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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62013FJ0012

    CQ/Parlamento

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA DA UNIÃO EUROPEIA

    (Terceira Secção)

    17 de setembro de 2014

    CQ

    contra

    Parlamento Europeu

    «Função pública — Agentes temporários — Agentes intérpretes de conferências (AIC) — Artigo 90.o do ROA — Assédio moral — Artigo 12.o‑A do Estatuto — Regras internas relativas ao Comité consultivo sobre o assédio e a sua prevenção no local de trabalho — Confidencialidade dos trabalhos do referido comité — Erros manifestos de apreciação»

    Objeto:

    Recurso interposto nos termos do artigo 270.o TFUE, aplicável ao Tratado CEEA por força do seu artigo 106.o‑A, em que CQ pede a anulação da decisão de 8 de maio de 2012 pela qual a Entidade Habilitada a Celebrar Contratos do Parlamento Europeu (a seguir «EHCC») concluiu, de acordo com o parecer dado pelo Comité consultivo sobre o assédio e a sua prevenção no local de trabalho (a seguir «comité sobre o assédio» ou «comité»), que a recorrente não tinha, nas suas funções como agente temporário, sido objeto de assédio moral por parte do seu chefe de unidade.

    Decisão:

    É negado provimento ao recurso. CQ suporta as suas próprias despesas e é condenada a suportar as despesas efetuadas pelo Parlamento Europeu.

    Sumário

    1. Funcionários — Agentes intérpretes de conferências — Regime estatutário — Agentes contratuais auxiliares

      (Regime aplicável aos outros agentes, artigos 3.°‑B e 90.°)

    2. Funcionários — Assédio moral — Conceito — Comportamento que tem por objeto ou por efeito o descrédito do interessado ou a degradação das suas condições de trabalho — Exigência de um caráter repetitivo do comportamento — Exigência de um caráter intencional do comportamento — Alcance — Falta de exigência de intenção maliciosa do assediador

      (Estatuto dos Funcionários, artigo 12.o‑A, n.o 3)

    3. Funcionários — Férias — Férias anuais — Pedidos de férias — Prazo de tratamento pela administração — Inexistência

      (Estatuto dos Funcionários, artigo 57.o, primeiro parágrafo)

    4. Funcionários — Assédio moral — Conceito — Atraso no tratamento dos pedidos de férias anuais — Exclusão — Requisitos

      (Estatuto dos Funcionários, artigo 12.o‑A, n.o 3)

    5. Funcionários — Direitos e obrigações — Participação em cursos de línguas no interesse do serviço — Obrigações em caso de ausência

    6. Funcionários — Obrigação de assistência que incumbe à administração — Aplicação em matéria de assédio moral — Inquérito interno relativo a um alegado assédio moral — Tramitação processual — Segunda audição concedida à parte que foi objeto da queixa — Violação dos direitos de defesa — Inexistência

      (Estatuto dos Funcionários, artigo 12.o‑A, n.o 3)

    1.  A contratação pelo Parlamento Europeu de um agente intérprete de conferências nos termos do artigo 90.o do Regime aplicável aos outros agentes confere necessariamente a esse agente a qualidade de agente contratual e, em particular, de agente contratual nos termos do artigo 3.o‑B do Regime Aplicável aos Outros Agentes, uma vez que o artigo 90.o do referido regime figura no capítulo 5, intitulado «Disposições especiais relativas aos agentes contratuais a que se refere o artigo 3.o‑B», do título IV do Regime aplicável aos outros agentes.

      (cf. n.o 74)

      Ver:

      Tribunal da Função Pública: acórdão Cantisani/Comissão, F‑71/10, EU:F:2012:71, n.o 60

    2.  O artigo 12.o‑A, n.o 3, do Estatuto define o assédio moral como uma conduta abusiva que requer o preenchimento de dois requisitos cumulativos para ser demonstrada. A primeira condição é relativa à existência de comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos que ocorram durante um período de tempo, de modo repetitivo ou sistemático, o que implica que o assédio moral deve ser compreendido como um processo que se inscreve necessariamente no tempo e pressupõe a existência de comportamentos repetidos ou contínuos, e que são intencionais. A segunda condição cumulativa exige que esses comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos tenham sido cometidos ou proferidos com intenção de prejudicar a personalidade, a dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa. É possível extrair uma dupla conclusão do facto de o adjetivo «intencional» dizer respeito ao primeiro requisito e não ao segundo. Por um lado, os comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos, referidos no referido artigo devem apresentar caráter voluntário, o que exclui do âmbito de aplicação desta disposição as ações que ocorram de modo acidental. Por outro lado, não se requer, em contrapartida, que esses comportamentos físicos, linguagem, verbal ou escrita, gestos ou outros atos tenham sido praticados com intenção de lesar a personalidade, a dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa. É suficiente que esses comportamentos, desde que cometidos voluntariamente, tenham acarretado objetivamente tais consequências.

      Por último, uma vez que os atos em causa devem, nos termos do artigo 12.o‑A, n.o 3, do Estatuto, ter caráter abusivo, daqui decorre que a qualificação de assédio depende do preenchimento do requisito de que este revista uma realidade objetiva suficiente, no sentido de que um observador imparcial e razoável, dotado de uma sensibilidade normal e colocado nas mesmas condições, o consideraria excessivo e criticável.

      (cf. n.os 76 a 78)

      Ver:

      Tribunal da Função Pública: acórdãos Q/Comissão, F‑52/05, EU:F:2008:161, n.os 134 e 135, não anulado, neste ponto, pelo acórdão Comissão/Q, T‑80/09 P, EU:T:2011:347; Skareby/Comissão, F‑42/10, EU:F:2012:64, n.o 65, eCantisani/Comissão, EU:F:2012:71,n.o 89

    3.  Embora, em virtude do artigo 57.o, primeiro parágrafo, do Estatuto, o funcionário tenha direito, em cada ano civil, a férias anuais de 24 dias úteis, no mínimo, e 30 dias úteis no máximo, esta disposição não impõe, contudo, prazos obrigatórios à administração no tratamento dos pedidos de férias dos funcionários e agentes.

      (cf. n.o 112)

    4.  Quanto à manifestação de um assédio moral relacionado com o tratamento dos pedidos de férias anuais, um eventual atraso na aprovação de um pedido de férias anuais não pode ser censurado à hierarquia quando esse atraso for imputável a uma outra unidade e, em qualquer caso, o pedido for tratado em tempo útil. É esse o caso quando o agente em causa recebe confirmação da aprovação duas semanas antes do período solicitado.

      No que respeita ao aviso de um chefe de unidade quanto à necessidade de apresentar os pedidos de férias pelo menos cinco dias úteis antes das férias solicitadas, tal aviso não é em si criticável, no contexto de um bom funcionamento do serviço.

      Quanto ao aviso de um chefe de unidade a um agente, segundo o qual este último deve esgotar as suas férias anuais antes do termo do seu contrato de agente temporário, tal aviso também não é em si criticável uma vez que, pelo contrário, uma boa gestão do pessoal implica velar por que os colaboradores declarem e utilizem as suas férias anuais de forma a evitar um reporte para os anos seguintes ou uma indemnização por essas férias não gozadas no final do contrato.

      (cf. n.os 116 a 118)

      Ver:

      Tribunal da Função Pública: acórdão Q/Comissão, EU:F:2008:161, n.o 180

    5.  A inscrição em cursos de línguas no interesse do serviço, organizadas no tempo de trabalho normal, implica que o interessado justifique imediatamente as suas ausências nesses cursos junto do seu superior hierárquico e do serviço responsável pelos referidos cursos de línguas.

      Depois de ter informado devidamente o seu chefe de unidade dos motivos da sua ausência no curso de línguas, incumbe ao funcionário ou ao agente em causa efetuar pessoalmente as diligências administrativas necessárias junto da unidade de formação encarregada do referido curso de línguas, assegurar, em seguida, que foram efetuadas as alterações adequadas na sua situação administrativa e responder pelas eventuais ausências também junto dessa unidade.

      (cf. n.os 120 e 121)

    6.  Quanto a um inquérito interno relativo ao alegado assédio moral efetuado segundo as regras internas do Parlamento Europeu relativas ao Comité consultivo sobre o assédio e a sua prevenção no local de trabalho, o comité sobre o assédio não está vinculado nos seus trabalhos por regras estritas de processo que lhe imporiam ouvir a parte recorrente uma segunda vez se o não considerar necessário. O seu papel é consultivo e o seu parecer não constitui um ato lesivo para a referida parte. Além disso, no comité sobre o assédio, a presumível vítima e o presumível assediador não se encontram na mesma posição. O presumível assediador deve poder, como precisa o artigo 10.o, segundo parágrafo, das referidas regras internas, defender‑se da queixa apresentada ao comité. Nestas condições, o facto de ter dado uma ocasião suplementar ao presumível assediador para responder às alegações formuladas a seu respeito não prova uma violação dos direitos de defesa da alegada vítima pelo comité para o assédio ou uma violação, por parte deste, do seu dever de imparcialidade.

      (cf. n.o 147)

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