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Document 52017IE1953

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Financiamento das organizações da sociedade civil pela UE» (parecer de iniciativa)

    JO C 81 de 2.3.2018, p. 9–15 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    2.3.2018   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 81/9


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Financiamento das organizações da sociedade civil pela UE»

    (parecer de iniciativa)

    (2018/C 081/02)

    Relator:

    Jean-Marc ROIRANT

    Base jurídica

    Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

     

     

    Decisão da Plenária

    30.3.2017

     

     

    Competência

    Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

    Adoção em secção

    27.9.2017

    Adoção em plenária

    19.10.2017

    Reunião plenária n.o

    529

    Resultado da votação

    (votos a favor/votos contra/abstenções)

    188/15/10

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1.

    As organizações da sociedade civil (OSC) desempenham um papel fundamental na promoção de uma cidadania ativa na Europa. Uma democracia participativa necessita de organismos intermediários para mobilizar os cidadãos e favorecer a sua expressão em todos os espaços cívicos. Uma sociedade civil organizada forte, independente e diversificada assenta na existência de financiamentos públicos adequados.

    1.2.

    Para além das dificuldades crescentes de acesso aos fundos públicos, a redução do espaço cívico que se observa em alguns países da UE é o elemento mais perigoso para o funcionamento das organizações da sociedade civil e para a democracia europeia.

    1.3.

    O CESE considera que se deve adotar um quadro político e legislativo a nível europeu e nacional para promover o desenvolvimento de uma sociedade civil europeia cuja atividade se paute por valores assentes nos direitos fundamentais.

    1.4.

    À semelhança do que alguns Estados-Membros fizeram a nível nacional através da adoção de «cartas de compromissos recíprocos» ou de «pactos», as instituições europeias poderiam assumir o compromisso de encetar um verdadeiro diálogo civil europeu. É necessário retomar os debates sobre o estatuto da associação europeia, bem como sobre um estatuto europeu das fundações, e garantir a aplicação do artigo 11.o do TUE sobre o diálogo estruturado com a sociedade civil.

    1.5.

    A UE deve encorajar os Estados-Membros a manter ou desenvolver incentivos fiscais para os donativos privados, bem como a canalizar uma parte das suas receitas fiscais para as organizações da sociedade civil. Deve também eliminar os obstáculos aos donativos transfronteiras, através da coordenação da legislação e dos procedimentos fiscais, e investir no desenvolvimento da filantropia em toda a UE.

    1.6.

    As instituições europeias devem assegurar a promoção de uma imagem positiva das organizações da sociedade civil e velar pela preservação da sua independência, designadamente através do reforço da sua capacidade de ação e empenho na inovação social e na participação cívica.

    1.7.

    O CESE apela à adoção de uma estratégia favorável ao desenvolvimento de uma sociedade civil forte e independente na Europa e à criação de um Provedor da UE em matéria de liberdades do espaço cívico, a quem as ONG comunicariam incidentes relacionados com tentativas de perseguição ou de restrição da sua atividade.

    1.8.

    No que diz respeito ao futuro quadro financeiro plurianual, o CESE apela às autoridades orçamentais para que reforcem o apoio às organizações da sociedade civil, nomeadamente através de subvenções de funcionamento e financiamentos plurianuais.

    1.9.

    O CESE exorta a Comissão a propor um fundo europeu para a democracia, os valores e os direitos humanos no território da UE (1), com uma dotação orçamental ambiciosa e diretamente acessível às organizações da sociedade civil de toda a Europa, e gerido de forma independente, à semelhança do Fundo Europeu para a Democracia (2) com a participação de representantes do CESE.

    1.10.

    A fim de promover a democracia participativa, o CESE considera que se deveria atribuir ao programa «Europa para os Cidadãos» uma dotação de 500 milhões de euros no próximo quadro financeiro plurianual (QFP), como proposto pelo Parlamento Europeu (3). Importaria igualmente aumentar as ações orientadas para a sociedade civil no âmbito do programa Erasmus+.

    1.11.

    O CESE insta a Comissão a acompanhar a aplicação do código de conduta sobre parcerias com a sociedade civil no âmbito dos fundos estruturais. A Comissão deve igualmente exortar os órgãos de poder nacional e regional a recorrer às disposições relativas à assistência técnica, concebidas para reforçar as capacidades das organizações da sociedade civil.

    1.12.

    O CESE apela para um debate mais aprofundado sobre o modo de promover uma maior participação das organizações da sociedade civil nos programas de investigação, fomentando a ligação entre os investigadores e a sociedade civil, e propondo a introdução de uma nova vertente dedicada à participação cívica e à democracia no âmbito do pilar «Desafios societais» no futuro programa-quadro de investigação.

    1.13.

    Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e as prioridades em matéria de género devem ser integrados no futuro QFP.

    1.14.

    A UE deve manter e reforçar a sua liderança como doadora no domínio da ajuda humanitária e da cooperação internacional e promover de forma proativa uma verdadeira sociedade civil.

    1.15.

    O CESE congratula-se com a perspetiva preconizada pela Comissão, na sua proposta de revisão do Regulamento Financeiro, de considerar o tempo de trabalho dos voluntários como um custo elegível (uma resposta direta ao parecer do CESE sobre as «Ferramentas estatísticas para medir o voluntariado» (4)) e de facilitar a contabilização das contribuições em espécie como cofinanciamentos. Acolhe também com agrado o relatório do Parlamento que apela à simplificação da supervisão dos fundos mediante, por exemplo, a confiança mútua nas avaliações e auditorias, a agilização das respostas aos requerentes e a assinatura dos contratos e pagamentos. O CESE insta as instituições da UE a chegarem a um acordo sobre o texto proposto que permite contabilizar de forma equitativa o tempo de trabalho dos voluntários.

    1.16.

    O reforço da sociedade civil depende também de um melhor acesso ao financiamento por parte das organizações mais pequenas e dos grupos sociais mais desfavorecidos. Para tal, a Comissão deve prever diversos mecanismos de financiamento e continuar a simplificar as formalidades administrativas, proporcionando formação e orientações sobre a execução dos contratos e as obrigações financeiras e garantindo, simultaneamente, uma interpretação coerente da regulamentação financeira pelos seus serviços.

    1.17.

    O CESE insta a Comissão Europeia a reagir prontamente com medidas adequadas, incluindo processos por infração contra os Estados-Membros, quando as disposições administrativas ou jurídicas nacionais restringem o acesso das organizações da sociedade civil aos fundos da UE, nomeadamente quando são impostas condições de financiamento que limitam a sua defesa de causas.

    2.   Introdução

    2.1.

    Em vários dos seus pareceres, o CESE analisou a questão do diálogo civil e da democracia participativa, a definição destes conceitos, a representatividade das diversas partes interessadas e as medidas a aplicar a nível europeu. Em particular, o CESE destacou que a aplicação do artigo 11.o do Tratado da UE (5) é de extraordinária importância para reforçar a legitimidade democrática da UE junto dos cidadãos.

    2.2.

    No entanto, a forma como os financiamentos podem contribuir para promover a cidadania ativa e a democracia participativa não foi, até à data, objeto de um parecer específico.

    2.3.

    É urgente analisar a distribuição e a eficácia dos financiamentos da UE neste domínio, num momento em que as instituições da União se preparam para debater a proposta relativa ao QFP pós-2020 e estão prestes a adotar uma decisão sobre a revisão do Regulamento Financeiro.

    2.4.

    As questões relativas ao financiamento estão igualmente ligadas ao reconhecimento de um papel e de um estatuto específicos para os diversos intervenientes no diálogo civil europeu. O CESE já se pronunciou, em várias ocasiões, sobre a necessidade de um estatuto da associação europeia (6).

    2.5.

    No âmbito do presente parecer, entende-se por «organizações da sociedade civil» as organizações não governamentais sem fins lucrativos, independentes das instituições públicas e dos interesses comerciais, cujas atividades contribuem para a realização de objetivos da Carta dos Direitos Fundamentais, como a inclusão social, a participação ativa dos cidadãos, o desenvolvimento sustentável em todas as suas dimensões, a educação, a saúde, o emprego, os direitos dos consumidores, o apoio aos migrantes e aos refugiados ou os direitos fundamentais (7).

    3.   O papel das organizações da sociedade civil

    3.1.

    Uma sociedade civil empenhada, pluralista e independente desempenha um papel essencial na promoção da participação ativa dos cidadãos no processo democrático, bem como na governação e na transparência a nível europeu e nacional. Pode também contribuir para o estabelecimento de políticas mais justas e eficientes e apoiar o desenvolvimento sustentável e o crescimento inclusivo (8). Na medida em que conseguem «atingir os grupos de população mais pobres e mais desfavorecidos, permitindo-lhes que façam ouvir a sua voz», as organizações da sociedade civil permitem uma maior participação e contribuem para a definição das políticas europeias (9).

    3.2.

    Para além das suas funções cívicas e sociais, algumas organizações da sociedade civil intervêm também no chamado setor da economia social e solidária, dando mesmo um contributo significativo para a criação de emprego.

    3.3.

    As organizações da sociedade civil têm a particularidade de reunir, em torno de diversos projetos, equipas de voluntários muito empenhados e trabalhadores dedicados. O voluntariado, enquanto expressão ativa da participação cívica que permite reforçar valores europeus comuns como a solidariedade e a coesão social, deve poder beneficiar de um ambiente propício (10).

    3.4.

    Uma verdadeira democracia participativa necessita de organismos intermediários (sindicatos, organizações de empregadores e PME, ONG e outros intervenientes sem fins lucrativos, etc.) para mobilizar os cidadãos e favorecer a apropriação popular e cívica dos desafios europeus, bem como construir uma Europa mais justa, solidária e inclusiva. Uma sociedade civil organizada forte e diversificada assenta na existência de financiamentos públicos adequados e de um enquadramento que facilite o acesso a diversas formas de financiamento privado.

    4.   As diferentes formas de financiamento

    4.1.

    A nível da UE, existem muitos programas, em diversos setores (educação, cultura, setor social, cidadania, ambiente, direitos fundamentais, investigação, cooperação internacional, ajuda humanitária, saúde, etc.), que incluem objetivos específicos relativos à participação da sociedade civil, nomeadamente sob a forma de projetos. Além disso, as instituições criaram subvenções de funcionamento destinadas, nomeadamente, a promover a ligação em rede das organizações nacionais que intervêm em diversos setores e temáticas sociais. Estes apoios financeiros contribuem, assim, para a formação de uma «opinião pública europeia».

    4.2.

    No que se refere ao alargamento e às políticas externas, nomeadamente em matéria de cooperação internacional e ajuda humanitária, a UE desenvolveu uma política proativa de promoção do desenvolvimento da sociedade civil, incluindo através de medidas específicas. A União é também um dos principais contribuintes a nível mundial para a ajuda ao desenvolvimento e a ajuda humanitária, contando neste aspeto com um grande apoio dos cidadãos europeus (11).

    4.3.

    No entanto, no que diz respeito à política interna, não houve uma reavaliação das relações entre a UE e as organizações da sociedade civil (nomeadamente nos termos do artigo 11.o do TUE) desde 2000, quando foi publicado um primeiro documento de reflexão da Comissão, no âmbito do processo de reforma administrativa, que salientou a necessidade de manter um nível elevado de financiamento público para apoiar o papel das ONG, definir uma abordagem coerente para o conjunto dos serviços da Comissão e melhorar a gestão das subvenções.

    4.4.

    O financiamento das organizações da sociedade civil centra-se essencialmente no domínio da ajuda humanitária e da cooperação internacional. Segundo dados de 2015, foram atribuídos 1200 milhões de euros ao financiamento de ONG (cerca de 15 % da rubrica «Europa global») (12), ao passo que o financiamento das organizações da sociedade civil que operam noutros domínios continua a ser bastante reduzido: 0,08 % da rubrica «Crescimento sustentável: recursos naturais», 2,5 % da rubrica «Segurança e cidadania» e menos de 0,009 % da rubrica «Crescimento inteligente e inclusivo». Urge, portanto, proceder à avaliação não só dos montantes atribuídos mas também da eficácia das medidas adotadas.

    5.   A disponibilidade de fundos públicos e a redução do espaço cívico

    5.1.

    Estudos e inquéritos recentes, a par de medidas adotadas em certos países da UE, também revelam uma deterioração do espaço cívico a nível nacional em alguns Estados-Membros (13). A revisão das perspetivas financeiras pós-2020 e a revisão em curso de certos programas de financiamento não poderão deixar de ter em conta esta nova situação.

    5.2.

    A lei húngara recentemente adotada (em junho de 2017) sobre a transparência das organizações que recebem financiamento externo mereceu a reprovação da Comissão Europeia, do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa. Este facto demonstra a necessidade de a Comissão assegurar que as medidas tomadas para combater o financiamento do terrorismo e o branqueamento de capitais não têm consequências indesejadas no tocante ao acesso das organizações da sociedade civil a financiamentos e empréstimos financeiros.

    5.3.

    Em muitos países europeus, assiste-se à adoção de medidas destinadas a condicionar as subvenções concedidas às organizações da sociedade civil, limitando o seu papel na defesa de causas e coartando a sua capacidade para ser parte em processos judiciais (14).

    5.4.

    Em muitos países, a crise financeira e económica levou a uma redução dos apoios estatais às organizações da sociedade civil e/ou à sua reorientação para subvenções a curto prazo. As formas de financiamento essencialmente centradas em projetos podem obrigar as organizações da sociedade civil a adaptarem as suas prioridades, afastando-se da sua missão original e das necessidades da sociedade. Em alguns países, os governos favorecem as organizações partidárias da sua linha estratégica (em detrimento de outras) e fomentam uma atmosfera de conivência política, sendo observável uma falta de transparência crescente no modo como as subvenções são atribuídas.

    5.5.

    O CESE insta a Comissão a acompanhar cuidadosamente a aplicação das condicionalidades ex ante quando da avaliação dos programas e em relação aos acordos de parceria — nomeadamente, em matéria de emprego, inclusão social e não discriminação, ambiente, igualdade de género e direitos das pessoas com deficiência, participação e reforço da capacidade institucional das organizações da sociedade civil (15) e transparência dos procedimentos de adjudicação de contratos —, bem como a suspender os pagamentos quando estas não são respeitadas. Recorda ainda a Comissão da necessidade de acompanhar a aplicação do artigo 125.o do regulamento em nota no que diz respeito à obrigação das autoridades de gestão de aplicarem procedimentos e critérios de seleção transparentes e não discriminatórios. Apela ao Tribunal de Contas Europeu para que avalie o cumprimento destas disposições no atinente aos procedimentos de seleção para as ONG no seu próximo relatório.

    5.6.

    O aumento do extremismo e do populismo e as ações antidemocráticas de todo e qualquer tipo constituem um desafio para o acervo democrático no seu conjunto e criam um clima hostil para os organismos intermediários. Importa, por isso, confirmar a importância do papel das organizações da sociedade civil e conceder-lhes mais apoio financeiro por parte da UE.

    5.7.

    O CESE advoga a criação de um Provedor da UE em matéria de liberdades do espaço cívico, ao qual as ONG também poderiam comunicar incidentes relacionados com tentativas de perseguição ou de restrição da sua atividade.

    6.   Respostas possíveis a nível europeu

    6.1.

    O CESE considera que se deve adotar um quadro político e legislativo a nível europeu e nacional para promover o desenvolvimento de uma sociedade civil europeia diversificada, cuja atividade se paute por valores assentes nos direitos fundamentais.

    6.2.

    As instituições europeias devem assegurar a promoção de uma imagem positiva das organizações da sociedade civil e velar pela preservação da sua independência, designadamente através do reforço da sua capacidade de ação e empenho na inovação social e na participação cívica, amiúde associada ao financiamento.

    6.3.

    Inspirando-se no exemplo dos Estados-Membros que adotaram «cartas de compromissos recíprocos» ou «pactos» para o efeito, as instituições europeias poderiam avançar no sentido de reconhecer e criar parcerias com organizações representativas da sociedade civil, criando assim as condições necessárias para um verdadeiro diálogo civil europeu e dando execução ao artigo 11.o do TUE, bem como a outros compromissos internacionais relevantes (16).

    6.4.

    É igualmente urgente retomar o debate sobre um estatuto da associação europeia — proposto pela Comissão em 1992 (17) —, bem como sobre um estatuto europeu das fundações. Tal permitiria promover o reconhecimento das organizações da sociedade civil e a sua cooperação a nível europeu, complementando o estatuto da sociedade europeia adotado em 2004 (18).

    6.5.

    O CESE considera que a UE deve encorajar os Estados-Membros a manter e desenvolver incentivos fiscais para os donativos privados, a canalizar uma parte das suas receitas fiscais para as organizações da sociedade civil, eliminando ao mesmo tempo os obstáculos aos donativos transfronteiras através da coordenação das legislações e dos procedimentos fiscais, bem como a investir no desenvolvimento da filantropia em toda a UE.

    6.6.

    No que diz respeito ao futuro quadro financeiro plurianual, o CESE apela às autoridades orçamentais para que aumentem o financiamento das organizações da sociedade civil, inclusive sob a forma de subvenções de funcionamento e de financiamentos plurianuais, de modo a garantir o sucesso das iniciativas a longo prazo.

    6.7.

    Desde a adoção da Carta dos Direitos Fundamentais, ainda não foi criado um verdadeiro programa de apoio à sociedade civil no plano dos direitos humanos nos Estados-Membros. O apoio vital concedido à sociedade civil dos países da Europa Central e Oriental quando da sua adesão à União não prosseguiu depois através de outros mecanismos de financiamento. Acontecimentos recentes, fruto do recrudescimento do terrorismo e de movimentos extremistas e/ou populistas, demonstram a necessidade de investir mais na sociedade civil e de assegurar a coesão entre os países no que diz respeito ao desenvolvimento da sociedade civil.

    6.8.

    O CESE exorta a Comissão a propor um fundo europeu para a democracia, os valores e os direitos humanos no território da UE (19), com uma dotação orçamental ambiciosa e diretamente acessível às organizações da sociedade civil de toda a Europa, incluindo as organizações de defesa dos direitos humanos empenhadas em promover e proteger os valores fundamentais da UE. O fundo deveria cobrir custos operacionais, ações judiciais e atividades de vigilância e ser gerido de forma independente, à semelhança do Fundo Europeu para a Democracia (20) com a participação de representantes do CESE.

    6.9.

    O programa «Europa para os Cidadãos» é o único programa europeu que contribui especificamente para reduzir o défice democrático ao permitir que todos os cidadãos participem diretamente na construção europeia, mas o seu financiamento é demasiado limitado. No atual contexto de questionamento dos valores europeus e da democracia, o CESE considera que se deveria atribuir a este programa uma dotação de 500 milhões de euros no próximo QFP, como proposto pelo Parlamento Europeu (21). Importaria igualmente aumentar as ações orientadas para a sociedade civil no âmbito do programa Erasmus+.

    6.10.

    A maioria das organizações da sociedade civil tem dificuldade em aceder aos fundos estruturais, sobretudo devido aos cofinanciamentos exigidos. Em consequência, as disposições relativas à assistência técnica, concebidas para promover o reforço de capacidades, são subutilizadas e ficam amiúde reservadas para as administrações públicas. O código de conduta sobre parcerias com a sociedade civil — o instrumento-chave neste contexto — não foi corretamente aplicado na maioria dos países (22). Mesmo quando são convidadas para os comités de controlo, as organizações da sociedade civil desempenham um papel limitado.

    6.11.

    O CESE insta a Comissão Europeia a reagir prontamente com medidas adequadas, incluindo processos por infração contra os Estados-Membros, quando as disposições administrativas ou jurídicas nacionais restringem o acesso das organizações da sociedade civil aos fundos da UE, nomeadamente quando são impostas condições de financiamento que limitam a sua defesa de causas.

    6.12.

    Devido à sua ligação e contacto permanente com os cidadãos e as atividades no terreno, as organizações da sociedade civil estão bem cientes dos desafios e das necessidades da sociedade, embora desempenhem um papel muito secundário no plano da investigação. O Programa da União Europeia para o Emprego e a Inovação Social (EaSI) também apresenta obstáculos ao acesso das organizações da sociedade civil. O CESE apela para um debate mais aprofundado sobre o modo de promover a ligação entre os investigadores e a sociedade civil e propõe a introdução de uma nova vertente dedicada à participação cívica e à democracia no âmbito do pilar «Desafios societais» no futuro programa-quadro de investigação.

    6.13.

    O desemprego juvenil permanece muito elevado e constitui um dos problemas mais urgentes que a UE enfrenta, com um número crescente de jovens em risco de exclusão social. Neste contexto, os financiamentos europeus deveriam fazer mais em prol das organizações da sociedade civil que investem no desenvolvimento das qualificações e competências dos jovens através da educação não formal.

    6.14.

    No setor da cultura, grande parte do financiamento não está adaptado às necessidades das organizações da sociedade civil ativas neste domínio, impedindo-as assim de acederem a uma série de instrumentos financeiros disponíveis, como empréstimos. Não se está a fazer um trabalho real sobre a dimensão europeia da cultura, num contexto em que as manifestações identitárias e populistas estão a ganhar expressão crescente. A UE também deveria apoiar mais — através do Programa Europa Criativa, nomeadamente — as produções culturais independentes e investir no desenvolvimento e sustentabilidade dos meios de comunicação comunitários locais sem fins lucrativos.

    6.15.

    No que se refere à cooperação para o desenvolvimento, a União Europeia deveria investir mais em ações de cooperação centradas nas populações, incidindo sobre dimensões como a igualdade de género, a governação, os direitos humanos, os direitos ambientais, a resiliência às alterações climáticas, a educação e a proteção social, nomeadamente através de uma abordagem temática por país que associe estreitamente a sociedade civil.

    6.16.

    Quando da conceção do futuro QFP, caberá ter igualmente em conta os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e as prioridades em matéria de igualdade de género.

    6.17.

    O reforço da sociedade civil depende também de um melhor acesso ao financiamento por parte das organizações mais pequenas e dos grupos sociais mais desfavorecidos. A Comissão Europeia deve prever, neste âmbito, diversas modalidades de financiamento e empenhar-se mais na simplificação administrativa. Importa prever um recurso mais sistemático a mecanismos de subsubvenção (ou financiamento em cascata), como os utilizados no Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos ou no quadro das subvenções do EEE, mediante a designação de um operador nacional independente através de um concurso (23).

    6.18.

    As organizações da sociedade civil dos países da Europa Central e Oriental ainda têm um acesso proporcionalmente limitado aos fundos. A Comissão Europeia deve reforçar as suas ações de informação sobre os diversos fundos destinados às organizações da sociedade civil e prestar mais apoio às parcerias entre organizações.

    6.19.

    Seria igualmente útil acompanhar de forma mais sistemática e apoiar as organizações beneficiárias e as diferentes direções-gerais responsáveis pela execução do Regulamento Financeiro, prevendo cursos de formação sobre as obrigações contratuais e as auditorias.

    6.20.

    A fim de promover a inovação e as parcerias, os potenciais candidatos devem poder aceder a bases de dados contendo uma descrição dos projetos já realizados e exemplos de boas práticas. A Comissão deve prosseguir os seus esforços para aliviar a carga administrativa imposta pelo processo de candidatura e a gestão dos financiamentos, nomeadamente através de um sistema de candidatura em linha único para os diversos programas.

    6.21.

    A avaliação dos programas diretamente geridos pela Comissão deve ser não só mais transparente mas também mais detalhada, tendo em conta o elevado número de pedidos de financiamento europeu e a baixa taxa de sucesso. Além disso, as informações recebidas permitiriam às organizações da sociedade civil não selecionadas realizar melhorias e aumentar a sua confiança no processo de seleção.

    6.22.

    Os prazos de notificação dos contratos, assinatura dos contratos e pagamento devem ser reduzidos de forma significativa, a fim de diminuir a necessidade de recorrer a empréstimos bancários por falta de liquidez.

    6.23.

    O CESE também exorta a Comissão a reavaliar os montantes dos cofinanciamentos, em particular no caso das organizações mais pequenas ou das organizações em que seja muito difícil recorrer a outro tipo de fundos, e das organizações ativas na defesa de causas, como as organizações de defesa dos consumidores, as associações ambientalistas, as organizações de defesa dos direitos humanos e de promoção da cidadania. tanto mais que as regras de cofinanciamento aumentam a carga administrativa imposta às organizações da sociedade civil e os riscos concomitantes decorrentes da diversidade das regras contratuais e financeiras dos financiadores.

    6.24.

    O CESE congratula-se vivamente com a perspetiva preconizada pela Comissão, na sua proposta de revisão do Regulamento Financeiro (24), de considerar o tempo de trabalho dos voluntários como um custo elegível e de facilitar a contabilização das contribuições em espécie como cofinanciamentos. A proposta é uma resposta direta ao apelo do CESE, expresso no seu parecer sobre as «Ferramentas estatísticas para medir o voluntariado» (25). Acolhe igualmente com agrado o relatório do Parlamento e a proposta do Conselho de introduzir uma exceção à regra relativa à inexistência de lucro para as associações sem fins lucrativos. O CESE insta as instituições da UE a chegarem a um acordo sobre o texto proposto que permite contabilizar de forma equitativa o tempo de trabalho dos voluntários.

    6.25.

    Importa melhorar a transparência no acesso e no controlo dos financiamentos mediante a definição de orientações claras para os controlos da Comissão e, no caso dos financiamentos que envolvem vários doadores, levando em conta as avaliações e seleções ex ante dos parceiros, bem como as verificações e auditorias ex post realizadas pelos outros doadores.

    6.26.

    Cabe igualmente viabilizar o acesso do público às informações relativas aos montantes e finalidades dos financiamentos através de uma reforma do sistema de transparência financeira da Comissão, o qual deveria incluir pagamentos anuais em lugar de compromissos plurianuais, e ser mais fiável graças à harmonização das diversas bases de dados dos programas. Ao mesmo tempo, as ONG deverão continuar a cumprir as normas mais elevadas em matéria de transparência.

    6.27.

    Por último, a Comissão deve fomentar um diálogo e um acompanhamento construtivos entre as diferentes direções-gerais e as organizações da sociedade civil, a fim de examinar as boas e más práticas e de desenvolver uma abordagem mais coerente.

    Bruxelas, 19 de outubro de 2017.

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Georges DASSIS


    (1)  Este fundo perseguiria os mesmos objetivos que o Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos: http://www.eidhr.eu/whatis-eidhr#

    (2)  O Fundo Europeu para a Democracia é uma organização independente que concede subvenções, criada em 2013 pela União Europeia e os Estados-Membros da UE para promover a democracia na vizinhança europeia e mais além. Todos os Estados-Membros fazem parte do Conselho de Governadores deste fundo, juntamente com deputados ao Parlamento Europeu e peritos da sociedade civil.

    (3)  Resolução do Parlamento Europeu que institui o programa «Europa para os Cidadãos»

    (4)  JO C 170 de 5.6.2014, p. 11.

    (5)  JO C 11 de 15.1.2013, p. 8.

    (6)  JO C 318 de 19.12.2014, p. 163.

    (7)  JO C 88 de 11.4.2006, p. 41.

    (8)  Livro Branco sobre a Governança Europeia, 25.7.2001

    (9)  COM(2000) 11 final.

    (10)  Ano Europeu do Voluntariado 2011.

    (11)  Ver, nomeadamente, o inquérito de 2017 http://ec.europa.eu/echo/eurobarometer_fr.

    (12)  EuropAid — Direção-Geral do Desenvolvimento e da Cooperação.

    (13)  «Civic Space in Europe 2016» [Espaço cívico na Europa 2016], Civicus Monitor.

    (14)  Veja-se o chamado Lobbying Act [lei do lóbi] no Reino Unido, que impede as ONG de manifestarem a sua opinião durante as campanhas eleitorais, ou o recente referendo relativo à permanência na UE; refira-se também a revisão em curso do The Electoral (Amendment) Act 2011 [lei de alteração relativa às eleições] na Irlanda, que pretende impedir a influência de terceiros nas campanhas eleitorais, mas cuja interpretação dos «objetivos políticos» e os limites impostos aos donativos individuais às ONG suscitaram polémica, nomeadamente no âmbito do financiamento de uma campanha a favor do aborto.

    (15)  JO L 347 de 20.12.2013, p. 320.

    (16)  Ver, por exemplo, as obrigações no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD), no atinente a um diálogo estruturado com base em financiamento adequado.

    (17)  JO C 99 de 21.4.1992, p. 1.

    (18)  Estatuto da sociedade europeia.

    (19)  O fundo perseguiria os mesmos objetivos que o Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos: http://www.eidhr.eu/whatis-eidhr#

    (20)  O Fundo Europeu para a Democracia é uma organização independente que concede subvenções, criada em 2013 pela União Europeia e os Estados-Membros da UE para promover a democracia na vizinhança europeia e mais além. Todos os Estados-Membros fazem parte do Conselho de Governadores deste fundo, juntamente com deputados ao Parlamento Europeu e peritos da sociedade civil.

    (21)  Resolução do Parlamento Europeu que institui o programa «Europa para os Cidadãos»

    (22)  AEIDL — Rede temática sobre a parceria.

    (23)  Publicada avaliação intercalar das ONG — Subvenções do EEE.

    (24)  COM(2016) 605 final

    (25)  JO C 170 de 5.6.2014, p. 11.


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