nacionais e os serviços da Comissão.
Articulação entre as políticas e o apoio da UE
O apoio financeiro da UE também demonstrou ser um instrumento eficaz para incentivar os Estados-Membros a realizar reformas e, caso necessário, acelerar a consecução dos objetivos consignados no direito da UE. Este apoio inclui os fundos estruturais e de investimento europeus, como o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura ou os fundos da política de coesão, o financiamento através dos programas Alfândega e Fiscalis e as subvenções e empréstimos ao abrigo do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR).
Este último instrumento visa atenuar o impacto económico e social da pandemia de coronavírus e permitir às economias e sociedades europeias tornarem-se mais sustentáveis, mais resilientes e mais bem preparadas para enfrentar os desafios e as oportunidades inerentes à dupla transição ecológica e digital. O mecanismo é um instrumento de recuperação a título temporário, que permite à Comissão mobilizar fundos para ajudar os Estados-Membros a realizar as reformas e os investimentos constantes dos seus próprios planos nacionais que sejam consentâneos com as prioridades da UE e que respondam aos desafios identificados nas recomendações específicas por país formuladas no âmbito do Semestre Europeu para a coordenação das políticas económicas e sociais. Apesar de o MRR não constituir um instrumento de execução, essas prioridades traduzem-se em marcos e metas a alcançar pelos Estados-Membros a fim de receberem o pagamento dos montantes que lhes foram afetados.
O MRR ajuda a UE a alcançar o seu objetivo de neutralidade climática
A fim de acelerar a transição ecológica e tendo nomeadamente em conta as metas visadas pelo Objetivo 55, muitos Estados-Membros têm vindo a colocar a tónica nos setores dos transportes e dos imóveis nos seus planos nacionais de recuperação e resiliência. O mecanismo será utilizado, entre outros, para apoiar os investimentos na renovação térmica dos edifícios, para tornar o parque automóvel mais ecológico e para apoiar a transferência modal para o transporte ferroviário. A título de exemplo, num Estado-Membro, o plano financiará uma subvenção atribuída aos proprietários de imóveis para ajudar a pagar a substituição do seu aquecimento, da sua ventilação ou as auditorias energéticas de habitações unifamiliares ou apartamentos em habitações coletivas. Estes investimentos financiarão a renovação térmica de 400 000 habitações familiares nesse Estado-Membro.
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A imposição de condições de cofinanciamento inerentes ao desembolso, por exemplo, dos fundos regionais, para desenvolver infraestruturas no âmbito da política de coesão da UE também incentivou em grande medida os Estados-Membros a acelerarem a sua conformidade com a legislação correspondente da UE.
Utilizar as condições de financiamento para impulsionar a conformidade no setor da água e dos resíduos
Os investimentos necessários para alcançar a plena conformidade com a legislação da UE em setores como a gestão da água ou dos resíduos atingem um montante elevado: as despesas cumuladas totais necessárias para assegurar a conformidade até 2030 no domínio do abastecimento de água e saneamento ascendem a 255 mil milhões de EUR nos 27 Estados-Membros. Do mesmo modo, estima-se que o investimento adicional necessário para cumprir os objetivos da economia circular e da gestão de resíduos se situe entre 13 mil milhões de EUR e 28 mil milhões de EUR por ano até 2030. Estes fundos são necessários para modernizar o sistema de resíduos, melhorando a recolha, a triagem, o tratamento dos biorresíduos, o retratamento e a digitalização dos registos.
Alguns Estados-Membros recorrem, por exemplo, aos fundos regionais da UE para financiar os investimentos necessários. No entanto, o acesso ao cofinanciamento da UE está sujeito a requisitos específicos. Os Estados-Membros apenas beneficiam de cofinanciamento se preencherem uma série de condições estabelecidas na legislação da UE (como a elaboração de planos de gestão de resíduos ou o planeamento dos investimentos necessários no setor da água). Esta condicionalidade garante que o cofinanciamento da UE será utilizado de forma eficiente e permitirá a criação de infraestruturas ambientais essenciais e o cumprimento das normas estabelecidas pela legislação da UE em matéria de resíduos e água.
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O respeito pelo Estado de direito é fundamental para a boa gestão financeira do orçamento da União e para uma utilização eficaz do seu financiamento. O Regulamento Condicionalidade vigora desde 1 de janeiro de 2021, protegendo o orçamento da UE contra as infrações ao Estado de direito nos Estados-Membros. Em 2 de março de 2022, a Comissão publicou orientações sobre a aplicação do regime geral de condicionalidade. Em 18 de setembro de 2022, adotou-se uma primeira proposta de decisão de execução do Conselho.
Para além de prestar apoio financeiro, a Comissão também disponibiliza conhecimentos técnicos específicos aos Estados-Membros da UE para conceberem e executarem reformas ao abrigo do Instrumento de Assistência Técnica. Este último ajuda as autoridades nacionais a melhorar a sua capacidade de conceber, elaborar e executar reformas destinadas a reforçar a resiliência em diversos domínios (cooperação administrativa, Estado de direito, reforma dos sistemas de justiça, reforço da supervisão financeira e intensificação da luta contra a fraude, a corrupção e o branqueamento de capitais).
Promover a boa administração pública através da iniciativa PACE (cooperação e intercâmbios entre as administrações públicas)
As administrações públicas constituem a interface direta entre a UE e os cidadãos, dado traduzirem a legislação e os programas da UE em ações concretas. A qualidade das administrações públicas é um fator determinante para a competitividade dos Estados‑Membros e, por conseguinte, da UE no seu conjunto. A Comissão está a testar, no âmbito do Instrumento de Assistência Técnica, uma iniciativa de cooperação e intercâmbios entre as administrações públicas (PACE) por meio da qual os funcionários podem ser temporariamente destacados para outro Estado-Membro. Este programa permite aos participantes adquirir conhecimentos e competências, criar vínculos e, em última análise, contribuir para a criação de um verdadeiro espaço administrativo europeu.
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V.DETEÇÃO E RESOLUÇÃO NUMA FASE PRECOCE DAS INFRAÇÕES À LEGISLAÇÃO DA UE
Maior transparência e mecanismos de acompanhamento para identificar os problemas
Uma maior transparência, a publicação de informações sobre a conformidade e os mecanismos de acompanhamento periódico também se revelaram eficazes para impelir os Estados-Membros a garantir uma conformidade mais célere ou, pelo menos, para identificar os domínios que requerem maior atenção.
A publicação de relatórios sobre estas questões permite ao público acompanhar o desempenho e o nível de conformidade do seu Estado-Membro em domínios de intervenção específicos, para além de sensibilizar as empresas e promover o debate público a este respeito. Os painéis de avaliação de indicadores e outras avaliações semelhantes ajudam a centrar estes trabalhos, por meio de instrumentos como o Painel de Avaliação do Mercado Interno, os relatórios específicos por país elaborados no âmbito do Semestre Europeu, o reexame da aplicação da política ambiental e o mapa interativo das infrações ambientais que o acompanha, ou a publicação das reações da Comissão às notificações dos Estados-Membros ao abrigo da Diretiva Transparência no Mercado Único. Outros instrumentos, como o relatório anual sobre o Estado de direito ou o Painel de Avaliação da Justiça na UE, fornecem informações específicas por país sobre a evolução da situação nos Estados-Membros, desempenhando assim um papel fundamental na aplicação eficaz da legislação da UE. O bom funcionamento dos sistemas de justiça nacionais é essencial para assegurar a tutela jurisdicional efetiva dos direitos que o direito da UE confere aos cidadãos e às empresas. Em determinados domínios de intervenção específicos, a Comissão publica informações sobre o estado de transposição das diretivas pelos Estados-Membros
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A Comissão também elabora frequentemente relatórios sobre a aplicação de instrumentos ou da legislação em domínios específicos do direito da UE. Estes relatórios visam não só informar o público sobre os domínios em que os seus direitos são postos em causa, mas também identificar tendências e problemas gerais, facilitando a adoção de medidas coercivas contra os Estados-Membros e incentivando estes últimos a proceder a uma eventual revisão da legislação.
Avaliação de Schengen
O bom funcionamento do espaço Schengen depende da aplicação correta e eficaz do acervo de Schengen e da confiança mútua entre os Estados-Membros. O mecanismo de avaliação e de monitorização de Schengen prevê a realização de avaliações objetivas e imparciais para identificar rapidamente as deficiências na aplicação das regras de Schengen e assegurar a sua rápida resolução. A Comissão e os Estados-Membros organizam visitas de avaliação, as quais são seguidas de recomendações do Conselho dirigidas aos Estados‑Membros para que estes tomem medidas corretivas. O mecanismo foi atualizado e melhorado, e este procedimento mais simplificado garante nomeadamente a rápida retificação de quaisquer deficiências graves.
Relatório sobre o Estado de direito
O relatório anual sobre o Estado de direito encontra-se no cerne do mecanismo europeu para o Estado de direito. Em julho de 2022, a Comissão apresentou o seu terceiro relatório anual sobre o Estado de direito, que contava com 27 capítulos, ou seja, um por cada país. O relatório resulta de um estreito diálogo com as autoridades nacionais e as partes interessadas e incide sobre todos os Estados-Membros de forma objetiva e imparcial, analisando os quatro pilares fundamentais do Estado de direito: os sistemas de justiça, o quadro de luta contra a corrupção, o pluralismo e a liberdade dos meios de comunicação social e outras questões institucionais relacionadas com o controlo e o equilíbrio dos poderes Desde 2022, o relatório é acompanhado de recomendações específicas dirigidas a cada Estado-Membro. Em consonância com a natureza preventiva do relatório, o objetivo das recomendações consiste em apoiar os esforços desenvolvidos pelos Estados-Membros para fazer avançar as reformas em curso ou projetadas e ajudá-los a identificar os domínios em que se impõem melhorias ou o acompanhamento de mudanças ou reformas recentes.
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Organização de auditorias para verificar a conformidade
Em determinados domínios do direito da UE, a Comissão organiza auditorias para verificar se os Estados-Membros cumprem as normas da UE na prática e no intuito de avaliar os controlos nacionais.
As auditorias constituem um instrumento essencial para proteger o orçamento da UE. Contribuem para detetar pagamentos irregulares e recuperar os montantes desembolsados indevidamente pelo Estado-Membro devido à não observância das regras e dos princípios da boa gestão financeira. As recomendações resultantes dessas auditorias e os planos de ação lançados pelos Estados-Membros a pedido da Comissão conduzem frequente e diretamente a uma melhor aplicação das regras pelas autoridades dos Estados-Membros.
Proteger as normas da UE em matéria de segurança dos alimentos para consumo humano e animal
Os cidadãos na UE exigem um elevado nível de normas de segurança dos alimentos para consumo humano e animal, bem como de saúde animal e vegetal. Estas normas são protegidas por controlos, incluindo auditorias, nos Estados-Membros e nos países terceiros que exportam vegetais, animais e alimentos para a UE. Em 2019-2020, a Comissão realizou 170 auditorias e diligências similares a respeito dos sistemas de controlo oficial dos Estados‑Membros, que suscitaram 527 recomendações dirigidas a estes últimos. Num número esmagador de casos, os Estados-Membros tomaram medidas corretivas ou assumiram compromissos satisfatórios para corrigir as deficiências. Em 2020, cerca de 17 milhões de operadores da cadeia agroalimentar foram sujeitos a controlos oficiais pelas autoridades nacionais, que realizaram mais de quatro milhões de controlos junto destes operadores, Tal ajudou as autoridades nacionais a aplicar melhor as elevadas normas da UE em matéria de segurança dos alimentos para consumo humano e animal.
Elaborar planos de ação para melhorar a conformidade com as regras comuns no setor das pescas
A Comissão procede a inspeções junto dos Estados-Membros para verificar a forma como estes aplicam os controlos no setor das pescas. Se detetar deficiências de controlo sistemáticas, a Comissão elabora planos de ação em conjunto com os Estados-Membros para reforçar os respetivos sistemas de controlo. Estes planos de ação ajudam a Comissão a assegurar o devido acompanhamento da aplicação e dos progressos alcançados nos sistemas de controlo das pescas dos Estados-Membros, essenciais para garantir uma pesca sustentável e unidades populacionais de peixes saudáveis. Tal permitiu tornar mais fiável a declaração das capturas e melhorar os sistemas de deteção de infrações à política comum das pescas.
Assegurar a regularidade dos pagamentos no domínio da agricultura
A Comissão realiza auditorias periódicas nos Estados-Membros para verificar o respeito, por parte destes últimos, da legislação da UE que rege o apoio prestado aos agricultores e a outros beneficiários através da política agrícola comum. Em caso de não conformidade ou de deficiências no sistema de controlo, a Comissão pode suspender ou recuperar o financiamento da UE junto dos Estados-Membros. Estas correções financeiras revelaram ser um mecanismo eficaz para corrigir os erros cometidos e proteger o orçamento da UE. Além disso, a fim de reforçar os sistemas de controlo do Estado-Membro em causa, a Comissão solicita a este último a aplicação de um plano de ação.
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Fase pré-contenciosa do procedimento de infração (EU Pilot)
Se, apesar dos esforços que desenvolve em matéria de prevenção e de apoio aos Estados‑Membros, a Comissão detetar uma eventual infração à legislação da UE, pode decidir recorrer à fase pré-contenciosa do procedimento de infração, designada por EU Pilot. Este instrumento é utilizado sempre que seja fonte de valor acrescentado: em 2021, entre os 302 procedimentos de infração iniciados pela Comissão após investigações lançadas por iniciativa própria ou na sequência de queixas, 33 foram precedidos da fase EU Pilot. Trata‑se de um instrumento que pode ser utilizado quando é suscetível de conduzir mais rapidamente à conformidade do que um procedimento formal de infração. Permite à Comissão resolver uma série de questões na fase EU Pilot sem necessidade de lançar numa etapa ulterior um procedimento de infração. Pode ser o caso, por exemplo, se os problemas em causa assumirem uma natureza técnica. Pode também revelar-se útil nos casos em que a Comissão pretenda recolher as informações, factuais ou jurídicas, necessárias para proceder à sua avaliação. Não é utilizado quando a infração está devidamente comprovada, é evidente ou reconhecida pelo país em causa, também não sendo utilizado quando se trata de questões mais sensíveis em que seja menos provável que os debates a nível técnico conduzam a um desfecho positivo. A Comissão deve igualmente precaver-se contra o risco de esta fase se tornar excessivamente morosa: se esta se prolongar sem que se registem progressos substanciais, ou se houver falta de cooperação por parte do Estado-Membro, a Comissão põe termo à fase pré‑contenciosa EU Pilot e lança um procedimento de infração.
Com o tempo, o sistema EU Pilot tem vindo a demonstrar a sua eficácia. Tem recorrido a uma abordagem que consiste em tirar partido da relação de abertura e de confiança mútua entre os Estados-Membros e a Comissão para assegurar mais rapidamente o cumprimento da legislação em causa. Em 2021, mais de 80 % dos procedimentos no âmbito do sistema EU Pilot foram resolvidos de forma satisfatória. Em caso de fracasso, recorre-se a um procedimento de infração.
Processo EU Pilot para garantir que as pessoas possam utilizar a sua conta IBAN em qualquer Estado-Membro
O Regulamento Espaço Único de Pagamentos em Euros (SEPA) visa garantir que qualquer conta bancária da UE possa ser utilizada para realizar transferências bancárias e débitos diretos transfronteiras tão facilmente como a nível nacional. No entanto, em alguns Estados-Membros, os principais beneficiários dos pagamentos, como as empresas de telecomunicações ou as autoridades fiscais ou de segurança social, não aceitavam o código IBAN, pelo que as contas estabelecidas noutros países da UE não podiam ser utilizadas para proceder a débitos diretos ou transferir fundos, por exemplo, relativamente a declarações fiscais ou pensões. No período compreendido entre 2016 e 2021, a Comissão iniciou processos EU Pilot contra cinco Estados-Membros. Em consequência, o quadro jurídico destes últimos foi alterado ou está em vias de alteração para combater as infrações e assegurar sanções adequadas. Em três casos, a Comissão também iniciou procedimentos de infração para assegurar que as autoridades nacionais competentes disponham de poderes suficientes para controlar a conformidade e impor sanções. Estes procedimentos resultaram igualmente em alterações legislativas que conferem às autoridades os poderes necessários.
Processo EU Pilot para melhorar o acesso transfronteiras aos cuidados de saúde
Os doentes têm o direito de receber cuidados de saúde em qualquer Estado-Membro e de ser reembolsados pelo seu país de origem por estes cuidados prestados no estrangeiro. Uma vez que alguns Estados-Membros transpuseram incorretamente para a sua legislação nacional as normas da UE relativas aos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiras, a Comissão lançou processos EU Pilot para melhorar rapidamente o acesso a cuidados de saúde transfronteiras seguros e de elevada qualidade nos referidos países. Muito embora tenham sido lançados procedimentos de infração contra três Estados‑Membros, a etapa pré-contenciosa EU Pilot conduziu a um resultado positivo em nove Estados-Membros. Na maioria desses casos, os Estados-Membros alteraram a legislação ou as práticas administrativas a fim de as harmonizar com as normas da UE. Em consequência destas alterações, os doentes beneficiam de requisitos de autorização prévia menos onerosos, de procedimentos administrativos mais simples e de informações mais transparentes sobre os cuidados de saúde transfronteiras. Deste modo, beneficiam doravante de um acesso mais fácil aos serviços de saúde noutros Estados-Membros.
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VI.UTILIZAÇÃO EFICAZ DOS PROCEDIMENTOS DE INFRAÇÃO
A política de controlo da aplicação da legislação levada a cabo pela Comissão evoluiu ao longo do tempo. Desde 2017, a Comissão tem vindo a centrar cada vez mais os seus esforços nos problemas em que as suas intervenções podem maximizar o respetivo valor acrescentado e melhorar a vida e as atividades do maior número possível de pessoas e empresas. Por conseguinte, a Comissão continua a seguir a abordagem estratégica, os objetivos e as prioridades que definiu na sua Comunicação de 2016 intitulada «Direito da UE: Melhores resultados através de uma melhor aplicação».
O principal objetivo dos procedimentos de infração consiste em assegurar que os Estados‑Membros apliquem a legislação da UE no interesse geral, e não conceder uma reparação a título individual. Assim, a abordagem estratégica da Comissão significa que os procedimentos de infração raramente se centram em questões individuais, mas sim em questões sistémicas e estruturais que afetam um grande número de pessoas ou empresas num determinado Estado-Membro ou em toda a União.
Abordar inúmeros casos individuais de aplicação incorreta do direito no âmbito de um único procedimento de infração
No domínio do ambiente, a Comissão lançava habitualmente procedimentos individuais a respeito de um único aterro que não respeitasse as normas ou de uma aglomeração que não cumprisse a legislação relativa às águas residuais urbanas. Atualmente, coloca a ênfase em casos sistémicos, abordando, por vezes, centenas de aglomerações no âmbito de um único procedimento relativo ao tratamento de águas residuais urbanas ou incidindo em dezenas de aterros num procedimento relativo a resíduos. Esta metodologia é muito mais eficaz para assegurar a conformidade de todas as regiões de um Estado-Membro por meio de um único procedimento de infração.
Tratamento das questões gerais de princípio suscitadas por uma queixa
O direito à liberdade de associação, consagrado pela Carta, constitui um dos alicerces fundamentais de uma sociedade democrática e pluralista A este respeito, num procedimento de infração lançado pela Comissão na sequência de uma queixa, o Tribunal de Justiça determinou que a legislação nacional de um Estado-Membro entravava a livre circulação de capitais e os direitos fundamentais à proteção dos dados pessoais, bem como à liberdade de associação.
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Os casos isolados de uma eventual aplicação incorreta do direito da UE, que não suscitam questões gerais de princípio (como sejam a transposição incorreta de uma diretiva ou a existência de entraves ao processo de decisão prejudicial) e que se pautam pela falta de elementos de prova quanto a práticas gerais ou deficiências sistémicas, são tratados de forma mais eficaz pelos organismos de recurso mais próximos daqueles afetados pela infração, dado poderem propor soluções rápidas e diretas. Para além da dificuldade de investigar estes casos no terreno e da duração de um procedimento de infração a nível da UE, um acórdão do Tribunal de Justiça é sempre dirigido a um Estado-Membro, pelo que só poderá resolver qualquer problema eventual de um particular de forma indireta. O Tribunal de Justiça não pode condenar o Estado-Membro a pagar uma indemnização a um particular lesado por uma infração ao direito da União. Para obter uma indemnização ou a anulação de uma medida nacional, os autores da denúncia devem sempre recorrer a um tribunal nacional para o efeito.
A Comissão recebe cerca de 4 000 queixas por ano. Recebe também muitas petições relacionadas com o direito da UE, transmitidas pela Comissão das Petições do Parlamento Europeu. Apesar de a Comissão não investigar todos os eventuais casos de aplicação incorreta do direito da UE, continua a examinar as queixas, as perguntas escritas e as petições enquanto fontes de informação no âmbito de casos mais latos relacionados com a violação sistémica ou estrutural do direito da UE nos Estados-Membros.
Esta abordagem estratégica exige que as normas nacionais prevejam vias de recurso eficazes em caso de infração à legislação da UE, por meio de um sistema judicial independente e eficiente. Trata-se da razão pela qual a Comissão atribui especial prioridade às infrações que afetam a capacidade dos sistemas judiciais nacionais de contribuírem para a aplicação eficaz do direito da UE. Paralelamente, a Comissão também concentra os seus esforços de controlo da aplicação da legislação, com vista a garantir que as autoridades nacionais e as entidades reguladoras disponham dos meios necessários para proporcionar vias de recurso eficazes, em termos de competências e recursos, e que as medidas nacionais de execução do direito da UE prevejam sanções adequadas para os casos de violação do direito da UE.
A Comissão tem como objetivo assegurar que os Estados-Membros cumpram o direito da UE o mais rapidamente possível. Congratula-se com o facto de a maioria das infrações ser resolvida numa fase inicial do processo: mais de 90 % dos procedimentos de infração foram resolvidos antes de serem submetidos à apreciação do Tribunal de Justiça. A resolução de problemas sem ter de recorrer ao Tribunal de Justiça garante um cumprimento mais rápido, para além de poupar tempo e dinheiro. Os Estados-Membros devem envidar todos os esforços para dar cumprimento ao acórdão do Tribunal o mais rapidamente possível. Todavia, se não obstante o acórdão do Tribunal, o Estado-Membro continuar a não dirimir a infração, a Comissão pode voltar a remeter o processo para o Tribunal de Justiça e solicitar a aplicação de sanções pecuniárias ao Estado-Membro.
Eficácia dos procedimentos de infração
A legislação da UE relativa à poluição atmosférica é um domínio em que a garantia da conformidade pode implicar um custo económico elevado, mas em que o não cumprimento dessa legislação impõe um preço em termos de vidas humanas, para além de provocar doenças graves, Trata-se de um domínio que deu origem a um elevado número de procedimentos de infração. Até julho de 2022, a Comissão tinha iniciado 28 procedimentos de infração por incumprimento da Diretiva Qualidade do Ar Ambiente por parte de 18 Estados-Membros. Foram submetidos à apreciação do Tribunal de Justiça 15 processos, dez dos quais resultaram num acórdão. Um destes processos constituiu uma segunda remissão para o Tribunal de Justiça, pelo que pode dar origem à aplicação de coimas. Estes esforços foram fundamentais para reduzir o número de zonas de qualidade do ar que excedem os limites legais aplicáveis às partículas em suspensão, que passaram de 91 em 2019 para 55 em 2021, e o número de zonas com excesso de dióxido de azoto, que passaram de 68 para 23 em 2021. Tal significa que os habitantes de várias cidades da Europa beneficiam atualmente de um ar mais limpo. A aplicação da legislação da UE relativa à qualidade do ar contribuiu para reduzir em um terço as mortes prematuras relacionadas com a poluição atmosférica desde 2005, o que permitiu salvar mais de 150 000 vidas.
A Comissão presta especial atenção à proteção das florestas europeias, pois estas acumulam importantes reservas de carbono, absorvem o carbono da atmosfera e assumem uma importância fundamental para a biodiversidade e para a prestação de serviços ecossistémicos essenciais. Quando os Estados-Membros se abstiveram sistematicamente de evitar a deterioração dos habitats florestais devido à exploração madeireira ilegal ou a práticas de gestão florestal irregulares, a Comissão deu início a procedimentos de infração, utilizando imagens de satélite como meio de demonstrar a deterioração desses habitats florestais. Há vários procedimentos de infração em curso contra quatro Estados-Membros, tendo o Tribunal de Justiça já proferido um acórdão num destes processos. Num processo judicial semelhante relativo à proteção das florestas, a Comissão invocou o artigo 279.º do TFUE, solicitando ao Tribunal de Justiça que impusesse medidas cautelares para evitar a ocorrência de danos irreparáveis às nossas florestas. Posteriormente, o Tribunal de Justiça ordenou ao Estado-Membro em causa que cessasse as suas operações de gestão florestal ativa e a retirada de abetos centenários mortos, a fim de proteger os habitats florestais, sob pena da imposição de uma coima diária até tal ser cumprido.
A Comissão utiliza todos os meios de que dispõe para proteger as empresas europeias contra os obstáculos de acesso aos contratos públicos. Para o efeito, assegura a devida aplicação das normas em vigor a fim de evitar o recurso abusivo às adjudicações diretas ou eliminar as restrições à subcontratação, o que assume uma importância fundamental no intuito de permitir às PME participar nos procedimentos de concurso, tanto a nível transfronteiras como a nível nacional.
No domínio dos serviços, a Comissão deu início a procedimentos de infração contra dez Estados-Membros por imporem restrições a determinados serviços prestados, nomeadamente, por arquitetos, engenheiros, contabilistas, consultores fiscais e advogados, bem como no setor da construção. Estas restrições dificultavam a atividade transfronteiras e a expansão das empresas em causa. Em consequência, as pessoas e as empresas não puderam beneficiar dos serviços mais competitivos e inovadores disponíveis no mercado da UE. Na sequência desses procedimentos de infração, os Estados-Membros alteraram a sua legislação.
Os consumidores europeus não devem defrontar-se com obstáculos ou dificuldades no acesso transfronteiras a bens e serviços em linha, independentemente da sua localização, residência ou nacionalidade. A Comissão apoiou os Estados-Membros na aplicação do Regulamento Bloqueio Geográfico, que protege o acesso dos consumidores aos sítios Web de comércio eletrónico contra qualquer discriminação com base na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento dos clientes que efetuam compras em linha. Todavia, as responsabilidades dos Estados-Membros incluem a obrigação de definir como e quem fará cumprir as normas. Neste contexto, em 2019, a Comissão encetou procedimentos de infração contra nove Estados-Membros. Em 2021, todos os Estados‑Membros tinham cumprido as suas obrigações, tendo sido designadas autoridades competentes em todos os Estados-Membros. Tal permitiu, por exemplo, elaborar uma investigação à escala da UE sobre um conhecido motor de pesquisa em linha por práticas injustificadas de bloqueio geográfico.
Para defender o Estado de direito e, mais especificamente, proteger a independência do poder judicial e assegurar a tutela jurisdicional efetiva por tribunais nacionais independentes, a Comissão intentou uma ação contra um Estado-Membro pelo mesmo ter adotado legislação que reduzia a idade de aposentação dos juízes, combinada com um poder inteiramente discricionário do executivo quanto ao prolongamento dos mandatos ativos, obrigando um determinado número de juízes a reformarem-se. A Comissão intentou uma ação perante o Tribunal de Justiça, que confirmou a infração ao direito da UE. Consequentemente, o Estado-Membro revogou as suas normas aplicáveis à aposentação dos juízes e reintegrou aqueles que haviam sido obrigados a reformar-se.
Na sequência de queixas apresentadas que apontavam para a falta de aplicação das regras em matéria de contadores e faturação do aquecimento e da água quente em prol dos agregados familiares ao abrigo da Diretiva Eficiência Energética, a Comissão deu início a um procedimento de infração. Dado que a diretiva não tinha sido transposta no Estado‑Membro em causa, a Comissão decidiu remeter o processo para o Tribunal de Justiça. Depois de este último ter proferido o seu acórdão, o Estado-Membro adotou a legislação necessária. As pessoas que vivem em imóveis de apartamentos têm agora o direito de instalar contadores de aquecimento e água quente individualmente, para que possam monitorizar o seu consumo individual de energia e tomar medidas para o reduzir.
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A Comissão dá início a procedimentos de infração, quer por sua própria iniciativa, na sequência da apresentação de uma queixa, quer automaticamente cada dois meses, ou seja, em casos de não comunicação desencadeados pelo facto de os Estados-Membros não terem procedido à plena transposição das diretivas da UE no prazo previsto para o efeito. Intentar ações penais em casos de transposição tardia das diretivas para o direito nacional tem sido, e continuará a ser, uma prioridade para a Comissão, pois estes atrasos impedem a concretização dos benefícios das normas acordadas a nível da UE. Ao longo do tempo, registaram-se cada vez menos casos de Estados-Membros que não cumprem o prazo de transposição das diretivas, o que levou a uma diminuição global dos procedimentos de infração
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Nos últimos anos, deu-se início a uma maior percentagem de procedimentos na sequência de diligências próprias da Comissão. Estes procedimentos de infração «por iniciativa própria» permitiram à Comissão prosseguir a sua abordagem estratégica em matéria de aplicação da legislação, lançando procedimentos em relação aos casos prioritários definidos na Comunicação de 2016, nomeadamente transposição incorreta de diretivas e infrações nos domínios mais importantes para a vida quotidiana dos cidadãos da UE, como aqueles relacionados com os direitos e valores fundamentais da UE.
VIIREAÇÃO RÁPIDA E EFICAZ ÀS CRISES
As crises ou as situações de emergência, como a pandemia de COVID-19 e a guerra de agressão russa contra a Ucrânia, põem à prova a capacidade de os Estados-Membros respeitarem plenamente as quatro liberdades fundamentais da UE e o funcionamento do mercado único. Em circunstâncias difíceis, pode prevalecer a tentação de favorecer considerações de ordem interna em detrimento da correta aplicação do direito da União. No entanto, a aplicação eficaz da legislação da UE continua a ser essencial para que as pessoas e as empresas possam continuar a beneficiar da proteção e da segurança jurídica proporcionadas por essa legislação e para que os bens e serviços essenciais possam ser fornecidos onde sejam mais necessários.
As crises recentes demonstraram tanto a necessidade como a capacidade de adaptação da UE. A Comissão recorreu a uma grande diversidade de medidas para ajudar os Estados-Membros e os cidadãos a adaptarem-se à evolução da situação, quer apresentando propostas de nova legislação para alterar as normas em vigor, quer propondo orientações ou apoio financeiro, ou ainda assegurando a coordenação entre as autoridades competentes e diálogos específicos. Utilizaram-se igualmente procedimentos de infração sempre que necessário. Esta abordagem global permitiu garantir a aplicação do direito da UE em situações de crise o que, por sua vez, contribuiu para a perceção generalizada de que a UE esteve em condições de reagir em conjunto a estas crises de forma mais eficaz do que teria sido o caso por meio de respostas meramente nacionais.
Algumas normas da UE já dispõem de uma importante flexibilidade intrínseca de que se tirou bom proveito durante a crise, como a cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento ou as medidas tomadas ao abrigo da Diretiva Proteção Temporária. A Comissão adotou quadros temporários para permitir aos Estados‑Membros tirar partido da flexibilidade das normas em matéria de auxílios estatais a fim de apoiar a economia. A Comissão apresentou propostas para aplicar derrogações específicas às normas aplicáveis às assembleias gerais das sociedades, bem como para adaptar os prazos em domínios como as declarações fiscais. Noutros casos, as orientações clarificaram as normas em vigor, como as relativas à iniciativa «corredores verdes» com vista a assegurar a continuidade do fluxo de mercadorias no mercado único e permitir a livre circulação de trabalhadores essenciais durante a pandemia, ou a contribuir para o reconhecimento dos diplomas dos refugiados oriundos da Ucrânia. Algumas medidas específicas contribuíram igualmente para revelar aos Estados-Membros a existência de alternativas claras às soluções nacionais: o Certificado Digital COVID da UE preservou a livre circulação de pessoas, conferindo às autoridades nacionais um meio de verificar o estatuto de todos os titulares de certificados que se deslocam no território da UE. No final de 2021, os Estados-Membros tinham emitido mais de mil milhões de certificados. Todas estas medidas preservaram a integridade do direito da UE, facultando ao mesmo tempo uma flexibilidade essencial.
No entanto, houve casos em que os Estados-Membros tentaram contornar as normas da UE. Por exemplo, no início da pandemia de COVID-19, alguns Estados-Membros introduziram unilateralmente restrições à exportação de medicamentos ou equipamento de proteção, ou tomaram medidas para favorecer os produtores ou os prestadores de serviços nacionais em setores como os produtos alimentares e as viagens. A Comissão manteve-se vigilante face a estas ameaças ao mercado único e muitas medidas protecionistas adotadas pelos Estados‑Membros nos primeiros meses da pandemia foram revogadas com relativa rapidez. A Comissão também iniciou procedimentos de infração contra medidas protecionistas nacionais após a invasão da Ucrânia, como as proibições de exportação em vários setores económicos, por exemplo, cereais e materiais de construção, ou a aplicação de preços discriminatórios de combustíveis aos veículos com chapas de matrícula estrangeiras.
Na sequência da invasão russa da Ucrânia, a Comissão adotou medidas para facilitar os transportes, o trânsito e as trocas comerciais com a Ucrânia, incluindo um «Plano de Ação para a Criação de Corredores Solidários UE-Ucrânia com vista a facilitar as exportações agrícolas e o comércio bilateral da Ucrânia com a UE», atenuando assim o efeito desta crise no transporte de mercadorias. A Comissão suspendeu por um ano os direitos de importação de todas as exportações ucranianas para a União Europeia. Tomou igualmente medidas para reforçar a execução e a aplicação das sanções contra as pessoas e entidades russas e bielorrussas enumeradas na lista correspondente. A Comissão publicou diversos documentos de orientação sobre a interpretação das sanções, prestando aos Estados-Membros esclarecimentos sobre novas questões e um apoio contínuo com vista a assegurar a devida aplicação.
A Comissão ativou os instrumentos de emergência previstos pelo direito da UE para atenuar o impacto da crise energética. Mediante proposta da Comissão, os colegisladores adotaram regras destinadas a garantir o enchimento das instalações de armazenamento de gás, por forma a dispor-se de um volume suficiente de gás durante o período de inverno de 2022, o que tem um impacto direto nas pessoas e nas empresas. A Comissão também propôs rapidamente novas regras relativas a medidas coordenadas de redução da procura de gás e a uma intervenção de emergência para fazer face aos elevados preços da energia. Estas intervenções de emergência representam mais uma etapa nos trabalhos da Comissão destinados a garantir que o quadro jurídico da UE proporcione uma resposta sólida e eficaz às situações de crise.
A Comissão tem vindo igualmente a extrair ilações e a analisar a forma como as normas da UE devem dispor de mecanismos integrados de flexibilidade e coordenação para que, em situações de crise, possam ser tomadas medidas no âmbito de um quadro jurídico predeterminado. Com base na experiência adquirida em resultado da pandemia de COVID-19, a Comissão adotou um plano de emergência para os transportes, que proporciona um conjunto de instrumentos para fazer face a qualquer tipo de crise no setor dos transportes e garante, nomeadamente, que a legislação da UE seja alterada e aplicada a fim de responder devidamente a essa evolução, se for caso disso, em tempo útil. Do mesmo modo, na sua proposta de alteração do Código das Fronteiras Schengen, de dezembro de 2021, a Comissão introduziu um mecanismo de coordenação para fazer face às ameaças para a saúde nas fronteiras externas e um novo mecanismo de salvaguarda Schengen destinado a assegurar uma resposta comum nas fronteiras internas face a quaisquer riscos que afetem os Estados‑Membros. No âmbito da União Europeia da Saúde, a Comissão criou também a Autoridade da UE de Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias (HERA), a fim de reforçar a capacidade da Europa de prevenir as emergências sanitárias transfronteiras e reagir rapidamente às mesmas, bem como intensificar a aplicação das medidas de emergência. Além disso, o Instrumento de Emergência do Mercado Único permitirá reagir rapidamente às situações de crise a fim de preservar a circulação de mercadorias e pessoas e salvaguardar o acesso a fornecimentos e serviços essenciais.
Utilização do conjunto diversificado de instrumentos de execução em situações de crise
A pandemia de COVID-19 causou graves perturbações no setor das viagens e vários Estados-Membros sentiram a necessidade de reagir. As medidas nacionais em virtude das quais as pessoas cujas férias tinham sido canceladas apenas receberiam vales de viagem ou reembolsos a longo prazo não estavam em conformidade com os direitos dos viajantes a um reembolso por força da legislação da UE. Numa primeira fase, a Comissão forneceu orientações precoces sobre a aplicação da legislação da UE em matéria de direitos dos passageiros e emitiu uma recomendação sobre os vales propostos em alternativa ao reembolso de viagens canceladas, salientando também a forma como os Estados-Membros poderiam apoiar a liquidez financeira dos operadores de transportes. Colaborou igualmente com as autoridades incumbidas de assegurar a cooperação no domínio da defesa do consumidor no âmbito dos diálogos com as companhias aéreas. Em consequência dessa colaboração, em 2022, 16 grandes companhias aéreas europeias chegaram a um consenso sobre a sua resposta que previa o reembolso de mais de 500 000 vales de voo que haviam sido impostos aos consumidores cujos voos tinham sido cancelados durante a pandemia. A Comissão também lançou procedimentos de infração contra os Estados‑Membros que tinham adotado regras contrárias ao Regulamento da UE Direitos dos Passageiros ou à Diretiva Viagens Organizadas. A grande maioria destes países harmonizou rapidamente as suas práticas com o direito da UE, tendo sido necessário remeter apenas um processo para o Tribunal de Justiça.
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VII.CONCLUSÃO
A aplicação da legislação da UE é, e continuará a ser, uma das principais prioridades da Comissão. A presente comunicação expôs o alargado leque diversificado de medidas adotadas pela Comissão para aplicar a legislação da UE, sempre em consonância com o nosso derradeiro objetivo, ou seja, suscitar uma evolução positiva e garantir que as pessoas e as empresas tirem pleno partido da legislação da UE. Pode haver muitos fatores que desencadeiam uma aplicação insuficiente ou incorreta, pelo que a Comissão desenvolveu um conjunto diversificado de instrumentos para responder à mesma.
Uma abordagem global, inteligente e estratégica no domínio da aplicação da legislação traduziu-se em benefícios diretos: desde um ar mais limpo, normas mais elevadas de qualidade da água, transportes mais seguros e uma melhor proteção dos consumidores, até à defesa dos direitos e liberdades fundamentais da UE. Em todas estas instâncias, colaborar com os Estados-Membros assume uma importância crucial: a execução e a aplicação da legislação da UE resultam de uma conjugação de esforços e o seu cumprimento é o corolário de os Estados-Membros tomarem as medidas necessárias para evitar e dirimir rapidamente qualquer problema de infração, nomeadamente através de um sistema judicial nacional eficaz com tribunais independentes.
A aplicação do direito da UE não é um ato pontual, mas um processo que exige esforços constantes e sustentados por parte da Comissão e dos Estados-Membros no intuito de garantir a aplicação coerente e eficaz das normas da UE e evitar problemas potenciais. A rápida evolução do nosso quadro internacional, as crises imprevistas e os novos desafios em matéria de aplicação da legislação exigem que a Comissão avalie de forma constante as formas de continuar a melhorar a execução e a aplicação das normas acordadas em comum. A Comissão e os Estados-Membros estão atualmente em vias de proceder a um balanço a fim de garantir a disponibilidade de instrumentos adequados de execução para que a legislação da UE funcione na prática
. Este exercício avalia, nomeadamente, se as atuais modalidades de gerir as queixas, as fases não contenciosas no âmbito do sistema EU Pilot e as infrações continua a adequar-se aos fins a que se destina. No âmbito desta análise, estão já a ser ponderadas diversas melhorias nestas atividades de controlo da aplicação da legislação.
Ao longo do tempo, o número de novas diretivas tem vindo a diminuir, ao mesmo tempo que se recorre cada vez mais aos regulamentos enquanto instrumento legislativo. A Comissão dispõe de um sistema consagrado para acompanhar e assegurar a transposição rápida e correta das diretivas. A execução e a aplicação dos regulamentos é igualmente importante e, embora os regulamentos tenham um efeito direto, tal depende muitas vezes dos trabalhos realizados pelas autoridades nacionais. Alguns regulamentos exigem a introdução de alterações na legislação nacional e muitos conferem às agências ou às entidades reguladoras nacionais responsabilidades cruciais para assegurar a aplicação na prática da legislação em causa. Por conseguinte, a Comissão redobrará esforços para acompanhar e assegurar a execução e a aplicação dos regulamentos de uma forma mais sistemática e estratégica.
A Comissão atribui grande importância à transparência, que permite ao público em geral assumir uma responsabilidade partilhada no domínio da aplicação das normas e favorece o seu cumprimento mais rápido por parte dos Estados-Membros. Trata-se da razão pela qual a Comissão tem vindo a aumentar progressivamente a informação disponibilizada ao público sobre as suas atividades de controlo da conformidade. Um relatório anual sobre o controlo da aplicação do direito da UE
apresenta a principal evolução neste domínio, descreve em pormenor a cooperação com os Estados-Membros e explica as decisões mais importantes adotadas no domínio das infrações. Um registo público dos procedimentos de infração
fornece informações atualizadas sobre o último passo dado no âmbito de cada procedimento. A Comissão publica comunicados de imprensa sobre todas as decisões adotadas em matéria de infrações, bem como informações adicionais sobre as decisões mais importantes. No entanto, o público e a sociedade civil identificaram uma série de domínios em que seria desejável uma maior transparência, como a fase pré-contenciosa EU Pilot, os resumos de descrição dos procedimentos e as estatísticas atualizadas sobre as medidas de execução tomadas pela Comissão. A Comissão continuará a melhorar e a intensificar as informações disponibilizadas ao público, de forma sistemática e mais facilmente acessível. O exercício de balanço em curso analisará de forma mais minuciosa as informações adicionais a disponibilizar ao público e os meios de proceder a essa divulgação, em estreita cooperação com os Estados-Membros.
Por último, o exercício de balanço analisará também as formas de melhorar a cooperação entre a Comissão e os Estados-Membros no que diz respeito à transposição rápida e correta das diretivas.
A Comissão apresentará um relatório sobre os resultados do exercício de balanço no decurso de 2023.