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Document 52004AE0102

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As indústrias culturais na Europa»

OJ C 108, 30.4.2004, p. 68–77 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

30.4.2004   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 108/68


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre »As indústrias culturais na Europa»

(2004/C 108/14)

Em 9 de Abril de 2003, a Comissão, por carta da comissária Viviane REDING, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, que emitisse um parecer sobre o tema «As indústrias culturais na Europa».

Em 15 de Abril de 2003, a Mesa do Comité incumbiu a Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo dos correspondentes trabalhos. A secção emitiu parecer em 16 de Dezembro de 2003 (relator: J. I. RODRÍGUEZ GARCÍA-CARO).

Na 405.a reunião plenária de 28 e 29 de Janeiro de 2004 (sessão de 28 de Janeiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 72 votos a favor, 7 votos contra e 5 abstenções o presente parecer.

1.   INTRODUÇÃO

1.1   Justificação do parecer

1.1.1

No dia oito de Abril de 2003, a comissária Viviane REDING solicitou, por carta dirigida ao presidente do Comité, um parecer exploratório sobre a indústria cultural europeia.

De acordo com a comissária, o CESE, pela sua posição na sociedade civil e por representar os interesses das empresas e dos trabalhadores, encontra-se bem posicionado para, nomeadamente:

contribuir com uma opinião qualificada nesta matéria;

realizar uma síntese dos interesses em jogo;

formular recomendações decorrentes do acordo entre os interlocutores sociais e económicos.

Nesse sentido, a Comissão pretende, em princípio, no início de 2004, propor novos instrumentos comunitários nos sectores cultural e audiovisual.

1.1.2

Segundo a Comissão, os principais desafios que estas indústrias têm de enfrentar são:

A concorrência externa à Europa.

A pirataria associada às novas tecnologias.

O equilíbrio entre os grandes operadores e as empresas independentes (acesso ao mercado e diversidade cultural).

Um tratamento fiscal diferenciado.

Um défice de peritos e de formação em determinadas matérias destes sectores.

1.1.3

A situação existente torna necessário, segundo a Comissão, iniciar um processo de reflexão sobre os seguintes aspectos:

Desafios que estas indústrias enfrentam.

Desafios a que devem responder.

Contributo possível da Europa para ajudar a responder a estes desafios, sobretudo no contexto do alargamento.

1.1.4

O Parlamento Europeu, na sessão realizada em 4 de Setembro de 2003, adoptou uma resolução sobre «Indústrias culturais» (relatora: Myrsini ZORBA).

1.1.4.1

Este vasto e completo texto é o resultado de uma rigorosa metodologia que o Parlamento Europeu seguiu para elaborar um projecto de resolução com recomendações operacionais destinadas às instituições competentes da União Europeia e dos Estados-Membros sobre possíveis medidas a adoptar.

1.1.4.2

Na audiência pública prévia, realizada em 22 de Abril de 2003, foram apresentados os resultados de um questionário enviado a duzentas associações profissionais, federações de diferentes sectores, empresas e peritos nestas matérias, que apresentaram como principais problemas da indústria cultural europeia:

A falta de investimento.

Os problemas relacionados com a distribuição.

A dimensão insuficiente do mercado.

A diversidade linguística.

A pirataria no sector.

1.1.4.3

De acordo com o referido documento apresentado na audiência, os profissionais do sector sentem-se insatisfeitos com as políticas culturais a nível nacional e europeu.

1.2   Teor do parecer exploratório

1.2.1

O parecer que o Comité Económico e Social Europeu elaborou inclui as medidas consideradas como pertinentes para desenvolver uma futura intervenção comunitária.

1.2.2

O Comité deve responder, fundamentalmente, a duas questões:

Quais são os desafios culturais e socioeconómicos que as indústrias culturais têm que enfrentar na Europa.

Que contribuição pode a Europa dar para responder de forma duradoura a esses desafios.

2.   A EUROPA E A CULTURA

2.1   Cultura

2.1.1

Em geral, os dicionários definem o termo «cultura», quando se referem ao conceito na sua globalidade, em termos semelhantes. Assim, poderíamos dizer que cultura é o conjunto de conhecimentos, costumes e graus de desenvolvimento artístico e científico numa época ou grupo social.

2.1.1.1

Os europeus partilham, com determinados graus de afinidade, conhecimentos, costumes, graus de desenvolvimento e valores, que indiciam, respeitando os sinais de identidade mais locais, a existência de uma Cultura Europeia ou de um Espaço Cultural Europeu.

2.1.1.2

Simultaneamente, e tendo em atenção o objectivo do parecer que apresentamos, a cultura pode definir-se como o conjunto de produções e de produtos culturais e artísticos relacionados com a música, o teatro, o cinema, a televisão, o livro, etc. Neste caso, a cultura enquadra-se em domínios mais próximos da dimensão económica e insere-se plenamente no domínio da indústria, da indústria cultural.

2.1.2

Mas a cultura não é uma entidade abstracta, é algo que faz parte da própria existência daqueles que a tornam possível. Não existe cultura se não existirem criadores, artistas, intérpretes, etc. que, com a sua inspiração, coloquem à disposição dos cidadãos obras que ficam no acervo cultural da humanidade, de uma humanidade que as contempla e valoriza em toda a sua dimensão.

2.1.3

Por isso, as criações culturais, as obras da cultura, não teriam razão de ser se os cidadãos não tivessem acesso a elas. O acesso à cultura engrandece as possibilidades do ser humano. Mas não nos podemos esquecer que fazendo um uso perverso da cultura, esta pode converter-se num factor de controlo de poder. Fortalecer a cultura e fomentar e promover o livre acesso dos cidadãos a ela pode constituir um elemento de contraposição a qualquer modelo de hegemonia que tente impor-se utilizando a cultura como veículo.

2.2   Política Cultural e Espaço Cultural Europeu

2.2.1

Até à entrada em vigor do Tratado de Maastricht, a União Europeia não dispunha de uma base jurídica que fundamentasse uma Política Cultural. Com uma base jurídica sólida e com o lançamento de programas específicos neste domínio da política comunitária, a posição da Europa no contexto internacional deixa de surgir apenas devido à sua configuração geográfica e pela sua posição política, social e económica, mas começam a sobressair os aspectos mais importantes do terreno cultural partilhado da Europa comunitária.

2.2.2

Nesse sentido, o Comité entende também que a cultura constitui um elemento essencial e unificador da vida quotidiana e da identidade dos cidadãos da Europa (1).

2.2.3

Embora não exista uma política comum para os diferentes sectores culturais e apesar das limitações do artigo 151.o do Tratado CE, seria necessário que os Estados-Membros e as instituições da UE contribuíssem com uma visão comum para o futuro que permita à União no seu conjunto uma intervenção mais participada no domínio da cultura.

2.2.3.1

Neste sentido, entendemos que uma política cultural a nível europeu deveria favorecer o acesso dos cidadãos da União ao conhecimento da identidade cultural que nos une e da diversidade cultural das diferentes regiões da Europa, para que os que participam dessa diversidade se possam compreender melhor.

2.2.4

O Parlamento Europeu, na sua resolução de 5 de Setembro de 2001, considerava oportuno para o futuro da União reforçar a dimensão cultural, tanto a nível político como a nível orçamental, fomentando a cooperação entre os Estados-Membros, com vista a permitir a criação de um «Espaço Cultural Europeu».

2.2.4.1

A criação desse Espaço Cultural Europeu comporta uma riqueza dupla: a riqueza cultural, entendida por si mesma, e a riqueza económica produzida pelas indústrias culturais. Através delas se verifica o acesso dos cidadãos da União à cultura e nelas deve, igualmente, basear-se a extensão e a exportação da nossa cultura para além das fronteiras comunitárias.

2.2.5

Embora o objectivo do presente parecer não seja discutir a política cultural da União Europeia, entende o Comité que ela é uma questão de enorme importância, a ser abordada em profundidade.

3.   OS PROGRAMAS COMUNITÁRIOS QUE APOIAM A CULTURA E AS INDÚSTRIAS CULTURAIS

3.1   Base jurídica

3.1.1

Até à aprovação do Tratado de Maastricht, a União Europeia carecia de um enquadramento jurídico que lhe permitisse abordar uma política cultural a nível comunitário. O Tratado de Roma não continha nenhum artigo ou secção específicos nesse sentido, apenas o seu preâmbulo aludia à cultura como elemento unificador dos povos e promotor do desenvolvimento socioeconómico.

3.1.1.1

O artigo 151.o do Tratado CE estabelece uma base de actuação para promover, apoiar e complementar as actividades dos Estados-Membros, respeitando a diversidade nacional e regional, pondo em evidência o património cultural comum dos cidadãos da União. Qualquer acção harmonizada está expressamente excluída do âmbito de aplicação deste artigo.

3.1.2

Uma das missões confiadas à União Europeia é garantir as condições necessárias à competitividade da indústria comunitária. O artigo 157.o do Tratado CE estabelece que a Comunidade estará orientada para acelerar a adaptação da indústria às alterações estruturais e incentivar um ambiente favorável à iniciativa e à cooperação entre empresas, entre outros.

3.1.2.1

A União Europeia deve contribuir para a criação de um ambiente favorável ao desenvolvimento das indústrias culturais, para que elas possam beneficiar dos resultados da investigação, dos avanços tecnológicos, de um melhor acesso ao financiamento e das vantagens da cooperação num espaço europeu da cultura.

3.2   Programas específicos no domínio da cultura

3.2.1

Contando com o quadro marco jurídico apropriado, o artigo 151.o do Tratado, a União Europeia implementou, entre 1996 e 1997, três programas específicos no âmbito da cultura: Caleidoscópio (2), destinado a fomentar a criação artística e a promover o conhecimento e a divulgação da cultura dos povos da Europa no sector da arte; Ariane (3), destinado a desenvolver a cooperação entre os Estados-Membros no sector do livro e da leitura e promover um maior conhecimento das obras literárias e da história dos povos através da tradução; e Rafael (4), destinado a fomentar a cooperação entre os Estados-Membros relativamente ao património cultural com dimensão europeia.

3.2.2

Em Fevereiro de 2000 foi aprovado o primeiro programa-quadro comunitário a favor da cultura (5). Com este programa simplifica-se a acção comunitária, centrando-a num único instrumento de financiamento e de gestão da cooperação cultural. Esta cooperação entre os agentes culturais contribui para a criação de um espaço cultural europeu, para o desenvolvimento da criação artística e literária, para o conhecimento da história e da cultura europeias, para a divulgação internacional da cultura, para a revalorização do património de relevância europeia e para o diálogo intercultural.

3.2.2.1

O programa «Cultura 2000» visa a criação de um espaço cultural caracterizado pela diversidade cultural e pela herança cultural partilhada da Europa. A participação no programa alarga-se aos países do Espaço Económico Europeu e aos países candidatos à adesão. O programa apoia os projectos artísticos e culturais que disponham de uma dimensão europeia a nível da sua concepção, organização e realização. A maioria dos projectos inclui uma dimensão multimédia para a criação de páginas na Internet e fóruns de discussão.

3.2.2.2

A nova Proposta de Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Decisão n.o 508/2000/CE (6) prevê o prolongamento do programa «Cultura 2000», estabelecido para o período 2000-2004. Com esta proposta pretende-se que o programa continue nos mesmos termos até 2006.

3.3   Programas comunitários com impacto no domínio da cultura

3.3.1

MEDIA, cujas siglas correspondem em francês a Medidas para Apoiar o Desenvolvimento da Indústria Audiovisual, pretende reduzir as debilidades das indústrias europeias de conteúdos audiovisuais e multimédia, caracterizadas pela circulação insuficiente de obras europeias entre os diferentes países e o défice crónico de investimento no desenvolvimento de projectos, formação contínua, distribuição das obras e promoção das mesmas. Estas carências são mais significativas se se fizerem comparações com as obras de origem norte-americana.

3.3.1.1

Por conseguinte, os Programas MEDIA pressupõem um apoio à cultura, através de acções a favor das indústrias audiovisuais que produzem este tipo de obras culturais. Mais concretamente, os programas MEDIA Formação (7) e MEDIA Plus (8), herdeiros dos programas MEDIA I e MEDIA II, destinam-se à formação dos profissionais da indústria europeia de programas audiovisuais (MEDIA-Formação) e ao desenvolvimento, distribuição e promoção de obras audiovisuais (MEDIA Plus).

3.3.1.2

A Comissão realizou uma consulta pública para propor, com base na mesma e nos resultados da avaliação dos programas em curso, uma nova geração de programas para a indústria audiovisual europeia.

3.3.2

Outros programas e acções da União Europeia, não relacionados directamente com o apoio à cultura, incluem linhas de acção e apoiam projectos que incidem em aspectos muito diversos da cultura em geral e do património cultural, em particular.

3.3.2.1

Nesse sentido, entre os programas mais importantes e as actividades culturais em que intervêm, incluem-se os seguintes:

a)

V Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico, prevendo alguns dos programas nele enquadrados acções a favor da preservação do património cultural, em particular o Programa Europeu de Investigação das Tecnologias da Sociedade da Informação.

b)

Diversos projectos financiados pelos programas de educação e formação da União Europeia SÓCRATES e LEONARDO visam a aprendizagem e o conhecimento das artes e a criação de associações entre instituições culturais e educativas, com o objectivo de levar os cidadãos europeus a conhecer e apreciar as obras de arte e criar profissões relacionadas com a cultura, nas suas múltiplas facetas.

c)

O Fundo Social Europeu, no que se refere à formação, inclui formação artística, como o restauro e a conservação do património fotográfico em Itália. Neste contexto, justifica-se mencionar a iniciativa comunitária EQUAL.

d)

O programa JUVENTUDE financia, anualmente, encontros para jovens dos 15 aos 25 anos. Alguns destes encontros centram-se em actividades artísticas.

e)

O Programa eContent, no âmbito do plano de acção eEuropa, desenvolve tecnologias de tradução automática que contribuem para a preservação da diversidade linguística das obras literárias que se realizam na Europa e apoia a produção de conteúdos europeus digitais.

f)

A Política Regional da União Europeia também contribui para o financiamento de espaços de criação e divulgação artística, tais como escolas de música, salas de concerto, estúdios de gravação, etc.

g)

No âmbito do Programa MEDA (programa de cooperação com os países mediterrânicos), o EUROMED HERITAGE é um programa regional de apoio ao desenvolvimento do legado cultural euromediterrânico. O EUMEDIS, uma iniciativa destinada a desenvolver os serviços digitais nos países mediterrânicos, entre eles os serviços de acesso multimédia ao património cultural e ao turismo, inscreve-se neste programa.

h)

O Programa URB-AL apoia a cooperação entre cidades da União Europeia e da América Latina em questões relativas à problemática urbana, incluindo a conservação do património urbano. No mesmo sentido, o programa ASIA-URB é o equivalente para a Ásia, e a conservação e revalorização do património também são objecto de cooperação com os países de África, das Caraíbas e do Pacífico no quadro do Acordo de Cotonou.

i)

O Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional financia projectos de restauro do património programados no quadro dos programas de desenvolvimento regional. As iniciativas comunitárias URBAN, para as zonas urbanas em crise, e INTERREG, que fomenta a cooperação entre as regiões da União Europeu em diferentes domínios, como o desenvolvimento urbano, apoiam projectos com essas características.

j)

O Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola apoia acções de desenvolvimento das zonas rurais. A iniciativa LEADER contribui igualmente para a renovação e a revalorização cultural dos edifícios, jazidas, património móvel e materiais no referido domínio.

k)

Dentro do VI Programa Comunitário de Acção na Área do Ambiente, o Programa LIFE III contribui para a política ambiental da União, fomentando a revalorização e a gestão turística de ambientes naturais e culturais.

3.3.3

Na opinião do Comité, a série de programas anteriormente referida reflecte o crescente interesse das instituições comunitárias em promover e apoiar a cultura, mas também revela uma dispersão de esforços e acções. Separadamente, tais esforços e acções têm permitido progressos incontestáveis, mas a sua coordenação permitiria talvez realizar sinergias e obter um melhor resultado e uma maior eficiência na concretização dos objectivos relacionados com a cultura.

3.3.3.1

Vários destes programas dependem de uma única Direcção-Geral, sobretudo os mais directamente relacionados com a cultura e a indústria cultural do sector audiovisual, mas existem outras acções integradas em programas dependentes de outros departamentos, que deveriam motivar uma reflexão sobre a conveniência de uma maior coordenação entre os mesmos.

4.   INDÚSTRIAS CULTURAIS

4.1   Que entendemos por indústrias culturais?

4.1.1

O Comité não pretende dar uma definição limitativa do que se deve entender por indústrias culturais; o objectivo deve, antes, ser o de determinar com clareza quais os sectores que aí se devem incluir.

4.1.1.1

De facto, a definição de uns e outros sectores de actividade como indústrias culturais depende das fontes consultadas. Nesse enquadramento podem-se incluir actividades tão diversas como: as artes cénicas, com todas as suas manifestações de interpretação teatral, musical, dança, etc.; as artes plásticas, em qualquer uma das suas manifestações de pintura, escultura, etc.; o artesanato cultural; a edição de livros; a edição de música, os meios audiovisuais e o cinema; o património cultural, sobretudo arquitectónico; as actividades de conservação e restauro de obras e do património cultural e, inclusivamente, o turismo, quando o seu objectivo for o contacto com um património cultural determinado, seja ele urbano ou rural, sem esquecer os museus, as bibliotecas e outros espaços de cultura.

4.1.2

Para a UNESCO, a criatividade, que constitui uma parte importante da identidade cultural dos seres humanos, expressa-se de diferentes formas. Reproduzidas e multiplicadas por processos industriais e divulgadas mundialmente, as obras da criatividade humana convertem-se em produtos de indústrias culturais como a edição de livros, a edição musical de discos, a produção cinematográfica e videográfica e, mais recentemente, a edição electrónica multimédia (9).

4.1.2.1

Efectivamente, esta definição da UNESCO aproxima-se, com grande rigor, do conceito de indústria cultural, ao qual deveríamos acrescentar os sectores que incluem obras culturais não reproduzíveis em massa, mas que atraem o interesse pela sua contemplação directa ou indirecta ou deslocação dos cidadãos que delas pretendem desfrutar. Desta forma, surgem indústrias que não necessitam de reproduzir uma obra, mas que através do turismo cultural põem milhões de cidadãos em contacto com o património cultural não reproduzível.

4.1.2.2

Por esse motivo, com vista a conferir eficácia a uma política europeia no domínio da cultura e, consequentemente, para apoiar as indústrias culturais, o Comité apoia a clarificação conceptual solicitada pelo Parlamento Europeu na sua resolução de 4 de Setembro de 2003 e contribui para tal definição com os critérios evocados nos pontos 4.1.2 e 4.1.2.1 do presente parecer.

4.2   Como se pode agrupar conceptualmente as indústrias culturais?

4.2.1

Para fins meramente didácticos, e admitindo qualquer outra forma de classificação, as indústrias culturais podem ser agrupadas da seguinte forma:

Manifestações culturais que incluem manifestações artísticas como o espectáculo teatral, a manifestação musical directa, a dança e todas as outras manifestações a que assistimos ao vivo.

Obras culturais e obras de arte como o património artístico e arquitectónico e o património mobiliário, bem como todas as importantes facetas de conservação e restauro, que garantem a sua perdurabilidade.

Instituições culturais como museus, galerias e bibliotecas.

Industria cultural de produtos editoriais, que incluiria a edição de livros e a edição fonográfica, assim como a cinematografia e a reprodução em vídeo e DVD.

Indústria cultural de comunicação, que inclui a rádio, a televisão e os meios de comunicação em geral.

O sector multimédia; nele se incluem os novos suportes digitais e a informação de natureza cultural em linha através do acesso à Internet pelo recurso à banda larga.

4.2.2

Com estes parâmetros, ninguém pode duvidar da importância económica dos produtos culturais e das indústrias que os suportam. A crescente importância económica dos mesmos torna as indústrias culturais numa importante fonte de actividade económica e de progressiva criação de emprego. Desta forma e na opinião do Comité, as indústrias culturais da União Europeia constituem um importante contributo para o cumprimento dos objectivos de Lisboa no que se refere à criação de emprego.

4.2.2.1

Numa sociedade que valoriza cada vez mais o ócio e as actividades associadas, as indústrias culturais facilitam o conhecimento, o entretenimento e o emprego, pelo que, logicamente, devem ser apoiadas pelos poderes públicos nacionais e comunitários, favorecendo a sua expansão e desenvolvimento, em especial no que respeita à mudança tecnológica.

4.2.2.2

As culturas produzidas e recebidas pelas populações autóctones e pelas minorias exigem medidas especiais.

5.   O COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU, A CULTURA E AS INDÚSTRIAS CULTURAIS

5.1

O Comité Económico e Social Europeu, pelo seu papel privilegiado como expressão da sociedade civil organizada e dos parceiros económicos e sociais, pode e deve contribuir com uma opinião que represente não apenas as preocupações e aspirações dos referidos parceiros, mas que dê conta do ponto de vista dos utilizadores destas indústrias culturais, contribuindo assim com uma perspectiva enriquecedora e integradora para o debate.

5.2

Ao longo dos anos, o Comité pronunciou-se por diversas vezes sobre a cultura, em geral, e sobre as indústrias culturais em particular. Neste sentido, o Comité expressou a sua opinião sobre as indústrias do sector audiovisual nos diferentes pareceres emitidos por ocasião da aprovação das diferentes fases do Programa MEDIA.

5.3

Nos referidos pareceres, o Comité manifestou de forma clara a sua posição quanto à identificação dos problemas e dos desafios que afectam as indústrias culturais e à procura de possíveis soluções a aplicar para fomentar, favorecer e apoiar as referidas indústrias, na perspectiva de promover o acesso e a divulgação da cultura europeia em geral e da cultura dos estados e das regiões em particular.

5.4

Relembrando e reafirmando essas opiniões, referiremos tais pareceres, que se mantêm plenamente actuais:

5.4.1

Parecer sobre a «Proposta de decisão do Conselho relativa à participação da Comunidade no Observatório Europeu do Audiovisual» (10).

5.4.2

Parecer sobre a proposta de decisão do Conselho que altera a Decisão 90/685/CEE relativa à execução de um programa de acção destinado a promover o desenvolvimento da indústria audiovisual europeia (MEDIA) (1991-1995) (11).

5.4.3

Parecer sobre a proposta de decisão do Conselho relativa a um programa de formação para os profissionais da indústria europeia de programas audiovisuais e sobre a proposta de decisão do Conselho relativa a um programa de incentivo ao desenvolvimento, à distribuição e à promoção de obras audiovisuais europeias (12).

5.4.3.1

No capítulo 3 das observações na generalidade, o Comité realiza uma análise séria das deficiências do sector apontadas pela Comissão na sua proposta de decisão e tece um conjunto de reflexões que se mantêm muito actuais, pelo que as apoiamos novamente sem reservas.

5.4.3.2

Actualmente, assistimos de novo à identificação e repetição das mesmas dificuldades expressas há alguns anos, sobre as quais o Comité manifestou a sua opinião. Consideramos que, sobretudo no sector audiovisual, as medidas tomadas, as acções empreendidas e os projectos apoiados não conseguiram ainda solucionar os problemas estruturais identificados há anos. Tal, na opinião do Comité, representa também um problema, já que, apesar de tudo, as instituições da União Europeia não foram eficazes na sua resolução.

5.4.4

Parecer sobre a proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um programa de formação para os profissionais da indústria europeia de programas audiovisuais (MEDIA Formação) e sobre a proposta de decisão do Conselho relativa a um programa de incentivo ao desenvolvimento, à distribuição e à promoção de obras audiovisuais europeias (MEDIA Plus) (13).

5.4.4.1

Se, na referência ao parecer anterior, evocávamos a identificação dos problemas por resolver que afectavam e afectam o sector audiovisual, nos pontos 1.3 e 1.4 do referido parecer estes problemas são mais uma vez salientados em termos muito semelhantes, acrescentando mais alguns desafios.

5.4.4.2

No ponto 3.1 das observações, o Comité apoia a proposta de decisão porquanto esta prevê medidas complementares que favorecem a divulgação do património cultural comum, mas faz notar que, tratando-se da promoção da nossa identidade cultural, a proposta deveria dar maior relevo a este aspecto.

5.4.4.3

Por último, do referido parecer salientamos a observação formulada no ponto 3.3. Parece-nos correcto que se não deva falar dos problemas e soluções das indústrias culturais sem referir previamente a mencionada observação, cuja actualidade reafirmamos no nosso parecer exploratório.

5.4.4.4

O Comité afirma o seguinte: «O Comité lamenta que a proposta não tenha tido em consideração que a importância da indústria audiovisual europeia não radica unicamente na sua dimensão empresarial, mas também na sua qualidade de veículo promotor da nossa cultura e dos nossos valores democráticos». O Comité defende, assim, o reconhecimento da dimensão cultural da indústria audiovisual.

5.4.5

Em 24 de Setembro passado, a assembleia plenária do Comité adoptou um novo parecer sobre a proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que modifica a Decisão n.o 163/2001/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 19 de Janeiro de 2001 relativa à execução de um programa de formação para os profissionais da indústria europeia de programas audiovisuais e sobre a proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que modifica a Decisão n.o 821/2000/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 2000, relativa à execução de um programa de incentivo ao desenvolvimento, distribuição e promoção de obras audiovisuais europeias (14).

5.4.5.1

Nos pontos 2.1 e 2.2 do referido parecer, o Comité considera que teria sido mais conveniente que a Comissão houvesse criado as condições e adoptado as medidas necessárias para antecipar o debate e a apresentação dos novos programas plurianuais, em vez de se limitar a prolongar a vigência dos actuais. O Comité manifesta-se uma vez mais esperançado em que sejam tidas em conta as sugestões e propostas formuladas no presente parecer e nos anteriores.

5.5   O Comité Económico e Social Europeu e o Programa Cultura 2000

5.5.1

O Comité lamenta não ter podido apresentar as suas observações ao referido programa, devido à expressa limitação estabelecida no ponto 5 do artigo 151.o do Tratado CE. O referido artigo não prevê que o Comité seja consultado quando se tratar de aplicar medidas de fomento da Cultura, embora, graças às disposições do artigo 157.o , deva ser consultado quando se tratar de medidas de apoio à indústria em geral e às indústrias culturais em particular.

5.5.2

Se o Comité representa a sociedade civil organizada, não é compreensível a ausência da sua opinião quando se debatem aspectos da política cultural da União, uma vez que o Comité considera que a cultura faz parte do modelo social europeu.

5.5.3

Em Abril de 2003, a Comissão publicou um documento de consulta pública intitulado «Conceber o futuro programa de cooperação cultural da União Europeia após 2003» (15). Este documento pretende abrir o debate sobre acções futuras a desenvolver após o termo do programa Cultura 2000.

5.5.4

Com o objectivo de divulgar a opinião do Comité sobre este programa que, directa ou indirectamente, afectará os agentes culturais, desde criadores a produtores ou editores, e que por último incide nas indústrias culturais, o Comité deveria elaborar um parecer de iniciativa que reflectisse a sua opinião sobre a matéria.

6.   DESAFIOS CULTURAIS E SOCIOECONÓMICOS QUE AS INDÚSTRIAS CULTURAIS TÊM QUE ENFRENTAR NA EUROPA

6.1   Necessidade de definir o que se entende por indústrias culturais e de identificar os sectores de actividade que englobam

6.1.1

Ao longo do presente documento, temos vindo a evocar uma série de problemas e desafios que a indústria cultural europeia enfrenta. A identificação destes problemas resulta dos numerosos estudos e análises realizados ao longo dos anos.

6.1.2

Como referido anteriormente, no conceito de indústrias culturais incluem-se actividades produtivas muito diversas, relacionadas com a cultura. Cada sector de actividade, no âmbito das indústrias culturais, apresenta uma problemática e interesses definidos que tornam difícil simplificar os problemas e as soluções relativas ao conjunto das indústrias culturais.

6.1.3

Seria, assim, necessário determinar quais as actividades que se enquadram nas chamadas indústrias culturais, com vista a identificar os problemas específicos que afectam cada sector de actividade e as possíveis soluções concretas a aplicar a cada um.

6.1.4

No ponto 4 do presente parecer, o Comité expressa a sua opinião sobre o que se deve entender por indústrias culturais e sobre os sectores que as constituem. Tratando-se de sectores muito variados e com uma problemática dispersa, a posição do Comité deve ser genérica, adoptando uma perspectiva horizontal quanto aos grandes desafios que afectam as indústrias culturais no seu conjunto ou que incidem em mais do que um dos sectores de actividade identificados no parecer.

6.2   Desafios resultantes da diversidade linguística

6.2.1

Em todas as análises realizadas, a diversidade linguística da Europa surge como um ponto forte e, ao mesmo tempo, como uma fragilidade. Ponto forte porque é um factor enriquecedor na medida em que representa uma multiplicidade de formas de expressão do que de mais positivo existe na cultura de que procedem. Fragilidade porque, vista, não de uma perspectiva cultural, mas sim industrial, representa um factor de encarecimento da produção e um factor de dificuldade na distribuição. É normal que esta fragilidade se verifique numa Europa multilingue; o Comité entende, no entanto, que os poderes públicos da União, dos Estados e das regiões da Europa devem contribuir para o reforço dessa diversidade, apoiando todas as acções e investigações que visem superar a referida fragilidade.

6.3   Problemas específicos que afectam as empresas do sector cultural

6.3.1

Tratando-se de um sector que abrange indústrias de tipos muito diferentes, as empresas que desenvolvem a sua produção neste domínio têm problemas de índole muito diversa. Importaria estabelecer uma norma, de forma a captar a indústria cultural europeia estatisticamente como uma só. Com base nos dados recolhidos, poderia desenvolver-se um plano de acção comum que tivesse em consideração tanto os sectores a título individual como também as regiões e que definisse objectivos, estratégias e medidas.

6.3.2

Da mesma forma que assistimos a uma grande concentração de empresas editoriais, também verificamos como o sector audiovisual continua excessivamente fragmentado para poder fazer face ao seu principal concorrente, a indústria norte-americana. Tanto no presente documento, como nos debates do grupo de estudo incumbido da elaboração do presente parecer, como na proposta de resolução do Parlamento Europeu elaborada pela eurodeputada Myrsini ZORBA, salientam-se alguns elementos comuns que surgem como os principais desafios que a indústria cultural e, sobretudo, a indústria audiovisual, têm de enfrentar. Tais elementos são, fundamentalmente:

a)

Falta de investimento, com um défice crónico do mesmo e uma incapacidade manifesta para mobilizar recursos financeiros, o que põe em risco a viabilidade comercial das empresas.

b)

Baixo investimento económico no planeamento e na realização de projectos audiovisuais, o que diminui a rentabilidade das obras e reduz a capacidade de investimento futuro.

c)

Insuficiente capitalização das empresas, o que enfraquece a sua estratégia industrial de desenvolvimento à escala internacional.

d)

Falta de apoio regulamentar em aspectos como a tributação, em especial no que se refere ao IVA, dada a grande diversidade da sua aplicação aos diferentes produtos culturais e nos diferentes países.

e)

Falta de apoio regulamentar para eliminar os obstáculos à mobilidade dos artistas e dos criadores. Continuam a existir mais obstáculos à mobilidade dos cidadãos do que à das mercadorias, se considerarmos como tal as obras culturais.

f)

Problemas relacionados com a distribuição, que se caracteriza pela sua debilidade relativamente à distribuição norte-americana e por uma escassa circulação transnacional das obras, à qual se alia a dificuldade para elaborar catálogos de obras ou listas de produções disponíveis para distribuição. Estes problemas afectam as empresas relacionadas com produtos audiovisuais e editoriais, quer escritos quer fonográficos.

g)

Dimensão insuficiente do mercado, fundamentalmente resultante da fragmentação e da compartimentação dos mercados nacionais, bem como da diversidade linguística, que – vista exclusivamente do ponto de vista industrial – representa um factor de encarecimento e dificulta a distribuição. Esta fragmentação dos mercados nacionais ou regionais debilita a circulação transnacional de programas e obras na Europa.

h)

Debilidade dos investimentos na promoção e na publicidade aos níveis europeu e internacional.

i)

Crescente pirataria e usurpação das marcas no sector audiovisual e fonográfico, o que pode conduzir as empresas a uma situação insustentável. O direito à propriedade intelectual deve prevalecer sobre o direito de reprodução de uma obra para uso particular. A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo do Comité Económico e Social Europeu elaborou um parecer (16) sobre a proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às medidas e procedimentos destinados a assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual.

6.4   Desafios relacionados com a globalização

6.4.1

Na opinião do Comité, um dos principais problemas que as indústrias culturais, em especial as audiovisuais e fonográficas, da União Europeia enfrentam decorre da globalização do intercâmbio de produtos culturais que experimentamos. A posição da indústria norte-americana é evidente, sendo enorme o excedente comercial de produtos audiovisuais dos Estados Unidos relativamente à União Europeia.

6.4.2

Para competir com essa indústria temos de ser imaginativos e não restritivos. Devemos reforçar a cooperação na Europa e promover um clima favorável ao desenvolvimento da indústria europeia, fomentando a sua expansão na própria Europa e apoiando a sua exportação.

6.5   Problemas que a União Europeia deve enfrentar

6.5.1

O Comité considera que não podemos afirmar que existe uma estratégia global na União Europeia nesta matéria. Se queremos apoiar a nossa indústria cultural temos que implementar uma política cultural na União Europeia, respeitando, naturalmente, o princípio da subsidiariedade, coordenando as políticas nacionais com um objectivo cultural comum que permita manter uma indústria cultural europeia competitiva.

6.5.1.1

O Comité considera ser necessário implementar essa política a nível da União, estabelecendo estratégias claras, reforçando o Espaço Cultural Europeu e promovendo a cultura europeia para além das nossas fronteiras.

6.5.2

A política cultural é, efectivamente, uma política transversal que deve interligar as políticas comunitárias para criar uma sinergia que apoie, de forma clara e precisa, os esforços envidados. Existe uma dispersão considerável de esforços e de acções nos diferentes programas que referimos no presente documento, os quais, separadamente, estão a alcançar progressos incontestáveis, mas que de uma forma coordenada poderiam, talvez, aliar sinergias e conseguir um melhor resultado. A descentralização, provocada pela transversalidade que a política cultural representa, não deve nunca afectar a eficiência na concretização dos objectivos estabelecidos.

6.5.3

As indústrias culturais da União Europeia podem prestar um importante contributo para o cumprimento dos objectivos de Lisboa, no que respeita à criação de emprego.

6.5.3.1

Outro dos problemas que a União deverá enfrentar é a dotação orçamental das acções de apoios à cultura e, por extensão, às indústrias culturais. Ninguém ignora que o orçamento atribuído aos diferentes programas directamente relacionados com a cultura e com as indústrias audiovisuais e as dotações atribuídas aos projectos enquadrados nas linhas de acção de outros programas relacionados com a cultura são realmente escassos para pretender um arranque do sector audiovisual, em particular, e da indústria cultural, em geral. As instituições europeias devem analisar quais os sectores produtivos com maior projecção e nos quais se prevê a criação de mais emprego e, nesse sentido, apoiar de forma clara o sector industrial cultural, que, nas suas diferentes formas de expressão, oferece perspectivas de crescimento cada vez maiores.

7.   CONTRIBUIÇÃO DA EUROPA PARA DAR UMA RESPOSTA SÓLIDA A ESTES DESAFIOS

Sem reiterarmos as opiniões manifestadas pelo Comité ao longo do presente documento e, mais concretamente, nos capítulos 5 e 6, podemos aduzir as seguintes observações sobre a forma de enfrentar os problemas que afectam as indústrias culturais.

7.1   Política cultural para a União Europeia

7.1.1

O Comité considera que uma política cultural a nível europeu deverá favorecer o acesso dos cidadãos da União ao conhecimento da identidade cultural que nos une, à recuperação dos valores europeus característicos e ao conhecimento da diversidade cultural das diferentes regiões da Europa, para que possam aprender a viver na diversidade.

7.1.2

Nesse sentido, o Comité partilha da opinião manifestada na resolução do Parlamento Europeu de 4 de Setembro de 2003, segundo a qual a cultura constitui um elemento essencial e unificador da vida quotidiana e da identidade dos cidadãos da Europa.

7.1.3

Por isso, a existência de uma política cultural comum na União Europeia não deverá ser entendida da perspectiva da intromissão nas competências regionais e/ou do Estado, mas como um elemento dinamizador da própria cultura para promover o que nos une.

7.2   Por um Espaço Cultural Europeu

7.2.1

O Comité partilha plenamente o teor da resolução de 5 de Setembro de 2001 do Parlamento Europeu que considerava oportuno, para o futuro da União, reforçar a dimensão cultural, tanto a nível político como a nível orçamental, fomentando a cooperação entre os Estados-Membros, com vista a permitir a criação de um «Espaço Cultural Europeu».

7.2.2

A criação desse Espaço Cultural Europeu implica uma dupla geração de riqueza: a riqueza cultural entendida por si mesma e a riqueza económica e social que ela gera, através das indústrias culturais.

7.2.3

A cooperação entre os diversos agentes culturais contribui para a criação do espaço cultural europeu, para o desenvolvimento da criação artística e literária, para o conhecimento da história e da cultura europeias, para a divulgação interna e internacional da cultura, para a revalorização do património de relevância europeia especial e para o diálogo intercultural.

7.2.4

O Comité propõe, assim, a ponderação das seguintes iniciativas:

Criação de incentivos à promoção da criação artística e ao estabelecimento de instrumentos que permitam aos criadores fazer chegar as suas criações aos cidadãos.

Apoio ao intercâmbio de espectáculos ao vivo e ampliação dos respectivos circuitos para além das fronteiras nacionais.

Sistema de apoio à difusão das produções audiovisuais através da Internet, da televisão por satélite e da televisão temática.

Uma ligação mais estreita entre as indústrias culturais e a investigação e o desenvolvimento tecnológico, de forma a poder oferecer-se produtos e serviços inovadores, de maior valor acrescentado.

7.3   Definição das indústrias culturais

7.3.1

O Comité considera que não se pode falar de indústrias culturais sem se ter previamente delimitado o seu campo de actuação, embora este seja o mais extenso possível, e sem necessitar de aplicar critérios restritivos à conceptualização, a qual pode manter uma lista não restritiva.

7.3.2

A diversidade de sectores incluídos no conceito de «indústrias culturais» suscita uma problemática tão variada como os diferentes sectores a que nos referimos. Para poder determinar quais os problemas e soluções aplicáveis ao conjunto das indústrias e a cada sector específico, é necessário, na opinião do Comité, definir o que se deve entender por «indústrias culturais» e seriar os sectores de actividade criativa e produtiva que as integram.

7.3.2.1

O Comité contribui para esta definição pelos critérios evocados na secção 4 do presente parecer.

7.3.3

Dessa perspectiva, as medidas destinadas a apoiar o sector cultural serão aplicadas com uma estratégia mais integradora e globalizante, apesar da transversalidade que deve presidir a uma política cultural.

7.4   Apoio à indústria cultural

7.4.1

Na perspectiva da aplicação do artigo 157.o, a União Europeia tem, para com as indústrias culturais, tal como para qualquer outro sector industrial, a obrigação de criar um ambiente favorável ao seu desenvolvimento para que possam beneficiar dos resultados da investigação, dos avanços tecnológicos, de um melhor acesso ao financiamento e das vantagens da cooperação num espaço europeu da cultura.

7.4.1.1

As indústrias criativas não dispõem, geralmente, de um modelo de acesso ao financiamento eficaz para satisfazer as suas necessidades. Os bancos e os serviços financeiros consideram habitualmente que as indústrias criativas são empresas de alto risco.

7.4.1.2

Com um sistema de garantia de crédito, uma entidade financeira poderia cobrir todo ou parte do risco do financiamento atribuído a uma indústria criativa, para o caso de ela não o poder reembolsar.

7.4.1.3

Neste contexto, poder-se-ia ponderar a criação de um apoio comunitário através do Banco Europeu de Investimento, com participação da União Europeia, a desenvolver pela via de intermediários financeiros escolhidos nos Estados-Membros.

7.4.1.4

Neste contexto, é de referir igualmente a iniciativa da Comissão de um programa de acção comunitária para a promoção de organismos activos no plano europeu no domínio da cultura.

7.4.2

Os desafios resultantes dos problemas que afectam as empresas do sector cultural devem ser objecto de uma análise mais aprofundada e abordados com a certeza da sua resolução, evitando a perpetuação das anomalias, como ocorre no sector audiovisual, em que se registam sempre os mesmos problemas sem que para eles se encontre uma solução definitiva.

7.4.3

A Comissão e os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para assegurar que os cidadãos activos nas indústrias criativas possam desfrutar dos mesmos direitos de mobilidade que os seus produtos e obras e de estabelecimento, de acordo com as disposições do Tratado.

7.4.4

Uma vez que alguns dos problemas que os operadores destes sectores têm que enfrentar derivam da sua falta de conhecimentos e de capacidade de gestão, ou da dificuldade de acesso aos mesmos, a Comissão e os Estados-Membros deveriam proporcionar os meios necessários para que as indústrias criativas recebessem assistência, informação e formação, na linha da que se oferece às pequenas e médias empresas, mas com uma oferta específica orientada para este tipo de indústrias. Neste sentido, haveria que alargar a outros âmbitos as iniciativas do tipo Media Desk.

7.5   Educação e sensibilização para a cultura

7.5.1

As indústrias culturais têm, antes de mais, necessidade de um público, de espectadores, ouvintes, consumidores. É necessário que os cidadãos, sobretudo os jovens, sejam sensibilizados e experimentem o gosto pela obras culturais. Para tal, importará promover e intensificar as acções relacionadas com a educação e a iniciação à cultura, sobretudo nas escolas. Com efeito, é sobretudo na família e na escola que se pode transmitir uma atitude aberta face à cultura e à diversidade do património cultural.

7.5.2

Os poderes públicos e a escola têm um papel importante neste âmbito. A televisão e a rádio, meios públicos ou privados presentes em todas os lares, devem despertar a atenção à cultura, difundindo programas de educação cultural e de valorização do património cultural.

7.5.3

Ao nível europeu, importaria criar uma plataforma com vista a estabelecer medidas comuns de sensibilização e interligar as iniciativas nacionais.

7.6   Apoio aos criadores e aos artistas

7.6.1

A Comissão e os Estados-Membros devem trabalhar com vista à eliminação efectiva dos obstáculos e dificuldades que ainda possam impedir a livre circulação dos artistas e criadores. É tão necessário permitir a circulação das mercadorias culturais como a circulação dos seus criadores, autores e intérpretes.

7.6.2

Por conseguinte, com o propósito de procurar soluções para os múltiplos problemas que afectam os criadores e os artistas, partilhamos a opinião manifestada na resolução do Parlamento Europeu sobre a criação de um «estatuto do artista» que permita garantir protecção social aos artistas e criadores e favorecer a sua mobilidade, e no qual se inclua, de forma clara, a legislação relativa aos direitos de propriedade intelectual.

7.6.3

Também as pequenas e microempresas da indústria cultural deveriam ser apoiadas no desenvolvimento das suas actividades comerciais, através da criação de plataformas de cooperação e da disponibilização da correspondente formação. O apoio em exposições, feiras, apresentações e missões comerciais pode ajudar estas empresas a imporem-se nos mercados internacionais.

7.7   Indústria cultural, liberdade e pluralismo

7.7.1

»A cultura liberta-nos« é uma expressão cujo sentido aqueles que vivem em países com instituições democráticas consolidadas conhecem.

7.7.2

Fortalecer a cultura e fomentar e promover o livre acesso dos cidadãos a ela é pois fundamental para garantir o efectivo respeito do direito à liberdade de expressão e de informação, afirmado pelo art. 11.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

7.7.3

Para além da vertente económica e social, a importância da indústria cultural assenta no seu potencial de vector da promoção dos valores democráticos da Europa. Através mesmo de uma constante actualização do quadro legal, pelo que é fundamental assegurar a concorrência e o pluralismo da indústria cultural face à progressiva globalização dos mercados, à crescente convergência dos meios de comunicação, favorecida pela afirmação das tecnologias digitais, à concentração progressiva dos grupos proprietários.

7.7.4

Por conseguinte, é necessário manifestar uma vez mais o nosso apoio a todas as iniciativas e propostas europeias de defesa do pluralismo da informação e da cultura e de garantia do controlo de todas as concentrações.

Bruxelas, 28 de Janeiro de 2004

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Roger BRIESCH


(1)  Resolução do Parlamento Europeu sobre as indústrias culturais (P5-TA-PROV (2003)0382).

(2)  Decisão 719/1996/CE.

(3)  Decisão 2085/1997/CE.

(4)  Decisão 2228/1997/CE.

(5)  Decisão 508/2000/CE.

(6)  COM(2003) 0187.

(7)  Decisão 163/2001/CE.

(8)  Decisão 821/2000/CE.

(9)  http://www.unesco.org/culture/industries/html_sp/index_sp.shtml.

(10)  JO C 329, de 17/11/1999.

(11)  JO C 148, de 30/05/1994.

(12)  JO C 256, de 2/10/1995.

(13)  JO C 168, de 16/06/2000.

(14)  JO C 10, de 14/1/2004.

(15)  http://europa.eu.int/comm/cutlture/eac/archive/consult_pub_en.html.

(16)  COM(2003) 46 final.


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social Europeu

Foram rejeitadas as seguintes propostas de alteração, que recolheram pelo menos um quarto dos votos expressos:

Novo ponto 2.1.1.3

«Considerar algo cultura parte de uma decisão subjectiva, por isso é difícil apresentar uma definição precisa. A cultura engloba também todas as formas de manifestações desportivas e todas as actividades desenvolvidas pelas populações europeias no âmbito de diversas formas de associação, como por exemplo a música folclórica, as danças folclóricas e o artesanato.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 16, votos contra: 37, abstenções: 7.

Novo ponto 2.1.1.4

«Na Europa também temos o dever de preservar e desenvolver a cultura particular das populações da Lapónia e de outras populações autóctones e minoritárias. Nesse contexto, a língua constitui um aspecto especialmente importante.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 21, votos contra: 44, abstenções: 9.

Novo ponto 2.1.2.1

«A cultura não tem a ver apenas com os artistas, mas também com os consumidores. Predomina um grande desequilíbrio no que se refere ao acesso à cultura, uma questão essencial em termos de política cultural. Todos os cidadãos devem ter o direito e a possibilidade de produzir e receber cultura.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 30, votos contra: 36, abstenções: 4.

Novo ponto 4.2.2.2

«Numa Europa cada vez mais multicultural é especialmente importante zelar pelas culturas próprias dos novos Estados-Membros.».

Resultado da votação:

Votos a favor: 26, votos contra: 31, abstenções: 8.


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