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Document 52004IE0960

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Convenção internacional para os trabalhadores migrantes»

    JO C 302 de 7.12.2004, p. 49–52 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

    7.12.2004   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 302/49


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Convenção internacional para os trabalhadores migrantes»

    (2004/C 302/12)

    Em 29 de Janeiro de 2004, o Comité Económico e Social Europeu, nos termos do n.o 2 do artigo 23.o do Regimento, decidiu elaborar um parecer sobre a «Convenção internacional para os trabalhadores migrantes»

    Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 14 de Junho de 2004, sendo relator L. PARIZA CASTAÑOS.

    Na 410.a reunião plenária de 30 de Junho e 1 de Julho de 2004 (sessão de 30 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou o presente parecer por 162 votos a favor, 3 votos contra e 11 abstenções.

    1.   Introdução

    1.1

    A «Convenção internacional sobre a protecção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias» foi adoptada pela Resolução 45/158 da Assembleia Geral das Nações Unidas, 18 de Dezembro de 1990, e entrou em vigor em 1 de Julho de 2003 após a ratificação pelos primeiros vinte Estados. Até agora, foi ratificada por 25 Estados (1). Trata-se de um tratado internacional que vincula os Estados que o ratifiquem.

    1.2

    A Convenção tem por objectivo a protecção dos direitos humanos e da dignidade das pessoas que emigram por razões económicas ou laborais em todo o mundo, mediante legislações adequadas e boas práticas nacionais. A promoção da democracia e dos direitos humanos devem constituir a base comum para uma adequada legislação internacional relativa às políticas migratórias. A Convenção garante igualmente o equilíbrio das diversas situações, tanto nos países de origem como nos países de acolhimento.

    1.3

    É um dos sete tratados internacionais sobre os direitos humanos das Nações Unidas e reconhece a protecção internacional de determinados direitos humanos fundamentais, definidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, para todos os trabalhadores migrantes e suas famílias. A Convenção codifica de modo integral e universal os direitos dos trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, com base no princípio da igualdade de tratamento. Define os direitos aplicáveis a todos os imigrantes em situação regular e irregular, estabelece normas mínimas de protecção dos direitos civis, económicos, políticos, sociais e de trabalho e reconhece que todos os trabalhadores migrantes devem gozar de determinados direitos fundamentais protegidos por normas internacionais.

    1.4

    Desenvolvendo convénios anteriores da OIT (2), esta Convenção alarga o quadro jurídico a todas as migrações internacionais; promove um tratamento justo para todos os imigrantes e pretende impedir a exploração dos trabalhadores em situação irregular. Abrange todo o processo migratório: formação, selecção, saída e trânsito, residência nos Estados de emprego e regresso e reinstalação nos países de origem.

    1.5

    A gestão dos fluxos migratórios cabe aos Estados. O CESE, de acordo com o secretário-geral das Nações Unidas, pretende ver melhorar a cooperação bilateral, regional e internacional entre os países de origem e os países de acolhimento dos migrantes. O convénio não promove nem gere os fluxos migratórios, pretendendo apenas garantir o reconhecimento universal dos direitos humanos fundamentais e reforçar a sua protecção internacional.

    1.6

    A Convenção abrange de modo diferente a situação administrativa dos migrantes: garantia universal da protecção dos direitos humanos fundamentais, aplicando-se aos imigrantes em situação legal direitos mais desenvolvidos.

    1.7

    Através da Convenção, a comunidade internacional e a Organização das Nações Unidas reiteram a sua vontade de melhorar a cooperação entre os países a fim de prevenir e eliminar o tráfico e o trabalho clandestino dos imigrantes em situação irregular, e alargar a protecção dos direitos humanos fundamentais dos imigrantes em todo o mundo (3).

    2.   Direitos dos imigrantes

    2.1

    A Convenção pretende garantir a igualdade de tratamento e as mesmas condições legais para os trabalhadores imigrantes e os trabalhadores nacionais, o que implica:

    prevenir condições de vida e de trabalho desumanas, abuso físico e sexual e tratamento degradante, inclusivamente a escravatura (artigos 10.o, 11.o, 25.o, 54.o);

    garantir os direitos dos imigrantes à liberdade de pensamento, de expressão e de religião (artigos 12.o, 13.o);

    reconhecer o direito à vida privada e à segurança pessoal (artigos 14.o, 15.o, 16.o);

    estabelecer o acesso à tutela judicial efectiva mediante processos judiciais justos que garantam o direito à igualdade perante a lei e à não-discriminação, aplicando-se a todos os trabalhadores imigrantes processos jurídicos adequados e com serviços de interpretação (artigos 18.o, 19.o, 20.o);

    garantir aos imigrantes o acesso à informação sobre os respectivos direitos (artigos 33.o, 37.o);

    garantir aos imigrantes a igualdade de acesso aos serviços de educação e sociais (artigos 27.o, 28.o, 30.o, 43.o, 45.o, 54.o);

    reconhecer aos imigrantes o direito de se inscreverem e participarem em sindicatos (artigos 26.o, 40.o).

    2.2

    A Convenção também reconhece aos imigrantes o direito de manter a ligação ao respectivo país de origem, o que implica:

    garantir o direito de regressar ao seu país de origem se assim o desejarem; permitir-lhes efectuar viagens ocasionais e manter laços culturais (artigos 8.o, 31.o, 38.o);

    garantir a participação política dos imigrantes no seu país de origem (artigos 41.o, 42.o);

    garantir aos imigrantes o direito de transferirem os seus ganhos e poupança para o país de origem (artigos 32.o, 46.o, 48.o).

    2.3

    A Convenção baseia-se na noção fundamental de que todos os imigrantes devem ter acesso a um nível mínimo de protecção. A Convenção abrange as duas situações (regular ou irregular) dos trabalhadores imigrantes; define uma lista de direitos mais alargados para os que se encontram em situação legal, reconhecendo igualmente alguns direitos fundamentais para os irregulares.

    2.4

    A Convenção propõe acções para erradicar a imigração ilegal, essencialmente através do combate à informação enganosa, tendente a incitar à imigração irregular, e mediante sanções contra os traficantes e os empregadores de imigrantes sem documentos.

    2.5

    Institui-se um comité de protecção dos direitos dos trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias, composto de dez peritos incumbidos de velar pela aplicação da Convenção e das suas disposições pelos Estados ratificantes.

    3.   Os países ocidentais não ratificaram a Convenção

    3.1

    As migrações internacionais são consequência das grandes desigualdades económicas e sociais entre os países ricos do Norte e os países em desenvolvimento; desigualdades que estão a aumentar num sistema económico cada vez mais globalizado. Todavia, a maioria dos países que ratificaram a Convenção são países de origem dos imigrantes. Os Estados-Membros da União Europeia, os EUA, Canadá, Austrália, Japão e os outros países ocidentais, que acolhem grande número de imigrantes, (4) não ratificaram nem assinaram (5) a Convenção até à data.

    3.2

    A União Europeia, que pretende estabelecer normas internacionais em diversos domínios (na OMC para o comércio internacional, no âmbito de Quioto para o ambiente, etc.), também deverá promover a garantia dos direitos fundamentais dos imigrantes mediante normas internacionais.

    4.   Política de imigração na União Europeia

    4.1

    A União Europeia constitui um espaço em que os direitos humanos são garantidos e respeitados, e em que se aplica a maior parte dos instrumentos jurídicos internacionais das Nações Unidas. Dispõe, igualmente, de instrumentos próprios, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a Carta dos Direitos Fundamentais.

    4.2

    A União Europeia instituiu diversos instrumentos jurídicos de combate à discriminação (6). Todavia, diversos especialistas, bem como o Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia, (7), informaram das discriminações de que são alvo os imigrantes nas suas condições de trabalho.

    4.3

    A União Europeia está a elaborar, desde o Conselho Europeu de Tampere, uma legislação comum em matéria de asilo e imigração. Tampere definiu uma boa base política para a harmonização da legislação comunitária em matéria de imigração e asilo; bem como para melhorar a cooperação com os países terceiros na gestão dos fluxos migratórios. Foi igualmente acordado em Tampere o tratamento justo das pessoas e a necessidade de políticas de integração e de combate à discriminação.

    4.4

    A Comissão elaborou numerosas iniciativas legislativas que, todavia, enfrentam grandes dificuldades no Conselho (8). O resultado é escasso, quatro anos depois de Tampere. A legislação adoptada é decepcionante, muito afastada dos objectivos de Tampere, das propostas da Comissão, do parecer do Parlamento Europeu e do parecer do CESE. Torna-se muito difícil, no Conselho, alcançar acordos, em virtude dos bloqueios permitidos pelo sistema actual e da atitude de alguns governantes.

    4.5

    O Comité Económico e Social Europeu solicitou ao Conselho, em diversos pareceres, uma actuação mais responsável, com espírito mais construtivo e de maior cooperação. Torna-se cada vez mais necessário dotar a União Europeia de legislação comum adequada para gerir a imigração de modo legal e transparente.

    4.6

    O CESE elaborou diversos pareceres (9), nos quais propõe a adopção pela União Europeia de uma política adequada para a canalização da imigração económica através de vias legais, a fim de evitar a imigração clandestina e de combater o tráfico ilegal de pessoas.

    4.7

    É urgente a aprovação da directiva relativa às condições de entrada e residência e acesso dos imigrantes ao emprego, com base na proposta da Comissão (10) e tendo em conta o parecer do CESE (11).

    4.8

    O Conselho Europeu de Salónica considerou positiva a Comunicação da Comissão sobre imigração, integração e emprego (12), a qual assinala que haverá aumento considerável da imigração laboral para a União Europeia, o que tornará necessário dispor de legislação adequada para gerir a imigração de modo legal. A Comissão afirma, igualmente, a necessidade de políticas de integração da população imigrada, bem como de luta contra todas as formas de exploração e discriminação.

    4.9

    Algumas legislações nacionais sobre imigração não respeitam inteiramente os convénios internacionais sobre os direitos humanos, e até algumas directivas europeias (relativas ao reagrupamento familiar, por exemplo) são consideradas contrárias aos direitos humanos fundamentais por diversas ONG e pelo Parlamento Europeu. O CESE entende que os convénios internacionais sobre direitos humanos e a Carta dos Direitos Fundamentais da UE devem constituir a base de toda a estrutura legislativa europeia em matéria de imigração.

    5.   Os valores da União Europeia no mundo

    5.1

    Ultimamente, os EUA implantaram uma lógica unilateral na governação dos assuntos internacionais. O que é grave para o sistema das Nações Unidas, colocando em perigo o único mecanismo existente para a resolução multilateral dos conflitos internacionais.

    5.2

    Com grandes dificuldades, a União Europeia está a construir uma política externa comum em que a ONU há-de desempenhar um papel crucial. O futuro tratado constitucional consolidará este mandato no domínio da política externa entre as missões comunitárias.

    5.3

    O multilateralismo constitui a base das relações externas da União Europeia, bem como o compromisso activo com o sistema das Nações Unidas. Num documento recente (13), a Comissão Europeia afirma: «O desafio que enfrentam actualmente as Nações Unidas é claro: a “governança” mundial continuará a ter um impacto reduzido enquanto as instituições multilaterais não puderem assegurar uma aplicação eficaz das suas decisões e regras, quer a nível das altas esferas políticas responsáveis pela paz e segurança internacionais, quer no que respeita à aplicação concreta dos compromissos assumidos durante as recentes conferências das Nações Unidas nos domínios social, económico e ambiental. A UE tem uma responsabilidade especial no que se refere a este aspecto: por um lado, fez do multilateralismo um princípio constante das suas relações externas, por outro, ao respeitar a aplicação dos seus compromissos internacionais (ou indo mesmo mais longe) pode e deve servir de modelo a muitos outros países.».

    5.4

    A globalização está a criar novas oportunidades e novos problemas na governação do mundo. As migrações implicam, actualmente, grandes problemas para os emigrantes e para os países de origem e de acolhimento. O desafio que se nos coloca consiste em transformar os problemas em oportunidades para todos, para os emigrantes, para os países de origem e de acolhimento. O multilateralismo e a cooperação internacional são a via para uma boa governação global, para se dispor de um sistema de regras e instituições estabelecidas pela comunidade internacional e universalmente reconhecidas.

    5.5

    Como afirmou o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi ANNAN, no Parlamento Europeu, em 29 de Janeiro de 2004, a cooperação internacional é a melhor maneira de gerir as migrações internacionais, que crescerão nos próximos anos. Só através da cooperação internacional, bilateral, regional e global, se podem estabelecer alianças entre os países de origem e os países que acolhem imigrantes, no interesse de todos; fazer da imigração um motor de desenvolvimento; combater eficazmente os traficantes de pessoas; e acordar regras comuns para o tratamento dos imigrantes e a gestão da imigração.

    5.6

    A Europa é um espaço de liberdade, democracia, respeito dos direitos humanos de todas as pessoas. A fim de reforçar, no futuro, estes valores, os convénios internacionais que protegem os direitos humanos fundamentais devem ser ratificados por todos os Estados-Membros da União e os seus preceitos jurídicos incorporados na legislação comunitária e nacional.

    5.7

    O artigo 7.o do Projecto de Constituição para a Europa propõe a adesão da União à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que o CESE apoia. O CESE apoia, igualmente, a integração na Constituição da Carta dos Direitos Fundamentais da União, que constituirá uma base comum para os direitos de todas as pessoas na União Europeia.

    5.8

    Estes valores devem-se integrar igualmente nas relações internacionais da União. Com base nos convénios internacionais patrocinados pelas Nações Unidas, a Europa deve promover a criação de um quadro jurídico comum de protecção internacional dos direitos fundamentais de todos os seres humanos, sem distinção de origem nacional e seja qual for o seu lugar de residência.

    6.   Proposta do CESE

    6.1

    Em conformidade com os pareceres que elaborou sobre a política europeia de imigração e com o parecer do Parlamento Europeu, o CESE propõe que os Estados-Membros da União Europeia ratifiquem a Convenção Internacional para a protecção dos Direitos de todos os imigrantes e dos membros das suas famílias, adoptada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas (Resolução n.o 45/158 de 18 de Dezembro de 1990), em vigor desde 1 de Julho de 2003.

    6.2

    O CESE apela ao presidente da Comissão e à Presidência em exercício do Conselho para que adoptem as iniciativas políticas adequadas, por forma que os Estados-Membros ratifiquem a Convenção durante os próximos 24 meses e que a UE ratifique também a Convenção quando o tratado constitucional autorizar a assinatura de acordos internacionais. A fim de facilitar a ratificação, a Comissão efectuará uma análise das legislações nacionais e comunitárias em relação com a Convenção. Acresce que os interlocutores sociais e outras organizações da sociedade civil associar-se-ão ao CESE e à Comissão na promoção da ratificação.

    Bruxelas, 30 de Junho de 2004.

    O Presidente

    do Comité Económico e Social Europeu

    Roger BRIESCH


    (1)  Azerbaijão, Belize, Bolívia, Bósnia e Herzegovina, Cabo Verde, Colômbia, Equador, Egipto, El Salvador, Gana, Guatemala, Guiné, Mali, México, Marrocos, Filipinas, Senegal, Seicheles, Sri Lanka, Tadjiquistão, Uganda, Uruguai.

    (2)  Convenções n.o 97, de 1949 e n.o 143, de 1975.

    (3)  Segundo a Organização Internacional para as Migrações, 175 milhões de pessoas residem actualmente em países distintos do de nascimento ou de nacionalidade.

    (4)  55 % dos imigrantes residem na América do Norte e na Europa Ocidental.

    (5)  Os signatários são Estados que manifestaram a vontade de uma futura adesão: Chile, Bangladesh, Turquia, Comores, Guiné-Bissau, Paraguai, São Tomé e Príncipe, Serra Leoa, Togo.

    (6)  Directivas 2000/43 e 2000/78.

    (7)  Ver o relatório de informação «Migrants, minorities and employment: exclusion, discrimination in 15 Member States of the European Union», Outubro de 2003.

    (8)  Em 1994, a Comissão recomendou aos Estados-Membros a ratificação da Convenção no Livro Branco sobre Política Social Europeia (COM(1994) 333 final).

    (9)  Ver os pareceres do CESE sobre o reagrupamento familiar, JO C 204 de 18.7.2000 e JO C 241 de 7.10.2002; sobre a comunicação da Comissão sobre uma política da Comunidade em matéria de imigração, JO C 260 de 17.9.2001; sobre o estatuto dos residentes de longa duração, JO C 36 de 8.2.2002; sobre as condições de entrada e residência para efeitos de trabalho, JO C 80 de 3.4.2002; sobre uma política comum em matéria de imigração clandestina, JO C 149 de 21.6.2002; sobre as condições de entrada e residência para efeitos de estudos, formação profissional ou voluntariado, JO C 133 de 6.6.2003, e sobre o acesso à cidadania da União Europeia, JO C 208 de 3.9.2003.

    (10)  JO C 332 de 27.11.2001.

    (11)  Parecer do CESE, JO C 80 de 3.4.2002 (relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

    (12)  Comunicação da Comissão COM(2003) 336 final e o parecer do CESE — JO C 80 de 30.3.2004 (relator: L. PARIZA CASTAÑOS).

    (13)  COM(526) 2003 final «A União Europeia e as Nações Unidas: a escolha do multilateralismo».


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