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Document 52000AC0811

Parecer do Comité Económico e Social sobre «A Comissão e as organizações não governamentais: reforço da parceria»

OJ C 268, 19.9.2000, p. 67–73 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

52000AC0811

Parecer do Comité Económico e Social sobre «A Comissão e as organizações não governamentais: reforço da parceria»

Jornal Oficial nº C 268 de 19/09/2000 p. 0067 - 0073


Parecer do Comité Económico e Social sobre "A Comissão e as organizações não governamentais: reforço da parceria"

(2000/C 268/15)

Em 25 de Janeiro de 2000, a Comissão decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre o documento supramencionado.

Na reunião plenária de 26 e 27 de Janeiro de 2000, o CES decidiu criar, nos termos do disposto no n.o 4 do artigo 11.o e n.o 1 do artigo 19.o do Regimento, um subcomité para elaborar um projecto de parecer.

O subcomité emitiu projecto de parecer em 28 de Junho de 2000 (relatora: A.-M. Sigmund).

Na 374.a reunião plenária de 12 e 13 de Julho de 2000 (sessão de 13 de Julho), o Comité Económico e Social adoptou por 92 votos a favor, 16 votos contra e 21 abstenções o seguinte parecer.

1. Introdução

1.1. No documento de reflexão sobre o tema "A Comissão e as organizações não governamentais: reforço da parceria(1)" a Comissão formula propostas tendentes a aumentar a eficácia da sua cooperação com as ONG e a assegurar uma melhor utilização dos recursos orçamentais previstos para o efeito. Este documento integra-se no contexto do programa geral de reforma da Comissão; constitui também uma resposta à reestruturação socioeconómica e à maior projecção das ONG. O número de organizações da sociedade civil prontas e em condições de participar num modelo europeu de democracia participativa aumentou sensivelmente nos últimos 20 anos e esses representantes da sociedade civil organizada fazem valer, com razão, o valor acrescentado que podem trazer para a construção europeia. Neste contexto, o Comité já se pronunciou no parecer de 10 de Dezembro de 1997 sobre "A cooperação com as organizações de solidariedade enquanto actores económicos e sociais no campo da assistência social(2)" e no parecer de 28 de Janeiro de 1998(3) sobre a "Comunicação da Comissão sobre a promoção do papel das associações e das fundações na Europa".

1.2. No ano passado, por ocasião de uma Convenção(4), o Comité analisou em pormenor o papel e a contribuição da sociedade civil organizada para a integração europeia. Para preparar esta Convenção, o comité adoptou um parecer em 23 de Setembro de 1999(5) que, a par de uma análise histórica da sociedade civil, abordou as características e especificidades das organizações que a representam. Por último, este parecer apresentou também propostas sobre as formas e os recursos de que o Comité dispõe, na sua qualidade de fórum da sociedade civil organizada, para cumprir a missão que lhe foi conferida pelos Tratados. As conclusões desta "Primeira Convenção da Sociedade Civil Organizada a nível europeu", de Outubro de 1999, confirmaram a importância do Comité enquanto fórum institucional da sociedade civil organizada. Ainda durante esta manifestação, a Comissão convidou o Comité a reforçar as suas iniciativas neste domínio.

1.3. As reflexões e propostas do Comité, incluídas no parecer de Setembro de 1999, devem ser consideradas parte integrante do presente parecer que lhes dá continuidade. O parecer tem também em conta os debates sobre a Convenção, de Outubro passado, e ainda as conclusões da audição dos representantes da sociedade civil organizada, em 28 de Abril de 2000.

1.4. O presente parecer destina-se a analisar o documento de reflexão na perspectiva da concretização, pretendida pelo Comité, das orientações saídas da Convenção, elaboradas com os representantes da sociedade civil organizada. Assim, o Comité não tem de modo nenhum a intenção de intervir nos processos que já deram provas no plano operacional. Mas os membros do Comité entendem dever assumir plenamente as suas responsabilidades como representantes(6), na acepção do artigo 257.o do Tratado, da sociedade civil organizada, dispondo-se a contribuir, com os seus conhecimentos especializados, para a criação de sinergias entre a sociedade civil organizada e as instituições comunitárias. Uma vez que o Comité é a única instituição europeia que representa toda a sociedade civil organizada, está vocacionado e tem condições para contribuir com o correspondente valor acrescentado para este projecto.

1.5. Por este motivo, o Comité analisará apenas os aspectos fundamentais e de conteúdo da cooperação da Comissão com as ONG e só abordará questões relativas ao orçamento, à afectação e à utilização de recursos, também analisadas no documento de reflexão da Comissão, se implicarem questões de fundo relevantes para o presente parecer.

2. Observações na generalidade

2.1. A própria Comissão sublinha a ligação estreita existente entre o documento de reflexão e as suas propostas de reforma administrativa e indica que "é evidente que as propostas específicas devem ser estabelecidas no âmbito do processo global de reforma administrativa(7)" . As reflexões da Comissão sobre a forma de facilitar a actividade das ONG e de melhorar os processos de consulta existentes são elaboradas na óptica de uma melhoria da transparência e da responsabilidade e de um reforço da eficácia e a coordenação das relações de trabalho da Comissão com as ONG.

O Comité saúda esta iniciativa da Comissão tendente a suprimir as deficiências a nível da cooperação operacional com as ONG e a tomar medidas que permitam melhorar mais ainda a cooperação. Para o Comité, é também neste sentido que se deve interpretar o título do documento de reflexão.

2.1.1. O Comité aprecia vivamente o presente documento de reflexão e considera-o um primeiro contributo da Comissão no sentido de melhorar, através de propostas administrativas, a base de cooperação com as ONG. A Comissão reconheceu, e bem, que, por uma questão de credibilidade, os princípios de eficácia, responsabilização, transparência, responsabilidade e serviço devem ser rapidamente convertidos em medidas concretas. Os cidadãos da Europa estão cépticos em relação às declarações programáticas de Bruxelas. Trata-se, portanto, de passar das palavras aos actos. Por este motivo, o Comité apoia a abordagem pragmática da Comissão de criação de estruturas claras, com que pretende facilitar e melhorar as possibilidades de participação dos cidadãos ou dos seus representantes. Esta intenção coincide plenamente com os objectivos do Comité que pretende também contribuir para um espaço europeu de liberdade, segurança e direito. No ver do Comité, são ainda necessários esforços de reforma, e os correspondentes pré-requisitos jurídicos e administrativos, para que a democracia participativa e a proximidade dos cidadãos na Europa possam também tornar-se uma realidade.

2.1.2. No entanto, o Comité considera igualmente essencial definir claramente o alcance do documento de reflexão para evitar mal-entendidos e não suscitar falsas expectativas. Portanto, a Comissão devia ter afirmado claramente que, com este documento, pretendia antes de mais organizar mais eficazmente a sua parceria com as ONG a nível europeu, mas não contribuir para a definição e concretização do diálogo civil.

2.2. Não há dúvida de que os parceiros sociais e as ONG europeias, dentro das suas respectivas competências, são os parceiros privilegiados da Comissão em matéria de consulta, e devem continuar a sê-lo. O mesmo sucede com os demais representantes da sociedade civil organizada, mas em especial com os parceiros sociais europeus. Esta situação não exclui a possibilidade de, em determinados casos, se consultarem as ONG nacionais, ou mesmo regionais e locais. Poderia ser esse o caso, se a experiência das várias organizações pudesse contribuir para obter soluções e não existisse (ainda) uma organização a nível europeu.

2.2.1. O Comité convida, portanto, a Comissão a tomar as disposições necessárias para que as ONG nacionais, ainda não representadas a nível europeu, não sejam a priori excluídas do processo de diálogo e de consulta, mas sejam admitidas em casos excepcionais. O Comité considera extremamente importante que as ONG criem sólidas estruturas organizativas a nível nacional, criando assim, segundo o princípio "de baixo para cima", as condições necessárias para o estabelecimento de fortes redes europeias.

2.2.2. No entanto, o Comité considera absolutamente essencial que as ONG que desejem participar no processo de consulta se estruturem a nível nacional e depois europeu, concretizando entre elas formas de cooperação, como a criação de redes ou de estruturas federadoras, que lhes permitam dialogar eficazmente umas com as outras e com as instituições comunitárias.

2.2.3. Neste contexto, o Comité considera que a Comissão deveria incentivar concretamente este processo de estruturação a nível europeu, o que viria ao encontro de preocupações, expressas no documento de reflexão, de racionalização dos processos de diálogo e de consulta com as ONG.

2.2.4. Segundo o Comité, é indispensável que, para efeitos de financiamento, a Comissão defina uma lista de critérios (representatividade e autofinanciamento, etc.) e regras processuais claras (orçamentação plurianual que permita um planeamento a mais longo prazo para as ONG, processos de revisão e avaliação periódicas com os respectivos sistemas de gestão e controlo, etc.). Em todo o caso, deve-se evitar que o financiamento seja influenciado por considerações políticas. O Comité contribuirá activamente para essa definição, em que também têm de participar as ONG. Considera essencial esse financiamento - executado e controlado segundo critérios objectivos - visto que assim se pode evitar que, para continuarem a trabalhar, as ONG europeias procurem o financiamento por patrocinadores comerciais ou "grupos de pressão" nacionais. A Comissão criaria assim as condições para a existência de parceiros independentes num futuro diálogo civil.

2.2.5. No âmbito da lista de critérios acima referida, assume importância fulcral a questão da avaliação da representatividade das ONG. Aferir a representatividade das ONG pelo número dos seus membros equivaleria a interpretar erradamente os princípios essenciais da sociedade civil. As iniciativas da sociedade civil surgem frequentemente onde não existe (ainda) consciência generalizada dos problemas, tal como há anos no domínio do ambiente. Por isso, as ONG agem muitas vezes contra a maioria com um mandato das minorias. Um bom exemplo desta situação encontra-se na tradição sindical: na altura da sua fundação, os sindicatos defendiam o interesse geral, mas (ainda) sem um número representativo de membros. Sem querer aludir às negociações e consultas, o Comité considera desde já que a avaliação da representatividade das ONG de modo algum deve obedecer a critérios puramente quantitativos, devendo satisfazer também critérios qualitativos. Portanto, a representatividade das ONG não se define exclusivamente pelo número de membros representados, mas também pela sua contribuição, com propostas construtivas e conhecimentos especializados, para um consenso e um processo de decisão democráticos.

2.3. O referido "diálogo civil" é mencionado frequentemente nos debates sobre as possíveis formas de participação da sociedade civil organizada a nível comunitário. Aparentemente, as pessoas que se lhe referem nem sempre estão de acordo quanto às condições ou ao âmbito em que se deve processar, nem quanto aos participantes ou aos objectivos deste diálogo civil. Um certo número de organizações reivindicaram já uma base jurídica para o diálogo civil. Segundo o Comité, devem ser esclarecidas primeiro várias questões prévias, nomeadamente quanto à finalidade, conteúdo, processos e organização.

2.3.1. O Comité, na qualidade de representante institucional de toda a sociedade civil organizada, contribuirá construtivamente também neste caso para a criação deste discurso público. O diálogo civil como condição prévia de um modelo europeu de democracia participativa deve, na opinião do Comité, antes de mais ter estruturas gerais de organização e de conteúdo e desenvolver-se então nos domínios em que já exista em embrião.

2.3.2. No parecer sobre a Conferência Intergovernamental, o Comité propôs uma nova redacção para o artigo 257.o do TCE, do seguinte teor: "Constituem o Comité representantes das diversas componentes de natureza económica e social da sociedade civil organizada." O Comité vê com agrado a apreciação positiva que a Comissão faz deste texto e espera que a Conferência Intergovernamental o adopte. Assim, a sociedade civil (organizada) tornar-se-ia um conceito jurídico e as eventuais questões em aberto sobre os participantes no diálogo civil seriam esclarecidas ex lege.

3. Organizações não governamentais

3.1. Durante as últimas décadas, o rápido desenvolvimento das ONG em muitos sectores foi simultaneamente condição e consequência de uma profunda evolução socioeconómica e de uma sensibilização política, pelo que as ONG são, em certa medida, um reflexo desta evolução. Por este processo estar longe de estar concluído, é praticamente impossível dar uma definição final de ONG. Aliás, o próprio nome o mostra, pois constitui apenas uma delimitação pela negativa e indica apenas o que as ONG não são. Por isso, o Comité se congratula também com as iniciativas que procuram dar-lhes uma definição positiva, como a tentativa de as denominar "organizações da sociedade civil" (OSC).

3.1.1. Em geral as ONG têm vindo a adquirir cada vez mais importância e desenvolvido consideravelmente as suas funções, responsabilidades e competências. No caso de um certo número delas o seu campo de acção ultrapassa já o nível local de que provêm, actuando, hoje, ao nível comunitário. Sem dúvida que, historicamente, pelas suas competências e estruturas, as ONG são associações geralmente provenientes "da base", que na essência, são a expressão da proximidade dos cidadãos e promovem a democracia participativa. Colectivamente, deveriam preocupar-se também com o bem comum da sociedade nas suas várias componentes.

3.1.2. Neste contexto, o Comité lembra que as ONG não representam todos os actores da sociedade civil organizada. Tal como o Comité referiu no parecer de 29 de Setembro de 1999, os parceiros sociais constituem o núcleo da sociedade civil organizada que, com a referida evolução, se alargou a muitos domínios e se expandiu numa multiplicidade de ONG. As características comuns referidas no ponto 1.2 do documento da Comissão não lhes dizem exclusivamente respeito. A Comissão também não toma em consideração a diversidade dessas organizações. Nesta matéria, o Comité remete para o parecer de Setembro passado, já referido, e em especial para as secções 5 a 7.

3.1.3. A Comissão sublinha que "o processo de tomada de decisão na UE é, em primeiro lugar ..., legitimado pelos representantes eleitos pelos povos europeus". O Comité contrapõe que a legitimidade, na Comunidade, não deve ser reduzida apenas ao princípio da territorialidade e aos mecanismos das eleições próprios da democracia representativa. É precisamente nos casos de baixa participação eleitoral que se revela a insuficiência do princípio da maioria democrática numérica. Assim, um deputado pode exercer o seu mandato com base na maioria dos votos expressos, mas, em termos numéricos, essa maioria pode constituir uma minoria dos eleitores. Este facto não impede esses representantes de considerarem legítima a sua eleição por uma maioria absoluta (fictícia). A par da legitimidade democrática adquirida pelos representantes eleitos pelos cidadãos, a que se refere a Comissão, há também a dos representantes nomeados que tem por base conhecimentos específicos e experiência. Essa legitimidade é válida tanto para os membros do Comité como para os representantes das ONG e inscreve-se no âmbito do desenvolvimento e da consolidação de um "modelo participativo da sociedade civil" para a elaboração de políticas, modelo esse que "apresenta igualmente a vantagem de reforçar a confiança no sistema democrático, criando assim um clima mais favorável a reformas e inovações(8)".

3.1.4. A democracia participativa requer que as pessoas interessadas num projecto de disposição legislativa sejam associadas ao processo de formação da opinião numa fase precoce e tenham a possibilidade de expor os seus desejos e ideias. Este princípio corresponde precisamente ao modelo participativo da sociedade civil, que, com o seu discurso público, pratica já uma forma de diálogo civil.

3.1.5. Pelo facto de os seus membros pertencerem a organizações da sociedade civil nos Estados-Membros, independentemente de as organizações serem nacionais, regionais ou locais, o Comité faz parte integrante deste modelo participativo da sociedade civil.

4. Reforço da parceria entre a Comissão e as ONG

4.1. A Comissão sublinha, por várias vezes, no documento de reflexão, as diferentes formas de cooperação com as ONG, bem como "as diversas regras de cooperação com a Comissão". No entanto, refere nas conclusões "a necessidade de estabelecer uma abordagem mais coerente nas suas relações com as ONG" e considera desejável "assegurar uma coordenação geral das relações entre a Comissão e as ONG através de um serviço horizontal". Atendendo a que os vários grupos de ONG têm métodos de trabalho e domínios de actividade diferentes, o Comité considera que esse serviço não devia ser responsável por domínios específicos, mas ter principalmente uma função de coordenação e prestar melhores serviços de informação. Uma abordagem do tipo "balcão único", por exemplo, para prestar informações sobre os programas comunitários ou assistência aos requerentes de apoio financeiro, constituiria uma novo avanço concreto e significativo para uma "Europa dos Cidadãos".

4.1.1. Este serviço podia também (a) ter a responsabilidade de garantir o cumprimento das melhores práticas em matéria de consulta, com base num certo número de princípios comuns a definir, mas sem descurar a especificidade dos diferentes sectores de actividade das ONG, nem as suas estruturas e inerentes necessidades. Esse serviço podia (b) contribuir para uma maior transparência, que aliás o Comité reclamara já para as associações e fundações no referido parecer de 28 de Janeiro de 1998. Ao adoptar esse projecto horizontal de informação e coordenação, a que também deviam ter acesso as ONG nacionais, a Comissão contribuiria em grande medida para a criação de estruturas de comunicação mais democráticas e para uma maior proximidade dos cidadãos.

4.1.2. Neste contexto e de um modo geral, é essencial que as condições em que decorrem as consultas (nomeadamente, duração das consultas, disponibilidade dos documentos necessários nas diferentes línguas, recursos humanos necessários para a sua realização) permitam às ONG europeias seguirem, nas relações com os seus membros, uma abordagem "de baixo para cima" e garantirem nas suas próprias estruturas, a transparência que exigem à Comissão. Da prática da democracia participativa pela ONG no seu próprio interior depende igualmente a credibilidade das posições que tomam.

4.2. O reforço da parceria com as ONG, que incide sobretudo nos aspectos técnicos de gestão, pressupõe que se defina claramente com que ONG a Comissão pretende cooperar no futuro. A Comissão tenciona ter "os seus próprios critérios ... para a selecção das ONG" e cita alguns exemplos desses critérios, nomeadamente "a sua participação anterior em comités e grupos de trabalho" e "a sua experiência, que comprove a sua competência para intervir (a título consultivo) num domínio específico"; neste caso, de acordo com a abordagem da Comissão, a instância habilitada para julgar dessa competência seria de novo a Comissão. Para atenuar a impressão de um acesso demasiado monolítico, a Comissão admite então que "a auto-selecção pela comunidade das ONG... pode constituir uma alternativa útil". No entanto, esta alternativa é fictícia, visto que não se refere a critérios, mas apenas ao processo técnico subsequente de nomeação dos representantes das ONG.

4.3. O Comité considera inaceitável um processo de selecção em virtude do qual as novas ONG de facto não têm praticamente possibilidade de cumprir os critérios ("a sua participação anterior em comités e grupos de trabalho"). Este método de selecção é, também, contrário à natureza da sociedade civil, que devia ser encarada não como um fenómeno estático, mas sim dinâmico, e instalaria de uma forma inadmissível um status quo, que impediria totalmente o reconhecimento de novas estruturas e de novas formas de organização das ONG.

4.4. No entanto, nem a própria Comissão parece considerar definitiva esta proposta de solução, pois, mais adiante, a propósito do desejo de maior transparência, afirma que "a questão de saber se devem ser acordados entre as ONG e a Comissão critérios comuns deve ser examinada". Seja como for, esses critérios devem ser objectivos, transparentes e do conhecimento público. A sua definição deverá, além disso, resultar de um processo participado, no qual as ONG estejam incluídas.

4.4.1. As consultas realizadas pelo Comité durante a elaboração do presente parecer revelaram a ausência de consenso, também entre as ONG, favorável à criação de um estatuto consultivo oficial, nomeadamente de um sistema de acreditação. O Comité convida a Comissão a analisar de forma aprofundada as vantagens e inconvenientes de um sistema desse tipo, em função das práticas em vigor na ONU e respectivas organizações especializadas e no Conselho da Europa.

4.4.2. Independentemente dos critérios que venham a ser aprovados para admitir as ONG ao processo de consulta com a Comissão, critérios esses que o Comité pretende ajudar a definir organizando, em especial, audições, o Comité salienta já que este processo de selecção não deve dar origem a estruturas e processos de consulta rígidos, devendo antes ser aberto, transparente e tão fácil de gerir quanto possível para ter plenamente em conta a evolução da sociedade civil europeia. Deverá ser publicada a lista das ONG seleccionadas e instituída uma instância de recurso a que poderão recorrer todas as ONG que se considerem injustamente rejeitadas. O indeferimento pela Comissão deverá ser justificado. De qualquer modo, o Comité deverá ser ouvido no quadro deste processo.

4.5. Outro contributo importante da Comissão para uma maior transparência na sua parceria com as ONG seria a publicação de relatórios de avaliação periódicos, a submeter às ONG para eventuais observações. Para permitir uma análise comparativa e uma avaliação eficaz dos resultados ("benchmarking"), estes relatórios deveriam documentar periodicamente a evolução, assim como a actualização, da cooperação da Comissão com todas as ONG. Aliás, o Comité reclamou já tais relatórios para as associações e as fundações, no parecer de 28 de Janeiro de 1998.

4.6. O Comité recorda a sua opinião de que a Comissão deve deixar claro que a presente tentativa - absolutamente louvável - de reforçar e melhorar as suas parcerias se limita apenas a aperfeiçoar os mecanismos de consulta existentes em termos de gestão e conteúdo. Assim, o seu objectivo é exclusivamente fazer beneficiar os trabalhos da Comissão dos importantes conhecimentos técnicos e estratégicos das ONG em determinados sectores, e não a criação a priori de estruturas para o diálogo civil em geral.

5. Diálogo civil

5.1. A necessidade de uma forma europeia de discurso público no plano comunitário entre os representantes da sociedade civil organizada foi-se desenvolvendo a nível comunitário com a importância que foi adquirindo. O desejo da sociedade civil organizada de um "diálogo civil" enquanto processo democrático e público de formação de vontade está claramente expresso, sendo o seu princípio também aceite pela instituições públicas. Chegou-se a um acordo de princípio em relação a que a Europa deve ser politicamente mais aberta, os processos decisão devem ser mais transparentes e se devem encontrar meios de reavivar o interesse dos cidadãos pela Europa. Os representantes da sociedade civil organizada têm, neste contexto, particular responsabilidade e um papel a desempenhar como mediadores perante os cidadãos.

5.1.1. Tal como o Comité recordou no parecer de Setembro último, a própria Comissão tenciona, a prazo, instituir um verdadeiro diálogo civil a nível europeu, que complemente o diálogo político com as autoridades nacionais e o diálogo social entre parceiros sociais(9). Aliás, deve ser respeitada a natureza específica do diálogo social, não só em relação às competências, mas também às funções dos seus participantes.

5.1.2. No entanto, considera o Comité que, para começar, a Comissão deveria esclarecer certas definições relacionadas com o diálogo civil. O Comité está disposto a efectuar trabalhos preparatórios com as ONG e a formular bases para discussão em colaboração com essas organizações.

5.1.3. Para o Comité, o diálogo civil deveria, em todo o caso, ter as seguintes características(10):

- em princípio, o diálogo civil deve estar aberto a todos os actores da sociedade civil organizada (e, portanto, também aos parceiros sociais);

- o diálogo civil não substitui nem faz concorrência ao diálogo social, que tem participantes e competências exclusivos e claramente definidos, mas serve-lhe de complemento indispensável;

- o diálogo civil pode ser conduzido exclusivamente entre os representantes da sociedade civil organizada, ou entre eles e um órgão ou instituição comunitária; pode versar sobre temas horizontais ou verticais, ou seja, tomar a forma de um diálogo geral ou sectorial;

- o diálogo civil deve dispor das estruturas necessárias ao seu funcionamento; o respectivo domínio de competência deve ser o das questões económicas e sociais(11), com excepção dos aspectos abrangidos pelo diálogo social, mas também o ambiente, o consumo, o desenvolvimento, os direitos do Homem, a cultura e todas as outras matérias importantes para a sociedade civil em todas as suas componentes;

- os participantes no diálogo civil devem também dar a conhecer aos Estados que não pertencem à UE, mas mais particularmente aos países candidatos à adesão, as estruturas de organização e as formas de comunicação da sociedade civil organizada. Esses países devem igualmente beneficiar de ajuda à criação e desenvolvimento de estruturas análogas.

Neste contexto, o Comité convida expressamente as ONG da União Europeia a apoiarem o desenvolvimento da sociedade civil organizada nos países candidatos, criando estruturas de cooperação e procedimentos de intercâmbio e consulta, em particular redes paneuropeias.

6. Conclusões

6.1. No documento de reflexão, a Comissão efectivamente não consagrou um capítulo especial ao "diálogo civil", mas por várias vezes referiu a promoção do "desenvolvimento do diálogo civil", o "reforço da sociedade civil a nível europeu", o compromisso assumido de proporcionar "dentro destes limites, possibilidades de diálogo... com as ONG enquanto representantes da sociedade civil", etc.

6.2. Pelas razões apontadas, o Comité considera especialmente importante apresentar desde já definições claras: a forma de consulta referida pela Comissão no documento de reflexão pode e deve realizar-se no âmbito do diálogo civil, mas não representa o próprio diálogo civil, que deve ser definido de uma forma mais ampla, tanto do ponto de vista institucional como da sociedade civil.

6.3. O Comité reafirma a sua disponibilidade para assumir plenamente o seu papel no âmbito do diálogo civil. Considera que a sua função não é de porta-voz de todas as ONG, nem de intermediário obrigatório das relações das ONG com as instituições comunitárias. O seu objectivo é antes contribuir, como catalisador deste discurso público, para o desenvolvimento da União Europeia com base nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais. Na sua qualidade de representantes directos dos interesses da sociedade civil organizada, os membros do Comité contribuem para que esse desenvolvimento dê resposta às preocupações dos cidadãos e se inscreva numa democracia pluralista e participativa. O Comité esforçar-se-á por que o diálogo civil proporcione à Europa abertura política, que é fonte de transparência, e não só permita a participação, mas também a reivindique. Desta forma, pretende criar sinergias entre as organizações da sociedade civil e as instituições comunitárias, e trazer valor acrescentado às medidas tomadas por essas organizações para criar uma Europa mais próxima dos cidadãos.

6.4. O Comité está plenamente consciente da impossibilidade de influir na nomeação dos seus membros, que - de acordo com o princípio de subsidiariedade - é da competência dos Estados-Membros. Por este motivo, uma das prioridades do Comité consiste em se dotar de meios que lhe permitam associar mais representantes da sociedade civil organizada ao nível comunitário às suas actividades e à execução de iniciativas concretas, no quadro de um processo evolutivo, o que deverá ser feito no respeito da estrutura tripartida do mesmo Comité Económico e Social.

6.4.1. Assim e na sequência da primeira Convenção da Sociedade Civil Organizada a nível europeu, realizada em Outubro de 1999, e tendo em conta o que ficou exposto, o Comité persegue dois objectivos também prioritários: (i) estabelecer bases de cooperação com as organizações representativas da sociedade civil a nível europeu abertas a essa cooperação e (ii) servir de ponte entre a sociedade civil organizada não só na União Europeia como nos países candidatos à adesão e as instituições comunitárias.

6.4.2. No que diz respeito ao alargamento, o Comité considera que uma das suas missões principais é contribuir para o processo de "institution building" (construções das instituições) nos países candidatos à adesão. O Comité está convicto de que não basta perfilhar o acervo comunitário, mas que é imperativo criar também estruturas adequadas que garantam a aplicação desse acervo consolidando o modelo de democracia representativa, o único que favorece o exercício de uma democracia participativa. As actividades relacionadas com este domínio assumirão, sem dúvida, particular relevância na futura estratégia do Comité.

6.4.3. Durante a referida Convenção, a Comissão, em especial, incitou expressamente o Comité a agir nesse sentido, tendo também sido saudadas as iniciativas já tomadas e as que o Comité pretende prosseguir e reforçar, para contribuir para o processo de "institution building" nos países candidatos à adesão.

6.4.4. Tendo em conta o que ficou exposto e ainda as expectativas suscitadas pela Convenção, o Comité manifesta a sua disponibilidade para estudar a possibilidade de criar uma estrutura organizativa de trabalho apropriada, designadamente um Observatório da Sociedade Civil, no seu interior, que sirva de fórum de reflexão e interacção, a cujas actividades seriam associadas, nomeadamente, as ONG europeias.

6.4.5. Em particular, podiam contar-se entre as missões desse Observatório:

- a elaboração de critérios de representatividade das ONG em colaboração com estas e com a Comissão Europeia;

- a análise dos diferentes modelos de acreditação das ONG (Conselho da Europa, ONU) e o exame, em colaboração com estas e com a Comissão Europeia, da exequibilidade de um sistema de acreditação das ONG;

- a monitorização do desenvolvimento da sociedade civil organizada e do diálogo civil a nível europeu;

- a avaliação dos meios que permitam uma maior participação das ONG no processo de decisão comunitário, sobretudo a nível da concepção das políticas;

- o apoio ao desenvolvimento da sociedade civil organizada nos países candidatos à adesão;

- a formulação de propostas para a execução de iniciativas comuns do Comité e das ONG.

6.4.6. Estas tarefas poderiam ser realizadas socorrendo-se de:

- recolha e difusão de informação de carácter horizontal sobre a sociedade civil organizada europeia e seus actores;

- criação, com a ajuda de peritos, de uma base de dados documental sobre a sociedade civil organizada;

- organização regular de consultas e audições, bem como de encontros e seminários;

- organização de seminários de informação para as organizações da sociedade civil dos países candidatos à adesão, designadamente com a cooperação da Comissão;

- criação de uma publicação periódica sobre o diálogo civil, que proporcione às organizações não representadas no Comité um meio de expressão.

6.5. O Comité considera que cada instituição tem uma missão a desempenhar para que os cidadãos sejam de facto parte interessada, participem verdadeira e activamente na integração europeia e influenciem a sua evolução. Para tal, é, a seu ver, indispensável uma estreita cooperação entre as diferentes instituições e órgãos da União Europeia. O Comité reitera a sua plena disponibilidade para agir nesse sentido no quadro de um diálogo aberto sobre a criação de novas formas e estruturas de participação e espera poder contar na sua acção com o apoio das demais instituições, em especial da Comissão.

Bruxelas, 13 de Julho de 2000.

A Presidente

do Comité Económico e Social

Beatrice Rangoni Machiavelli

(1) COM(2000) 11 final.

(2) JO C 73 de 9.3.1998, p. 92.

(3) JO C 95 de 30.3.1998, p. 99.

(4) Primeira Convenção da Sociedade Civil Organizada - 15 e 16.10.1999.

(5) JO C 329 de 17.11.1999, p. 30.

(6) Artigo 257.o do Tratado que dispõe, designadamente, que o "Comité é composto por representantes dos diferentes sectores da vida económica e social ...".

(7) Cf. ponto 1.1, último período.

(8) Cf. ponto 5.1 do parecer do Comité de Setembro de 1999, já referido.

(9) Cf. ponto 9.3 do parecer do CES de Setembro de 1999 e a Comunicação da Comissão relativa às associações e fundações na Europa (COM(97) 241 final).

(10) Cf. também parecer do Comité de Setembro de 1999.

(11) Tal como demonstra o convite dirigido à Plataforma Europeia de ONG do domínio social para participar numa reunião informal dos Ministros dos Assuntos Sociais em 10 e 11 de Fevereiro de 2000 em Lisboa.

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