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Document 52020AE5731

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a salários mínimos adequados na União Europeia» [COM(2020) 682 final — 2020/310 (COD)]

EESC 2020/05731

OJ C 220, 9.6.2021, p. 106–117 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

9.6.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 220/106


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a salários mínimos adequados na União Europeia»

[COM(2020) 682 final — 2020/310 (COD)]

(2021/C 220/16)

Relatoras:

Milena ANGELOVA e Cinzia DEL RIO

Consulta

Parlamento Europeu, 11.11.2020

Conselho, 10.11.2020

Base jurídica

Artigo 153.o, n.o 2, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

11.3.2021

Adoção em plenária

25.3.2021

Reunião plenária n.o

559

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

155/100/20

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) apoia firmemente o objetivo salientado de a Europa assumir a liderança na transição de uma situação de fragilidade para um novo dinamismo, através da criação de oportunidades e de prosperidade, promovendo a inovação, o crescimento sustentável e a concorrência leal (1), a fim de estimular a convergência económica e social ascendente. O CESE concorda com os objetivos gerais de alcançar salários mínimos adequados e de reforçar os sistemas de negociação coletiva em toda a União Europeia (UE), tornar o trabalho compensador, combater a pobreza e reforçar o papel dos parceiros sociais e do diálogo social, em consonância com os sistemas nacionais de relações laborais.

1.2.

O CESE observa que a diretiva proposta contribuirá para os objetivos da União de promover o bem-estar dos seus povos, desenvolver uma economia social de mercado altamente competitiva (artigo 3.o do TUE) e promover melhores condições de vida e de trabalho (artigo 151.o do TFUE). Aborda igualmente os direitos consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da UE, como o direito dos trabalhadores a condições de trabalho justas e equitativas (artigo 31.o), e está em consonância com o princípio 6 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais. A Comissão Europeia salienta que a proposta não contém quaisquer medidas com impacto direto em matéria de remuneração e que, por conseguinte, o disposto no artigo 153.o, n.o 5, do TFUE é plenamente respeitado.

1.3.

O CESE concorda com os objetivos gerais da proposta e espera que a diretiva seja cuidadosamente elaborada, de forma consentânea com as tradições, a legislação e as práticas a nível nacional, e que as obrigações impostas deixem margem de manobra para adaptações ao contexto nacional. No CESE, as opiniões divergem quanto a determinados elementos da base jurídica da proposta. Apesar destas divergências de opinião, o CESE decidiu pronunciar-se sobre certos aspetos da proposta da Comissão.

1.4.

O papel do Estado na criação de condições favoráveis — tanto políticas como jurídicas —, apoiando e respeitando o papel dos sindicatos e das organizações de empregadores no diálogo social e na negociação coletiva, é reconhecido por diversas instituições internacionais e também salientado em vários pareceres do CESE. Os parceiros sociais devem ser autónomos, e as organizações de empregadores e os sindicatos devem ser protegidos de qualquer forma de restrição dos seus direitos de organização, de representação ou de ação coletiva. Ao mesmo tempo, o CESE reitera novamente a importância de ações conjuntas e de programas de desenvolvimento de capacidades a nível europeu e nacional, geridos diretamente pelos parceiros sociais europeus e nacionais.

1.5.

O CESE apoia o objetivo de aumentar a cobertura da negociação coletiva, de acordo com a legislação e as práticas nacionais e no pleno respeito, e cumprimento, da repartição de competências e da autonomia dos parceiros sociais. O CESE concorda com o objetivo de 70 % e considera que os planos de ação nacionais (artigo 4.o) poderiam desempenhar um papel fundamental na convergência ascendente dos salários e no estabelecimento de medidas e mecanismos mais adequados de fixação de salários, bem como no aumento da cobertura a nível nacional, visando nomeadamente reduzir a disparidade salarial entre homens e mulheres e ligada à idade e diminuir as desigualdades e a discriminação, nomeadamente no que toca aos jovens trabalhadores. O CESE recomenda que qualquer plano de ação nacional seja concebido pelos parceiros sociais e aprovado por meio de um processo tripartido.

1.6.

O CESE reconhece que, em países onde existe um sistema de negociação coletiva autorregulador, que assegura limiares salariais justos e adequados, juntamente com outras condições de trabalho acordadas, deve ser evitada qualquer intervenção do Estado, a fim de salvaguardar/preservar o bom funcionamento do sistema de relações laborais, que pode, por si só, assegurar a concretização dos objetivos fixados na diretiva proposta.

1.7.

O CESE considera que a representatividade dos parceiros sociais é um fator importante, pois assegura o seu mandato democrático. Existem diversos critérios que podem constituir boas práticas a considerar na elaboração dos planos de ação, em conformidade com a legislação e as práticas nacionais. Há vários fatores e critérios complexos que podem ser ponderados aquando da avaliação da representatividade dos parceiros sociais a nível nacional, tendo presente que variam consoante o Estado-Membro.

1.8.

O CESE apoia sistemas de fixação de salários bem desenvolvidos e sistemas de proteção social eficazes que proporcionem redes de segurança para as pessoas necessitadas, bem como outras medidas de prevenção da pobreza no trabalho. O CESE considera que a proposta de diretiva apenas estabelece o princípio geral de adequação dos salários, com base em valores de referência não vinculativos, calculados em função do salário mediano ou médio ilíquido ou líquido, e não prevê quaisquer medidas ou disposições específicas sobre a forma de fixar salários a nível nacional, uma vez que tal continua a ser uma competência exclusiva dos Estados-Membros. O CESE apoia a definição de indicadores vinculativos para orientar os Estados-Membros e os parceiros sociais na sua avaliação da adequação dos salários mínimos legais e na identificação e introdução de medidas pertinentes nos planos de ação nacionais.

1.9.

O CESE observa que o artigo 9.o da proposta de diretiva em apreço inclui disposições aplicáveis aos trabalhadores empregados no âmbito de contratos públicos e da subcontratação, instando os Estados-Membros a respeitarem os salários mínimos em todos os projetos adjudicados por contrato público. O CESE reitera o seu apelo para que os contratos públicos respeitem integralmente as convenções coletivas e para que se suspendam os acordos comerciais em caso de incumprimento das convenções fundamentais e atualizadas da OIT.

1.10.

O CESE recomenda que os relatórios apresentados pelos Estados-Membros sejam examinados e avaliados com a devida participação dos parceiros sociais no Comité do Emprego (COEM), podendo ser criado um subgrupo específico para o efeito, constituído por representantes dos governos nacionais, sindicatos e organizações de empregadores nacionais e europeus, bem como especialistas nomeados pela Comissão.

2.   Observações na generalidade

2.1.

O CESE concorda com os objetivos gerais de alcançar salários mínimos adequados e de reforçar os sistemas de negociação coletiva em toda a União Europeia (UE), tornar o trabalho compensador, combater a pobreza e reforçar o papel dos parceiros sociais e do diálogo social, em consonância com os sistemas nacionais de relações laborais. Um nível adequado de salário mínimo contribui para estimular a procura interna e o crescimento económico e desenvolver uma economia social de mercado altamente competitiva. Existem vários instrumentos de governação através dos quais a União Europeia (UE) e os Estados-Membros trabalham em conjunto para atingir esses objetivos, nomeadamente o Semestre Europeu. É essencial que os parceiros sociais e as organizações da sociedade civil participem de forma plena, estruturada e efetiva em todo o processo do Semestre Europeu, tanto a nível europeu como a nível nacional, a fim de aplicar as políticas económicas e sociais.

2.2.

O CESE observa que a diretiva proposta contribuirá para os objetivos da União de promover o bem-estar dos seus povos, desenvolver uma economia social de mercado altamente competitiva (artigo 3.o do TUE) e promover melhores condições de vida e de trabalho (artigo 151.o do TFUE). Aborda igualmente os direitos consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da UE, como o direito dos trabalhadores a condições de trabalho justas e equitativas (artigo 31.o), e está em consonância com o princípio 6 do Pilar Europeu dos Direitos Sociais. A Comissão Europeia salienta que a proposta não contém quaisquer medidas com impacto direto em matéria de remuneração e que, por conseguinte, o disposto no artigo 153.o, n.o 5, do TFUE é plenamente respeitado.

2.3.

Há preocupações e opiniões divergentes no CESE no que diz respeito a determinados elementos da base jurídica da proposta (2). Apesar destas diferenças, o CESE pronuncia-se, no presente parecer, sobre diversos elementos incluídos na proposta da Comissão.

2.4.

O CESE manifesta preocupação com o facto de a proporção de trabalhadores em situação de pobreza ter aumentado de 8,3 % do total da população ativa da UE em 2007 para 9,4 % em 2018, com um impacto significativo nos jovens (28,1 % dos trabalhadores na faixa etária dos 16 aos 24 anos estão em risco de pobreza ou de exclusão social), nas mulheres, nas pessoas com antecedentes migratórios, nas pessoas com deficiências e nas pessoas à margem do mercado de trabalho. Estes grupos têm empregos mais precários e atípicos, com salários baixos e menor proteção social, o que terá impacto na sustentabilidade dos sistemas de proteção social a médio e longo prazo. Devem aplicar-se medidas e reformas direcionadas, a fim de proteger da pobreza os grupos marginalizados (3).

2.5.

O CESE recomenda a adoção de medidas para prevenir o risco de incumprimento, nomeadamente um aumento indesejável do número de trabalhadores não declarados que conduza à concorrência desleal, devendo estes aspetos ser acompanhados de perto e tratados na fase de execução da proposta.

3.   Observações na especialidade relativamente à proposta

3.1.   Vias e condições favoráveis para a promoção da negociação coletiva na fixação de salários

3.1.1.

A proposta de diretiva visa assegurar que os trabalhadores na UE são protegidos através de salários mínimos adequados que permitam uma vida digna onde quer que trabalhem e promover a negociação coletiva na fixação de salários e, em geral, na definição das condições de trabalho em todos os Estados-Membros (4). O CESE espera que a proposta de diretiva seja cuidadosamente elaborada de forma a respeitar as tradições nacionais estabelecidas neste domínio e a deixar margem de manobra para adaptações aos contextos nacionais no cumprimento das suas obrigações.

3.1.2.

Os parceiros sociais europeus apelaram várias vezes às instituições para que promovam ou criem, sempre que necessário, condições favoráveis e propícias para tornar o diálogo social e a negociação coletiva eficazes e capazes de responder aos desafios reais. A declaração quadripartida (5)«Um novo começo para o diálogo social» e as conclusões do Conselho de 16 de junho de 2016 instam os Estados-Membros a «apoiar a melhoria do funcionamento e da eficácia do diálogo social a nível nacional, que conduza à negociação coletiva e crie um espaço adequado para as negociações entre os parceiros sociais».

3.1.3.

O papel do Estado na criação de condições favoráveis, tanto políticas como jurídicas, é reconhecido por várias instituições internacionais. «O CESE reconhece que, para ser eficaz, o diálogo social tem de incluir: parceiros sociais representativos e legítimos com os conhecimentos, a capacidade técnica e um acesso atempado às informações pertinentes para que possam participar; a vontade política e o empenho em participar no diálogo social; o respeito pelos direitos fundamentais de autonomia dos parceiros sociais, de liberdade de associação e de negociação coletiva, que permanecem no centro das relações laborais, bem como um quadro jurídico e institucional facilitador que apoie os processos de diálogo social com instituições funcionais» (6). Alguns estudos indicam que, nos países em que o papel da negociação coletiva é bem reconhecido e totalmente apoiado e respeitado pelo Estado, as taxas de desemprego são mais baixas, a produtividade é maior e a convergência salarial é promovida (7). É também importante que os resultados dos processos de diálogo social proporcionem resultados tangíveis, tanto para os trabalhadores como para as empresas.

3.1.4.

As ações conjuntas e os programas de desenvolvimento de capacidades a nível europeu e nacional geridos diretamente pelos parceiros sociais europeus e nacionais são um instrumento eficaz para reforçar as capacidades no domínio do diálogo social e da negociação coletiva para sindicatos e organizações de empregadores sempre que necessário (8). O CESE recomenda que os programas e ações de desenvolvimento de capacidades sejam adequadamente apoiados e que os seus resultados sejam avaliados a fim de alcançar eficazmente os objetivos visados.

3.1.5.

O CESE recomenda que algumas disposições e alguns conceitos da proposta (9) sejam formulados com maior precisão, de modo a não deixar margem para incerteza e interpretações por parte do Tribunal de Justiça da UE (TJUE). O objeto e o âmbito de aplicação dos artigos 1.o e 2.o são válidos para todos os Estados-Membros, incluindo os países em que existe um sistema de negociação coletiva autorregulador.

3.1.6.

O CESE recomenda que qualquer plano de ação nacional que vise permitir a promoção da cobertura da negociação coletiva seja concebido pelos parceiros sociais e aprovado por meio de um processo tripartido. Tais planos devem também ser elaborados em plena conformidade com os princípios amplamente reconhecidos de liberdade de associação e da natureza voluntária da negociação coletiva, consagrados nas convenções da OIT. O CESE congratula-se com a abordagem equilibrada dos artigos 1.o e 3.o da Convenção n.o 131 da OIT sobre a fixação de salários mínimos (10). O CESE recomenda que as disposições da proposta de diretiva respeitem os princípios das Convenções n.os 87, 98 e 154 da OIT, a fim de salvaguardar a autonomia dos parceiros sociais, a possibilidade de recrutarem membros e os incentivos e direitos à negociação e celebração de convenções coletivas.

3.1.7.

O CESE apoia o objetivo de aumentar a cobertura da negociação coletiva, de acordo com a legislação e as práticas nacionais e no pleno respeito, e cumprimento, da repartição de competências e da autonomia dos parceiros sociais. A este respeito, o CESE apoia a promoção das capacidades dos parceiros sociais e promove as suas ações conjuntas para participar na negociação coletiva sobre a fixação dos salários e incentivar negociações construtivas, pertinentes e informadas nesta matéria (11). O artigo 4.o estabelece requisitos para a intervenção governamental na elaboração de quadros e planos de ação, e o CESE insiste que tal seja feito através de uma abordagem tripartida, em conformidade com a autonomia dos parceiros sociais e em cooperação com estes. Em alguns Estados-Membros, a cobertura das convenções coletivas é decidida pelos parceiros sociais, enquanto noutros Estados-Membros é a legislação ou a prática comum que prevê mecanismos para alargar as convenções coletivas, devendo tais diferenças ser respeitadas.

O CESE concorda com o objetivo proposto de 70 % e considera que os planos de ação nacionais, acordados e concebidos com os parceiros sociais, podem desempenhar um papel crucial na convergência salarial ascendente e no estabelecimento de mecanismos justos de fixação de salários a nível nacional, nomeadamente a fim de reduzir as disparidades salariais entre homens e mulheres e em função da idade. Também permitirão levar em consideração as práticas nacionais e melhorar os sistemas, se for caso disso. Esses planos de ação devem ser devidamente executados, avaliados, revistos e adaptados, com vista a aumentar gradualmente a cobertura da negociação coletiva a médio prazo. Em alguns países, estão em vigor mecanismos de alargamento de convenções coletivas destinados a aumentar a cobertura da negociação coletiva. No entanto, a utilização de mecanismos de alargamento é apenas uma das formas de promover a negociação coletiva e aumentar a cobertura, juntamente com ações conjuntas e ações de desenvolvimento de capacidades, medidas de combate a ações antissindicais, a proteção dos direitos das organizações sindicais e patronais de negociar coletivamente, a definição de critérios de representatividade acordados e o combate a todas as formas de discriminação, por exemplo. Estes elementos e propostas específicas devem ser tidos em consideração nos planos de ação nacionais, a par de outras iniciativas.

3.1.8.

No entanto, em países onde existe um sistema de negociação coletiva autorregulador, que assegura limiares salariais justos e adequados, juntamente com outras condições de trabalho acordadas, deve evitar-se qualquer intervenção do Estado, a fim de salvaguardar/preservar o bom funcionamento do sistema de relações laborais, que pode, por si só, assegurar a consecução dos objetivos fixados na diretiva proposta. Nestes países, no caso de a cobertura da negociação coletiva se situar abaixo de um determinado limiar, os planos de ação nacionais devem partir, em primeira instância, dos parceiros sociais e ser aprovados por estes.

3.2.

A proposta estabelece uma abordagem diferenciada que distingue entre os Estados-Membros com fixação de salário mínimo nacional e os Estados-Membros com fixação de salários por convenção coletiva. Tal distinção, ainda que amplamente utilizada pela OCDE, a Eurofound e outras instituições para fins académicos e de investigação, pode ser questionável quando utilizada no âmbito de qualquer exercício relacionado com a fixação de salários — por diversos motivos, sendo um deles o facto de, nalguns Estados-Membros em que a intervenção do governo se limita à oficialização das convenções negociadas pelos parceiros sociais, o salário mínimo não ser imposto pela legislação, mas sim por convenções.

3.3.   Negociação coletiva — definições e cobertura

3.3.1.

O CESE sublinha que a negociação coletiva é o instrumento mais eficaz para fixar salários — incluindo salários mínimos — adequados e bem adaptados, que são uma componente essencial da economia social de mercado. O artigo 3.o da proposta inclui algumas definições aplicáveis para efeitos da diretiva.

3.3.2.

O CESE considera que a representatividade dos parceiros sociais é um fator importante, pois assegura o seu mandato democrático. Existem diversos critérios que podem representar boas práticas a considerar a nível nacional, de acordo com as leis e práticas nacionais. Ao avaliar a representatividade dos parceiros sociais a nível nacional, podem ser tidos em consideração diversos fatores/critérios complexos, tendo em conta que variam consoante o Estado-Membro: o número de membros e a importância da presença no território a nível nacional; a capacidade de mobilizar os seus membros e de agir; o número de convenções coletivas celebradas a diversos níveis (setor/empresa, etc.); o número de representantes sindicais ou patronais eleitos; a afiliação a uma organização europeia de parceiros sociais (reconhecida pela Comissão); o reconhecimento pelo governo e a presença em estruturas ou órgãos nacionais/setoriais bipartidos/tripartidos de diálogo social, etc. O CESE apela para que o termo «organizações de trabalhadores» seja substituído pelo termo «sindicatos», já que o primeiro pode levar a interpretações erróneas e abrir a participação em negociações a outras formas não reconhecidas de grupos de interesses de trabalhadores ou mesmo a sindicatos «amarelos» dominados ou influenciados pelos empregadores.

3.3.3.

O CESE afirmou várias vezes que o diálogo social é parte integrante do modelo social europeu. Os parceiros sociais devem ser autónomos e as organizações de empregadores e os sindicatos devem ser protegidos de qualquer forma de restrição do seu direito de organização, de representação ou de ação coletiva. Essa circunstância é igualmente importante para os empregadores e sindicatos.

3.3.4.

O artigo 7.o da diretiva estabelece disposições sobre a participação e a consulta dos parceiros sociais no que diz respeito à determinação e atualização dos salários mínimos nacionais. Nos últimos anos, no contexto do Semestre Europeu, foram emitidas várias recomendações específicas por país em que se apela aos Estados-Membros para que assegurem a devida participação dos parceiros sociais neste processo. No Semestre Europeu de 2020-2021, doze Estados-Membros receberam recomendações específicas por país em que se aponta a necessidade de aumentar a participação e a apropriação dos parceiros sociais nos processos de decisão (12).

4.   Adequação

4.1.

Em resultado das crises económicas e da pandemia em curso, os dados indicam que houve uma estagnação geral dos salários e, em alguns países, até mesmo uma deterioração nos últimos anos. O CESE salienta que a negociação coletiva desempenha um papel fundamental na proteção de um salário mínimo adequado. Os países em que a cobertura da negociação coletiva é elevada tendem a registar, em comparação com outros países, uma menor proporção de trabalhadores com salários baixos, salários mínimos mais elevados em relação ao salário mediano, menos desigualdade salarial e salários mais elevados (13).

4.2.

O CESE apoia sistemas de fixação de salários bem desenvolvidos e sistemas de proteção social eficazes que proporcionem redes de segurança para as pessoas necessitadas, bem como outras medidas de prevenção da pobreza no trabalho. O CESE considera que a proposta de diretiva apenas estabelece o princípio geral de adequação dos salários, com base em valores de referência não vinculativos, calculados em função do salário mediano ou médio ilíquido ou líquido, e não prevê quaisquer medidas ou disposições específicas sobre a forma de fixar salários a nível nacional, uma vez que tal continua a ser uma competência exclusiva dos Estados-Membros. O CESE apoia a definição de indicadores vinculativos para orientar os Estados-Membros e os parceiros sociais na sua avaliação da adequação dos salários mínimos legais e na identificação e introdução de medidas pertinentes nos planos de ação nacionais. Com efeito, os salários são fixados por leis nacionais que preveem um salário mínimo nacional, nos casos em que estes existem, ou por negociação coletiva. Ao mesmo tempo, retirar mais pessoas da pobreza reduzirá os gastos públicos com regimes de proteção social. Os limiares de pobreza e os indicadores de exclusão social são usados a nível da UE para análises e recolhas de dados comuns, mas não existe atualmente nenhum indicador acordado a nível da UE para medir em termos absolutos a justiça e a adequação dos salários mínimos, conceitos cuja definição a proposta deixa ao critério dos Estados-Membros aquando da elaboração dos respetivos planos nacionais.

4.3.

Na fixação de salários por negociação coletiva de acordo com a legislação e as práticas nacionais, os parceiros sociais devem ter em conta elementos importantes como a competitividade, a produtividade, o desenvolvimento económico por setor, a gestão de competências, os novos processos de produção devido à introdução de novas tecnologias, a digitalização e a organização do trabalho diferente e mais flexível em determinados setores produtivos. Sublinhando a necessidade de convergência salarial ascendente, o CESE assinala que salários mais elevados significam também um aumento do consumo e, por conseguinte, da procura interna, com um impacto económico positivo, e que o aumento dos salários também conduz a receitas mais elevadas para os sistemas fiscais e de segurança social. Esses efeitos devem ser criteriosamente analisados.

4.4.

No entanto, a proposta de diretiva visa fixar um limiar indicativo a nível da UE como referência para os salários mínimos nacionais nos países em que estes existam. Tendo em conta que os salários são uma remuneração pelo trabalho efetuado, também podem ser considerados outros fatores, como o limiar de pobreza, um nível de vida minimamente digno e o custo de vida de cada país. Estes elementos são os principais fatores de base na fixação de salários mínimos nacionais e de salários acordados por convenção coletiva nos países da UE. Deve fazer-se uma distinção clara entre fixação do salário mínimo e aumentos salariais.

4.5.

Os critérios apresentados para a adequação dos salários mínimos, com exceção do poder de compra, dizem respeito à distribuição dos salários e à sua evolução e prendem-se com aspetos mais gerais sobre as desigualdades e não com a proteção dos trabalhadores mais vulneráveis. «Os salários mínimos devem ser justos em relação à distribuição dos salários nos diferentes países e o seu nível também deve ser adequado em termos de preços reais, de modo a permitir um nível de vida digno e, simultaneamente, salvaguardar a sustentabilidade das empresas que criam emprego de qualidade» (14).

5.   Contratação pública

5.1.

O artigo 9.o da proposta de diretiva em apreço inclui disposições aplicáveis aos trabalhadores empregados no âmbito de contratos públicos e da subcontratação, convidando os Estados-Membros a respeitarem os salários mínimos em todos os projetos adjudicados por contrato público. Em consonância com as Diretivas 2014/23/UE (15), 2014/24/UE (16) e 2014/25/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (17), a disposição obriga todos os contratantes a cumprirem o nível de salário mínimo aplicável, seja ele nacional ou celebrado em convenções coletivas. Esta disposição está também em conformidade com algumas decisões do Tribunal de Justiça da UE, nomeadamente com o acórdão «Regiopost» de 2015 (Processo C-115/14) (18). No âmbito da contratação pública, os Estados-Membros têm a possibilidade de rejeitar propostas de contratantes que não se comprometam a pagar aos trabalhadores taxas de remuneração mínimas reguladas localmente ou acordadas coletivamente, conforme estabelecido no artigo 70.o da Diretiva 2014/24/UE e no artigo 3.o da Diretiva Destacamento de Trabalhadores (19). O CESE já apelou para que os contratos públicos respeitem integralmente as convenções coletivas e para que se suspendam os acordos comerciais em caso de incumprimento das convenções fundamentais e atualizadas da OIT. O CESE apelou também para a aplicação de sanções, incluindo a inelegibilidade para contratos públicos e financiamento público, contra as empresas que não respeitem as obrigações em matéria de dever de diligência decorrentes do instrumento obrigatório proposto sobre o dever de diligência (20).

6.   Acompanhamento e recolha de dados

6.1.

Já existe um número significativo de bases de dados e análises sobre salários mínimos e processos de negociação coletiva. A disponibilização de dados fiáveis e atualizados às instituições e aos parceiros sociais poderia ajudar a avaliar e a compreender melhor as tendências reais no momento de tomar decisões neste domínio. Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a continuar a ajudar os Estados-Membros, em cooperação com os parceiros sociais, a melhorar continuamente a recolha de dados e a acompanhar a evolução dos salários mínimos nacionais (21).

6.2.

Em alguns Estados-Membros, as convenções coletivas são acessíveis e públicas e, nalguns casos, podem ser consultadas gratuitamente em sítios Web públicos, enquanto noutros Estados-Membros as convenções coletivas e a adequação dos níveis salariais são controladas e avaliadas pelos parceiros sociais e não pelas autoridades, e não são públicas. Embora apoie o delicado desenvolvimento da acessibilidade dos dados (que pode ser sensível no que toca à observância da autonomia dos parceiros sociais e das convenções e negociações coletivas, à proteção de dados, à concorrência leal e a outros domínios), o CESE manifesta preocupação com o possível aumento dos encargos administrativos, especialmente para as PME e para as empresas da economia social sem fins lucrativos, e apela para um equilíbrio entre o valor acrescentado decorrente da obrigação de informação anual muito pormenorizada e a necessidade de reduzir esses encargos tanto quanto possível, aquando da aplicação desta disposição a nível nacional, em particular no tocante à necessidade de partilhar informações sobre os trabalhadores abrangidos e não abrangidos, repartidos por género, idade, deficiência, dimensão da empresa e setor. É também necessária maior clareza sobre a necessidade de proporcionar uma distribuição, em decis, dos salários mínimos nos países que possuem uma abordagem baseada em convenções.

6.3.

O CESE recomenda que os relatórios apresentados pelos Estados-Membros sejam examinados e avaliados com a devida participação dos parceiros sociais no COEM, podendo ser criado um subgrupo específico para o efeito, constituído por representantes dos governos nacionais, sindicatos e organizações de empregadores nacionais e europeus, bem como especialistas nomeados pela Comissão.

6.4.

O CESE assinala a introdução, na diretiva, de cláusulas de não regressão fortes e insta o Parlamento a reforçar ainda mais alguns pontos fundamentais a este respeito, nomeadamente:

Excluir a possibilidade de, no futuro, interpretar a diretiva no sentido de pôr em causa o bom funcionamento dos sistemas de fixação de salários mínimos ou de convenções coletivas;

Excluir qualquer utilização de disposições da diretiva em detrimento da liberdade de associação ou da autonomia dos parceiros sociais;

Excluir a introdução de salários mínimos legais nos casos em que não existam, exceto mediante o acordo dos parceiros sociais;

Os mecanismos de fixação dos salários são uma prerrogativa nacional e nenhuma decisão das instituições da União Europeia deve ter por objetivo interferir diretamente com os mecanismos de fixação dos salários a nível nacional e das empresas, que continuam a ser uma prerrogativa dos parceiros sociais.

O CESE insta igualmente o Parlamento Europeu a vincar que nenhuma disposição da diretiva deve ser interpretada como restringindo ou prejudicando os direitos e princípios reconhecidos, nos respetivos âmbitos de aplicação, pelo direito da União ou pelo direito internacional e pelos acordos internacionais em que a União ou os Estados-Membros são partes, incluindo a Carta Social Europeia e as convenções e recomendações pertinentes da Organização Internacional do Trabalho.

A disposição também prevê que os Estados-Membros e os parceiros sociais possam introduzir disposições legislativas/regulamentares/administrativas ou aplicar convenções coletivas que sejam mais favoráveis para os trabalhadores. O CESE salienta também a necessidade de assegurar o cumprimento das convenções coletivas aplicáveis e uma aplicação eficaz, essenciais para garantir o acesso à proteção do salário mínimo e evitar a concorrência desleal para as empresas.

Bruxelas, 25 de março de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Discurso sobre o estado da União proferido pela presidente Ursula von der Leyen na sessão plenária do Parlamento Europeu

(2)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159.

(3)  Salários mínimos adequados: perguntas e respostas.

(4)  COM(2020) 682 final, artigo 4.o, p. 26.

(5)  Declaração quadripartida.

(6)  JO C 10 de 11.1.2021, p. 14, ponto 1.3. Ver «OECD Job Strategy» [Estratégia para o Emprego da OCDE]; o estudo da Eurofound «Capacity building: towards effective social dialogue» [Reforço das capacidades: rumo a um diálogo social eficaz], 2019; e as Resoluções da OIT de 2013 e 2018 relativas ao debate recorrente em matéria de diálogo social

(7)  O papel dos sistemas de negociação coletiva no desempenho do mercado de trabalho

(8)  Recentemente, os parceiros sociais europeus declararam conjuntamente que serão desenvolvidos mais esforços no domínio do desenvolvimento das capacidades. No seu programa comum para 2019-2021, afirmaram que as atividades de desenvolvimento de capacidades continuam a ser uma prioridade para os parceiros sociais europeus. Reconhecem que, para que o diálogo social europeu tenha um impacto positivo, há ainda muito a fazer para reforçar e apoiar o diálogo social a todos os níveis. Ver também JO C 10 de 11.1.2021, p. 14, pontos 3.23 e 3.24.

(9)  Em especial no que toca ao respeito pelas competências dos parceiros sociais.

(10)  Ratificado por dez Estados-Membros, que possuem todos um sistema de salário mínimo nacional.

(11)  OCDE, «Job strategy 2018» [Estratégia para o Emprego 2018], p. 143 («Achieving higher convergence» [Alcançar uma maior convergência]).

(12)  Ver JO C 10 de 11.1.2021, p. 14, ponto 6.13, e panorâmica das recomendações específicas por país no domínio social relativas ao período 2021-2021

(13)  Base de dados AMECO em linha

(14)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.5.

(15)  JO L 94 de 28.3.2014, p. 1.

(16)  JO L 94 de 28.3.2014, p. 65.

(17)  JO L 94 de 28.3.2014, p. 243.

(18)  Processo C-115/14

(19)  Ver Convenção n.o 94 da OIT, JO C 429 de 11.12.2020, p. 197, e JO C 429 de 11.12.2020, p. 136

(20)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 197, ponto 6.4, e JO C 429 de 11.12.2020, p. 136, ponto 4.10.

(21)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 6.4.1.


ANEXO

O seguinte contraparecer foi rejeitado durante o debate, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos (artigo 43.o, n.o 2, do Regimento):

1.   Conclusões

1.1

O CESE reconheceu, no seu recente Parecer SOC/632 «Salários mínimos dignos em toda a Europa», que a situação jurídica relativa a uma iniciativa da UE no domínio dos salários mínimos é altamente complexa. A UE pode adotar instrumentos jurídicos em matéria de condições de trabalho com base no artigo 151.o e no artigo 153.o, n.o 1, alínea b), do TFUE. O Tratado estabelece que as disposições do artigo 153.o não se aplicam à «remuneração». Por outro lado, a questão da remuneração como condição de trabalho fundamental já foi objeto de jurisprudência e de diretivas da UE em vigor. Existem opiniões claramente divergentes sobre esta matéria, e o CESE reconhece que a Comissão deverá adotar uma abordagem equilibrada e cautelosa (1), quando um número crescente de vozes insta a Comissão Europeia a utilizar uma recomendação do Conselho em vez de uma diretiva (2).

1.2

O CESE também afirmou que (3) é importante que qualquer ação da UE seja precedida de uma análise precisa e compreensão da situação, que tenha em consideração os pontos críticos em cada um dos Estados-Membros e respeite plenamente o papel e a autonomia dos parceiros sociais, bem como os diferentes modelos de relações laborais. Além disso, é essencial que qualquer iniciativa da UE proteja os modelos naqueles Estados-Membros cujos parceiros sociais entendam ser desnecessário fixar salários mínimos nacionais.

1.3

O CESE descreve em seguida as razões pelas quais a proposta da Comissão (4) relativa a salários mínimos adequados na União Europeia não segue a abordagem equilibrada e cautelosa e por que razão não pode ser considerada baseada numa análise rigorosa e no pleno respeito da autonomia dos parceiros sociais e dos diferentes modelos de relações laborais, tal como solicitado pelo CESE.

2.   Observações na generalidade

2.1

Os salários, incluindo os salários mínimos, são um aspeto importante do modelo de economia social de mercado da União Europeia. Garantir salários mínimos dignos em todos os Estados-Membros contribuiria para realizar uma série de objetivos da UE, nomeadamente uma maior convergência salarial, o fomento da coesão social e económica, a eliminação das disparidades salariais entre homens e mulheres, a melhoria das condições de vida e de trabalho em geral e a garantia de condições equitativas no mercado único. Os salários representam a remuneração por trabalho efetuado e constituem um dos fatores que garantem benefícios mútuos para empresas e trabalhadores. Os salários estão relacionados com a situação económica de um país, região ou setor. As mudanças podem ter impacto no emprego, na competitividade e na procura macroeconómica (5).

2.2

O CESE recorda o que já indicou (6) em anteriores trabalhos sobre o salário mínimo: as opiniões no CESE divergem. Alguns membros do CESE defendem que todos os trabalhadores na UE devem estar protegidos por um salário mínimo justo, que lhes permita um nível de vida digno onde quer que trabalhem. Outros membros do CESE consideram que a fixação de salários mínimos é uma questão de competência nacional, em conformidade com as especificidades dos respetivos sistemas nacionais.

2.3

O CESE afirmou anteriormente (7) que são necessários mais esforços em relação à convergência dos salários e à fixação de salários mínimos nos Estados-Membros, além de enfatizar que importa respeitar plenamente a competência e a autonomia dos parceiros sociais nacionais em relação aos processos de fixação de salários, em conformidade com as práticas nacionais (8). Estes esforços devem também visar o reforço da negociação coletiva, o que também contribuiria para salários mais justos em geral.

2.4

O CESE salienta que o nível do salário mínimo é um instrumento fundamental da política económica, que deve continuar a ser uma questão de decisão ao nível dos Estados-Membros, a fim de ter em conta de forma flexível a sua evolução política, económica e social.

2.5

Tal como a Comissão declarou no seu memorando explicativo das medidas propostas, os Estados-Membros onde a cobertura da negociação coletiva é extensa obtêm melhores resultados do que outros em termos de salários mais elevados e de menos trabalhadores com salários baixos. O CESE considera que o êxito de tais modelos de negociação coletiva pode ser explicado pelo facto de o Estado não estar envolvido na definição dos critérios de negociação coletiva nem na sua aplicação, e de os parceiros sociais terem plena responsabilidade e autonomia em relação a ambos.

Pandemia de COVID-19

2.6

Já no seu Parecer SOC/632, o CESE afirmou que a pandemia de COVID-19 atingiu duramente a Europa. A União Europeia e os seus Estados-Membros enfrentam uma recessão económica de proporções históricas, com consequências dramáticas para as pessoas e as empresas (9). Desde então, a situação agravou-se em vez de melhorar. O investimento das empresas continua a ser baixo.

2.7

Ainda não vimos toda a magnitude do impacto da crise da COVID-19 no emprego, mas é evidente que se espera que a crise atual leve a um aumento significativo do desemprego no próximo ano. A crise da COVID-19 enfraqueceu a situação financeira de muitas PME, tornando-as mais vulneráveis ao aumento dos custos. A situação é idêntica em toda a Europa.

Efeitos no emprego

2.8

O CESE já afirmou (10) que outro motivo de preocupação é o facto de uma política europeia em matéria de salário mínimo legal poder eventualmente ter efeitos negativos no emprego (11), especialmente no caso dos jovens e dos trabalhadores pouco qualificados, e agravar o incumprimento, o que também pode levar um grande número de trabalhadores que auferem salários baixos a passar para um regime de informalidade (12). O trabalho não declarado conduz a uma concorrência desleal, prejudica os sistemas sociais e fiscais e viola os direitos dos trabalhadores, nomeadamente o direito a condições de trabalho dignas e a salários mínimos. O CESE lamenta que a Comissão Europeia não tenha procedido a uma avaliação completa do impacto da sua proposta no emprego e na economia no seu conjunto. Atualmente, uma diretiva sobre salários mínimos é particularmente prejudicial, uma vez que as nossas economias e sociedades se veem confrontadas com o desafio sem precedentes da COVID-19.

3.   Observações sobre a proposta da Comissão

3.1    Base jurídica

3.1.1

De acordo com a proposta da Comissão (13), a base jurídica da proposta de diretiva é o artigo 153.o, n.o 1, alínea b), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

3.1.2

O CESE observa que o artigo 153.o, n.o 5, do TFUE exclui expressamente as remunerações, o direito sindical, o direito de greve e o direito de lock-out da competência legislativa da UE no domínio da política social. Por conseguinte, estas questões são inteiramente da competência nacional.

3.1.3

No CESE, houve opiniões divergentes quanto à legitimidade de uma iniciativa jurídica da UE, nos termos do artigo 153.o, especialmente uma diretiva (14). O CESE já afirmou (15) que as principais preocupações residem no facto de a UE não ter competência em matéria de «remuneração», nem em matéria de níveis salariais, e na circunstância de a sua ação poder interferir com a autonomia dos parceiros sociais e minar os sistemas de negociação coletiva, sobretudo nos Estados-Membros onde os limites mínimos salariais são estabelecidos pela via da negociação coletiva. Além disso, as opiniões divergem quanto ao valor acrescentado da ação da UE, incluindo no próprio Comité: embora a maioria dos membros do CESE considere que daí possa resultar um valor acrescentado, outros não concordam. Em todas as circunstâncias, e tendo em conta que a fixação de salários mínimos é uma competência nacional, a UE deve exercer os seus poderes legislativos com precaução em qualquer iniciativa legislativa, a fim de respeitar plenamente o princípio da subsidiariedade.

3.1.4

Além disso, no que diz respeito à base jurídica, outras disposições da proposta fazem referência aos direitos coletivos, como a promoção de convenções coletivas de diversas formas (artigo 4.o). O CESE observa que o artigo 153.o, n.o 1, alínea f), do TFUE cria uma base jurídica específica, sendo que abrange a representação e defesa coletiva dos interesses dos trabalhadores e das entidades patronais, incluindo a cogestão, sem prejuízo do disposto no n.o 5. A UE tem competência para legislar nesta base apenas com uma decisão unânime. O CESE considera que este artigo deveria ter sido utilizado para as disposições relativas à promoção da negociação coletiva.

3.1.5

Com base nas preocupações acima expostas, reforçadas pelo facto de, em muitos casos, a linguagem utilizada no título da proposta, no título de alguns artigos e no seu texto e preâmbulo não ser coerente com o verdadeiro âmbito de aplicação da proposta, a Comissão deve considerar a possibilidade de publicar uma recomendação em vez de uma diretiva. Tal proporcionaria aos Estados-Membros a flexibilidade necessária para alcançarem os objetivos da proposta, respeitando simultaneamente os seus sistemas de determinação dos salários e a autonomia dos parceiros sociais.

3.2    Objeto e âmbito de aplicação

3.2.1

O artigo 1.o estabelece que os trabalhadores devem ter «acesso à proteção salarial mínima», quer por lei quer por convenções coletivas. Nos termos do artigo 2.o, a diretiva seria aplicável aos trabalhadores que têm um contrato de trabalho ou uma relação de trabalho conforme definido pela legislação, por convenções coletivas ou pelas práticas em vigor.

3.2.2

Nenhum Estado-Membro nem nenhum trabalhador está excluído do âmbito de aplicação da diretiva. Nos países que se baseiam exclusivamente na negociação coletiva e onde nem todos os trabalhadores são abrangidos por salários mínimos e, por conseguinte, não têm acesso garantido à proteção do salário mínimo, tal significa uma incerteza jurídica significativa e inaceitável. O CESE receia que a diretiva possa ser interpretada, também no que diz respeito aos países que recorrem exclusivamente à negociação coletiva, no sentido de garantir direitos a todos os trabalhadores, a fim de serem abrangidos pela proteção do salário mínimo. Na prática, apesar das garantias previstas no artigo 1.o, n.o 3, tal interpretação interferiria diretamente com a cobertura do salário mínimo nos Estados-Membros e incentivaria estes países a avançar no sentido de uma aplicação geral das convenções coletivas, o que comprometeria — e, a mais longo prazo, os obrigaria a mudar — os seus modelos de mercado de trabalho.

3.2.3

O CESE recomenda que algumas disposições e alguns conceitos da proposta (16) sejam formulados com maior precisão, de modo a não deixar margem para incerteza e interpretações por parte do Tribunal de Justiça da UE (TJUE). O objeto e o âmbito de aplicação dos artigos 1.o e 2.o são válidos para todos os Estados-Membros, incluindo os países em que existe um sistema de negociação coletiva autorregulador. Conforme acima referido, nos países que dependem exclusivamente da negociação coletiva, tal deixa margem para incerteza jurídica. Além disso, devem ser incluídos ajustamentos para alguns casos específicos, que devem ser excluídos do âmbito de aplicação da proposta — por exemplo, os marítimos — cuja fixação de salários está prevista em convenções internacionais (17).

3.3    Definições

3.3.1

O artigo 3.o da proposta não estabelece qualquer distinção entre salários mínimos nacionais e salários mínimos, ou antes patamares salariais mínimos, estipulados em convenções coletivas.

3.3.2

Embora compreenda que, nos sistemas de salários mínimos nacionais, são necessários critérios de adequação, definidos a nível nacional com a participação dos parceiros sociais, o CESE questiona o tratamento idêntico dado aos dois tipos de salários mínimos na proposta de diretiva. No caso dos sistemas baseados unicamente na negociação coletiva, a regulação da adequação dos salários mínimos viola a autonomia dos parceiros sociais.

3.3.3

O CESE recorda que os salários mínimos nos modelos baseados em convenções coletivas são determinados nas negociações entre empregadores e trabalhadores que abrangem também, de um modo mais geral, os salários e as condições de trabalho. Isto significa, por exemplo, que, nestas situações, a «adequação» é intrinsecamente equilibrada com outros interesses e outras partes da convenção coletiva, ao passo que os salários mínimos nacionais são exógenos.

3.4    Promoção da negociação coletiva na fixação dos salários

3.4.1

O artigo 4.o exige que os Estados-Membros tomem medidas para reforçar a capacidade dos parceiros sociais para participarem na negociação coletiva sobre a fixação de salários a nível setorial ou intersetorial. Propõe-se um limiar de 70 % para a cobertura da negociação coletiva.

3.4.2

O CESE salientou no seu parecer anterior (18) que o bom funcionamento dos sistemas de negociação coletiva, nomeadamente a negociação coletiva setorial, desempenha um papel crucial para garantir salários justos e adequados em toda a estrutura salarial, incluindo os salários mínimos nacionais, quando existam.

3.4.3

O CESE sublinha que é necessário garantir que cabe a cada Estado-Membro decidir, tendo em conta as condições nacionais, em conformidade com o respetivo sistema de relações laborais, em primeiro lugar, qual é o objetivo de cobertura adequado e, em segundo lugar, quais as medidas a tomar a nível nacional caso o nível desça abaixo do objetivo definido a nível nacional.

3.4.4

O CESE receia igualmente que o objetivo vinculativo proposto (cobertura de 70 %) enfraqueça os parceiros sociais a longo prazo, uma vez que, em alguns países, uma forma de alcançar esse objetivo seria introduzir um sistema de alargamento automático das convenções coletivas a todas as empresas e trabalhadores, reduzindo assim o papel dos parceiros sociais e enfraquecendo a negociação coletiva.

3.5    Adequação

3.5.1

O artigo 5.o, n.o 2, refere os critérios nacionais que os Estados-Membros devem utilizar na fixação dos salários mínimos nacionais. Estes critérios incluem, por exemplo, o poder de compra, a taxa de crescimento dos salários brutos e a evolução da produtividade do trabalho. O considerando 21 refere que os indicadores de 60 % do salário mediano bruto e 50 % do salário médio bruto, cumulativamente, servem de orientação para a avaliação da adequação dos salários mínimos em relação ao nível dos salários brutos. No entanto, esses indicadores prendem-se com aspetos mais gerais sobre as desigualdades e não com a proteção dos trabalhadores mais vulneráveis.

3.5.2

O CESE receia que, apesar das garantias dadas pela Comissão na exposição de motivos em contrário, a proposta tenha um impacto no nível do salário mínimo e, consequentemente, no nível da remuneração. Além disso, as declarações constantes da exposição de motivos clarificam que a diretiva deve permitir uma vida digna, reduzir a pobreza no trabalho e criar condições de concorrência mais equitativas. O CESE considera que estas disposições abordam o nível dos salários mínimos, o que agrava as suas preocupações quanto à validade da base jurídica e à escolha do instrumento jurídico.

3.6

O CESE observa que a proposta vai além do disposto no artigo 18.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24/UE relativa aos contratos públicos. Este artigo estabelece que os Estados-Membros devem assegurar que os operadores económicos cumprem as obrigações do direito laboral aplicáveis estabelecidas, nomeadamente, em convenções coletivas. No artigo 9.o da proposta, falta o termo «aplicáveis», o que dá a impressão de que, segundo este artigo, os salários acordados em convenções coletivas devem ser sempre exigidos nos contratos públicos. Tal suscita a questão de saber se a intenção da Comissão é ir além da Diretiva 2014/24/UE, estabelecendo sempre um salário consentâneo com uma convenção coletiva em todos os contratos públicos.

3.7    Monitorização e recolha de dados

3.7.1

O artigo 10.o exige que os Estados-Membros comuniquem, entre outros, dados sobre a cobertura da negociação coletiva e o nível dos salários mínimos. Os Estados-Membros devem igualmente assegurar que os acordos coletivos sejam transparentes e acessíveis ao público, tanto no que diz respeito aos salários como a outras disposições. Os salários mínimos serão então avaliados pela Comissão e pelo Comité do Emprego do Conselho, o COEM.

3.7.2

Nos modelos do mercado de trabalho baseadas exclusivamente na negociação coletiva, a adequação dos salários não é examinada pelo Estado ou por uma agência governamental. Estes acordos são geridos e interpretados exclusivamente pelos parceiros sociais. Seria inaceitável sujeitar a revisão os níveis salariais nas convenções coletivas. É igualmente questionável, no que diz respeito à autonomia dos parceiros sociais, obrigá-los a tornar os acordos acessíveis e transparentes de uma forma geral, tanto mais que os acordos só podem ser interpretados e revistos pelos parceiros sociais. O CESE recorda igualmente que as convenções coletivas nem sempre contêm níveis mínimos de salários ou patamares salariais mínimos. Além disso, as obrigações de comunicação são muito intensivas em termos de mão de obra e, em algumas partes, os requisitos em matéria de dados não são exequíveis.

Resultado da votação

Votos a favor:

106

Votos contra:

147

Abstenções:

17


(1)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, «Salários mínimos dignos em toda a Europa», https://www.eesc.europa.eu/pt/our-work/opinions-information-reports/opinions/decent-minimum-wages-across-europe, ver ponto 6.1.2.

(2)  Nove Estados-Membros dirigiram uma carta às presidências alemã e portuguesa do Conselho da União Europeia sobre a necessidade da referida análise jurídica indicando que uma recomendação do Conselho seria um instrumento jurídico mais adequado e que a aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais deve respeitar os limites dos Tratados da UE.

(3)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.11.

(4)  Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a salários mínimos adequados na União Europeia {SEC(2020) 362 final} — {SWD(2020) 245 final} — {SWD(2020) 246 final}.

(5)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, «Salários mínimos dignos em toda a Europa», https://www.eesc.europa.eu/pt/our-work/opinions-information-reports/opinions/decent-minimum-wages-across-europe, ver ponto 1.4.

(6)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.2.

(7)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.3, e JO C 125 de 21.4.2017, p. 10

(8)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.3.

(9)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.1.

(10)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 3.4.8.

(11)  Com base no gráfico A12.9, p. 197, da avaliação do impacto da Comissão

(12)  Eurofound (2019) «Upward convergence in employment and socioeconomic factors» [Convergência ascendente no emprego e nos fatores socioeconómicos].

(13)  Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a salários mínimos adequados na União Europeia {SEC(2020) 362 final} — {SWD(2020) 245 final} — {SWD(2020) 246 final}.

(14)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.8.

(15)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 1.9.

(16)  Em especial no que toca ao respeito pelas competências dos parceiros sociais.

(17)  A Convenção do Trabalho Marítimo da OIT (OIT, CTM, 2006).

(18)  JO C 429 de 11.12.2020, p. 159, ponto 3.3.10.


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