EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62015TJ0760

Acórdão do Tribunal Geral (Sétima Secção alargada) de 24 de setembro de 2019.
Reino dos Países Baixos contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Auxílio posto em execução pelos Países Baixos — Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado interno e ilegal que ordena a sua recuperação — Decisão fiscal antecipada (tax ruling) — Preço de transferência — Cálculo da matéria coletável — Princípio de plena concorrência — Vantagem — Sistema de referência — Autonomia fiscal e processual dos Estados‑Membros.
Processo T-760/15.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2019:669

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada)

24 de setembro de 2019 ( *1 )

«Auxílios de Estado — Auxílio posto em execução pelos Países Baixos — Decisão que declara a incompatibilidade com o mercado interno e a ilegalidade do auxílio e que ordena a sua recuperação — Decisão fiscal antecipada (tax ruling) — Preço de transferência — Cálculo da matéria coletável — Princípio da plena concorrência — Vantagem — Sistema de referência — Autonomia fiscal e processual dos Estados‑Membros»

Nos processos T‑760/15 e T‑636/16,

Reino dos Países Baixos, representado inicialmente por M. Bulterman, B. Koopman, M. de Ree e M. Noort e, em seguida, por M. Bulterman, M. de Ree e M. Noort, na qualidade de agentes,

recorrente no processo T‑760/15,

apoiado por

Irlanda, representada inicialmente por E. Creedon, G. Hodge, K. Duggan e A. Joyce e, em seguida, por G. Hodge, A. Joyce, K. Duggan, M. Browne e J. Quaney, na qualidade de agentes, assistidos por M. Collins, P. Gallagher, SC, e B. Doherty e S. Kingston, barristers,

interveniente,

Starbucks Corp., com sede em Seattle, Washington (Estados Unidos),

Starbucks Manufacturing Emea BV, com sede em Amesterdão (Países Baixos),

representadas por S. Verschuur, M. Petite e M. Stroungi, advogados,

recorrentes no processo T‑636/16,

contra

Comissão Europeia, representada, no processo T‑760/15, inicialmente por P‑J. Loewenthal e B. Stromsky e, em seguida, por P‑J. Loewenthal e F. Tomat, na qualidade de agentes, e, no processo T‑636/16, por P‑J. Loewenthal e F. Tomat, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto pedidos baseados no artigo 263.o TFUE e destinados a obter a anulação da Decisão (UE) 2017/502 da Comissão, de 21 de outubro de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38374 (2014/C ex 2014/NN) concedido pelos Países Baixos à Starbucks (JO 2017, L 83, p. 38),

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada),

composto por: M. van der Woude, presidente, V. Tomljenović (relator), E. Bieliūnas, A. Marcoulli e A. Kornezov, juízes,

secretário: S. Spyropoulos, administradora,

vista a fase escrita do processo e após a audiência de 2 de julho de 2018,

profere o presente

Acórdão

I. Antecedentes do litígio e quadro jurídico

1

A Starbucks Manufacturing Emea BV (a seguir «SMBV») é uma filial do grupo Starbucks (a seguir «grupo Starbucks»), estabelecida nos Países Baixos. O grupo Starbucks é composto pela Starbucks Corp. e por todas as empresas sob o seu controlo. A Starbucks Corp. tem a sua sede principal em Seattle, Washington (Estados Unidos). A Alki LP (a seguir «Alki») é uma filial do grupo Starbucks, estabelecida no Reino Unido, que controla indiretamente a SMBV. A Alki e a SMBV celebraram um acordo de torrefação (a seguir «acordo de torrefação»), que prevê, nomeadamente, que a SMBV pague à Alki royalties pelo uso dos direitos de propriedade intelectual da Alki, designadamente os métodos de torrefação e outros conhecimentos em matéria de torrefação (a seguir «royalties»).

2

A Decisão (UE) 2017/502 da Comissão, de 21 de outubro de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38374 (2014/C ex 2014/NN) concedido pelos Países Baixos à Starbucks (JO 2017, L 83, p. 38, a seguir «decisão impugnada»), tem por objeto uma medida relativa à aplicação do regime neerlandês do imposto sobre as sociedades ao caso específico da SMBV.

A. Sobre o quadro jurídico nacional

3

Ao abrigo do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, este imposto é devido pelas empresas estabelecidas nos Países Baixos que são contribuintes nacionais e pelas empresas não estabelecidas, que são contribuintes estrangeiros, com uma atividade económica nos Países Baixos. Com efeito, nos termos do artigo 2.o da Wet op de vennootschapsbelasting (Lei do imposto sobre as sociedades, a seguir «LIS»), de 1969, as empresas estabelecidas — o que inclui necessariamente as sociedades constituídas de acordo com o direito neerlandês — estão sujeitas ao imposto sobre as sociedades pelos seus rendimentos mundiais. Nos termos do artigo 3.o da LIS, as empresas não estabelecidas são tributadas pelos seus rendimentos com origem neerlandesa.

4

Neste contexto, a matéria coletável do imposto sobre as sociedades é constituída pelos lucros realizados pela empresa contribuinte. Com efeito, decorre do artigo 8.o da LIS, lido em conjugação com o artigo 3.8 da Wet inkomstenbelasting (Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento), de 2001, que todos os contribuintes devem ser tributados em função do princípio do lucro total. Segundo este princípio, todos os lucros das empresas são tributados, desde que provenham de uma atividade económica ou comercial. O artigo 3.8 da Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento prevê que «[o] lucro de uma empresa é a soma dos benefícios conjuntos que são obtidos por uma empresa, sejam quais forem a sua designação ou a sua forma». Segundo o artigo 3.25 da Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento, que se aplica igualmente por força do artigo 8.o da LIS aos contribuintes sujeitos ao imposto sobre as sociedades, o lucro anual tributável deve ser determinado em conformidade com as boas práticas comerciais e tendo em conta uma linha comportamental constante.

5

O lucro tributável corresponde, em geral, ao lucro contabilístico, tal como este resulta da conta de perdas e ganhos da empresa. No entanto, podem ser feitos ajustamentos com base em cláusulas fiscais específicas, tais como incentivos fiscais aplicáveis, isenção de participação, correções ao resultado fiscal proveniente de transações que não respeitam o princípio da plena concorrência e a aplicação de diferentes regras de amortização com base em disposições fiscais ou contabilísticas.

6

O artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS dispõe que, «[s]e um organismo participar, direta ou indiretamente, na gestão, no controlo ou no capital de outra entidade e se, em razão dessas relações jurídicas recíprocas, forem acordadas ou impostas (preços de transferência) condições que seriam normalmente acordadas por partes independentes no circuito económico, o lucro realizado por essas entidades é determinado como se estas últimas condições referidas tivessem sido acordadas».

7

O Decreto IFZ2001/295M do Secretário de Estado das Finanças neerlandês, de 30 de março de 2001, intitulado «Preços de Transferência, Aplicação do Princípio da Plena Concorrência e das Orientações da OCDE Aplicáveis em Matéria de Preços de Transferência Destinadas às Empresas Multinacionais e às Administrações Fiscais (Orientações da OCDE)» (a seguir «Decreto sobre os Preços de Transferência»), descreve a forma como a Administração Fiscal neerlandesa interpreta o princípio da plena concorrência com base no artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS. O preâmbulo do Decreto sobre os Preços de Transferência dispõe o seguinte:

«A política dos Países Baixos no domínio do direito fiscal internacional no que respeita ao princípio da plena concorrência parte do postulado de que este princípio se inscreve na ordem jurídica fiscal neerlandesa, o englobado no conceito lato dos rendimentos visado no artigo 3.8. da [Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento]. Teoricamente, as [Orientações da OCDE aplicáveis em matéria de preços de transferência destinadas às empresas multinacionais e às Administrações Fiscais, adotadas pelo Comité dos Assuntos Fiscais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) em 27 de junho de 1995] são, assim, diretamente aplicáveis aos Países Baixos com base no artigo 3.8 da [Lei relativa ao Imposto sobre o Rendimento]. Orientações da OCDE permitem uma margem de interpretação sobre um certo número de aspetos. Noutros domínios, a experiência revelou que as Orientações da OCDE carecem de clarificação. O presente decreto clarifica os pontos de vista das autoridades neerlandesas sobre estes aspetos e elimina, sendo o caso, incertezas existentes.»

8

O Decreto sobre os Preços de Transferência divide‑se em doze partes que têm por objeto o princípio da plena concorrência, os métodos dos preços de transferência, as abordagens administrativas destinadas a prevenir e a resolver os litígios relativos aos preços de transferência, os ajustamentos secundários, a determinação do preço de plena concorrência quando a avaliação é muito incerta no momento da transação, a prestação de serviços dentro de um grupo, as contribuições para um acordo de partilha de custos com margem de lucro, a remuneração conforme com o princípio da plena concorrência para os serviços financeiros, as subvenções, incentivos fiscais e custos parcialmente dedutíveis, a imputação de lucros a uma empresa‑mãe e a um estabelecimento estável, a entrada em vigor deste decreto e a aplicação da política atual.

9

Mais especificamente, o Decreto sobre os Preços de Transferência enuncia no seu ponto 1, designadamente, que o princípio da plena concorrência em direito neerlandês se baseia, de um modo geral, na comparação das condições de uma transação entre empresas coligadas com as condições de uma transação entre empresas independentes. Assiste à Administração o direito de esperar que um contribuinte demonstre que os preços de transferência por ele aplicados são conformes com o princípio da plena concorrência. Neste contexto, a premissa deve ser a de que cada uma das empresas em causa recebe uma remuneração que reflita as funções exercidas, tendo em conta os ativos mobilizados e os riscos incorridos. Além disso, a remuneração conforme com o princípio da plena concorrência deve ser teoricamente determinada com base nas transações. Ora, em caso de dificuldade, as transações podem ser avaliadas conjuntamente a fim de determinar a conformidade com o princípio da plena concorrência. Acresce que, no âmbito de um exame dos dados plurianuais, a Administração Fiscal não pode utilizar os conhecimentos adquiridos a posteriori.

10

No seu ponto 2, o Decreto sobre os Preços de Transferência faz referência a cinco métodos, expostos nas Orientações aplicáveis em matéria de preços de transferência destinadas às empresas multinacionais e às Administrações Fiscais, adotadas pelo Comité dos Assuntos Fiscais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) em 27 de junho de 1995 e revistos em 22 de julho de 2010 (a seguir «Orientações da OCDE»), relativas à determinação dos preços de transferência. De entre esses métodos figuram, designadamente, o método do preço comparável no mercado livre (a seguir «método CUP») e o método da margem líquida da transação (a seguir «MMLT»). Segundo o referido decreto, as Orientações da OCDE pressupõem uma certa hierarquia entre os métodos, dando preferência aos métodos de transação tradicionais. A Administração Fiscal neerlandesa deve iniciar sempre o seu exame dos preços de transferência da perspetiva do método escolhido pelo contribuinte à data da transação. O decreto precisa que esta regra é conforme com o ponto 1.68 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995. Decorre daí que o contribuinte tem, em princípio, liberdade para escolher um método de preço de transferência desde que o método selecionado conduza a um resultado conforme com o princípio da plena concorrência para a transação em causa. Ainda que seja suposto o contribuinte ter em conta, quando escolhe um método de preço de transferência, a fiabilidade desse método na situação em causa, este procedimento não se destina, precisamente, a incitá‑lo a avaliar todos os métodos e a justificar, posteriormente, as razões pelas quais o método escolhido dá o melhor resultado face às condições em causa.

11

O ponto 5 do Decreto sobre os Preços de Transferência prevê, nomeadamente, que pode ser difícil, na transferência de bens incorpóreos, como por exemplo as patentes, avaliar o valor desses ativos no momento da transferência devido à existência de conhecimentos insuficientes sobre as vantagens e os riscos futuros. No caso em que empresas independentes optaram por uma cláusula de revisão dos preços, em circunstâncias comparáveis, a Administração Fiscal deve ter a possibilidade de determinar o preço com base nessa cláusula. O objetivo é alcançar um regime em que a remuneração seja conforme com os benefícios que o bem incorpóreo gerará no futuro.

B. Quanto ao acordo prévio em matéria de preços

12

Em 28 de abril de 2008, as autoridades fiscais neerlandesas celebraram um acordo prévio em matéria de preços com a SMBV (a seguir «APPT»), que tinha por objeto determinar a remuneração da SMBV pelas suas atividades de produção e de distribuição, conforme descritas no APPT, dentro do grupo Starbucks (a seguir «remuneração da SMBV»). A remuneração da SMBV serviu, posteriormente, para determinar anualmente o lucro tributável da SMBV a título do imposto sobre as sociedades nos Países Baixos. Com efeito, segundo o seu preâmbulo, o APPT é um acordo fiscal relativo à conformidade com o princípio da plena concorrência dos preços de transferência a utilizar no âmbito do cálculo do lucro no interior de um grupo internacional. Decorre [confidencial] ( 1 ) do APPT que este tinha, designadamente, por objetivo ser utilizado para efeitos das declarações anuais relativas ao imposto sobre as sociedades nos Países Baixos. O APPT era válido para o período compreendido entre 1 de outubro de 2007 e 31 de dezembro de 2017.

13

O APPT previa um método para a determinação da remuneração da SMBV em conformidade com a plena concorrência para as suas atividades de produção e de distribuição dentro do grupo Starbucks. Acresce que o APPT aprovava o montante dos royalties, pagos pela SMBV à Alki para a utilização das tecnologias de torrefação, das misturas de café e das curvas de torrefação do café (a seguir «propriedade intelectual em matéria de torrefação»), no âmbito do processo de produção e de fornecimento de café aos gerentes das lojas.

14

Mais precisamente, quanto ao âmbito de aplicação do APPT, [confidencial]. Quanto às funções da SMBV, [confidencial] esta última era principalmente responsável pela produção de grãos de café torrados e pelo fornecimento de grãos de café torrados, e produtos equiparados, às lojas Starbucks da região Europa, Médio Oriente e África (a seguir «região EMEA») e era proprietária, nos Países Baixos, de uma fábrica de torrefação. Além disso, o APPT indicava que a SMBV explorava sob licença certos direitos de propriedade intelectual pertencentes à Alki e que esses direitos eram necessários no âmbito do processo de produção e de fornecimento do café aos gerentes das lojas. Era especificado que, para o efeito, a SMBV pagava royalties à Alki. [confidencial] Acresce que, segundo [confidencial] o APPT, a SMBV exercia uma função de distribuidor para vários outros produtos ligados ao café e, além das funções logísticas relacionadas com as suas próprias atividades de produção, fornecia igualmente um suporte logístico para outros produtos em certos mercados.

15

Quanto ao método de determinação dos preços de transferência para as atividades de produção e distribuição da SMBV, [confidencial] do APPT enunciava, designadamente, que a remuneração da SMBV devia ser determinada com base no método do custo majorado (cost plus method) (v. n.o 187, infra, sobre o significado desta expressão), e que este era conforme com a plena concorrência se a «margem operacional» ascendesse a [confidencial] % da base de custos relevantes (a seguir «base de custos da SMBV). Além disso, de acordo com o APPT, não faziam parte da base de custos da SMBV:

as despesas relativas aos copos Starbucks, aos guardanapos de papel Starbucks, etc.;

o custo dos grãos de café verde;

as despesas de logística e de distribuição relativas aos serviços prestados por terceiros e a remuneração das atividades exercidas por terceiros no âmbito de contratos de fabrico por consignação (consignment manufacturing);

o pagamento de royalties.

16

No que diz respeito aos royalties que deviam ser pagos anualmente pela SMBV à Alki, [confidencial] o APPT previa que estes deviam ser fixados com base na diferença entre o lucro operacional realizado tendo em conta a função de produção e de distribuição, antes de despesas ligadas aos royalties, e a remuneração da SMBV. O pagamento dos royalties era dedutível para efeitos do imposto sobre as sociedades e não estava sujeito ao imposto sobre os dividendos neerlandês.

C. Antecedentes do litígio

1.   Quanto ao procedimento administrativo na Comissão

17

Em 30 de julho de 2013, a Comissão Europeia enviou ao Reino dos Países Baixos um primeiro pedido de informações sobre as práticas nacionais relativas às decisões antecipativas em matéria de tributação das sociedades. Neste âmbito, a Comissão pediu que lhe fossem comunicadas todas as decisões antecipativas que beneficiassem a SMBV e a Starbucks Coffee Emea BV, duas filiais do grupo Starbucks estabelecidas nos Países Baixos. Em resposta a esse pedido, o Reino dos Países Baixos comunicou, nomeadamente, o APPT.

18

Em 11 de junho de 2014, a Comissão deu início ao procedimento formal de investigação, previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE (a seguir «decisão de início do procedimento»), no que diz respeito ao APPT, pelo facto de este último poder constituir um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

19

Na sequência da decisão de início do procedimento, a Comissão teve vários intercâmbios com o Reino dos Países Baixos e com as entidades do grupo Starbucks que eram os correspondentes da Comissão durante o procedimento administrativo (a seguir «correspondentes Starbucks»), a respeito, nomeadamente, do APPT.

2.   Quanto à decisão impugnada

20

Em 21 de outubro de 2015, a Comissão adotou a decisão impugnada. Nessa decisão, a Comissão considerou, por um lado, que o APPT constituía um auxílio incompatível com o mercado interno e, por outro, ordenou a recuperação desse auxílio. A decisão impugnada está dividida em onze secções.

a)   Quanto à descrição da medida contestada

21

Na secção 2 da decisão impugnada, intitulada «Descrição da medida contestada», a Comissão identificou o APPT como a medida em causa. A Comissão precisou que o APPT tinha sido celebrado com base no Relatório sobre os preços de transferência elaborado pelo consultor fiscal do Grupo Starbucks (a seguir «Relatório sobre os preços de transferência») e referiu que esse documento fazia parte integrante do APPT (considerandos 40 e 46 da decisão impugnada).

22

Em primeiro lugar, a Comissão salientou que, ao adotar o APPT, as autoridades fiscais neerlandesas tinham aceitado que a remuneração das atividades da SMBV nos Países Baixos, tal como determinada pelo consultor fiscal do grupo Starbucks, constituía uma remuneração em condições de plena concorrência. A Comissão precisou, em seguida, que as autoridades neerlandesas tinham também aceitado que o montante dos royalties a pagar pela SMBV à Alki correspondia à diferença entre o lucro de exploração realizado antes de pagamentos royalties e a remuneração da SMBV conforme prevista pelo APPT. A Comissão constatou que o APPT previa que o montante dos royalties seria dedutível do lucro tributável da SMBV e não seria sujeito ao imposto nos Países Baixos (considerandos 40 a 44 da decisão impugnada).

23

Em segundo lugar, a Comissão expôs o conteúdo do Relatório sobre os preços de transferência. Antes de mais, a Comissão declarou que o Relatório sobre os preços de transferência apresentava a Starbucks Coffee Emea como o estabelecimento principal do grupo Starbucks na região EMEA. A Starbucks Coffee Emea era descrita como tendo por função conceder em sublicença os direitos de propriedade intelectual do grupo Starbucks (marca, tecnologia e saber‑fazer) — pelos quais pagava ela própria royalties à Alki — a terceiros que exploravam as insígnias Starbucks. Esses terceiros pagavam, então, direitos de propriedade intelectual à Starbucks Coffee Emea correspondentes a uma percentagem do seu volume de negócios. A este respeito, a Comissão salientou que o consultor fiscal do Grupo Starbucks considerava que o método CUP podia ser utilizado para determinar o preço de plena concorrência dos pagamentos de direitos de propriedade intelectual intragrupo à Starbucks Coffee Emea.

24

Em seguida, no que respeita à SMBV, por um lado, a Comissão salientou que o Relatório sobre os preços de transferência se limitava a descrevê‑la como uma entidade que tinha por função primária a torrefação dos grãos de café verde e a revenda do café torrado a entidades filiadas e não filiadas. No âmbito dessas atividades, a SMBV era obrigada a respeitar o caderno de encargos fornecido pelas sociedades do grupo Starbucks que estavam estabelecidas no território dos Estados Unidos (a seguir «Starbucks US») e tinha a responsabilidade de assegurar que a sua produção era conforme com os padrões de qualidade da Starbucks US. A SMBV atuava também como intermediária na distribuição de vários produtos não derivados do café e prestava serviços de «apoio à cadeia de abastecimento». Por outro lado, a Comissão precisou que, para exercer essa atividade, a SMBV se fornecia em grãos de café verde numa filial do grupo Starbucks estabelecida na Suíça, a Starbucks Coffee Trading SARL (a seguir «SCTC»). A SMBV pagava igualmente royalties à Alki pela utilização dos processos de torrefação e pelo direito de fornecer as insígnias Starbucks em café. A este respeito, a Comissão salientou que o Relatório sobre os preços de transferência não descrevia o acordo de licença ao abrigo do qual a SMBV pagava royalties à Alki como sendo uma das transações mais importantes. As relações entre a SMBV e as várias entidades do grupo Starbucks foram descritas na figura 1 da decisão impugnada, reproduzida a seguir:

Image

25

Por último, a Comissão declarou que, quanto à escolha do método de determinação dos preços de transferência, o Relatório sobre os preços de transferência optou pelo MMLT, método segundo o qual devem ser tidas em conta as margens líquidas que tinham sido obtidas em transações comparáveis por sociedades não coligadas. Segundo o Relatório sobre os preços de transferência, esse método era apropriado no caso vertente, pelo facto de as diferenças entre as transações e as funções das entidades a comparar para determinar a margem líquida serem menos propícias a erros do que no âmbito dos métodos tradicionais (considerando 55 da decisão impugnada).

26

A Comissão precisou que, a fim de aplicar o MMLT, o consultor fiscal tinha escolhido como indicador do nível de lucro os custos de exploração relativos às atividades às quais a SMBV trazia valor acrescentado. Após uma procura de comparabilidade, o consultor fiscal considerou que o lucro líquido das entidades comparáveis à SMBV correspondia a uma margem de lucro sobre os custos totais. Em seguida, o consultor fiscal do grupo Starbucks efetuou duas correções a fim de ter em conta as diferenças entre as entidades comparadas e a SMBV, tais como os riscos incorridos ou as funções exercidas. A primeira correção destinava‑se a ter em conta o facto de a base de custos da SMBV, à qual era aplicada a margem de lucro, não incluir o custo dos grãos de café verde. A segunda correção tinha por objetivo ter em conta o facto de as empresas comparáveis suportarem o custo das matérias‑primas e de o seu rendimento ser calculado sobre uma base de custos que incluía as matérias‑primas. Em aplicação destas duas correções, a margem de lucro tinha, assim, ascendido a [confidencial] % da base de custos da SMBV (considerandos 56 a 61 da decisão impugnada).

27

Em terceiro lugar, a Comissão expôs o conteúdo das Orientações da OCDE nas suas versões de 1995 e 2010. Em seu entender, as Orientações da OCDE enumeravam cinco métodos para estabelecer o mais adequadamente possível preços de plena concorrência para as transações e a repartição de lucros entre sociedades do mesmo grupo. Segundo a Comissão, as Orientações da OCDE estabeleciam uma classificação desses cinco métodos em métodos de transação tradicionais baseados nas transações e em métodos tradicionais de lucro. De acordo com a decisão impugnada, devia ser dada preferência aos métodos tradicionais baseados nas transações. De entre os cinco métodos enumerados nas Orientações da OCDE figuravam, nomeadamente, o método CUP e o MMLT (considerandos 67 a 70 da decisão impugnada).

28

O primeiro método, o método CUP, é, conforme descrito pela Comissão, um método tradicional baseado nas transações, que consiste em comparar o preço faturado pela transferência de bens ou de serviços no âmbito de uma transação entre duas empresas associadas com o preço faturado pela transferência de bens ou de serviços numa transação comparável efetuada em circunstâncias comparáveis entre duas empresas independentes (considerandos 67 e 71 da decisão impugnada).

29

O segundo método, o MMLT, é, conforme descrito pela Comissão, um método de lucro da transação, que consiste em calcular o montante potencial do lucro com base no princípio da plena concorrência, para uma atividade considerada no seu todo, em vez de para transações específicas. Neste âmbito, devia ser escolhido um indicador do nível de lucro, como os custos, o volume de negócios ou os investimentos fixos, e aplicar‑lhe uma margem de lucro que refletisse a margem observada em transações comparáveis efetuadas no mercado (considerando 67 e 72 a 74 da decisão impugnada).

b)   Quanto à apreciação da medida contestada

30

Na secção 9 da decisão impugnada, intitulada «Apreciação da medida contestada», a Comissão concluiu pela existência de um auxílio de Estado. A Comissão considerou que as quatro condições para a existência de um auxílio de Estado estavam preenchidas.

31

Após ter recordado as condições da existência de um auxílio de Estado, previstas no artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a Comissão considerou que a primeira condição de existência de um auxílio de Estado, que exige uma intervenção do Estado ou efetuada através de recursos estatais, estava preenchida. A este respeito, a Comissão salientou, por um lado, que o APPT continha a aceitação pela Administração Fiscal neerlandesa de um método de imputação dos lucros à SMBV dentro do grupo Starbucks, tal como proposto pelo consultor fiscal do grupo Starbucks. A SMBV calculou então sobre esta base o montante anual do imposto sobre as sociedades que devia pagar aos Países Baixos. Segundo a Comissão, o APPT era, portanto, imputável ao Reino dos Países Baixos. Por outro lado, a Comissão declarou que este APPT conduziu a uma redução do imposto devido pela SMBV nos Países Baixos, ao desviar‑se do imposto que, sem o APPT, a SMBV seria obrigada a pagar ao abrigo do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades. Assim, a Comissão considerou que o APPT deu origem a uma diminuição das receitas fiscais do Reino dos Países Baixos (considerandos 223 a 226 da decisão impugnada).

32

Quanto à segunda e quarta condições de existência de um auxílio de Estado, a Comissão considerou, por um lado, que o APPT era suscetível de afetar as trocas comerciais na União Europeia, uma vez que a SMBV fazia parte do grupo Starbucks, uma entidade ativa à escala internacional que opera em todos os Estados‑Membros da União. Por outro lado, a Comissão sustentou que, na medida em que reduzia a carga fiscal que, de outro modo, a SMBV teria de suportar por força do regime geral do imposto sobre as sociedades, o APPT falseava ou ameaçava falsear a concorrência ao reforçar a posição financeira da SMBV (considerando 227 da decisão impugnada).

33

Quanto à terceira condição de existência de um auxílio de Estado, a Comissão considerou que o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV, na medida em que resultava numa redução do imposto devido pela SMBV nos Países Baixos em comparação com o que deveria ter pago por força do regime geral do imposto sobre as sociedades e em comparação com as empresas autónomas (considerando 228 da decisão impugnada).

34

A título preliminar, a Comissão indicou que, segundo a jurisprudência, se impõe uma análise em três fases para determinar se a medida é seletiva. Em primeiro lugar, trata‑se de determinar o «sistema de referência», ou seja, o regime fiscal normalmente aplicável ao beneficiário da medida fiscal. Em seguida, há que apreciar se a medida fiscal constitui uma derrogação a esse sistema de referência, na medida em que introduz diferenciações entre operadores económicos que se encontram, tendo em conta os objetivos intrínsecos do sistema de referência, numa situação jurídica e factual comparável. Por último, se a medida constituir uma derrogação ao sistema de referência, cabe ao Estado‑Membro demonstrar que a derrogação se justifica pela natureza ou pela economia geral do sistema de referência (considerando 230 da decisão impugnada).

35

No que respeita à primeira fase, a saber, a identificação do sistema de referência, a Comissão considerou que o sistema de referência era o regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, que tem por objetivo a tributação dos lucros de todas as empresas sujeitas a imposto nos Países Baixos. A Comissão precisou, a este respeito, que as empresas estabelecidas nos Países Baixos são contribuintes nacionais e estão sujeitas ao imposto sobre as sociedades sobre os seus rendimentos à escala mundial. As empresas que não tenham sede nos Países Baixos são contribuintes estrangeiros e estão sujeitas ao imposto sobre os rendimentos provenientes de fontes neerlandesas. Segundo a Comissão, as empresas integradas e as empresas autónomas encontravam‑se numa situação jurídica e factual comparável tendo em conta este objetivo e, por conseguinte, estavam sujeitas, sem qualquer distinção, ao imposto sobre as sociedades. A este respeito, a diferença nas modalidades de cálculo dos lucros tributáveis das empresas integradas não tinha qualquer incidência sobre o objetivo do sistema de referência, a saber, a tributação de todas as empresas sujeitas a imposto nos Países Baixos (considerandos 231 a 244 da decisão impugnada).

36

No que respeita à segunda fase enunciada no n.o 34, supra, a saber, a demonstração de uma derrogação ao sistema de referência, a Comissão referiu, em primeiro lugar, que a questão de saber se uma medida fiscal constituía uma derrogação ao sistema de referência coincidia, regra geral, com a constatação de que uma vantagem tinha sido conferida ao beneficiário por intermédio dessa medida. Com efeito, em seu entender, quando uma medida fiscal conduz a uma redução do imposto devido pelo beneficiário em relação ao imposto que normalmente deveria pagar na falta da referida medida, essa redução constitui a vantagem concedida pela medida fiscal e, ao mesmo tempo, a derrogação ao sistema de referência (considerando 253 da decisão impugnada).

37

Em seguida, a Comissão recordou a jurisprudência segundo a qual, no caso de uma medida individual, a identificação da vantagem económica permite, em princípio, presumir a seletividade da referida medida. A Comissão precisou que, no caso em apreço, o APPT concedido à SMBV era uma medida de auxílio individual (considerando 254 da decisão impugnada).

38

Por último, a Comissão afirmou que, no Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416), o Tribunal de Justiça tinha considerado que uma medida fiscal que leve uma empresa integrada a aplicar preços de transferência que não refletem os preços que seriam aplicados num contexto no qual domina a livre concorrência, ou seja, preços acordados por empresas autónomas que negociavam seguindo o princípio da plena concorrência em condições comparáveis, conferia à referida empresa integrada uma vantagem, na medida em que resulta numa redução da sua base tributável e, portanto, do imposto exigível com base no sistema comum de imposto sobre as sociedades. A Comissão recordou que o princípio da plena concorrência consistia no facto de as transações efetuadas no interior de um grupo de empresas deverem ser remuneradas como se tivessem sido acordadas por empresas autónomas que negociavam seguindo condições de livre concorrência. Por conseguinte, a Comissão precisou que tinha de verificar se o método aceite pela Administração Fiscal neerlandesa através do APPT, para efeitos da determinação dos lucros tributáveis da SMBV nos Países Baixos, se afastava de um método que resultasse numa aproximação fiável de um resultado baseado no mercado e, desse modo, do princípio da plena concorrência. Nesse caso, considerar‑se‑ia que o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (considerandos 259 a 263 da decisão impugnada).

39

Consequentemente, a Comissão entendeu que o princípio da plena concorrência fazia necessariamente parte integrante da sua apreciação, ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, das medidas fiscais concedidas às sociedades integradas, independentemente da questão de saber se um Estado‑Membro tinha incorporado este princípio no seu sistema jurídico nacional. A Comissão especificou, então, que, em resposta aos argumentos do Reino dos Países Baixos suscitados no âmbito do procedimento administrativo, não tinha examinado se o APPT respeitava o princípio da plena concorrência, conforme definido no artigo 8.o‑B da LIS e pelo Decreto sobre os Preços de Transferência, mas que tinha procurado determinar se a Administração Fiscal neerlandesa tinha conferido uma vantagem seletiva à SMBV na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (considerandos 264 e 265 da decisão impugnada).

40

À luz desses elementos, a Comissão expôs uma série de linhas de raciocínio destinadas a demonstrar que o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV. Num raciocínio principal, a Comissão desenvolveu várias linhas de raciocínio, algumas das quais eram subsidiárias entre si, destinadas a demonstrar que o APPT constituía uma derrogação ao regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades. Num raciocínio subsidiário, a Comissão sustentou que o APPT derrogava o artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência.

41

Em especial, no seu raciocínio principal destinado a demonstrar que o APPT constituía uma derrogação ao regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, a Comissão salientou, em primeiro lugar, que o consultor fiscal do grupo Starbucks tinha escolhido o MMLT para efeitos de determinar os lucros tributáveis da SMBV. A Comissão considerou que diferentes escolhas metodológicas, propostas pelo consultor fiscal do grupo Starbucks e validadas pelo Reino dos Países Baixos, conduziam a uma redução do imposto sobre as sociedades, pago pela SMBV, em relação às empresas autónomas cujos lucros tributáveis eram determinados em condições de mercado (considerandos 268 a 274 da decisão impugnada).

42

Em primeiro lugar, a Comissão considerou que o Relatório sobre os preços de transferência não tinha examinado se a transação intragrupo para a qual o APPT tinha sido, efetivamente, pedido e concedido, ou seja, os royalties que a SMBV pagava à Alki pela licença de utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação, era conforme com o princípio da plena concorrência. Por conseguinte, o Relatório sobre os preços de transferência não identificava e não analisava as transações controladas e não controladas relevantes, embora se tratasse de um primeiro passo necessário na apreciação da natureza de plena concorrência das condições comerciais que se aplicavam para efeitos de determinação dos preços de transferência entre partes coligadas (considerandos 275 a 285 da decisão impugnada).

43

Em segundo lugar, no que respeita ao nível dos royalties, a Comissão considerou que, se o Relatório tivesse identificado e examinado corretamente os royalties, teria chegado a um valor de plena concorrência igual a zero. A Comissão sublinhou, nomeadamente, que a SMBV não retirou ganho nenhum da utilização dos direitos de propriedade intelectual que eram objeto dos royalties, na medida em que não explorava esses direitos no mercado. A Comissão considerou, então, que os lucros que reverteram para a Alki por intermédio dos royalties deveriam ter sido integralmente tributados nos Países Baixos (considerandos 286 a 341 da decisão impugnada).

44

Para apreciar o caráter de plena concorrência dos royalties, a Comissão aplicou o método CUP e identificou vários acordos de produção entre o grupo Starbucks e entidades terceiras, ou entre entidades alheias ao grupo Starbucks, como sendo transações comparáveis.

45

Além disso, a Comissão rejeitou os argumentos suscitados pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks a fim de justificar o montante dos royalties. Por um lado, a Comissão considerou que o pagamento dos royalties não podia ter por contrapartida a assunção dos riscos empresariais da SMBV pela Alki, sob pena de admitir que as empresas integradas pudessem reafetar contratualmente os riscos e, assim, afastar qualquer aplicação do princípio da plena concorrência. Por outro lado, a Comissão acrescentou que o pagamento dos royalties não podia ser justificado pela importância dos montantes pagos pela Alki à Starbucks US.

46

Em terceiro lugar, no que respeita ao nível do preço de compra dos grãos de café verde, a Comissão salientou que essa transação não tinha sido examinada no Relatório sobre os preços de transferência, apesar de o referido relatório a ter identificado como uma das principais transações efetuadas pela SMBV. A partir dos dados financeiros da SCTC, a Comissão calculou a margem bruta média sobre os custos dos grãos de café verde para o período de validade do APPT. A Comissão considerou que a margem bruta entre 2011 e 2014, que traduzia um aumento significativo do preço dos grãos de café a cargo da SMBV em comparação com os custos suportados pela SCTC, não refletia uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado. A Comissão concluiu que o preço excessivo pago pela SMBV, ao reduzir os lucros registados e, assim, a matéria coletável desta última, constituía uma vantagem seletiva (considerandos 342 a 361 da decisão impugnada).

47

Em segundo lugar, ainda no seu raciocínio principal que visa demonstrar que o APPT derrogava o regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, mas subsidiariamente às críticas expostas nos n.os 42 a 46, supra, a Comissão considerou que, de qualquer modo, e mesmo supondo que o MMLT fosse apropriado para identificar os lucros realizados pela SMBV, o relatório sobre os preços de transferência tinha optado por uma aplicação incorreta do MMLT. A Comissão concluiu que, uma vez que esse método não conduzia a um resultado de plena concorrência, as autoridades fiscais neerlandesas não podiam aprová‑lo no APPT (considerandos 362 a 408 da decisão impugnada).

48

Em primeiro lugar, a Comissão considerou que o Relatório sobre os preços de transferência tinha erradamente identificado a SMBV como a entidade menos complexa e, portanto, como a «parte a testar», para efeitos de aplicação do MMLT. A Comissão acrescentou, em contrapartida, que a SMBV deveria ter sido identificada como sendo a entidade mais complexa, na medida em que, por um lado, a Alki apenas exercia funções limitadas e, por outro, além do facto de a SMBV exercer funções diferentes das da torrefação, esta função não consistia em atividades rotineiras, mas era essencial (considerandos 362 a 377 da decisão impugnada).

49

Em segundo lugar, a Comissão considerou que o nível de lucro, tido em conta no Relatório sobre os preços de transferência, ou seja, os custos de exploração, era inapropriado. Segundo a Comissão, o consultor fiscal do Grupo Starbucks tinha erradamente considerado que a torrefação era a principal função da SMBV em vez da revenda e da distribuição. A Comissão concluiu então que a utilização das vendas registadas pela SMBV como indicador do nível de lucro era mais apropriada e teria resultado numa remuneração mais elevada da atividade da SMBV. Em apoio desta conclusão, a Comissão calculou um rácio de rendibilidade a partir de um grupo de entidades independentes que exerciam as mesmas atividades de revenda e de torrefação que a SMBV. A Comissão concluiu, após comparação com a Starbucks Manufacturing Corporation (a seguir «SMC») — a única outra entidade do grupo a exercer atividades de torrefação para o grupo — que a SMC era [confidencial] vezes mais rentável do que a SMBV com base no APPT (considerandos 379 a 400 da decisão impugnada).

50

Em terceiro lugar, a Comissão considerou que, de qualquer modo, e mesmo supondo que os custos de exploração fossem um indicador do nível de lucro apropriado para calcular os preços de transferência da SMBV, os dois ajustamentos efetuados pelo consultor fiscal no Relatório sobre os preços de transferência não permitiam chegar a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado. A Comissão criticou, por um lado, o uso de um «ajustamento do capital de exploração» e, por outro, a exclusão dos custos da empresa designada, no considerando 300 da decisão impugnada, tal como publicada no Jornal Oficial da União Europeia, pela expressão «empresa transformadora 1 não filiada» (a seguir «empresa transformadora 1 não filiada») da base de custos utilizada como indicador do nível de lucro (considerandos 401 a 408 da decisão impugnada).

51

A Comissão concluiu então que a metodologia aceite pelas autoridades fiscais neerlandesas, segundo a qual os lucros gerados pela SMBV e que excediam a margem de [confidencial] % dos custos de exploração deviam ser pagos como royalties à Alki, não era conforme com o princípio da plena concorrência e conduzia a uma redução da carga fiscal que recaía sobre a SMBV.

52

Por conseguinte, resulta do que precede que, no âmbito do exame efetuado à luz do sistema geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, a Comissão suscitou seis erros que permitiam concluir pela existência de uma vantagem seletiva no caso em apreço. Nesse exame, os três primeiros erros inscrevem‑se numa posição principal, enquanto os outros três erros se inscrevem numa posição subsidiária e são subsidiários entre eles.

53

Mais especificamente, no que respeita à posição principal, a Comissão considerou que o método aceite pelo APPT derrogava um método que permitia uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência, uma vez que:

a escolha do MMLT era errada e o Relatório sobre os preços de transferência não examinava a transação intragrupo para a qual o APPT tinha sido efetivamente solicitado e concedido (a seguir «primeira linha de raciocínio»);

por um lado, o APPT não estabelecia uma metodologia que visava garantir que os royalties pagos pela SMBV à Alki eram conformes com o princípio da plena concorrência; ora, o método CUP deveria ter sido aplicado para determinar o montante dos royalties pagos pela SMBV à Alki; com a aplicação deste método, o valor dos royalties deveria ter sido igual a zero (a seguir «segunda linha de raciocínio»);

por outro lado, o APPT não examinou se o nível do preço de compra do café verde era conforme com o princípio da plena concorrência; ora, este estava sobreavaliado (a seguir «terceira linha de raciocínio»).

54

No que respeita à posição subsidiária, a Comissão considerou que, mesmo supondo que o MMLT fosse o método apropriado para determinar os lucros realizados pela SMBV, o Relatório sobre os preços de transferência optou por uma aplicação incorreta do MMLT. A este respeito, a Comissão considerou que:

o método aceite pelo APPT derrogava um método que permitia uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência, na medida em que a SMBV tinha sido incorretamente identificada como a entidade menos complexa e, assim, como a entidade a testar para efeitos de aplicação do MMLT (a seguir «quarta linha de raciocínio»);

a título subsidiário, o método aceite pelo APPT não permitia uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência, na medida em que as funções da SMBV tinham sido incorretamente analisadas e a escolha dos custos de exploração como indicador do nível de lucro era errada (a seguir «quinta linha de raciocínio»);

a título subsidiário, o método aceite pelo APPT não permitia uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência, na medida em que os ajustamentos aplicados à margem de lucro eram inapropriados (a seguir «sexta linha de raciocínio»).

55

Em terceiro lugar, no seu raciocínio subsidiário que visava demonstrar que o APPT constituía uma derrogação ao artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e ao Decreto sobre os Preços de Transferência, a Comissão considerou que, mesmo supondo que o sistema de referência pertinente não fosse composto por normas gerais relativas ao imposto sobre as sociedades, mas, como sustentavam as autoridades neerlandesas, apenas por disposições que consagravam no direito neerlandês o princípio da plena concorrência, ou seja, o artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência, o APPT, ao aprovar um método de determinação dos lucros da SMBV que não conduzia a resultados de plena concorrência, também derrogava esse regime de referência. Para o efeito, a Comissão remeteu para a sua análise efetuada à luz do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades e às seis linhas de raciocínio expostas nos n.os 52 a 54, supra, (a seguir «raciocínio à luz do sistema de referência restrito» (considerandos 409 a 412 da decisão impugnada).

56

No que diz respeito à terceira fase da análise da seletividade das medidas fiscais, conforme identificada no n.o 34, supra, a Comissão considerou que a derrogação ao regime de referência não se justificava. A este respeito, a Comissão salientou que nem as autoridades neerlandesas nem a Starbucks tinham adiantado possíveis justificações para o tratamento seletivo da SMBV, quando lhes cabia o ónus da prova neste ponto. Além disso, a Comissão acrescentou que não tinha identificado nenhuma possível justificação (considerandos 413 e 414 da decisão impugnada).

57

A Comissão concluiu que o APPT da SMBV conferia à SMBV uma vantagem seletiva, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, na medida em que tinha validado um método de afetação de lucros à SMBV que não podia ser considerado como conduzindo a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência. Segundo a Comissão, esse método resultou numa redução da carga fiscal da SMBV, a título principal, à luz do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, em comparação com as empresas autónomas, e, a título subsidiário, à luz do artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e do Decreto sobre os Preços de Transferência, em comparação com as outras empresas integradas (considerandos 415 a 416 da decisão impugnada).

58

Por conseguinte, a Comissão concluiu que o APPT constituía um auxílio de Estado (considerandos 422 e 423 da decisão impugnada).

59

A Comissão considerou então que o auxílio concedido à SMBV era incompatível com o mercado interno. Com efeito, o Reino dos Países Baixos não invocou nenhum dos fundamentos de compatibilidade previstos no artigo 107.o, n.os 2 e 3, TFUE. Ora, o auxílio em questão, que devia ser considerado um auxílio ao funcionamento, não podia, em princípio, ser considerado compatível com o mercado interno (considerandos 431 a 434 da decisão impugnada).

60

Além disso, a Comissão declarou que o Reino dos Países Baixos não lhe tinha comunicado, em conformidade com o artigo 108.o, n.o 3, TFUE, nenhum projeto correspondente ao APPT e não tinha respeitado a obrigação de suspensão que lhe incumbia em conformidade com este artigo. Por conseguinte, só podia tratar‑se de um auxílio de Estado ilegal concedido em violação da referida disposição (considerandos 435 e 436 da decisão impugnada).

61

Por outro lado, a Comissão precisou que as informações em que baseou a sua decisão estavam disponíveis para a Administração Fiscal neerlandesa no momento da adoção do APPT. No que respeita ao custo dos grãos de café verde, a Comissão acrescentou que o Relatório sobre os preços de transferência não analisou os preços faturados pela SCTC à SMBV ao abrigo do respetivo acordo de compra de grãos de café verde e que, se essa transação tivesse sido examinada no APPT em 2008, a fim de determinar o preço de plena concorrência para a mesma, o APPT não poderia deixar margem para os aumentos de preços observados em 2011 (considerandos 424 a 427 da decisão impugnada).

62

Por último, a Comissão identificou a SMBV e o grupo Starbucks no seu conjunto com sendo beneficiários do auxílio, pelo facto de formarem uma só entidade económica (considerandos 417 a 419 da decisão impugnada).

c)   Quanto à recuperação do auxílio de Estado

63

Na secção 10 da decisão impugnada, intitulada «Recuperação», em primeiro lugar, a Comissão considerou, nomeadamente, que não era obrigada a fixar o montante exato do auxílio a recuperar, mas que lhe incumbia apenas fornecer ao destinatário da decisão informações suficientes para que ele próprio pudesse determinar o montante da recuperação. No caso em apreço, a Comissão considerou que, devendo o montante dos royalties ser igual a zero, os lucros contabilísticos da SMBV deveriam ter sido utilizados para calcular os lucros tributáveis da SMBV. Além disso, esses lucros deveriam ter sido aumentados da diferença entre o preço pago pelos grãos de café verde e o preço que deveria ter sido pago. A este respeito, a Comissão considerou que uma margem bruta de [confidencial] % para a SCTC constituía um preço de plena concorrência para a compra dos grãos de café. A Comissão especificou, então, que o montante a recuperar correspondia à diferença entre os impostos que deveriam ter sido pagos com base nesse preço e o montante efetivamente pago ao abrigo do APPT (considerandos 442 a 448 da decisão impugnada).

64

Em segundo lugar, a Comissão considerou que o Reino dos Países Baixos devia primeiro recuperar o auxílio junto da SMBV e que, se esta não estivesse em condições de efetuar o pagamento, o Reino dos Países Baixos deveria então recuperá‑lo junto da Starbucks Corp., dado que era esta entidade que controlava o grupo Starbucks (considerando 449 da decisão impugnada).

d)   Conclusão

65

A título de conclusão, a Comissão considerou que o Reino dos Países Baixos, através do APPT, tinha concedido ilegalmente um auxílio de Estado à SMBV e ao grupo Starbucks, em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, que o Reino dos Países Baixos tinha a obrigação de o recuperar, por força do artigo 16.o do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (JO 2015, L 248, p. 9), junto da SBMV e, caso esta não restituísse o montante total, junto da Starbucks Corp., no que respeita ao montante do auxílio não restituído (considerando 450 da decisão impugnada).

66

O dispositivo da decisão impugnada tem a seguinte redação:

«Artigo 1.o

O acordo prévio de preços de transferência celebrado [pelo Reino dos] Países Baixos em 28 de abril de 2008 com a [SMBV], que permite a esta última determinar a sua sujeição ao imposto sobre [as sociedades] nos Países Baixos numa base anual por um período de dez anos, constitui um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que é incompatível com o mercado interno e que foi ilegalmente executado [pelo Reino dos] Países Baixos em violação do artigo 108.o, n.o 3, do Tratado.

Artigo 2.o

[O Reino dos] Países Baixos dev[e] recuperar o auxílio incompatível e ilegal a que se refere o artigo 1.o junto da [SMBV].

Quaisquer montantes que continuem por recuperar junto da [SMBV], na sequência da recuperação descrita no número anterior, devem ser recuperados junto da Starbucks [Corp.]

Os montantes a recuperar devem ser acrescidos de juros, desde a data em que foram colocados à disposição dos beneficiários até à data da sua recuperação efetiva.

Os juros devem ser calculados numa base composta, em conformidade com o capítulo V do Regulamento (CE) n.o 794/2004.

Artigo 3.o

A recuperação do auxílio referido no artigo 1.o deve ser imediata e efetiva.

[O Reino dos] Países Baixos assegur[a] a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da sua notificação.

Artigo 4.o

No prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, [o Reino dos] Países Baixos dev[e] apresentar informações sobre o método adotado para calcular o montante exato do auxílio.

[O Reino dos] Países Baixos dev[e] manter a Comissão informada sobre a evolução das medidas nacionais adotadas para aplicar a presente decisão até que a recuperação do auxílio referido no artigo 1.o tenha sido concluída. A pedido da Comissão, dev[e] apresentar de imediato informações sobre as medidas já tomadas e planeadas para dar cumprimento à presente decisão.

[…]»

II. Tramitação processual e pedidos das partes

A. Quanto à fase escrita do processo T‑760/15

67

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de dezembro de 2015, o Reino dos Países Baixos interpôs o recurso no processo T‑760/15. A Comissão apresentou resposta em 30 de março de 2016. A réplica e a tréplica foram apresentadas, respetivamente, em 14 de junho de 2016 e 9 de setembro de 2016.

1.   Quanto à composição da formação de julgamento e ao tratamento prioritário

68

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de junho de 2016, o Reino dos Países Baixos pediu que o processo T‑760/15 fosse julgado por uma formação de julgamento alargada. O Tribunal Geral fez constar, em aplicação do artigo 28.o, n.o 5, do seu Regulamento de Processo, que o processo T‑760/15 foi remetido à Quinta Secção alargada.

69

Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada em 26 de setembro de 2016, o juiz‑relator foi afetado, em aplicação do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, à Sétima Secção alargada, à qual o processo T‑760/15 foi, consequentemente, atribuído.

70

Por impedimento de um membro da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral, o presidente do Tribunal Geral designou, por decisão de 26 de abril de 2017, o vice‑presidente do Tribunal Geral para completar a secção.

71

Por Decisão de 12 de dezembro de 2017, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral deferiu a proposta do juiz‑relator de o processo T‑760/15 ser julgado com prioridade, ao abrigo do artigo 67.o, n.o 2, do Regulamento de Processo.

2.   Quanto às intervenções

72

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de abril de 2016, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte pediu para intervir no processo T‑760/15 em apoio dos pedidos da Comissão.

73

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de abril de 2016, a Irlanda pediu para intervir no processo T‑760/15 em apoio dos pedidos do Reino dos Países Baixos.

74

Por Despacho de 13 de junho de 2016, o presidente da Quinta Secção do Tribunal Geral deferiu os pedidos de intervenção do Reino Unido e da Irlanda.

75

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de novembro de 2016, o Reino Unido desistiu da sua intervenção. Por Despacho de 12 de dezembro de 2016, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral cancelou no processo T‑760/15 o Reino Unido como interveniente.

3.   Quanto aos pedidos de tratamento confidencial

76

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de fevereiro de 2016, o Reino dos Países Baixos pediu o tratamento confidencial, em relação ao público, de uma parte da petição e de alguns documentos a esta anexados.

77

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de maio de 2016, o Reino dos Países Baixos pediu o tratamento confidencial, em relação à Irlanda, de parte da petição e de alguns dos seus documentos anexos, da decisão impugnada e de parte da contestação.

78

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de maio de 2016, a Comissão pediu o tratamento confidencial, em relação à Irlanda, de uma parte da resposta.

79

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de julho de 2016, o Reino dos Países Baixos pediu o tratamento confidencial, em relação à Irlanda, de uma parte da réplica e de alguns documentos a esta anexados.

80

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de julho de 2016, o Reino dos Países Baixos informou o Tribunal Geral de que tinha chegado a um acordo com a Comissão sobre a versão não confidencial da decisão impugnada para efeitos da sua publicação e que modificava os pedidos de tratamento confidencial efetuados no âmbito do processo T‑760/15, em relação à decisão impugnada, em conformidade com esse acordo.

81

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de outubro de 2016, o Reino dos Países Baixos pediu o tratamento confidencial, em relação à Irlanda, de uma parte da tréplica e de alguns documentos a esta anexados.

82

Na sequência da sua admissão como interveniente, a Irlanda recebeu unicamente versões não confidenciais das peças processuais e não levantou nenhuma objeção contra os pedidos de tratamento confidencial formulados a seu respeito.

83

Sob proposta do juiz‑relator, a Sétima Secção alargada do Tribunal Geral adotou uma medida de organização do processo prevista no artigo 89.o do Regulamento de Processo, através da qual o Reino dos Países Baixos foi convidado a rever os seus pedidos de tratamento confidencial relativos ao APPT, ao acordo de torrefação entre a SMBV e a Alki, mencionado no considerando 142 da decisão impugnada, e ao Relatório sobre os preços de transferência, a fim de eliminar algumas incoerências nos referidos pedidos. O Reino dos Países Baixos apresentou novas versões não confidenciais desses documentos dentro do prazo fixado.

4.   Quanto aos pedidos das partes

84

O Reino dos Países Baixos conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão nas despesas do processo T‑760/15.

85

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso no processo T‑760/15;

condenar o Reino dos Países Baixos nas despesas do processo T‑760/15.

86

A Irlanda conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne anular a decisão impugnada em conformidade com os pedidos do Reino dos Países Baixos.

B. Quanto à fase escrita do processo T‑636/16

87

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de setembro de 2016, a Starbucks Corp. e a Starbucks Manufacturing Emea (a seguir, conjuntamente, «Starbucks») interpuseram o recurso no processo T‑636/16. A Comissão apresentou a resposta em 16 de março de 2017. A réplica e a tréplica deram entrada, respetivamente, em 26 de junho e 20 de outubro de 2017.

1.   Quanto à composição da formação de julgamento e ao tratamento prioritário

88

Sob proposta da sua Sétima Secção, o Tribunal Geral decidiu, em 12 de julho de 2017, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

89

Por impedimento de um membro da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral, o presidente do Tribunal Geral designou, por decisão de 1 de agosto de 2017, o vice‑presidente do Tribunal Geral para completar a secção.

90

Por Decisão de 12 de dezembro de 2017, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral deferiu a proposta do juiz‑relator de o processo T‑636/16 ser julgado com prioridade ao abrigo do artigo 67.o, n.o 2, do Regulamento de Processo.

2.   Quanto aos pedidos de tratamento confidencial

91

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de abril de 2017 e que foi regularizado pelos requerimentos que deram entrada em 23 de abril de 2018, a Starbucks pediu o tratamento confidencial, em relação à Irlanda, de determinadas informações constantes da petição, da resposta, da réplica e da tréplica e de alguns dos anexos desses articulados.

3.   Quanto aos pedidos das partes

92

A Starbucks conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular os artigos 1.o a 4.o da decisão impugnada;

a título subsidiário, anular o artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada;

condenar a Comissão nas despesas do processo T‑636/16.

93

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso no processo T‑636/16;

condenar a Starbucks nas despesas do processo T‑636/16.

C. Quanto à apensação para efeitos da fase oral e à fase oral do processo

94

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de fevereiro de 2017, a Starbucks pediu a apensação dos processos T‑760/15 e T‑636/16 para efeitos da fase oral do processo.

95

Por Decisão de 7 de junho de 2017, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral decidiu não apensar, nessa fase do processo, os processos T‑760/15 e T‑636/16.

96

Por Decisão do presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral de 8 de maio de 2018, os processos T‑760/15 e T‑636/16 foram apensados para efeitos da fase oral do processo, em conformidade com o artigo 68.o do Regulamento de Processo.

97

Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu iniciar a fase oral do processo e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, pediu às partes que respondessem a perguntas escritas. As partes deram resposta a essa medida de organização do processo no prazo fixado.

98

Por requerimentos que deram entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 e 15 de junho de 2018, a Starbucks pediu o tratamento confidencial de determinadas informações constantes da sua resposta e da resposta da Comissão dadas às medidas de organização do processo.

99

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de junho de 2018, a Starbucks apresentou observações sobre o relatório para audiência.

100

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de junho de 2018, a Comissão pediu o desentranhamento dos autos das observações da Starbucks sobre o relatório para audiência.

101

Após ter recebido apenas as versões não confidenciais dos documentos mencionados nos n.os 91, 98 e 99, supra, a Irlanda não levantou nenhuma objeção contra os pedidos de tratamento confidencial formulados a seu respeito.

102

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de junho de 2018, a Starbucks pediu autorização para utilizar meios técnicos na audiência e propôs recorrer, durante a audiência, a um perito. Na audiência, a Comissão foi convidada a pronunciar‑se oralmente sobre o referido pedido e solicitou, por sua vez, autorização para utilizar meios técnicos durante a audiência.

103

Foram ouvidas as alegações das partes, com utilização dos meios técnicos pedidos, e as suas respostas às perguntas feitas pelo Tribunal Geral na audiência de 2 de julho de 2018.

104

As partes foram ouvidas na audiência sobre uma eventual apensação dos processos T‑760/15 e T‑636/16 para efeitos da decisão que põe termo à instância, o que o Tribunal Geral fez constar na ata da audiência.

III. Questão de direito

105

Para efeitos de apreciação dos presentes recursos, há que, desde já, dirimir algumas questões processuais suscitadas pelas partes, antes de analisar os fundamentos de mérito que foram invocados por estás últimas.

A. Questões processuais

106

No que respeita às questões processuais que se colocam no caso em apreço, há que, em primeiro lugar, examinar a eventual apensação dos presentes processos para efeitos da decisão que põe termo à instância. Em seguida, há que examinar o pedido da Comissão no sentido de as observações da Starbucks, de 8 de junho de 2018, sobre o relatório para audiência serem desentranhadas dos autos. Por último, importa examinar a questão da admissibilidade do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15, que foi contestada pela Comissão.

1.   Quanto à apensação dos presentes processos para efeitos da decisão que põe termo à instância

107

Ao abrigo do artigo 19.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral submeteu à Sétima Secção alargada do Tribunal Geral a decisão sobre a apensação dos processos T‑760/15 e T‑636/16 para efeitos da decisão que põe termo à instância, que era da sua competência.

108

Ouvidas as partes na audiência sobre uma eventual apensação, há que apensar, para efeitos da decisão que põe termo à instância, os processos T‑760/15 e T‑636/16, por razões de conexão.

2.   Quanto ao pedido de desentranhamento dos autos das observações da Starbucks sobre o relatório para audiência

109

Por carta de 14 de junho de 2018, a Comissão pediu ao Tribunal Geral o desentranhamento, dos autos dos processos T‑760/15 e T‑636/16, da carta da Starbucks de 8 de junho de 2018 (v. n.o 100, supra), na medida em que esta contém observações sobre o relatório para audiência, pelo facto de tais observações não estarem previstas no Regulamento de Processo nem nas disposições práticas de execução deste último.

110

Por um lado, importa recordar que, por decisão de 13 de junho de 2018, o presidente da Sétima Secção alargada do Tribunal Geral decidiu a junção aos autos da carta da Starbucks de 8 de junho de 2018. Por outro lado, há que relembrar que o Tribunal Geral é o único a decidir da necessidade de juntar aos autos atos não previstos no Regulamento de Processo. Por conseguinte, há que indeferir o pedido da Comissão de desentranhamento dos autos da carta de 8 de junho de 2018.

111

Todavia, segundo o artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, é proibido deduzir fundamentos novos no decurso da instância, a menos que esses fundamentos tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

112

Uma vez que a Starbucks não forneceu nenhuma justificação para a apresentação tardia dos argumentos suscitados na sua carta de 8 de junho de 2018, há que os julgar, como alegou a Comissão, inadmissíveis, na medida em que, ao alterar os fundamentos invocados na petição, vão além de meras observações sobre a confidencialidade e a exatidão do relatório para audiência.

3.   Quanto à admissibilidade do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15

113

A Comissão contesta a admissibilidade do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15, que contém uma comparação esquemática de certos aspetos do funcionamento dos contratos celebrados entre o grupo Starbucks e determinadas partes terceiras. Segundo a Comissão, os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia o recurso devem ser enunciados, sob pena de inadmissibilidade, pelo menos de forma sumária, mas coerente e compreensível, no próprio texto da petição. Esse requisito não está preenchido no caso em apreço.

114

Há que recordar que, por força do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objeto do litígio, os fundamentos e argumentos invocados e uma exposição sumária dos referidos fundamentos. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao recorrido preparar a sua defesa e ao Tribunal decidir do recurso, sendo caso disso, sem outras informações em apoio. Para que um recurso seja admissível, é necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição. Embora a petição possa ser sustentada e completada, no que respeita a aspetos específicos, por remissões para passagens bem determinadas de documentos que lhe estão anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexados à petição, não pode suprir a falta dos elementos essenciais da argumentação jurídica, os quais, por força das disposições acima referidas, devem constar da petição. Os anexos só podem ser tidos em conta na medida em que alicercem ou complementem fundamentos ou argumentos expressamente invocados pelos recorrentes no corpo dos seus articulados e em que seja possível determinar com precisão quais os elementos neles contidos que alicerçam ou complementam os referidos fundamentos ou argumentos. Além disso, não cabe ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos, os fundamentos e argumentos que possa considerar como o fundamento do recurso, uma vez que os anexos têm uma função puramente probatória e instrumental (v. Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.os 268 a 271 e jurisprudência referida).

115

No caso em apreço, há que observar que, relativamente aos contratos celebrados entre o grupo Starbucks e os torrefatores externos e fabricantes de produtos derivados do café, o Reino dos Países Baixos alega que o anexo A.7 contém um «resumo esquemático dos pontos de comparação dos contratos apresentados pela Comissão […] que retoma as três diferenças mencionadas» na petição do processo T‑760/15. Todavia, o Reino dos Países Baixos expõe, nos n.os 140 a 155 da petição no processo T‑760/15, as razões que demonstram, em seu entender, que os contratos invocados pela Comissão na sua decisão impugnada não são comparáveis à relação contratual entre a Alki e a SMBV.

116

A este respeito, há que referir que todos os argumentos constantes do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15 decorrem de forma suficientemente clara e precisa dos n.os 140 a 155 da petição no processo T‑760/15. Assim, na falta do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15, a Comissão teria condições para preparar a sua defesa e o Tribunal Geral para decidir do recurso. A única mais‑valia do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15 consiste, portanto, em indicar quais são os contratos específicos abrangidos pelos respetivos argumentos do Reino dos Países Baixos quando este se refere, nos n.os 140 a 155 da petição, à «maior parte» ou à «maioria» dos referidos contratos.

117

Por conseguinte, há que rejeitar o argumento da Comissão segundo o qual o anexo A.7 da petição no processo T‑760/15 deve ser julgado inadmissível.

B. Quanto aos fundamentos invocados e à estrutura do exame dos presentes recursos

118

Os recursos interpostos nos processos T‑760/15 e T‑636/16 visam a anulação da decisão impugnada na medida em que qualifica o APPT de auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e ordena a recuperação das quantias que não teriam sido cobradas pelo Reino dos Países Baixos à SMBV a título de imposto sobre as sociedades.

119

Em apoio dos seus recursos, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks invocam, respetivamente, cinco e dois fundamentos, a maioria dos quais se sobrepõe.

120

No âmbito do primeiro fundamento no processo T‑760/15, bem como no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks põem em causa a apreciação do caráter seletivo do APPT feita pela Comissão. Mais especificamente, alegam que a Comissão considerou um sistema de referência erróneo para efeitos do exame da seletividade do APPT.

121

No âmbito do segundo, terceiro e quarto fundamentos no processo T‑760/15, bem como no âmbito da segunda parte do primeiro fundamento e do segundo fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks alegam que a análise da Comissão segundo a qual o APPT conferia uma vantagem à SMBV é errada.

122

Mais especificamente, no âmbito do segundo fundamento no processo T‑760/15 e da segunda parte do primeiro fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks invocam, em substância, a violação do artigo 107.o TFUE, dado que a Comissão apreciou erradamente a existência de uma vantagem tendo em conta um princípio da plena concorrência que é próprio do direito da União e violou, assim, a autonomia fiscal dos Estados‑Membros.

123

No âmbito do terceiro fundamento no processo T‑760/15, bem como no âmbito da terceira parte do primeiro fundamento e da primeira, segunda, quarta e quinta partes do segundo fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks alegam, em substância, a violação do artigo 107.o TFUE, na medida em que a Comissão considerou erradamente que a escolha do MMLT para fixar os preços de transferência era constitutivo de uma vantagem. O Reino dos Países Baixos e a Starbucks contestam, em substância, a principal linha de raciocínio da Comissão referente à existência de uma vantagem fiscal a favor da SMBV, exposta nos considerandos 255 a 361 da decisão impugnada. Esses fundamentos dizem respeito à primeira a terceira linhas de raciocínio referidas no n.o 53, supra.

124

No âmbito do quarto fundamento no processo T‑760/15 e da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks invocam a violação do artigo 107.o TFUE, na medida em que a Comissão considerou erradamente que as modalidades de aplicação do MMLT, conforme validadas no APPT, conferiam uma vantagem à SMBV. Esses fundamentos dizem respeito à quarta a sexta linhas de raciocínio referidas no n.o 54, supra.

125

No âmbito do quinto fundamento no processo T‑760/15, o Reino dos Países Baixos alega a violação do princípio da diligência.

126

No que respeita à análise dos fundamentos invocados pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks, há que examinar, em primeiro lugar, o fundamento em que se contesta a existência do princípio da plena concorrência, tal como descrito pela Comissão na decisão impugnada. Em seguida, importa analisar os fundamentos que contestam que, nas suas primeira a sexta linhas de raciocínio expostas nos n.os 53 e 54, supra, a Comissão demonstrou que o APPT derrogava o regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades e conferia uma vantagem, na aceção do artigo 107.o TFUE, à SMBV. Mais, há que apreciar o fundamento que contesta que, no seu raciocínio à luz do sistema de referência restrito, exposto no n.o 55, supra, a Comissão demonstrou que o APPT derrogava o quadro de referência limitado composto pelo artigo 8.o‑B da LIS e pelo Decreto sobre os Preços de Transferência e conferia uma vantagem, na aceção do artigo 107.o TFUE, à SMBV. Por último, se o exame efetuado sobre a existência de uma vantagem resultar na rejeição dos referidos fundamentos, deverão ser examinados os fundamentos relativos à falta de seletividade da medida controvertida e à violação do dever de diligência.

127

A este respeito, importa, de resto, recordar que, segundo a jurisprudência, a qualificação de auxílio de Estado exige que estejam preenchidas todas as condições previstas no artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Está, assim, estabelecido que, para que uma medida possa ser qualificada de auxílio de Estado na aceção desta disposição, em primeiro lugar, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou com recursos estatais, em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem seletiva ao seu beneficiário e, em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (v. Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck, C‑524/14 P, EU:C:2016:971, n.o 40 e jurisprudência referida).

128

Ora, no caso em apreço, conforme resulta da apresentação dos fundamentos exposta nos n.os 118 a 125, supra, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks não contestam a apreciação efetuada pela Comissão referente às duas primeiras condições e à quarta condição a satisfazer para que uma medida seja qualificada de auxílio de Estado. Com efeito, supondo que a Comissão tivesse demonstrado que o APPT conferia uma vantagem fiscal, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks não contestam que o mesmo constituía uma intervenção do Estado ou como recursos estatais, que era suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros e que falseava ou ameaçava falsear a concorrência. Os quatro primeiros fundamentos invocados no processo T‑760/15 destinam‑se, em substância, a pôr em causa a conclusão da Comissão de que o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV.

129

Além disso, no que respeita à demonstração da vantagem seletiva, há que salientar que a abordagem da Comissão que consiste em analisar concomitantemente os critérios da vantagem e da seletividade não é, em si, errada, dado que são examinados tanto a vantagem como o respetivo caráter seletivo. No entanto, o Tribunal Geral entende que é oportuno apreciar, em primeiro lugar, se a Comissão podia legitimamente concluir pela existência de uma vantagem, antes de proceder, sendo caso disso, à análise da questão de saber se essa vantagem devia ser considerada seletiva.

130

Posteriormente, deverão ser analisados os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks relativos à inexistência de uma vantagem, na aceção do artigo 107.o TFUE, conferida à SMBV pelo APPT.

C. Quanto à existência de um princípio da plena concorrência no domínio da fiscalização dos auxílios de Estado e quanto ao respeito do princípio da autonomia fiscal dos Estados‑Membros

131

Com o seu segundo fundamento, o Reino dos Países Baixos alega que a Comissão cometeu um erro ao identificar um princípio da plena concorrência próprio do direito da União e ao identificá‑lo enquanto critério de apreciação da existência de um auxílio de Estado. A Starbucks invoca, em substância, as mesmas alegações, na segunda parte do seu primeiro fundamento.

132

Em primeiro lugar, o Reino dos Países Baixos alega que o Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416), no qual a Comissão se baseia para identificar um princípio da plena concorrência próprio do direito da União, não permite inferir a existência de tal princípio. Além disso, a Comissão não indicou o fundamento a partir do qual identificou a existência de um princípio da plena concorrência no direito da União, nem especificou o conteúdo desse princípio. A Starbucks acrescentou que, não obstante o facto de o respeito do artigo 107.o TFUE constituir efetivamente um limite à autonomia fiscal dos Estados‑Membros, a Comissão excedeu os poderes que lhe foram conferidos pelo artigo 107.o TFUE. A Starbucks acusa a Comissão de ter substituído, a coberto do princípio da igualdade de tratamento, as normas de direito fiscal neerlandês por um princípio em matéria de preços de transferência desenvolvido de forma autónoma e, assim, de ter imposto normas substantivas de direito fiscal.

133

Em segundo lugar, o Reino dos Países Baixos alega que a Comissão não podia examinar o APPT atendendo a um princípio da plena concorrência próprio do direito da União, porque apenas a legislação e a regulamentação nacional do Estado‑Membro em causa são pertinentes para efeitos de fiscalização dos auxílios de Estado. Mais especificamente, o Reino dos Países Baixos sustenta que a existência de uma vantagem só podia ser apreciada atendendo aos encargos que normalmente oneram o orçamento da empresa ao abrigo do direito nacional e não à luz de um princípio da plena concorrência próprio do direito da União. A Starbucks acrescenta, ainda, que a Comissão não teve em conta o direito neerlandês e terá mesmo baseado o seu raciocínio em considerações divergentes, até mesmo opostas, às regras neerlandesas em matéria de preços de transferência.

134

Antes de mais, a Irlanda acrescenta que a Comissão, que tinha a obrigação de identificar uma derrogação, não comparou a situação da Starbucks à de qualquer outro contribuinte e apenas procurou aplicar o princípio da plena concorrência. Em seguida, a Irlanda alega que a Comissão não pode impor a aplicação de regras que nunca foram incorporadas no sistema nacional. Assim, admitir um princípio de igualdade de tratamento em matéria fiscal prejudicaria a autonomia e a soberania dos Estados‑Membros. Por último, a Irlanda afirma que o Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416), não identificou um princípio da plena concorrência próprio do direito da União, na medida em que, nesse caso, por um lado, o princípio da plena concorrência estava incorporado no direito nacional belga e, por outro, o acórdão faz referência às Orientações da OCDE, que foram integradas no direito nacional belga.

135

A Comissão contesta esses argumentos. A Comissão alega, nomeadamente, que apreciou a existência de uma vantagem seletiva à luz do sistema de referência decorrente do direito nacional e não à luz do princípio da plena concorrência. Com efeito, resulta claramente da decisão impugnada que a existência de uma vantagem teria sido analisada por comparação com a carga fiscal que normalmente deveria ter sido tributada à SMBV ao abrigo do regime comum neerlandês do imposto sobre as sociedades.

136

No âmbito do presente fundamento, em substância, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks acusam, portanto, a Comissão de ter identificado um princípio da plena concorrência próprio do direito da União, em violação da autonomia fiscal dos Estados‑Membros, e de ter examinado o APPT apenas à luz desse princípio, sem ter em conta o direito neerlandês.

137

Antes de mais, importa salientar que, como resulta designadamente dos considerandos 252, 267 e 408 da decisão impugnada, a apreciação à luz do princípio da plena concorrência conforme descrita pela Comissão na decisão impugnada se inscreve no âmbito da sua análise da vantagem seletiva efetuada a título principal. Conforme exposto no n.o 35, supra, essa análise feita a título principal consiste em examinar se o APPT derroga o sistema geral neerlandês do imposto sobre as sociedades. A este respeito, há que sublinhar que a Comissão indicou previamente, nos considerandos 232 a 244 da decisão impugnada, que o objetivo do sistema geral neerlandês do imposto sobre as sociedades era tributar os lucros de todas as sociedades estabelecidas nos Países Baixos, independentemente de estarem ou não integradas, e que estes dois tipos de sociedades se encontram numa situação factual e jurídica semelhante à luz deste objetivo.

138

No que respeita à definição do princípio da plena concorrência, a Comissão afirmou, nos considerandos 258 e 261 da decisão impugnada, que, de acordo com este princípio, as transações intragrupo deveriam ser remuneradas como se tivessem sido negociadas entre empresas independentes. A Comissão acrescentou, no considerando 262 da decisão impugnada, que o objetivo do referido princípio era assegurar que as transações intragrupo fossem tratadas, para efeitos fiscais, em relação ao montante do lucro que teria sido realizado se a transação tivesse sido concluída por empresas autónomas. Aliás, a Comissão sustentou na audiência que o princípio da plena concorrência era, em seu entender, um instrumento para a apreciação do nível de preços das transações intragrupo, o que o Tribunal Geral fez constar na ata da audiência.

139

No que respeita à natureza jurídica do princípio da plena concorrência, a Comissão entendeu, no considerando 264 da decisão impugnada, que o princípio da plena concorrência fazia necessariamente parte da análise, no âmbito do artigo 107.o TFUE, das medidas fiscais concedidas às sociedades de um grupo, independentemente da questão de saber se o Estado‑Membro tinha incorporado esse princípio no seu sistema jurídico nacional. A Comissão precisou que o princípio da plena concorrência por ela aplicado era um princípio geral de igualdade de tratamento em matéria fiscal, que era abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o TFUE. A versão francesa da decisão impugnada menciona, neste contexto, um «princípio de tratamento equitativo», o que constitui um erro na tradução da expressão «princípio da igualdade de tratamento». A Comissão baseou essa conclusão no Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416), referente ao regime fiscal dos centros de coordenação na Bélgica, no qual o Tribunal de Justiça considerou que o método de determinação dos rendimentos tributáveis previsto pelo referido regime conferia uma vantagem seletiva aos referidos centros. Mais especificamente, a Comissão remete para o n.o 96 do referido acórdão, no qual o Tribunal de Justiça considerou que o método de determinação dos rendimentos tributáveis dos referidos centros «não permite obter preços de transferência próximos dos que [er]am praticados em condições de livre concorrência».

140

Quanto à aplicação do princípio da plena concorrência, no considerando 263 da decisão impugnada, a Comissão indicou que, para apreciar se o Reino dos Países Baixos tinha concedido uma vantagem seletiva à SMBV, devia, por conseguinte, verificar se a metodologia aceite pela Administração Fiscal neerlandesa através da celebração do APPT, para a determinação dos lucros tributáveis da SMBV nos Países Baixos, se afastava de uma metodologia que resultasse numa aproximação fiável de resultados baseados no mercado e, desse modo, do princípio da plena concorrência. A Comissão acrescentou, no considerando 264 da decisão impugnada, que o princípio da plena concorrência era aplicado para determinar se os lucros tributáveis de uma sociedade pertencente a um grupo, para efeitos de cômputo do imposto sobre as sociedades, tinham sido calculados aplicando uma metodologia que se aproximava das condições de mercado, para que essa sociedade não beneficiasse de um tratamento mais favorável, ao abrigo do sistema geral de imposto sobre as sociedades, do que o reservado às sociedades não integradas, cujos lucros tributáveis eram determinados pelo mercado.

141

Por conseguinte, importa apreciar se a Comissão podia analisar a medida em causa à luz do princípio da plena concorrência, conforme descrito na decisão impugnada e resumido nos n.os 138 a 140, supra, que consiste em verificar se as transações intragrupo são remuneradas como se tivessem sido negociadas em condições de mercado.

142

Segundo jurisprudência constante, embora, na atual fase de desenvolvimento do direito da União, a fiscalidade direta seja da competência dos Estados‑Membros, estes devem, todavia, exercer essa competência no respeito do direito da União (v. Acórdão de 12 de julho de 2012, Comissão/Espanha, C‑269/09, EU:C:2012:439, n.o 47 e jurisprudência referida). Assim, as intervenções dos Estados‑Membros em matéria de fiscalidade direta, ainda que incidam sobre questões que não foram objeto de uma harmonização na União, não estão excluídas do âmbito de aplicação da regulamentação relativa à fiscalização dos auxílios de Estado.

143

Decorre daí que a Comissão pode qualificar uma medida fiscal de auxílio de Estado, desde que estejam reunidas as condições para essa qualificação (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.o 28; e de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416, n.o 81). Com efeito, os Estados‑Membros devem exercer a sua competência em matéria fiscal em conformidade com o direito da União (Acórdão de3 de junho de 2010, Comissão/Espanha, C‑487/08, EU:C:2010:310, n.o 37). Por conseguinte, devem abster‑se de tomar, neste contexto, qualquer medida suscetível de constituir um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno.

144

Ora, no que respeita à condição segundo a qual a medida em causa deve conceder uma vantagem económica, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, são consideradas auxílios de Estado as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam suscetíveis de favorecer direta ou indiretamente empresas, ou que devam ser consideradas uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado (v. Acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post, C‑399/08 P, EU:C:2010:481, n.o 40 e jurisprudência referida; Acórdão de 9 de outubro de 2014, Ministerio de Defensa e Navantia, C‑522/13, EU:C:2014:2262, n.o 21).

145

Mais precisamente, uma medida através da qual as autoridades públicas concedem a determinadas empresas um tratamento fiscal vantajoso que, ainda que não implique uma transferência de recursos do Estado, coloca os beneficiários numa situação financeira mais favorável do que a dos outros contribuintes, constitui um auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (Acórdão de 15 de março de 1994, Banco Exterior de España, C‑387/92, EU:C:1994:100, n.o 14; v., igualmente, Acórdão de 8 de setembro de 2011, Paint Graphos e o., C‑78/08 a C‑80/08, EU:C:2011:550, n.o 46 e jurisprudência referida).

146

No caso das medidas fiscais, a própria existência de uma vantagem só pode ser afirmada em relação a uma tributação dita «normal» (Acórdão de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, EU:C:2006:511, n.o 56). Por conseguinte, tal medida confere uma vantagem económica ao seu beneficiário sempre que aliviar os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa e que, deste modo, sem ser uma subvenção no sentido estrito da palavra, tiver a mesma natureza e efeitos idênticos (Acórdão de 9 de outubro de 2014, Ministerio de Defensa e Navantia, C‑522/13, EU:C:2014:2262, n.o 22).

147

Consequentemente, para determinar se existe uma vantagem fiscal, há que comparar a situação do beneficiário resultante da aplicação da medida em causa com a situação dele na falta da medida em causa (v., neste sentido, Acórdão de 26 de abril de 2018, Cellnex Telecom e Telecom Castilla‑La Mancha/Comissão, C‑91/17 P e C‑92/17 P, não publicado, EU:C:2018:284, n.o 114) e com a aplicação das regras normais de tributação.

148

No contexto da determinação da situação fiscal de uma sociedade integrada que faz parte de um grupo de empresas, há que salientar, desde já, que os preços das transações intragrupo efetuadas por esta sociedade não foram determinados em condições de mercado. Com efeito, esses preços são acordados entre sociedades pertencentes ao mesmo grupo, pelo que não estão sujeitos às forças do mercado.

149

Ora, quando o direito fiscal nacional não faz qualquer distinção entre as empresas integradas e as empresas autónomas para efeitos de sujeição ao imposto sobre as sociedades, esse direito pretende tributar o lucro resultante da atividade económica de uma empresa integrada como se resultasse de transações efetuadas a preços de mercado. Nestas circunstâncias, há que declarar que, quando examina, no âmbito da competência que lhe é atribuída pelo artigo 107.o, n.o 1, TFUE, uma medida fiscal concedida a uma empresa integrada, a Comissão pode comparar a carga fiscal de tal empresa integrada resultante da aplicação da referida medida fiscal com a carga fiscal resultante da aplicação das regras normais de tributação do direito nacional de uma empresa, colocada numa situação factual comparável, que exerce as suas atividades em condições de mercado.

150

Aliás, como salientou com razão a Comissão na decisão impugnada, estas conclusões são corroboradas pelo Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão (C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416), que era referente ao direito fiscal belga, o qual previa que as sociedades integradas e as sociedades autónomas fossem tratadas nas mesmas condições. Com efeito, o Tribunal de Justiça reconheceu, no n.o 95 desse acórdão, a necessidade de comparar um regime de auxílios derrogatório com o do «direito comum baseado na diferença entre receitas e despesas de uma empresa que exerça as suas atividades em condições de livre concorrência».

151

Neste contexto, embora, através da medida fiscal concedida a uma sociedade integrada, as autoridades nacionais tenham aceitado um determinado nível de preços de uma transação intragrupo, o artigo 107.o, n.o 1, TFUE permite à Comissão fiscalizar se esse nível de preços corresponde ao que teria sido praticado em condições de mercado, a fim de verificar se daí resulta um alívio dos encargos que normalmente oneram o orçamento da empresa em causa, conferindo‑lhe assim uma vantagem na aceção do referido artigo. O princípio da plena concorrência, conforme descrito pela Comissão na decisão impugnada, constitui então um instrumento que permite efetuar essa verificação no âmbito do exercício das suas competências ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Aliás, a Comissão precisou, com razão, no considerando 261 da decisão impugnada que o princípio da plena concorrência intervinha como um «indicador de referência» para determinar se uma sociedade integrada beneficiava, ao abrigo de uma medida fiscal que determina os seus preços de transferência, de uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

152

Além disso, há que precisar que, quando aplica este instrumento a fim de fiscalizar se o lucro tributável de uma empresa integrada, em aplicação de uma medida fiscal, corresponde a uma aproximação fiável de um lucro tributável gerado em condições de mercado, a Comissão só pode declarar a existência de uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se a discrepância entre os dois fatores de comparação for além das imprecisões inerentes ao método aplicado para obter a referida aproximação.

153

No caso em apreço, o APPT tem por objeto a determinação do lucro tributável da SMBV ao abrigo da LIS, que, independentemente da questão de saber se as regras normais de tributação devem ser definidas de forma ampla ou restrita, tende a que empresas integradas e as empresas autónomas nos Países Baixos sejam tributadas do mesmo modo no que diz respeito ao imposto sobre as sociedades. Por conseguinte, a Comissão estava em condições de verificar se o lucro tributável da SMBV ao abrigo do APPT era inferior à carga fiscal da SMBV na falta do APPT e em aplicação das regras normais de tributação do direito neerlandês. Dado que a SMBV é uma empresa integrada e que a LIS visa tributar o lucro que provém da atividade económica de tal empresa integrada como se ele resultasse de transações efetuadas a preços de mercado, há que comparar, no âmbito da análise do APPT, o lucro tributável da SMBV resultante da aplicação do APPT com a situação, resultante da aplicação das regras normais de tributação do direito neerlandês, de uma empresa, numa situação factual comparável, que exerce as suas atividades em condições de livre concorrência. Nesta matéria, se o APPT aceitar um determinado nível de preços de uma transação intragrupo, há que fiscalizar se esse nível de preços corresponde ao que teria sido praticado em condições de mercado.

154

Neste contexto, importa precisar que, no que respeita ao exame da questão de saber se uma empresa integrada obteve uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, não se pode censurar a Comissão por ter utilizado um método de determinação dos preços de transferência, que considera apropriado no caso vertente, a fim de examinar o nível dos preços de transferência para uma transação ou várias transações estreitamente ligadas, que faz parte da medida controvertida. No entanto, cabe à Comissão justificar a sua escolha metodológica.

155

Embora a Comissão tenha referido, com razão, que não pode estar formalmente vinculada pelas Orientações da OCDE, não é menos verdade que estas orientações se baseiam em trabalhos realizados por grupos de peritos, refletem o consenso alcançado à escala internacional relativamente aos preços de transferência e revestem, deste modo, uma importância prática indubitável na interpretação das questões relativas aos preços de transferência, conforme reconheceu a Comissão no considerando 66 da decisão impugnada.

156

Por conseguinte, a Comissão considerou, com razão, que podia examinar, no âmbito da sua análise feita ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se as transações intragrupo eram remuneradas como se tivessem sido negociadas em condições de mercado. Esta conclusão não é posta em causa pelos outros argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks.

157

Em primeiro lugar, quanto ao argumento do Reino dos Países Baixos segundo o qual a Comissão não especificou o conteúdo do princípio da plena concorrência tal como descrito na decisão impugnada, basta recordar que decorre da decisão impugnada que este é um instrumento que permite fiscalizar se as transações intragrupo são remuneradas como se tivessem sido negociadas entre empresas independentes (v. n.o 138, supra). Por conseguinte, há que rejeitar esse argumento.

158

Em segundo lugar, por mais que o Reino dos Países Baixos e a Starbucks sustentem que o princípio da plena concorrência, conforme descrito pela Comissão na decisão impugnada, lhe permite, por si só, prescrever o lucro tributável de uma empresa, tendo por consequência uma harmonização dissimulada em matéria de fiscalidade direta que viola à autonomia fiscal dos Estados‑Membros, este argumento dever ser rejeitado.

159

Com efeito, se, na falta de regulamentação da União nesta matéria, é da competência dos Estados‑Membros a determinação da matéria coletável e a repartição da carga fiscal entre os diferentes fatores de produção e os diferentes setores económicos (v., neste sentido, Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão e Espanha/Government of Gibraltar e Reino Unido, C‑106/09 P e C‑107/09 P, EU:C:2011:732, n.o 97), isso não implica que qualquer medida fiscal, que afeta designadamente a matéria coletável tida em conta pelas autoridades fiscais, escape à aplicação do artigo 107.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão e Espanha/Government of Gibraltar e Reino Unido, C‑106/09 P e C‑107/09 P, EU:C:2011:732, n.o 104). Decorre daí que a Comissão não dispõe, nesta fase do desenvolvimento do direito da União, de uma competência que lhe permita definir de forma autónoma a tributação dita «normal» de uma empresa integrada, fazendo abstração das regras fiscais nacionais. Todavia, embora a tributação dita «normal» seja definida pelas normas fiscais nacionais e a própria existência de uma vantagem deva ser estabelecida em relação às mesmas, não é menos verdade que, se for previsto por essas normas nacionais que as sociedades autónomas e as sociedades integradas são tributadas nas mesmas condições, o artigo 107.o, n.o 1, TFUE permite à Comissão fiscalizar se o nível de preços das transações intragrupo, aceite pelas autoridades nacionais para a determinação da matéria coletável de uma empresa integrada, corresponde ao nível de preços de uma transação que foi negociada em condições de mercado.

160

Por conseguinte, ao examinar se o método validado numa medida fiscal nacional conduz a um resultado que foi estabelecido em conformidade com o princípio da plena concorrência, conforme definido no n.o 137, supra, a Comissão não excede as suas competências.

161

Em terceiro lugar, uma vez que o Reino dos Países Baixos sustenta que a Comissão não indicou nenhum fundamento jurídico para o seu princípio da plena concorrência, há que salientar que, nos considerandos 264 e 265 da decisão impugnada, a Comissão expôs que o princípio da plena concorrência, conforme descrito na decisão impugnada, existia independentemente da incorporação desse princípio no sistema jurídico nacional. A Comissão também precisou que não examinou se o APPT era conforme com o princípio da plena concorrência previsto no artigo 8.o‑B da LIS ou do Decreto sobre os Preços de Transferência, que incorporam o princípio da plena concorrência no direito neerlandês. Do mesmo modo, a Comissão afirmou que o princípio da plena concorrência por ela aplicado era distinto do princípio consagrado no artigo 9.o do Modelo de Convenção da OCDE sobre o rendimento e a fortuna.

162

Contudo, a Comissão também especificou, no considerando 264 da decisão impugnada, que o princípio da plena concorrência fazia necessariamente parte integrante da análise, nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, das medidas fiscais concedidas às sociedades de um grupo e que o referido princípio era um princípio geral de igualdade de tratamento em matéria de tributação, que era abrangido pela aplicação do artigo 107.o TFUE.

163

Resulta, portanto, da decisão impugnada que o princípio da plena concorrência, conforme descrito pela Comissão, é um instrumento utilizado, legalmente, no âmbito do exame efetuado ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

164

É certo que, na audiência, a Comissão sustentou, nomeadamente, que o princípio da plena concorrência, conforme descrito na decisão impugnada, não era abrangido pelo direito da União, nem pelo direito internacional, mas que era inerente ao sistema comum de tributação tal como previsto pelo direito nacional. Assim, segundo a Comissão, se um Estado‑Membro optar, no âmbito do seu sistema fiscal nacional, pela abordagem da entidade jurídica distinta, segundo a qual o direito fiscal se prende com as entidades jurídicas e não com as entidades económicas, o princípio da plena concorrência é necessariamente um corolário dessa abordagem, que tem valor vinculativo no Estado‑Membro em causa, independentemente da questão de saber se o princípio da plena concorrência foi, explícita ou implicitamente, incorporado no direito nacional.

165

A este respeito, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks indicaram na audiência que, com essas afirmações, a Comissão parecia alterar a sua posição referente ao princípio da plena concorrência, conforme descrito na decisão impugnada. Todavia, supondo que a interpretação avançada pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks seja confirmada, há que salientar, em todo o caso, que a Comissão não pode alterar, na fase da audiência, a base jurídica do princípio da plena concorrência tal como exposta na decisão impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.o 116).

166

Seja como for, há que referir que a precisão feita na audiência não põe em causa a constatação, no n.o 156, supra, segundo a qual decorre da decisão impugnada que o princípio da plena concorrência intervém no âmbito da análise feita ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Aliás, resulta de todos os articulados do Reino dos Países Baixos e da Starbucks que estes entenderam corretamente a decisão impugnada, no sentido de que o princípio da plena concorrência, conforme descrito pela Comissão na decisão impugnada, intervém no âmbito da análise de uma medida fiscal nacional ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE

167

Em quarto lugar, o Reino dos Países Baixos e a Irlanda alegam, em substância, que a Comissão consagrou indevidamente, na decisão impugnada, a existência de um princípio geral de igualdade de tratamento para efeitos do imposto sobre os lucros das empresas integradas e não integradas.

168

É certo que a Comissão indicou, no considerando 264 da decisão impugnada, que o princípio da plena concorrência era um princípio geral de igualdade de tratamento em matéria de tributação, que era abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. No entanto, essa formulação não deve ser isolada do seu contexto e não pode ser interpretada no sentido de que a Comissão teria afirmado a existência de um princípio geral de igualdade de tratamento perante o imposto inerente ao artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o que daria um alcance demasiado amplo ao referido artigo.

169

De qualquer modo, resulta implicitamente, mas necessariamente, dos n.os 258 a 267 da decisão impugnada, e, em especial, dos n.os 262 e 265 dessa decisão, que o princípio da plena concorrência, conforme descrito pela Comissão na decisão impugnada, foi apenas entendido por esta como um instrumento que lhe permite fiscalizar que as transações intragrupo são remuneradas como se tivessem sido negociadas entre empresas independentes. O argumento do Reino dos Países Baixos e da Irlanda não pode pôr em causa a conclusão tirada nos n.os 147 a 156, supra, de que a Comissão podia examinar, no âmbito da sua análise feita ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se as transações intragrupo eram remuneradas como se tivessem sido negociadas em condições de mercado.

170

Por conseguinte, há que rejeitar o argumento do Reino dos Países Baixos e da Irlanda a este respeito.

171

Em quinto lugar, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks sustentam que a Comissão fez uma apreciação à luz do princípio da plena concorrência, mas não examinou a existência de uma vantagem por via do direito fiscal nacional. A este respeito, importa referir que resulta claramente dos considerandos 267, 341, 415 e 416 da decisão impugnada que a Comissão efetuou a sua análise da existência de uma vantagem à luz do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades. Haverá que verificar se essa análise enferma de erro no âmbito da apreciação específica das seis linhas de raciocínio e, se for o caso, do raciocínio à luz do sistema de referência restrito.

172

Com base no que precede, há que julgar improcedente o segundo fundamento no processo T‑760/15 e a segunda parte do primeiro fundamento no processo T‑636/16, segundo os quais a Comissão cometeu um erro ao identificar um princípio da plena concorrência como critério de apreciação da existência de um auxílio de Estado. É, portanto, à luz das considerações referidas nos n.os 137 a 170, supra, que há que apreciar o mérito de cada linha de raciocínio exposta na decisão impugnada (v. n.os 53 e 54, supra).

D. Quanto à contestação do raciocínio principal relativo à existência de uma vantagem fiscal a favor da SMBV (considerandos 275 a 361 da decisão impugnada)

1.   Quanto à escolha do MMLT no caso vertente e ao facto de não ter sido examinada a transação intragrupo para a qual o APPT foi efetivamente pedido (primeira linha de raciocínio)

173

A primeira parte do terceiro fundamento no processo T‑760/15, bem como a terceira parte do primeiro fundamento e a primeira e segunda partes do segundo fundamento no processo T‑636/16, incide sobre a análise da Comissão, efetuada na decisão impugnada, segundo a qual, por um lado, o Relatório sobre os preços de transferência não tinha identificado nem analisado a transação para a qual era efetivamente determinado um preço no APPT, a saber, os royalties, e, por outro, o método CUP deveria ter sido privilegiado, para determinar o nível dos royalties, em relação ao MMLT, a fim de determinar o lucro líquido das atividades de produção e de distribuição da SMBV. Essas duas acusações formuladas contra o APPT, enquanto questão de princípio, precedem a análise concreta da Comissão segundo a qual o nível dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero e o nível dos preços dos grãos de café verde a partir de 2011 era demasiado elevado, aspetos que serão examinados nos n.os 217 a 404, infra.

174

Com a primeira parte do terceiro fundamento no processo T‑760/15, o Reino dos Países Baixos contesta o argumento da Comissão segundo o qual o MMLT não permite examinar e apreciar distintamente a conformidade com a plena concorrência dos royalties. O Reino dos Países Baixos alega que esse argumento é errado e não é suscetível de questionar a pertinência da escolha do MMLT no caso vertente.

175

Em primeiro lugar, o Reino dos Países Baixos sustenta que parece resultar da decisão impugnada que a Comissão fez do método de determinação dos preços de transferência um fim em si, quando se trata apenas de um meio para determinar a conformidade com a plena concorrência das condições das transações intragrupo. Ora, se o método escolhido conduz a um resultado conforme com a plena concorrência, a Comissão não poderia pô‑lo em causa pelo facto de os royalties e a margem percentual aplicada ao preço de custo dos grãos de café verde não terem sido examinados individualmente. Mais, segundo o Reino dos Países Baixos, a Comissão não podia considerar que as Orientações da OCDE privilegiavam a utilização dos métodos tradicionais, como o método CUP, em detrimento dos métodos transacionais, como o MMLT. Pelo contrário, resulta do n.o 2 do Decreto sobre os Preços de Transferência e do ponto 4.9 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995, que o contribuinte é livre de escolher um método de preços de transferência, desde que o método escolhido conduza a um resultado de plena concorrência.

176

Em segundo lugar, o Reino dos Países Baixos considera que, contrariamente ao que sustenta a Comissão na decisão impugnada, as únicas transações abrangidas pelo APPT são a torrefação de grãos de café e a prestação de serviços logísticos e administrativos por conta da Alki. O APPT não visa determinar se os royalties estão conformes com a plena concorrência. Por outro lado, o Reino dos Países Baixos salienta que, na decisão impugnada, a Comissão não explica as razões que a levaram a presumir que o APPT tinha sido solicitado e celebrado para um contrato de licença e para os royalties.

177

Em terceiro lugar, o Reino dos Países Baixos sustenta que o MMLT era o método mais adequado no caso em apreço. Segundo o Reino dos Países Baixos, a principal razão para a escolha desse método foi a falta de transações independentes externas ou internas semelhantes, necessárias para efeitos de aplicação do método CUP, às quais seria possível comparar as transações entre a Alki e a SMBV e, consequentemente, a remuneração que lhes era associada. Em contrapartida, segundo o Reino dos Países Baixos, o MMLT podia ser aplicado no caso da SMBV pelo facto de haver, efetivamente, informações disponíveis sobre o lucro de exploração das empresas que lhe eram comparáveis em termos de função, a saber, a torrefação de grãos de café.

178

Na terceira parte do primeiro fundamento e na segunda parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, a Starbucks sustenta que o MMLT era o método mais apropriado para calcular os preços de transferência no caso em apreço e que a Comissão não podia ter rejeitado o MMLT pelos motivos enunciados na decisão impugnada. Segundo a Starbucks, na medida em que o MMLT foi corretamente aplicado para calcular a remuneração de plena concorrência da SMBV, é inútil examinar separadamente os pagamentos dos royalties efetuados pela SMBV, dado que esses pagamentos não podiam ter qualquer incidência sobre a sua remuneração tal como foi calculada com base no MMLT.

179

Mais especificamente, em primeiro lugar, a Starbucks alega que a afirmação feita pela Comissão de que existe uma regra estrita a favor da utilização do método CUP não tem nenhum fundamento em direito fiscal neerlandês nem nas Orientações da OCDE. Além disso, a Starbucks considera que a utilização de um método diferente em matéria de preços de transferência não tem, por si só, por efeito reduzir o montante do imposto devido, na medida em que todos os métodos procuram alcançar a afetação dos lucros que reflita preços de transferência de plena concorrência. O facto de alegar um erro metodológico não basta para provar a existência de uma vantagem.

180

Em segundo lugar, no entender da Starbucks, a Comissão comparou o preço do café verde e os royalties com transações «controladas» (intragrupo) em violação do direito fiscal neerlandês. Ora, a Starbucks escolheu o MMLT porque o contrato de torrefação combinava diversas transações intragrupo pelas quais eram confiadas à SMBV atividades rotineiras de baixo risco, a saber, atividades de torrefação e de acondicionamento de café e atividades de apoio administrativo e logístico.

181

Em terceiro lugar, a Starbucks sustenta que a decisão impugnada não contém nenhum argumento que permita afirmar que a simples falta de identificação e de análise das transações intragrupo da SMBV baste para provar a existência de uma vantagem e que esse argumento foi suscitado pela primeira vez na contestação no processo T‑636/16 e é, por conseguinte, inadmissível.

182

A Comissão contesta esses argumentos.

183

Em primeiro lugar, a Comissão explica que em nenhuma parte da decisão impugnada impôs uma regra estrita de aplicação do método CUP em vez de outro método de fixação dos preços de transferência, mas que o método mais fiável devia ser escolhido em função das circunstâncias do caso. A Comissão estabeleceu, antes de mais, que o APPT tinha sido solicitado e concedido para fixar o preço do contrato de licença de propriedade intelectual entre a SMBV e a Alki e concluiu, em seguida, que, uma vez que era possível determinar um preço comparável para o preço dessa transação, a utilização do método CUP era, no caso em apreço, preferível à do método MMLT. A Comissão sustenta que, para o efeito, se baseou no exposto nas Orientações da OCDE.

184

Em segundo lugar, a Comissão sustenta que o método aprovado no APPT para determinar o montante dos royalties, através dos quais a SMBV paga à Alki o lucro residual da venda dos grãos torrados e dos produtos não relacionados com café, não pode conduzir a um resultado que seja conforme com o princípio da plena concorrência. Com efeito, segundo a Comissão, visto que existiam transações comparáveis que permitiam estimar o valor dos royalties, o consultor fiscal deveria ter utilizado o método CUP para definir o preço dos royalties devidos pela SMBV à Alki, que foi a transação para a qual o APPT tinha sido efetivamente solicitado e concedido. Além disso, os preços faturados pela SCTC à SMBV pelos grãos de café verde também deveriam ter sido sujeitos a uma análise dos preços de transferência. A Comissão alega que, contrariamente ao que sustentam o Reino dos Países Baixos e a Starbucks, a fixação do preço de transações individuais é a própria essência desse princípio. Assim, a identificação e a análise das transações controladas e não controladas constituem uma primeira etapa indispensável na apreciação da natureza de plena concorrência dos preços de transferência.

185

Em terceiro lugar, a Comissão alega que o Reino dos Países Baixos não fez prova de que o MMLT fosse mais apropriado, no caso vertente, do que o método CUP. Com efeito, a Comissão sustenta, em primeiro lugar, que as Orientações da OCDE na sua versão de 1995 — em vigor no momento da conclusão do APP — e na sua versão de 2010 dão preferência aos métodos de transação tradicionais, como o método CUP, em detrimento dos métodos de lucro da transação. Ora, segundo a Comissão, as circunstâncias específicas que justificam que o MMLT seja preferível ao método CUP não se verificam no caso em apreço.

a)   Observações preliminares

186

A título preliminar, há que referir que o texto do APPT, conforme exposto nos n.os 12 a 16, supra, requer duas precisões importantes.

187

Em primeiro lugar, é ponto assente entre as partes que o método aplicado no APPT é efetivamente o MMLT. A este respeito, o Reino dos Países Baixos especificou na petição no processo T‑760/15 e na audiência que a referência ao método do custo majorado no APPT constituía uma utilização não técnica desta expressão.

188

Em segundo lugar, nas suas respostas às medidas de organização do processo e na audiência, as partes precisaram que, na realidade e contrariamente ao exposto no APPT, os royalties a pagar à Alki não eram fixados com base na diferença entre o lucro de exploração realizado no âmbito da função de produção e distribuição, antes das despesas relacionadas com os royalties, e a remuneração da SMBV, mas com base na diferença entre as receitas totais da SMBV, por um lado, e os custos da SMBV, acrescidos da remuneração da SMBV, por outro.

189

Além disso, há que recordar que a Comissão expôs a sua primeira linha de raciocínio referente à existência de uma vantagem seletiva nos considerandos 272 e 275 a 285 da decisão impugnada, principalmente na secção 9.2.3.2, intitulada «O [R]elatório sobre [os] preços de transferência não analisa a transação intragrupo para a qual o APPT […] foi efetivamente solicitado e concedido».

190

Por um lado, nos considerandos 272, 276 a 279 e 285 da decisão impugnada, a Comissão considerou, em substância, que o Relatório sobre os preços de transferência, aceite pelas autoridades fiscais neerlandesas no âmbito da celebração do APPT com a SMBV, não identificou nem analisou as transações controladas e as transações não controladas da SMBV, apesar de constituir um primeiro passo necessário para a apreciação do caráter de plena concorrência dos preços de transferência. Mais especificamente, a Comissão considerou que o pagamento dos royalties pela licença de propriedade intelectual em matéria de torrefação entre a Alki e a SMBV era a transação para a qual o APPT tinha sido efetivamente solicitado.

191

Por outro lado, nos considerandos 280 a 284 da decisão impugnada, a Comissão afirmou, em substância, que uma abordagem que consiste em determinar os preços de transferência para cada transação considerada individualmente devia ser privilegiada em detrimento de uma abordagem que consiste em determinar os preços de transferência para uma função no seu conjunto. Por outras palavras, a Comissão considerou que o método CUP deveria ser favorecido em detrimento dos métodos de lucro da transação, como o MMLT. No considerando 285 da decisão impugnada, a Comissão sustentou que, tendo a análise de uma remuneração de plena concorrência para a SMBV sido feita no Relatório sobre os preços de transferência a partir de um ponto de partida inadequado, essa remuneração é necessariamente mal estimada ao utilizar o MMLT. Além disso, a Comissão considerou que, para determinar os preços de transferência no caso em apreço, o Relatório sobre os preços de transferência deveria ter recorrido a comparações fiáveis com as informações disponíveis sobre as transações entre partes independentes que se encontravam na posse da Starbucks no momento da apresentação do pedido de APPT.

192

Aliás, a Comissão confirmou nos seus articulados que a sua primeira linha de raciocínio consistia em criticar o uso do MMLT para determinar o lucro líquido das atividades de produção e de distribuição da SMBV em vez do método CUP para determinar o nível dos royalties. Com efeito, a Comissão sustentou que a validade da sua primeira linha de raciocínio não dependia da conclusão de que o valor de plena concorrência dos royalties era igual a zero. O facto de o Relatório sobre os preços de transferência não ter identificado ou analisado as transações controladas e as transações não controladas da SMBV tem por consequência a não realização de um primeiro passo necessário na apreciação da natureza de plena concorrência das condições comerciais aplicáveis aos preços de transferência entre partes coligadas.

193

Sem necessidade de analisar, nesta fase, a alegação da Starbucks segundo a qual a decisão impugnada não contém nenhum argumento que permita afirmar que a simples falta de identificação e de análise das transações intragrupo da SMBV baste para provar a existência de uma vantagem, argumento que terá sido suscitado pela primeira vez na contestação no processo T‑636/16 e seria, portanto, inadmissível, há que examinar se as críticas formuladas pela Comissão no âmbito da sua primeira linha de raciocínio permitiram fundamentar a conclusão de que o APPT teria conferido uma vantagem à SMBV pelo facto de a própria escolha do método de determinação dos preços de transferência, proposto no Relatório sobre os preços de transferência, não resultar numa aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência.

b)   Quanto ao ónus da prova

194

Importa recordar que, no âmbito da fiscalização dos auxílios de Estado, cabe, em princípio, à Comissão fazer prova, na decisão impugnada, da existência desse auxílio (v., neste sentido, Acórdãos de 12 setembro de 2007, Olympiaki Aeroporia Ypiresies/Comissão, T‑68/03, EU:T:2007:253, n.o 34, e de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.o 95). Neste contexto, a Comissão é obrigada a conduzir o procedimento de investigação das medidas em causa de forma diligente e imparcial, de modo a dispor, aquando da adoção de uma decisão final que conclua pela existência e, se for o caso, pela incompatibilidade ou ilegalidade do auxílio, dos elementos mais completos e fiáveis possíveis (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, EU:C:2010:480, n.o 90, e de 3 de abril de 2014, França/Comissão, C‑559/12 P, EU:C:2014:217, n.o 63).

195

Em contrapartida, incumbe ao Estado‑Membro que introduziu uma diferenciação entre empresas demonstrar que a mesma é justificada pela natureza e a economia do sistema em causa. Com efeito, o conceito de auxílio de Estado não visa as medidas estatais que introduzem uma diferenciação entre empresas e que, portanto, são a priori seletivas, quando essa diferenciação resulta da natureza ou da economia do sistema em que se inscrevem (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2012, BNP Paribas e BNL/Comissão, C‑452/10 P, EU:C:2012:366, n.os 120 e 121 e jurisprudência referida).

196

Decorre daí que, na decisão impugnada, incumbia à Comissão demonstrar que estavam reunidas as condições de existência de um auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. A este respeito, há que referir que, embora seja pacífico que o Estado‑Membro dispõe de uma margem de apreciação na aprovação dos preços de transferência, essa margem de apreciação não pode, todavia, levar a que a Comissão seja privada da sua competência para fiscalizar que os preços de transferência em causa não resultam na concessão de uma vantagem seletiva na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Neste contexto, a Comissão deve ter em conta que o princípio da plena concorrência lhe permite verificar se um preço de transferência aprovado por um Estado‑Membro corresponde a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado e se a eventual discrepância constatada no âmbito desse exame não vai além das imprecisões inerentes ao método aplicado para obter a referida aproximação.

c)   Quanto ao nível de fiscalização a efetuar pelo Tribunal Geral

197

No que diz respeito ao nível de fiscalização a efetuar pelo Tribunal Geral no caso vertente, há que salientar que, conforme resulta do artigo 263.o TFUE, o objeto do recurso de anulação é a fiscalização da legalidade dos atos adotados pelas instituições da União nele enumeradas. Assim, a análise dos fundamentos invocados no âmbito desse recurso não tem por objeto nem por efeito substituir uma instrução completa do processo efetuada no âmbito de um procedimento administrativo (v., neste sentido, Acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Deutsche Post, C‑399/08 P, EU:C:2010:481, n.o 84).

198

No que respeita ao domínio dos auxílios de Estado, há que recordar que o conceito de auxílio de Estado, tal como definido no TFUE, é um conceito jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos. Por esta razão, o juiz da União deve, em princípio e tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio que lhe foi submetido como o caráter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização integral relativamente à questão de saber se uma medida entra no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (Acórdãos de 4 de setembro de 2014, SNCM e França/Corsica Ferries France, C‑533/12 P e C‑536/12 P, EU:C:2014:2142, n.o 15, e de 30 de novembro de 2016, Comissão/França e Orange, C‑486/15 P, EU:C:2016:912, n.o 87).

199

Quanto à questão de saber se um método de determinação de um preço de transferência de uma sociedade integrada é conforme com o princípio da plena concorrência, há que recordar, conforme indicado supra, que, quando utiliza este instrumento no âmbito da sua apreciação ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a Comissão deve ter em conta a sua natureza aproximativa. A fiscalização do Tribunal Geral tende, portanto, a verificar que os erros identificados na decisão impugnada, com base nos quais a Comissão concluiu pela existência de uma vantagem, vão além das imprecisões inerentes à aplicação de um método destinado a obter uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado.

d)   Quanto à falta de identificação e de análise dos royalties pagos pela SMBV à Alki no APPT

200

No que respeita à constatação feita pela Comissão de que o Relatório sobre os preços de transferência não identificou nem analisou a transação para a qual era efetivamente determinado um preço no APPT, há que assinalar que, no considerando 276 da decisão impugnada, a Comissão explicou que o lucro tributável da SMBV era mais baixo que o lucro efetivamente registado devido à aceitação pelas autoridades fiscais neerlandesas de que, para efeitos de imposto sobre as sociedades, o nível real do lucro gerado pela SMBV nos Países Baixos fosse reduzido na proporção do montante dos royalties da propriedade intelectual em matéria de torrefação. Nos considerandos 277 e 278 da decisão impugnada, a Comissão retira daí que os royalties da propriedade intelectual em matéria de torrefação era a transação para a qual o APPT tinha efetivamente sido solicitado e que o método que permite determinar o nível desses royalties, enquanto variável de ajustamento, era a transação para a qual foi efetivamente fixado um preço de transferência no APPT. A Comissão também considerou que o preço dos grãos de café deveria ter sido objeto de análise.

201

A este respeito, por um lado, basta referir que a mera inobservância das prescrições metodológicas não resulta necessariamente numa diminuição da carga fiscal. É preciso ainda que a Comissão demonstre que os erros metodológicos por ela identificados no APPT não permitem chegar a uma aproximação fiável de resultados de plena concorrência e que conduziram a uma redução do lucro tributável em comparação com a carga fiscal resultante da aplicação das regras normais de tributação do direito nacional a uma empresa colocada numa situação factual comparável à da SMBV e que exerce as suas atividades em condições de mercado. Assim, em princípio, a simples verificação de um erro metodológico não basta, por si só, para demonstrar que o APPT tenha conferido uma vantagem à SMBV e, consequentemente, concluir pela existência de um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o TFUE.

202

Por outro lado, há que relembrar que os diferentes métodos de fixação dos preços de transferência, quer se trate do CUP ou do MMLT, procuram alcançar níveis de lucro que reflitam preços de transferência de plena concorrência e que não se pode concluir, por princípio, que um método não permite chegar a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado.

203

Daqui resulta que o simples facto de, segundo a Comissão, o Relatório sobre os preços de transferência e o APPT não terem identificado os royalties como sendo a transação para a qual era efetivamente fixado um preço de transferência no APPT e de não terem analisado se os royalties eram conformes com o princípio da plena concorrência, não basta para demonstrar que esses royalties não eram efetivamente conformes com o princípio da plena concorrência. Por conseguinte, esta simples constatação não permitia demonstrar que o APPT tinha conferido uma vantagem à SMBV.

204

Além disso, há que assinalar que o argumento da Comissão segundo o qual o Relatório sobre os preços de transferência não identificou nem analisou os royalties enquanto transação para qual era efetivamente fixado um preço no APPT, assenta na afirmação de que, no Relatório sobre os preços de transferência, o pagamento de royalties não é considerado como sendo a variável de ajustamento da estrutura dessa remuneração sugerida. A este respeito, há que observar que o Relatório sobre os preços de transferência não faz, de todo, abstração do acordo de licença celebrado entre a SMBV e a Alki. Com efeito, esse acordo é mencionado tanto na descrição das atividades do grupo Starbucks na região EMEA e nos Países Baixos como na representação gráfica das transações na região EMEA. Portanto, o consultor fiscal do grupo Starbucks teve efetivamente em conta essas transações quando propôs a remuneração da SMBV.

205

Por conseguinte, há que julgar procedente a alegação do Reino dos Países Baixos e da Starbucks segundo a qual a Comissão considerou erradamente que a falta de análise separada dos royalties no Relatório sobre os preços de transferência e no APPT conferia uma vantagem à SMBV.

e)   Quanto ao imperativo de privilegiar o método CUP em detrimento do MMLT

206

No que respeita à tese da Comissão segundo a qual o método CUP deveria ter sido privilegiado em detrimento do MMLT, uma vez que esse primeiro método era aplicável no caso em apreço, há que, antes de mais, observar que, no caso vertente, o APPT aceitou a utilização do MMLT para determinar a margem operacional para as atividades de produção e de distribuição da SMBV. Ora, o APPT aceitou que os royalties fossem determinados como sendo, em substância, a diferença entre os lucros de exploração realizados no âmbito da função de produção e distribuição e a margem operacional. Daqui resulta que o APPT não prevê diretamente a utilização de um método de determinação dos preços de transferência para o cálculo do nível dos royalties, que são definidos como sendo um valor puramente residual.

207

É certo que decorre das considerações expostas nos n.os 148 a 156, supra, que, uma vez que os royalties são uma transação intragrupo cujo nível se encontrava fixado no APPT, a Comissão tinha o direito de examinar no âmbito da sua análise feita ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, utilizando um método de determinação dos preços de transferência por ela considerado apropriado no caso vertente, se o montante dos royalties era determinado como se tivessem sido negociados em condições de mercado.

208

Todavia, no âmbito da decisão impugnada, embora sustente que o método CUP deveria ter sido privilegiado em detrimento do MMLT a fim de poder determinar o nível de plena concorrência dos royalties, a Comissão esquece‑se de considerar que, de facto, no APPT, o nível dos royalties não foi calculado com a aplicação de um método de determinação dos preços de transferência e, em especial, do MMLT. Em contrapartida, o MMLT foi utilizado no APPT para determinar a remuneração da SMBV pelas atividades de produção e distribuição. Assim, a tese da Comissão equivale, em substância, a criticar o facto de o MMLT ter sido utilizado para determinar a remuneração da SMBV pelas atividades de produção e de distribuição em vez do método CUP, que deveria ter sido utilizado, segundo a Comissão, para o cálculo do nível dos royalties.

209

A este respeito, é forçoso constatar que os dois métodos são aplicados para o cálculo do nível dos preços de diferentes transações intragrupo. Todavia, embora sustente que as Orientações da OCDE exprimiram uma certa preferência pela utilização dos métodos tradicionais, como o método CUP, a Comissão não pode exigir uma análise de uma transação diferente daquela para a qual o APPT fixou um preço de transferência com base no MMLT, pelo simples facto de que, para essa outra transação, deveria ter sido determinado um preço de transferência baseado no método CUP. A regra invocada pela Comissão apenas permite escolher o método apropriado de determinação dos preços de transferência para o mesmo tipo de transação ou transações estreitamente ligadas. Com efeito, a escolha do método de determinação dos preços de transferência não constitui um fim em si, mas efetua‑se à luz da transação intragrupo para a qual deve ser determinado o nível de plena concorrência e não o contrário.

210

Em segundo lugar, há que recordar que, conforme exposto nos n.os 146 e 147, supra, uma medida fiscal confere uma vantagem económica quando conduz a uma diminuição da carga fiscal em relação à que deveria, normalmente, ter sido suportada na falta da referida medida.

211

Ora, conforme referido no n.o 201, supra, a mera inobservância das prescrições metodológicas não resulta necessariamente numa diminuição da carga fiscal. Decorre daí que não basta, em princípio, a simples verificação pela Comissão de erros na escolha ou na aplicação do método de determinação dos preços de transferência para demonstrar a existência de uma vantagem.

212

Todavia, nos considerandos 275 a 285 da decisão impugnada, a Comissão não invoca nenhum elemento que permita concluir, sem que seja efetuada uma comparação com o resultado que teria sido obtido com a aplicação do método CUP, que a escolha do MMLT conduz, necessariamente, a um resultado demasiado baixo. Com efeito, neste contexto, a Comissão limita‑se a alegar, no considerando 284 da decisão impugnada, que recaía sobre o contribuinte a obrigação de verificar se o método de determinação dos preços de transferência por ele escolhido conduzia a uma aproximação fiável de um preço de plena concorrência, antes de as autoridades fiscais poderem aceitar um pedido de APPT baseado nesse método.

213

Além disso, é forçoso constatar que a obrigação referida pela Comissão é abrangida pelo direito fiscal e que, se a sua violação pode ter consequências no plano fiscal — no plano dos auxílios de Estado — essa violação não permite presumir que o método escolhido pelo contribuinte não oferece uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência.

214

Por uma questão de exaustividade, há que recordar (v. n.o 10, supra) que o ponto 2 do Decreto sobre os Preços de Transferência prevê que a Administração Fiscal neerlandesa deve sempre iniciar o seu exame dos preços de transferência a partir da perspetiva do método escolhido pelo contribuinte na data da transação. Esta regra seria conforme com o ponto 1.68 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995. Decorre daí que o contribuinte é, em princípio, livre de escolher um método de preço de transferência desde que o método selecionado conduza a um resultado conforme com o princípio da plena concorrência para a transação em causa. Se bem que o contribuinte tenha supostamente em conta, quando escolhe um método de preço de transferência, a fiabilidade desse método na situação em causa, este procedimento não se destina, precisamente, a incitar o contribuinte a avaliar todos os métodos e a justificar, posteriormente, as razões pelas quais o método escolhido dá o melhor resultado à luz das circunstâncias em presença.

215

Resulta daí que, no caso em apreço, a Comissão não podia considerar que o método CUP devia ser, em princípio, preferido ao método MMLT.

216

Por conseguinte, há que julgar procedente a alegação do Reino dos Países Baixos e da Starbucks segundo a qual a Comissão considerou erradamente que a mera escolha do MMLT, no caso vertente, conferia uma vantagem à SMBV, sem que seja necessário apreciar o argumento da Starbucks que contesta a admissibilidade de determinados argumentos apresentados pela Comissão.

2.   Quanto à questão de saber se o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ser igual a zero (segunda linha de raciocínio)

217

No âmbito da segunda parte do terceiro fundamento no processo T‑760/15, o Reino dos Países Baixos alega que a Comissão sustenta, erradamente, que a remuneração paga pela SMBV à Alki deveria ser igual a zero e que resultaria daí uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Com efeito, os contratos celebrados entre o grupo Starbucks e os torrefatores externos e fabricantes de produtos derivados do café, em que assenta a comparação efetuada pela Comissão, não são utilizáveis para uma comparação com os acordos contratuais entre a Alki e a SMBV, baseada no método CUP. O Reino dos Países Baixos considera que a Comissão não demonstrou que o MMLT não tinha conduzido a um resultado de plena concorrência.

218

No âmbito da quarta parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, a Starbucks sustenta, em substância, que a análise dos royalties pela Comissão se apoia, quase exclusivamente, em elementos de prova que não eram acessíveis em abril de 2008. Além disso, contrariamente ao direito fiscal neerlandês e às Orientações da OCDE, a Comissão não estabeleceu um intervalo de plena concorrência para os royalties, mas concluiu que o valor dos mesmos devia ser igual a zero. Como o Reino dos Países Baixos, a Starbucks considera que todos os produtores terceiros, mencionados na decisão impugnada, que, à semelhança da SMBV, fornecem produtos de café que ostentam a marca Starbucks a lojas ou a revendedores, pagam royalties substanciais como contrapartida pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação da Starbucks. Não são pagos royalties pelos subcontratados que, contrariamente à SMBV, não fornecem esses produtos aos clientes, mas apenas asseguram um serviço de torrefação ao grupo Starbucks. Contrariamente ao que é referido na decisão impugnada, o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação é gerado quando os produtos de café que ostentam a marca Starbucks são vendidos a lojas e revendedores, que estão dispostos a pagar um preço premium para esses produtos. Além disso, a Starbucks sustenta que, contrariamente ao que a decisão impugnada conclui, no período examinado, as atividades de torrefação da SMBV foram sempre rentáveis.

219

A Comissão contesta esses argumentos.

220

Por um lado, a Comissão alega, em substância, que comparou o montante dos royalties no âmbito dos sete contratos mencionados no considerando 300 da decisão impugnada com o dos royalties no âmbito da relação entre a SMBV e a Alki. Além disso, a Comissão explica, no processo T‑760/15, que também se baseou nos contratos mencionados no considerando 303 da decisão impugnada e, no processo T‑636/16, que, em princípio, tal não sucedia. A Comissão acrescenta que se baseou, aliás, nos acordos entre concorrentes do grupo Starbucks e sociedades terceiras de torrefação de café, mencionados nos considerandos 305 a 308 da decisão impugnada, para chegar à conclusão de que o valor de plena concorrência dos royalties pagos no âmbito da relação entre a SMBV e a Alki devia ser igual a zero. A Comissão também refere que, nos considerandos 292 a 298 da decisão impugnada, explicou as razões pelas quais considerou que essas transações constituíam um elemento comparável direto que permite determinar o montante dos royalties devidos pela SMBV à Alki como contrapartida da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

221

Por outro lado, a Comissão alega que não contesta que a propriedade intelectual em matéria de torrefação possa representar um valor. Todavia, não se tira partido do valor dessa propriedade intelectual antes de os produtos de café da marca Starbucks serem vendidos pelas lojas Starbucks aos clientes finais. Segundo a Comissão, a propriedade intelectual em matéria de torrefação não pode, portanto, ser considerada uma vantagem para a SMBV pela qual devem ser pagos royalties.

a)   Observações preliminares

222

Há que relembrar que a Comissão expôs a sua segunda linha de raciocínio nos considerandos 286 a 341 da decisão impugnada, na secção 9.2.3.3, intitulada «O pagamento de royalties à Alki […] resultante do APPT […] não tem um preço de plena concorrência».

223

A título preliminar, importa formular duas observações.

224

Em primeiro lugar, há que salientar que é ponto assente entre as partes que os royalties constituíam, em princípio, um encargo dedutível em direito fiscal neerlandês. Além disso, não é contestado que, uma vez que se trata de uma transação dentro do grupo Starbucks, os royalties constituem uma transação intragrupo. Resulta dos n.os 147 a 156, supra, que o nível dessa transação deve, para efeitos de determinação do imposto sobre as sociedades da SMBV, ser apreciado como se tivesse sido determinado em condições de mercado.

225

Em segundo lugar, importa assinalar que, embora tenha considerado que o nível dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero, a Comissão reconheceu no considerando 310 da decisão impugnada que o saber‑fazer em matéria de torrefação e as curvas de torrefação podem ter um valor. De igual modo, no n.o 126 da sua contestação no processo T‑636/16, a Comissão explica que não nega que a propriedade intelectual em matéria de torrefação possa representar um valor.

226

Decorre daí que a única questão sobre a qual as partes estão em desacordo é a de saber qual teria sido o nível do preço de transferência para os royalties se tivesse sido fixado em condições de mercado.

227

A este respeito, há que recordar que, nos considerandos 286 a 341 da decisão impugnada, a Comissão sustenta que o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero. Com efeito, de acordo com o texto da decisão impugnada, a Comissão não alega que o nível dos referidos royalties deveria ter sido menos elevado do que o nível dos royalties aceite pelo APPT, mas que não deveriam ter sido pagos royalties. A própria Comissão afirma que não procedeu a qualquer estimativa de um intervalo para o nível dos royalties, dado que este deveria ter sido exatamente igual a zero (considerando 340 da decisão impugnada).

228

Na decisão impugnada, a Comissão apoiou, em substância, em três elementos a sua demonstração segundo a qual o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero (considerando 318 da decisão impugnado).

229

No que respeita ao primeiro elemento, a Comissão sustentou que a natureza variável do pagamento de royalties durante o período compreendido entre 2006 e 2014 fornecia uma «primeira indicação» de que o nível do pagamento não tinha qualquer relação com o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação (considerando 289 da decisão impugnada). No que se refere ao segundo elemento, a Comissão alegou que, na sua relação com a Alki, a SMBV não retirou um benefício do valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação (considerandos 310 a 313 da decisão impugnada). No que diz respeito ao terceiro elemento, a Comissão explicou que os acordos de produção celebrados pela Starbucks com terceiros não exigiam o pagamento de royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação (considerandos 291 a 309 da decisão impugnada).

230

Além disso, na decisão impugnada, a Comissão rejeitou os argumentos suscitados pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks no decurso do procedimento administrativo. Mais especificamente, a Comissão considerou que os royalties não representavam uma remuneração pela transferência dos riscos empresariais (considerandos 319 a 332 da decisão impugnada) e que o montante dos royalties não era justificado pelos montantes pagos pela Alki à Starbucks US para a tecnologia ao abrigo do Acordo de Partilha dos Custos (considerandos 333 a 338 da decisão impugnada).

231

A seguir, em primeiro lugar, há que expor sucintamente a teoria defendida pela Comissão na decisão impugnada no que respeita às funções da SMBV relacionadas com os royalties e às regras normais de tributação pertinentes. Com efeito, esses elementos constituem a base sobre a qual assenta a análise do nível dos royalties, efetuada pela Comissão na decisão impugnada. Em segundo lugar, há que examinar o argumento da Starbucks segundo o qual a análise dos royalties efetuada pela Comissão não podia assentar em elementos de prova que não estavam disponíveis em abril de 2008. Em terceiro lugar, há que examinar os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks sobre a questão de saber quem usufruiu da propriedade intelectual em matéria de torrefação. Em quarto lugar, há que analisar se a Comissão tinha fundamento para concluir, com base numa comparação com os royalties previstos em contratos com terceiros, que o valor dos royalties deveria ter sido igual a zero. Em quinto lugar, há que examinar o argumento da Comissão, suscitado na audiência, segundo o qual, na realidade, esta sustentou na sua decisão impugnada que o nível dos royalties deveria ter sido menos elevado do que o nível aprovado pelo APPT.

b)   Quanto às funções da SMBV relacionadas com os royalties

232

No que respeita às funções da SMBV que são pertinentes para a análise dos royalties, em primeiro lugar, é pacífico que a SMBV torrificava os grãos de café verde que comprava à SCTC.

233

Em seguida, a Comissão sustenta na decisão impugnada, designadamente nos considerandos 49, 96, 137, 313 e 330, e nos seus articulados, que as lojas Starbucks, coligadas ou independentes, são obrigadas a comprar café torrado à SMBV e, por conseguinte, que a SMBV é também o vendedor do café torrado.

234

Além disso, na decisão impugnada, a Comissão considera que as existências que a SMBV compra e vende devem aparecer, segundo as normas de contabilidade, no seu balanço, pelo facto de ser a entidade encarregada da celebração dos contratos e da faturação com as lojas.

235

Por último, decorre da decisão impugnada, lida no seu conjunto, que a Comissão considera que a SMBV é erradamente apresentada no Relatório sobre os preços de transferência como um produtor de café de baixo risco. A este respeito, nos considerandos 319 a 332 da decisão impugnada, a Comissão rejeitou, nomeadamente, os argumentos do Reino dos Países Baixos e os argumentos correspondentes da Starbucks segundo os quais os acordos contratuais entre a SMBV e a Alki, sobre os quais se baseou o relatório do consultor fiscal, resultariam numa transferência de riscos empresariais efetiva da SMBV para a Alki. Mais, a Comissão explicou que a SMBV suportava riscos comerciais nas suas relações com a SCTC e as lojas Starbucks.

236

Decorre daí, segundo a Comissão, que a SMBV não é, atendendo às suas vendas de café torrado às lojas Starbucks, um fabricante por encomenda ou um subcontratado, mas que esta torra o café por conta própria e atua como vendedor. Com efeito, segundo a decisão impugnada, a expressão «fabrico por encomenda» é normalmente entendida como um acordo pelo qual uma empresa transforma matérias‑primas ou produtos semiacabados para outra empresa.

c)   Quanto às regras normais de tributação em direito neerlandês

237

Como referido no n.o 146, supra, a análise de uma medida fiscal concedida a uma empresa integrada, feita ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, implica determinar, previamente, as regras normais de tributação aplicáveis ao beneficiário da referida medida.

238

No considerando 232 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que as regras neerlandesas ao abrigo das quais deve ser examinado o APPT são as regras do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades. Estas regras são resumidas nos n.os 3 a 11 e 35, supra.

239

Com efeito, no caso em apreço, é pacífico que o APPT foi celebrado para permitir à SMBV antecipar a aplicação das regras relativas ao imposto sobre as sociedades ao determinar o seu lucro tributável. Decorre daí que o APPT se inscreve no âmbito do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, que tem por objetivo tributar as empresas — integradas ou autónomas — sujeitas ao referido imposto.

240

Por conseguinte, é à luz das funções da SMBV, conforme identificadas nos n.os 232 a 236, supra, e das regras normais de tributação acima referidas, que se deve analisar a questão de saber se o nível dos royalties correspondia a um nível que teria sido praticado em condições de mercado.

d)   Quanto à utilização de elementos invocados pela Comissão que eram indisponíveis no momento da conclusão do APPT

241

A Starbucks alega que, na decisão impugnada, a Comissão se baseou principalmente em informações que não se encontravam disponíveis no momento da conclusão do APPT em abril de 2008. Mais especificamente, a Starbucks remete para a jurisprudência do juiz da União relativa ao critério do investidor privado, segundo a qual, a fim de avaliar a racionalidade económica de uma determinada medida, há que se situar no contexto da época em que as medidas de apoio financeiro foram tomadas e, portanto, se abster de qualquer apreciação baseada numa situação posterior. O mesmo princípio também é estabelecido, segundo a Starbucks, no direito fiscal neerlandês e nas Orientações da OCDE.

242

A Comissão não contesta a aplicação desse princípio no caso em apreço e limita‑se a alegar que um número considerável de argumentos que apoiam a sua conclusão de que o APPT não respeita o princípio da plena concorrência se baseia em informações e dados que se encontravam à disposição da Administração Fiscal neerlandesa no momento em que o APPT foi celebrado.

243

Desde já, há que referir que o facto de o direito fiscal neerlandês e as Orientações da OCDE preverem, segundo a Starbucks, a necessidade de se abster de qualquer apreciação baseada numa situação posterior à adoção de um acordo prévio em matéria de preços, a fim de examinar se esse acordo respeita o princípio da plena concorrência, não tem nenhuma relevância para a análise no caso vertente do APPT à luz das condições do artigo 107.o TFUE.

244

A Starbucks baseia o seu argumento numa aplicação análoga da jurisprudência do juiz da União segundo a qual, para averiguar se o Estado‑Membro ou a entidade pública em causa adotou o comportamento de um empresário privado avisado numa economia de mercado, há que tomar como referência o contexto da época em que as medidas em causa foram adotadas, a fim de avaliar a racionalidade económica do comportamento do Estado‑Membro ou da entidade pública e, portanto, abstrair de qualquer apreciação baseada numa situação posterior (Acórdão de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.o 93; v., igualmente, neste sentido, Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.os 69 e 71, e de 5 de junho de 2012, Comissão/EDF, C‑124/10 P, EU:C:2012:318, n.o 105).

245

A este respeito, basta referir que a determinação de um preço de transferência em conformidade com as condições de mercado não tem fundamento no princípio da igualdade de tratamento entre empresas públicas e privadas, mas, como reconhece a Comissão, no objetivo legítimo de um acordo fiscal prévio, como o APPT, que consiste em estabelecer, antecipadamente, por razões de segurança jurídica, a aplicação de uma disposição fiscal.

246

Há que referir que, na medida em que a Comissão considera que a adoção de um acordo fiscal prévio, como o APPT, dava origem a um novo auxílio, este deveria ter‑lhe sido notificado antes da sua aplicação, nos termos do artigo 108.o, n.o 3, do TFUE. Ora, se a Comissão se pronunciasse sobre tal notificação, não iria conseguir ter em consideração elementos de informação que eram desconhecidos ou que não eram razoavelmente previsíveis no momento da sua decisão. Por conseguinte, a Comissão não pode acusar o Estado‑Membro em causa de não ter tido em consideração elementos que eram desconhecidos ou que não eram razoavelmente previsíveis no momento da adoção do acordo em questão.

247

Neste contexto, em primeiro lugar, há que recordar que resulta do artigo 1.o e do considerando 40 da decisão impugnada que a medida contestada pela Comissão é apenas o APPT.

248

Em segundo lugar, embora o APPT possa, efetivamente, ser revogado ou alterado durante o seu período de validade, compreendido entre 2007 e 2017, importa assinalar que, na decisão impugnada, a Comissão não considerou que o facto de APPT não ter sido revogado ou alterado durante a sua validade pelas autoridades neerlandesas tenha conferido uma vantagem à SMBV. Com efeito, o ponto 6, segundo travessão, do APPT, lido em conjugação com o seu ponto 4, primeiro travessão, estipula que este cessa quando houver uma alteração substancial dos factos e circunstâncias previstos pelo APPT, a menos que as partes tenham convencionado uma revisão do acordo. Ora, nada teria, portanto, impedido a Comissão de declarar a existência de uma alteração substancial dos factos e circunstâncias previstos pelo APPT e, consequentemente, a concessão de uma vantagem seletiva à SMBV pela aplicação contínua do APPT.

249

Em terceiro lugar, no que respeita ao argumento da Comissão segundo o qual o APPT foi objeto de uma verificação intercalar, após o sexto exercício contabilístico que terminou em 31 de dezembro de 2013, e não foi alterado nessa ocasião, basta referir que, em nenhuma parte da decisão impugnada a Comissão sustenta que a falta de alteração ou revogação do APPT, na sequência dessa verificação intercalar, teria conferido à SMBV uma vantagem nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

250

Daqui resulta que, nestas circunstâncias, a apreciação da existência de uma vantagem conferida por um acordo prévio, como o APPT, deve ser feita atendendo ao contexto da época em que foi celebrado. Esta conclusão implica que a Comissão é obrigada a abster‑se de apreciações baseadas numa situação posterior à adoção do APPT.

251

Por conseguinte, há que julgar procedente o argumento formulado pela Starbucks segundo o qual, nas circunstâncias do caso vertente, a Comissão não podia basear a sua análise em informações que não eram disponíveis ou razoavelmente previsíveis no momento da conclusão do APPT, em abril de 2008.

e)   Quanto à questão de saber se a propriedade intelectual em matéria de torrefação representava um valor para a SMBV

252

Com o segundo argumento exposto nos considerandos 310 a 332 da decisão impugnada (v. n.o 230, supra), a Comissão procurou, em substância, demonstrar que o pagamento dos royalties pela SMBV à Alki não era justificado, por princípio, dado que a SMBV não beneficiava, segundo a Comissão, do valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação. Este argumento divide‑se em duas partes. Em substância, por um lado, a Comissão considerou que a SMBV não explorava a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado. Por outro lado, a Comissão concluiu que a atividade de torrefação de café não gerava lucros suficientes para permitir o pagamento dos royalties.

1) Quanto à questão de saber se a SMBV explorava a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado.

253

No que diz respeito ao argumento de que a SMBV não explorava a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado, a Comissão explicou, nos considerandos 310 a 313 da decisão impugnada que, em primeiro lugar, na relação específica entre a Alki e a SMBV, o torrefator, ou seja, a SMBV, não «usufrui[u]» do valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação. Segundo a Comissão, a importância do saber‑fazer e das curvas de torrefação residia na garantia da coerência do sabor associado à marca e aos produtos individuais. A Comissão deduziu daí que o valor do saber‑fazer e das curvas de torrefação da Starbucks era apenas «explorado» quando os produtos Starbucks eram vendidos sob a marca Starbucks pelas lojas. Além disso, a Comissão sustenta que, por si só, o saber‑fazer e as curvas de torrefação do café não geravam valor para o torrefator numa base contínua se não pudessem ser explorados no mercado. Em seu entender, no caso da SMBV, o saber‑fazer e as curvas de torrefação «parec[ia]m» constituir uma especificação técnica segundo a qual a torrefação devia ocorrer, devido a uma preferência ou a uma escolha da empresa adquirente. O facto de as especificações estabelecidas pela Alki, relativamente ao processo de torrefação e, em especial, às curvas de torrefação, permitirem à SMBV a torrefação do café que era vendido sob a marca Starbucks não trazia, segundo a Comissão, qualquer vantagem à SMBV em termos de aumento das vendas ou do preço de venda, tendo em conta que a SMBV não vendia, em princípio, a sua produção a clientes finais que valorizavam a marca Starbucks. Por último, a Comissão acrescentou que a SMBV vendia praticamente toda a sua produção às lojas franchisadas da Starbucks e que, portanto, não explorava a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado.

254

Nos seus articulados, a Comissão acrescenta que o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação só é explorado quando os produtos são vendidos a clientes finais que apreciam o sabor coerente associado à marca em questão. No plano económico, não é racional que o torrefator/produtor de café pague royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação quando não comercializa diretamente o produto acabado. Isto porque, num tal cenário, o torrefator/produtor de café utiliza essa propriedade intelectual para torrar os grãos de café a pedido do subcontratante.

255

A título preliminar, por um lado, [confidencial]. Daqui resulta que, ao abrigo do acordo de torrefação, a SMBV era obrigada a pagar os royalties como contrapartida pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

256

Por outro lado, há que referir que a Comissão não sustentou, na decisão impugnada, que a sua tese de que a exploração da propriedade intelectual em matéria de torrefação se faz junto dos consumidores finais constituía um critério prescrito pelo direito fiscal neerlandês. Em contrapartida, resulta dos considerandos 310 a 313 da decisão impugnada, lidos em conjugação com os considerandos introdutórios que apresentam a posição da Comissão na sequência da decisão de início do procedimento, que a Comissão efetuou uma análise puramente económica que baseou nas Orientações da OCDE nas suas versões de 1995 e 2010.

257

À luz destas considerações, há que apreciar a justeza da tese da Comissão, exposta nos considerandos 298, 300 e 310 a 313 da decisão impugnada, segundo a qual a SMBV não explorava diretamente a propriedade intelectual em matéria de torrefação no mercado devido ao facto de não vender os produtos a clientes finais.

258

A este respeito, é forçoso referir que as explicações apresentadas nos considerandos 310 a 313 da decisão impugnada não são plausíveis. Com efeito, o raciocínio seguido pela Comissão, nos considerandos 310 a 313 da decisão impugnada e nos seus articulados junto do Tribunal Geral, assenta, em substância, na premissa de que o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação só é explorado quando os produtos são vendidos aos clientes finais que apreciam o sabor coerente associado à marca em questão e que, no plano económico, não seria racional que o torrefator/produtor de café pagasse royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação quando não comercializa diretamente o produto acabado. Todavia, essa premissa não é confirmada pelos factos apurados na decisão impugnada.

259

Com efeito, em primeiro lugar, é pacífico entre as partes que a propriedade intelectual em matéria de torrefação era, em princípio, suscetível de representar um valor económico. Em segundo lugar, é também ponto assente entre as partes que a SMBV é um torrefator que era obrigado a utilizar a propriedade intelectual em matéria de torrefação para torrar o seu café. Em terceiro lugar, a Comissão sustenta que as lojas Starbucks, coligadas ou independentes, são obrigadas a comprar café torrado à SMBV e que, por conseguinte, a SMBV também é o vendedor do café torrado.

260

Neste contexto, há que referir que a Comissão focou erradamente a sua análise na premissa de que o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação só é explorado quando os produtos são vendidos aos clientes finais. A questão de saber quem suporta, afinal, as despesas que correspondem à compensação do valor da propriedade intelectual utilizada para a produção do café é bem distinta da questão de saber se a propriedade intelectual em matéria de torrefação era necessária para permitir à SMBV produzir café torrado de acordo com os critérios exigidos pelas lojas Starbucks, às quais vende, por conta própria, o café.

261

Na hipótese de a SMBV vender o café que torrou a lojas Starbucks que exigem que o café tenha sido torrado conforme as especificações da Starbucks, é plausível que, sem o direito de utilização, ou — para retomar a terminologia da decisão impugnada — de exploração da propriedade intelectual da torrefação, a SMBV não fosse capaz de produzir e fornecer café torrado de acordo com as especificações da Starbucks às lojas com o mesmo nome.

262

Há que concluir que, contrariamente ao que sustenta a Comissão, o pagamento dos royalties pela SMBV pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação não é desprovido de racionalidade económica. A propriedade intelectual era efetivamente necessária para o exercício da atividade económica da SMBV, a saber, a produção de café torrado de acordo com as especificações da Starbucks. Daqui decorre que a SMBV retira efetivamente uma mais‑valia da utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação, sem a qual não poderia, em seguida, revender o café torrado às lojas Starbucks.

263

Além disso, há que rejeitar o argumento da Comissão segundo o qual são as lojas Starbucks que pagam royalties à Starbucks Coffee Emea que já incluem uma remuneração [confidencial]. Por um lado, os desenvolvimentos no âmbito da presente linha de raciocínio na decisão impugnada não contêm elementos que permitam sustentar essa tese. Por outro lado, o facto de as lojas Starbucks pagarem royalties à Starbucks Coffee Emea não exclui que a SMBV possa repercutir [confidencial] no preço faturado às lojas. Além disso, o facto de, segundo a Comissão, as lojas Starbucks pagarem uma segunda taxa [confidencial] à Starbucks Coffee Emea, [confidencial], seria suscetível de conferir, quando muito, uma vantagem a esta última, mas não à SMBV.

264

Resulta do que precede que a Comissão considerou erradamente, nos considerandos 298 e 300 da decisão impugnada, que uma empresa transformadora não filiada só explora uma propriedade intelectual em matéria de torrefação se vender os seus produtos a clientes finais. Com efeito, a exploração da propriedade intelectual em matéria de torrefação não se limita a situações em que um torrefator escoa o seu café no mercado retalhista aos consumidores finais, mas também inclui situações como a da SMBV, em que um torrefator é ativo enquanto vendedor no mercado grossista. Em contrapartida, a simples transformação do café por conta de um subcontratante que procura as especificações técnicas de produção não basta para demonstrar a exploração dos direitos de tal propriedade intelectual.

265

Por conseguinte, há que salientar que a Comissão errou ao concluir que a SMBV, tal como descrita na decisão impugnada, não devia pagar royalties pelo facto de não explorar a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado.

2) Quanto à questão de saber se a SMBV registou perdas nas suas atividades de torrefação

266

O Reino dos Países Baixos e a Starbucks contestam o argumento da Comissão, exposto nos considerandos 314 a 317 da decisão impugnada, segundo o qual a SMBV registou perdas, desde 2010, nas suas atividades de torrefação, situação que não permitia pagar royalties pela propriedade intelectual em matéria de torrefação. Segundo o Reino dos Países Baixos, a Comissão designadamente, não teve suficientemente em conta, designadamente, o facto de os grãos adquiridos pela SMBV terem sido também utilizados para a produção do café por terceiros. A Comissão considerou, assim, que isso demonstrava que o método utilizado para determinar os royalties enquanto variável de ajustamento, conforme aprovada pelo APPT, não era conforme com o princípio da plena concorrência.

267

A Comissão retorque que, de acordo com as informações que recebeu da Starbucks durante o procedimento administrativo, apenas uma parte limitada do café torrado era transformada por produtores externos. Portanto, a Comissão considerou corretamente que praticamente todos os grãos comprados pela SMBV eram transformados no âmbito das suas próprias atividades de produção de café.

268

Na decisão impugnada, a Comissão referiu, em substância, que, desde 2010, a SMBV registava perdas nas suas atividades de torrefação e que os royalties pagos pela SMBV à Alki eram financiados em parte por outras atividades da SMBV, sem que houvesse qualquer perspetiva de lucros futuros provenientes da torrefação. Segundo a Comissão, a atividade de torrefação de café não gerou lucros suficientes para permitir o pagamento dos royalties. Além disso, a Comissão sustenta que os royalties pagos pela SMBV à Alki pela propriedade intelectual de torrefação num contexto intragrupo «parec[iam]» servir estruturalmente o objetivo exclusivo de transferir os lucros provenientes da função de revenda da SMBV para a Alki.

269

Há que referir, desde já, que o raciocínio da Comissão se baseia na premissa segundo a qual é necessário realizar lucros sobre as atividades de torrefação para poder pagar royalties pela propriedade intelectual em matéria de torrefação. Ora, a Comissão não demonstra que as regras neerlandesas de tributação prevejam que a obrigação de pagar royalties é dependente da rendibilidade da atividade em causa. Além disso, a questão de saber se as atividades de torrefação da SMBV eram rentáveis não está relacionada com a questão de saber se uma obrigação de pagar royalties, como a do caso vertente, podia ser economicamente justificada.

270

A este respeito, em primeiro lugar, importa assinalar que a Comissão sustenta que a atividade de torrefação não gerou lucros suficientes para o período com início em 2010. Esta constatação não diz respeito, portanto, à totalidade do período de validade do APPT (que iniciou em 2007).

271

Em seguida, há que referir que, conforme indicado nos n.os 243 a 251, supra, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão era obrigada a abster‑se de qualquer apreciação baseada numa situação posterior à conclusão do APPT. Ora, a Comissão não explica, na decisão impugnada, de que modo as perdas que refere nos considerandos 314 a 317 dessa decisão teriam sido previsíveis no momento da adoção do APPT, quando as mesmas integram a situação da SMBV a partir de 2010. Por conseguinte, a Comissão não demonstrou que tinha o direito de basear‑se no facto de, desde 2010, a SMBV ter sofrido perdas nas suas atividades de torrefação.

272

Por último, em todo o caso, dado que a Starbucks sustenta que as atividades de torrefação da SMBV foram sempre rentáveis, há que recordar que a Comissão efetuou a sua análise a partir de uma comparação dos rendimentos obtidos junto das lojas Starbucks com o valor de compra dos grãos de café verde pela SMBV à SCTC. No entanto, no âmbito da terceira linha de raciocínio, a Comissão sustenta precisamente que o aumento dos preços dos grãos de café verde a partir de 2010 foi demasiado elevado. Por conseguinte, resulta já dos argumentos da Comissão na decisão impugnada que os custos do café verde eram consideravelmente sobreavaliados e que, portanto, as perdas que mencionou na decisão impugnada não existiam, pelo menos não nas proporções descritas nos considerandos 314 a 317 da decisão impugnada.

273

Estas constatações bastam para rejeitar o argumento da Comissão segundo o qual a SMBV não tinha condições de pagar royalties pela propriedade intelectual em matéria de torrefação pelo facto de ter registado perdas nas suas atividades de torrefação.

274

Em todo o caso, a Starbucks sustenta que o cálculo da Comissão é errado, dado que não teve em conta o facto de um volume considerável do total das compras de café verde não ter sido torrado pela SMBV. A Comissão invoca a inadmissibilidade desse argumento, pelo facto de essa informação ser nova e contraditória em relação às informações transmitidas durante o procedimento administrativo.

275

A este respeito, há que referir que a Comissão admite, tanto na nota 155 da decisão impugnada como nos seus articulados, que as informações fornecidas pela Starbucks durante o procedimento administrativo permitiam concluir que praticamente todo o café verde adquirido pela SMBV, com exceção de um «volume limitado» que tinha sido fornecido a terceiros, tinha sido também torrado pela SMBV. Neste contexto, a Comissão faz referência à carta dos correspondentes Starbucks que lhe foi enviada em 23 de setembro de 2015. Todavia, decorre da referida carta que o terceiro em questão tinha um contrato de fabrico por encomenda com o grupo Starbucks que dizia respeito, «de forma preponderante» (predominantly), ao fabrico de produtos diferentes do café torrado, «mas também à torrefação do café verde enquanto tal (embora se tratasse de volumes limitados)». A referência aos «volumes limitados» indica que o terceiro em questão produzia uma quantidade limitada de café torrado em relação ao seu fabrico de produtos que não fossem o café em pó, mas não é indicativa de que produzia quantidades negligenciáveis de café torrado. A Comissão foi, portanto, avisada durante o procedimento administrativo de que parte do café verde adquirido pela SMBV não era torrado pela SMBV. A objeção formulada pela Comissão sobre a admissibilidade do argumento da Starbucks e relativa ao facto de esse argumento se basear em informações que não foram levadas ao seu conhecimento durante o procedimento administrativo carece, portanto, de base factual e deve ser rejeitada.

276

Quanto à justeza do argumento da Starbucks segundo o qual a Comissão considerou no seu cálculo que a totalidade dos montantes correspondentes às compras de café verde da SMBV eram custos, apesar de um volume considerável do total das compras de café verde não ter sido torrado pela SMBV, há que referir que a Comissão sustenta que a Starbucks não indicou, nos documentos enviados em 29 de maio de 2015, que uma parte significativa dos grãos de café verde eram torrados por terceiros. Todavia, conforme sustenta com razão a Starbucks, a resposta à pergunta 2 na carta dos correspondentes Starbucks de 29 de maio de 2015, que a Comissão invoca nos seus articulados, tinha por objeto a afetação dos rendimentos da SMBV às suas diferentes funções, e não a afetação dos seus custos a essas funções. Decorre daí que as respostas dos correspondentes Starbucks sobre as quais a Comissão sustentou, de acordo com os seus articulados, a sua conclusão de que a função de torrefação da SMBV tinha gerado perdas a partir de 2010 não eram suficientes para permitir à Comissão chegar a esta conclusão.

277

Além disso, conforme exposto no n.o 275, supra, aquando da adoção da decisão impugnada, a Comissão já dispunha de indicações para considerar que o seu cálculo, exposto no considerando 314 da decisão impugnada, que consistia em subtrair o preço pago pela SMBV à SCTC pelos grãos de café verde dos rendimentos provenientes da torrefação do café, era errado.

278

Daqui decorre que a Comissão não demonstrou que a SMBV teria registado perdas desde 2010 nas suas atividades de torrefação, situação que não lhe permitia pagar royalties pela propriedade intelectual em matéria de torrefação.

f)   Quanto à comparação com contratos de torrefação de café celebrados pela Starbucks com terceiros e em relação a acordos de licenças semelhantes «no mercado»

279

Com o seu terceiro argumento exposto na decisão impugnada (v. n.o 229, supra), a Comissão procurou explicar, em substância, que os acordos de produção celebrados pela Starbucks com terceiros e alguns acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e torrefatores terceiros não previam o pagamento de royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação (considerandos 291 a 309 da decisão impugnada).

280

Neste contexto, a Comissão explicou, no considerando 309 da decisão impugnada, que uma análise dos preços de transferência do valor de plena concorrência dos royalties pagos pela SMBV à Alki pela propriedade intelectual de torrefação levava à conclusão de que não deviam ser aplicáveis royalties por essa propriedade intelectual nessa relação específica. A Comissão baseou essa conclusão, por um lado, numa análise dos acordos de produção celebrados pela Starbucks com terceiros e, por outro, numa comparação com os acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e torrefatores terceiros. Resulta, designadamente, dos considerandos 291 e 299 da decisão impugnada que a Comissão procurou determinar o nível de royalties conforme com a plena concorrência entre a SMBV e a Alki.

281

O Reino dos Países Baixos e a Starbucks discordam da Comissão, em substância, na questão de saber se os contratos celebrados pela Starbucks com torrefatores externos e com fabricantes de produtos derivados do café, sobre os quais se baseia a comparação efetuada pela Comissão, eram pertinentes para efetuar uma comparação com os acordos contratuais entre a Alki e a SMBV, em aplicação do método CUP.

282

Em substância, no que respeita à questão de saber se os acordos de produção celebrados pela Starbucks com terceiros implicam que o valor dos royalties deveria ter sido igual a zero, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks alegam que:

os contratos celebrados entre a Starbucks e torrefatores externos e fabricantes de produtos derivados do café, em que assenta a decisão impugnada, não eram utilizáveis para uma comparação com os acordos contratuais entre a Alki e a SMBV, baseada no método CUP.

a análise da Comissão que incide sobre os royalties se apoia, quase exclusivamente, em elementos de prova que não eram disponíveis em abril de 2008;

a maioria dos contratos utilizados pela Comissão para a comparação das transações era referente a produtos específicos, derivados do café, que não os grãos de café torrados;

a remuneração da Alki estava indissociavelmente ligada à compra de grãos de café verde junto da SCTC, mas nenhuma das transações derivadas dos contratos utilizados pela Comissão para a comparação estava indissociavelmente ligada a uma outra transação da referida forma;

todos os produtores terceiros, mencionados na decisão impugnada, que, como a SMBV, forneciam produtos de café que ostentavam a marca Starbucks a lojas ou revendedores, pagavam royalties substanciais em contrapartida da utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação do café da Starbucks.

283

No que diz respeito aos acordos de produção celebrados pela Starbucks com terceiros, a Comissão examinou, numa primeira fase, nos considerandos 291 a 298 da decisão impugnada, se os contratos de torrefação de café celebrados pelo grupo Starbucks com dez empresas terceiras constituíam um elemento comparável direto que permitisse determinar o montante dos royalties devidos pela SMBV à Alki. A este respeito, a Comissão baseou a sua análise no ponto 1.36 das Orientações da OCDE, na sua versão de 2010, que, para efeitos de análise da comparabilidade entre as transações controladas da empresa contribuinte e as transações não controladas comparáveis, enumera cinco fatores de comparabilidade, que incluem as características dos bens ou serviços transferidos, as funções desempenhadas pelas partes, as cláusulas contratuais, a situação económica das partes e as estratégias industriais e comerciais por estas prosseguidas. A Comissão remeteu também, na nota 147 da decisão impugnada, para o ponto 1.17 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995. De acordo com este ponto, para efeitos da análise de comparabilidade, as características que podem ser importantes são as dos bens ou serviços transferidos, as funções desempenhadas pelas partes, as cláusulas contratuais, a situação económica das partes e as estratégias industriais e comerciais por estas prosseguidas.

284

Numa segunda fase, nos considerandos 299 a 304 da decisão impugnada, a Comissão referiu que, com base nessas dez transações não controladas, o montante de royalties conforme com plena concorrência entre a SMBV e a Alki podia ser determinado utilizando o método CUP.

285

Mais especificamente, em primeiro lugar, a fim de determinar o montante dos royalties aplicando o método CUP, a Comissão comparou o pagamento dos royalties da SMBV à Alki com os pagamentos devidos por terceiros a outras empresas do grupo Starbucks, no âmbito de transações comparáveis, efetuadas em circunstâncias comparáveis no mercado livre. Em segundo lugar, a Comissão analisou contratos celebrados pelo grupo Starbucks com a empresa transformadora 1 não filiada e com as empresas designadas, no considerando 300 da versão da decisão impugnada publicada no Jornal Oficial da União Europeia, pelos termos «empresas transformadoras 2, 3, 4, 8, 9 e 10 não filiadas» (a seguir, respetivamente, «empresa transformadora 2 não filiada», «empresa transformadora 3 não filiada», «empresa transformadora 4 não filiada», «empresa transformadora 8 não filiada», «empresa transformadora 9 não filiada» e «empresa transformadora 10 não filiada»). A Comissão referiu, então, que os referidos terceiros não pagavam royalties ao abrigo dos seus acordos de licenças com o grupo Starbucks se não explorassem a propriedade intelectual da torrefação diretamente no mercado. Em terceiro lugar, a Comissão referiu, no que diz respeito às relações entre o grupo Starbucks e as empresas designadas, no considerando 303 da versão da decisão impugnada publicada no Jornal Oficial da União Europeia, pelos termos «empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas» (a seguir, respetivamente, «empresa transformadora 5 não filiada», «empresa transformadora 6 não filiada» e «empresa transformadora 7 não filiada»), que apenas os acordos de licença de tecnologia e de marca celebrados pela Starbucks com esses terceiros incluíam o pagamento de royalties.

286

Numa terceira fase, a Comissão referiu, no considerando 309 da decisão impugnada, que os contratos de torrefação de café celebrados pelo grupo Starbucks com dez empresas terceiras não exigiam royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação. A Comissão concluiu, portanto, que, no âmbito da relação especial entre a SMBV e a Alki, não podiam ser devidos royalties pela referida propriedade intelectual.

287

Sem que seja necessário, nesta fase, examinar se a escolha pela Comissão dos elementos pertinentes para a análise da comparabilidade, a saber, as características dos bens ou serviços transferidos, as funções desempenhadas pelas partes, as cláusulas contratuais, a situação económica das partes e as estratégias industriais e comerciais por elas prosseguidas, enfermava de erro, há que referir que existem vários elementos no contexto dessa análise que se opõem à comparabilidade entre, por um lado, as relações entre o grupo Starbucks com terceiros e, por outro, as relações entre a SMBV e a Alki. Esses elementos estão expostos nos n.os 288 a 345, infra.

1) Quanto aos contratos celebrados posteriormente ao APPT

288

Há que assinalar que sete dos dez contratos examinados pela Comissão, a saber, os contratos celebrados com as empresas transformadoras 1, 3, 4, 7, 8, 9 e 10 não filiadas, foram‑no após a conclusão do APPT. Uma vez que não explica como esses contratos estavam disponíveis ou eram razoavelmente previsíveis no momento da conclusão do APPT, a Comissão não tinha condições, pelas razões expostas nos pontos 243 a 251, supra, para basear a sua análise do APPT em elementos posteriores à sua celebração. Por conseguinte, há que afastar esses sete contratos da análise comparativa.

2) Quanto aos contratos celebrados com empresas que não torram café

289

Conforme exposto nos n.os 232 a 236, supra, a SMBV é um torrefator de café verde que paga à Alki royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

290

No considerando 295 da decisão impugnada, a Comissão reconheceu que, de entre as dez empresas terceiras que celebraram um contrato com o grupo Starbucks, algumas não torravam café. Ora, é notório que uma empresa que não torra café não pagará royalties ao grupo Starbucks pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação para efeitos de produção do café torrado.

291

Além disso, na decisão impugnada, a Comissão não apresentou elementos indicativos de que os contratos no âmbito dos quais o terceiro não produzia café torrado seriam comparáveis ao contrato celebrado entre a SMBV e a Alki. É certo que esta conclusão não exclui que a Comissão pudesse basear a sua análise nas transações de uma empresa que não desempenhava exatamente as mesmas funções que a SMBV ou que se encontrava numa situação factual diferente. Nesta hipótese, cabia‑lhe justificar essa escolha e explicar as adaptações que teria efetuado na sua análise a fim de levar em consideração as diferenças entre as empresas.

292

Por conseguinte, um contrato que foi celebrado com uma empresa que não era um torrefator não podia ser utilizado, no caso em apreço, sem ajustamentos ou adaptações, para efeitos da análise comparativa, a fim de demonstrar que o nível dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero.

293

A este respeito, os contratos celebrados com as empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas não eram referentes, de acordo com a respetiva descrição na decisão impugnada, à torrefação de café verde. Dado que, no contexto dos contratos em causa, as empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas não desempenharam a função de torrefator de café, há que concluir que os contratos celebrados com as referidas empresas não podiam ser utilizados, no caso vertente, para efeitos da análise comparativa.

3) Quanto aos contratos com empresas que não procederam à venda de café torrado a lojas ou consumidores

294

Conforme exposto no n.o 235, supra, as existências que a SMBV comprou à SCTC e vendeu às lojas aparecem no balanço da SMBV pelo facto de ser a entidade responsável pela celebração dos contratos e pela faturação com as lojas. Daqui resulta que a SMBV se tornou proprietária das existências do café verde que torrou e vendeu às lojas. Ora, é forçoso constatar que, se a SMBV fosse uma empresa autónoma, não seria capaz de produzir o seu café de acordo com as especificações do grupo Starbucks sem ter obtido o direito de utilizar a propriedade intelectual em matéria de torrefação. Portanto, a SMBV não poderia produzir o seu café torrado sem pagar royalties.

295

Em contrapartida, conforme exposto no n.o 236, supra, um fabricante por encomenda ou um subcontratado transforma matérias‑primas ou produtos semiacabados por conta do subcontratante. Por conseguinte, a propriedade intelectual em matéria de torrefação representa para ele apenas uma especificação técnica pela qual não pagará royalties ao subcontratante.

296

A este respeito, em primeiro lugar, há que referir que, na contestação do processo T‑636/16, a Comissão sustenta que, relativamente às suas relações contratuais com o grupo Starbucks, as empresas transformadoras 1, 8 e 9 não filiadas operavam no âmbito de acordos de fabrico por encomenda e produziam principalmente produtos como café aromatizado, pó para um produto à base de café que beneficiava de uma marca registada ou café solúvel. Segundo a Comissão, as empresas transformadoras 1, 8 e 9 não filiadas não se tornaram proprietárias dos componentes da Starbucks. Além disso, a Comissão reconhece que os acordos com as empresas transformadoras 1, 8 e 9 não filiadas diferem do acordo em matéria de torrefação de café celebrado entre a SMBV e a Alki.

297

Em segundo lugar, no que diz respeito ao contrato celebrado entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 4 não filiada, a Comissão precisou, no considerando 148, terceiro travessão, da decisão impugnada que esse contrato se destinava a subcontratar a torrefação do café. A este respeito, a Starbucks sustenta que a empresa transformadora 4 não filiada compra o café verde ao grupo Starbucks e, em seguida, torra‑o em conformidade com as curvas de torrefação e as receitas para a mistura de grãos fornecidas por esse grupo. Em seguida, a empresa transformadora 4 não filiada vende todo o seu café torrado a uma filial totalmente detida pelo grupo Starbucks, que revende o café torrado às lojas.

298

Decorre desta descrição que a empresa transformadora 4 não filiada não vendeu o café que torrou a lojas. A empresa transformadora 4 não filiada apenas forneceu o café torrado, enquanto empresa subcontratada, a uma empresa do grupo Starbucks que se ocupava da venda desse café. Nestas circunstâncias, a propriedade intelectual em matéria de torrefação era apenas uma especificação técnica da produção. Por conseguinte, o facto de a empresa transformadora 4 não filiada não ter pagado royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação ao grupo Starbucks não implica que a SMBV não deva pagar royalties à Alki.

299

Em terceiro lugar, no que diz respeito à empresa transformadora 10 não filiada, a Comissão explica nos seus articulados no processo T‑636/16 que essa empresa produzia e torrava os grãos de café verde, diretamente comprados aos fornecedores de café verde, e vendia todos os produtos de café da marca Starbucks a uma única entidade do grupo Starbucks que se ocupava da respetiva venda.

300

Decorre desta descrição que a empresa transformadora 10 não filiada não vendeu, portanto, o seu café torrado a lojas, mas a uma empresa do grupo Starbucks que se ocupava da sua venda. Nestas circunstâncias, a propriedade intelectual em matéria de torrefação era apenas uma especificação técnica da produção. Por conseguinte, não é surpreendente que essa empresa não tenha pagado ao grupo Starbucks royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

301

A Comissão retorque que tanto as empresas transformadoras 4 e 10 não filiadas como a SMBV produzem produtos de café de que não são o fornecedor independente no mercado e que, por conseguinte, estão em situações comparáveis. Todavia, esse argumento não convence. Com efeito, há que recordar que, para determinar se a SMBV beneficiou de uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, há que comparar a situação da SMBV, em aplicação da medida em questão, à situação de uma empresa comparável que exerce as suas atividades de forma autónoma em condições de livre concorrência (v. n.os 148 e 149, supra). O objeto de comparação no âmbito dessa análise é, portanto, uma empresa autónoma na situação da SMBV, ou seja, uma empresa que torra o café e o vende às lojas, no mercado.

302

Tendo em conta essas diferenças entre a situação da SMBV e a situação das empresas transformadoras 1, 4, 8, 9 e 10 não filiadas e na falta de elementos adicionais indicativos de que existia, no entanto, uma comparabilidade entre os contratos em causa, havia, portanto, que excluir da análise de comparabilidade os contratos celebrados entre o grupo Starbucks e as referidas empresas.

4) Quanto aos contratos referentes a produtos diferentes do café torrado

303

No considerando 295 da decisão impugnada, a Comissão reconheceu que, de entre as dez empresas terceiras que celebraram um contrato com o grupo Starbucks, algumas delas produziam bebidas prontas a beber ou outros produtos e ingredientes para a preparação de bebidas e que, por conseguinte, as dez empresas terceiras não produziam todas café torrado. De acordo com o mesmo considerando, os contratos relativos à torrefação de café verde eram os celebrados com as empresas transformadoras 2, 3, 4 e 10 não filiadas.

304

Conforme exposto no n.o 296, supra, a Comissão reconheceu que, no que diz respeito às suas relações contratuais com o grupo Starbucks, as empresas transformadoras 1, 8 e 9 não filiadas produziam principalmente produtos como café aromatizado, pó para um produto à base de café que beneficiava de uma marca registada ou café solúvel. Além disso, a Comissão reconhece que os acordos com as empresas transformadoras 1, 8 e 9 não filiadas diferem, a este respeito, do acordo em matéria de torrefação de café entre a SMBV e a Alki.

305

Mais, há que recordar que a Comissão sustenta, na contestação do processo T‑636/16, que a sua avaliação dos contratos celebrados com terceiros não assenta, em princípio, nos acordos celebrados com as empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas, devido às diferenças apresentadas no saber‑fazer sob licença — ou seja, a propriedade intelectual em matéria de torrefação, por oposição ao saber‑fazer em matéria de produção de bebidas prontas a beber — e ao lugar ocupado por essas empresas na cadeia de abastecimento — ou seja, o facto de a SMBV torrar e, em seguida, revender os grãos de café a distribuidores ou a terceiros produtores, enquanto as empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas fabricam produtos ligados ao café que vendem diretamente aos seus clientes, neste caso, principalmente a supermercados.

306

Ora, no que respeita às relações contratuais entre o grupo Starbucks e as empresas transformadoras 1, 5, 6, 7, 8 e 9 não filiadas, há que assinalar que, na decisão impugnada, a Comissão não apresenta elementos indicativos de que os contratos no âmbito dos quais o terceiro não produz café torrado, para efeitos de venda a lojas ligadas ou não ao grupo Starbucks, são comparáveis ao celebrado entre a SMBV e a Alki. Com efeito, resulta nomeadamente dos considerandos 298 e 300 da decisão impugnada que, no âmbito do exercício de comparação entre os royalties pagos pela SMBV à Alki e os royalties previstos, sendo caso disso, nos dez contratos celebrados entre o grupo Starbucks e terceiros, a Comissão considerou que o elemento pertinente para a comparabilidade era a questão de saber se o terceiro explorava diretamente a propriedade intelectual no mercado vendendo os produtos a clientes finais.

307

No entanto, as empresas transformadoras 1, 5, 6, 7, 8 e 9 não filiadas não tinham, segundo a Comissão, uma função de torrefação que incidisse sobre o mesmo produto que a função de torrefação de café da SMBV. A Comissão não conseguiu, portanto, demonstrar que esses contratos eram suficientemente comparáveis com o contrato de torrefação celebrado entre a SMBV e a Alki.

308

Por conseguinte, no caso vertente, por esse motivo, os contratos entre o grupo Starbucks e as empresas transformadoras 1, 5, 6, 7, 8 e 9 não filiadas devem igualmente ser afastados da análise comparativa.

5) Quanto ao contrato que prevê o pagamento de royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação

309

No que diz respeito ao contrato celebrado entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 3 não filiada, a Comissão sustentou, no segundo travessão do considerando 148 da decisão impugnada, que, ao abrigo de um acordo de licença de torrefação, a empresa transformadora 3 não filiada prestou serviços de torrefação de café. O café foi vendido ao grupo Starbucks e a uma empresa comum, detida pela empresa transformadora 3 não filiada e pelo grupo Starbucks (a seguir «empresa comum»), que explorava as lojas Starbucks num país fora da União. A empresa transformadora 3 não filiada pagou ao grupo Starbucks royalties pela torrefação do café, de montante fixo, por uma determinada quantidade de café verde produzido e vendido à empresa comum.

310

No considerando 301 da decisão impugnada, a Comissão acrescentou que a empresa transformadora 3 não filiada só pagava royalties ao grupo Starbucks quando vendia a sua produção à empresa comum. Nesta hipótese, segundo a Comissão, a empresa transformadora 3 não filiada «explora[va] diretamente a [propriedade intelectual] de torrefação no mercado através de uma parte relacionada», de modo que o pagamento de royalties«parece» abranger a distribuição de produtos da marca Starbucks a terceiros pela empresa comum. Esta conclusão é confirmada pelo facto de que, quando a empresa transformadora 3 não filiada vendia o café torrado ao grupo Starbucks, e não à empresa comum, e quando o grupo Starbucks assegurava a distribuição e a exploração da marca no mercado, a empresa transformadora 3 não filiada não pagava royalties à Starbucks pela propriedade intelectual em matéria de torrefação.

311

A este respeito, é forçoso constatar que é pacífico entre a Comissão e a Starbucks que, quando vende os seus grãos torrados à empresa comum para um determinado território, a empresa transformadora 3 não filiada paga ao grupo Starbucks royalties pela licença de torrefação, de montante fixo, por quantidade de café torrado e embalado e que, quando vende os seus grãos torrados à Starbucks [confidencial], não são pagos royalties pela licença de torrefação.

312

Esta conclusão contradiz claramente a teoria da Comissão segundo a qual a empresa transformadora 3 não filiada não pagava royalties ao abrigo do seu acordo de licença celebrado com o grupo Starbucks se não explorasse a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente junto dos consumidores finais no mercado. Conforme alega, com razão, a Starbucks, a obrigação para a empresa transformadora 3 não filiada de pagar royalties assenta apenas nas suas vendas de café torrado às lojas no território em causa, independentemente da questão de saber se as lojas distribuem ou não café torrado ao cliente final.

313

Neste contexto, a Comissão alega que existe uma diferença entre a situação da empresa transformadora 3 não filiada e a situação da SMBV, que reside no facto de a empresa transformadora 3 não filiada e as lojas Starbucks, no território em causa, serem controladas pela mesma entidade, a saber, a sociedade‑mãe da empresa transformadora 3 não filiada. A Comissão acrescenta que o pagamento de royalties pela empresa transformadora 3 não filiada «parece» ser efetuado por conta da empresa comum, e não a título de remuneração pela utilização, pela empresa transformadora 3 não filiada, da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

314

Ora, em primeiro lugar, há que referir que, conforme exposto nos n.os 194 a 196, supra, cabe, em princípio, à Comissão fazer prova, na decisão impugnada, da existência de um auxílio.

315

Essa obrigação não se mostra preenchida se a Comissão se limitar a fazer constatações prima facie, como, no caso em apreço, quando se limita a declarar que o pagamento de royalties«parece» abranger a distribuição de produtos da marca Starbucks a terceiros pela empresa comum ou que «parece» ser efetuado por conta da empresa comum.

316

Em seguida, há que salientar que a diferença entre a situação da SMBV e a situação da empresa transformadora 3 não filiada, a que se refere a Comissão, a saber, o facto de a empresa transformadora 3 não filiada ter vendido o seu café torrado através da empresa comum às lojas Starbucks presentes no território em questão, não põe em causa o facto de terem sido pagos royalties pela licença em matéria de torrefação, de montante fixo, por quantidade de café torrado e embalado, pela empresa transformadora 3 não filiada ao grupo Starbucks. [confidencial]

317

Por último, a própria Comissão sustenta, nos seus articulados, que, sendo a empresa transformadora 3 não filiada e a empresa comum partes coligadas, não é possível estabelecer uma comparação direta com a relação entre a SMBV e as lojas Starbucks na região EMEA. Esta conclusão enfraquece ainda mais a teoria da Comissão segundo a qual as relações contratuais entre a empresa transformadora 3 não filiada e o grupo Starbucks são comparáveis às existentes entre a SMBV e a Alki e permitem concluir que o valor dos royalties deveria ser igual a zero.

318

Em resumo, decorre do que precede que, contrariamente ao que afirmou a Comissão na sua decisão impugnada, a empresa transformadora 3 não filiada era um torrefator que pagava royalties ao grupo Starbucks pela utilização de uma propriedade intelectual em matéria de torrefação.

319

Por conseguinte, pelas razões expostas nos n.os 289 a 318, supra, há que declarar que a Comissão não logrou demonstrar que uma comparação entre, por um lado, as relações contratuais entre a Alki e a SMBV e, por outro, as relações contratuais entre o grupo Starbucks e as empresas transformadoras 1 e 3 a 10 não filiadas permitia concluir que o nível dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero.

6) Quanto ao contrato celebrado com a empresa transformadora 2 não filiada

320

Resulta do considerando 148, primeiro travessão, da decisão impugnada que, a fim de subcontratar a torrefação do café, o grupo Starbucks celebrou dois tipos de contratos com a empresa transformadora 2 não filiada, que foram alterados por diversas vezes. Por um lado, ao abrigo de um acordo de licença de tecnologia, celebrado antes de 2008, uma empresa do grupo Starbucks concedeu à empresa transformadora 2 não filiada uma licença não exclusiva para a utilização, designadamente, da tecnologia e do saber‑fazer da Starbucks na produção e venda de café torrado a determinadas partes terceiras com as quais a Starbucks celebrou acordos de fornecimento, a saber, em substância, a empresa transformadora 5 não filiada. Em contrapartida, a empresa transformadora 2 não filiada devia prestar os serviços de modo a garantir que o café torrado fosse de primeira qualidade. Para o efeito, a empresa transformadora 2 não filiada devia satisfazer, nomeadamente, determinadas normas de controlo de qualidade estabelecidas pela Starbucks. O acordo de licença de tecnologia estipulava que a empresa transformadora 2 não filiada não tinha de pagar royalties pela licença. Por outro lado, um acordo de fornecimento de café verde estipulava que a empresa transformadora 2 não filiada tinha a obrigação de comprar o café verde exclusivamente ao grupo Starbucks mediante o pagamento de uma remuneração fixa para uma determinada quantidade. O acordo de licença de tecnologia e o acordo de fornecimento foram celebrados com duas entidades diferentes no seio do grupo Starbucks.

321

Nos considerandos 300 e 302 da decisão impugnada, a Comissão acrescentou que a empresa transformadora 2 não filiada não pagava royalties ao abrigo do seu acordo de licença celebrado com o grupo Starbucks se não explorasse a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado, vendendo os produtos a clientes finais. Todavia, há que referir que decorre da descrição feita no considerando 148 da decisão impugnada que a empresa transformadora 2 não filiada não vendeu o seu café torrado aos consumidores finais.

322

No que respeita à questão de saber se a empresa transformadora 2 não filiada se encontrava numa situação comparável à da SMBV, é forçoso constatar que o acordo contratual entre a empresa transformadora 2 não filiada e o grupo Starbucks está estreitamente ligado ao acordo celebrado entre a empresa transformadora 5 não filiada e o grupo Starbucks. Com efeito, vários anos antes da conclusão do APPT, a empresa transformadora 5 não filiada e a SMBV celebraram um acordo de fornecimento pelo qual o grupo Starbucks se comprometeu a fornecer grãos de café torrado, concentrado e outros ingredientes de café à empresa transformadora 5 não filiada.

323

Num momento ulterior, mas anterior à conclusão do APPT, a empresa transformadora 5 não filiada e a SMBV celebraram um contrato de delegação [confidencial] ao qual aderiu, no mesmo dia, a empresa transformadora 2 não filiada. [confidencial]

324

[confidencial]

325

[confidencial]

326

Decorre dessas disposições que o papel da empresa transformadora 2 não filiada era diferente do da SMBV, que era, segundo a Comissão, um torrefator que também assegurava a venda do café torrado às lojas Starbucks. Com efeito, de acordo com o contrato de delegação, a empresa transformadora 2 não filiada forneceu a empresa transformadora 5 não filiada, a fim de permitir ao grupo Starbucks cumprir as suas obrigações contratuais, para com esta última empresa, decorrentes do acordo de fornecimento.

327

Neste contexto, há que relembrar que, na decisão impugnada, a Comissão classificou a natureza do acordo contratual entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 2 não filiada como sendo um contrato de subcontratação (v. n.o 320, supra). No entanto, conforme exposto no n.o 236, supra, esse subcontratado limita‑se a executar a torrefação em conformidade com as instruções do subcontratante, a fim de satisfazer a obrigação contratual de fornecimento do café torrado que lhe incumbe. Nestas circunstâncias, o torrefator apenas segue as prescrições técnicas do subcontratante.

328

Ora, é forçoso referir que a Comissão não apresenta, na decisão impugnada, elementos suficientes indicativos de que esse contrato de subcontratação seria comparável ao que foi celebrado entre a SMBV e a Alki, para efeitos de determinação do nível dos royalties.

329

Em todo o caso, mesmo supondo que, para efeitos de determinação do nível dos royalties, os acordos contratuais entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 2 não filiada fossem comparáveis aos celebrados entre a SMBV e a Alki, a Comissão limitou‑se, no considerando 302 da decisão impugnada, a rejeitar o argumento da Starbucks segundo o qual uma margem de lucro mais elevada nos custos dos grãos de café verde que a empresa transformadora 2 não filiada pagou ao grupo Starbucks constitui uma remuneração «disfarçada» da propriedade intelectual em matéria de torrefação. Neste contexto, por um lado, a Comissão afirma que a margem de lucro «parece» ter sido transferida para a empresa transformadora 5 não filiada. Por outro lado, a Comissão sustentou que «[n]ão existem indícios de que qualquer margem de lucro sobre um preço de compra não seria transferida diretamente para a [empresa transformadora 5 não filiada] ou de que afetaria as condições comerciais entre a [empresa transformadora 5 não filiada] e a [empresa transformadora 2 não filiada], uma vez que este acordo contratual não foi celebrado independentemente do acordo contratual entre [o grupo] Starbucks e a [empresa transformadora 5 não filiada]».

330

Todavia, as considerações expostas no considerando 302 da decisão impugnada em nada alteram a conclusão de que a posição de «subcontratado» da empresa transformadora 2 não filiada não basta para concluir que a SMBV, enquanto vendedora do seu café torrado, não deveria pagar royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

331

Além disso, relativamente à questão de saber se a margem de lucro mais elevada nos custos dos grãos de café verde paga pela empresa transformadora 2 não filiada ao grupo Starbucks constituía a remuneração de uma propriedade intelectual em matéria de torrefação de café, há que salientar que o argumento da Comissão segundo o qual a margem de lucro mais elevada nos custos dos grãos de café paga pela empresa transformadora 2 não filiada «parece» ser transferida para a empresa transformadora 5 não filiada é especulativo e não exclui, como tal, que uma remuneração pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação tenha sido efetivamente paga ao grupo Starbucks pela empresa transformadora 2 não filiada.

332

Em contrapartida, vários elementos suscitam dúvidas no que diz respeito ao argumento da Comissão segundo o qual, no caso em apreço, não foi paga ao grupo Starbucks nenhuma remuneração pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação pela empresa transformadora 2 não filiada.

333

Em primeiro lugar, há que referir que, à primeira vista, o nível do preço dos grãos de café verde fornecidos pela SMBV, pago pela empresa transformadora 2 não filiada ao grupo Starbucks, parece elevado em relação aos valores invocados pela Starbucks na nota 189 da petição no processo T‑636/16. A Comissão não contesta esses valores. Aliás, no considerando 302 da decisão impugnada, a Comissão não contestou a afirmação feita pelos correspondentes Starbucks de que o referido preço era elevado.

334

Em segundo lugar, a Comissão sustenta que declarou na decisão impugnada que o acordo de licença de tecnologia estipulava que a empresa transformadora 2 não filiada não devia pagar royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação. A Comissão considera que cabia, portanto, ao Reino dos Países Baixos e à Starbucks provar que a diferença nos preços do café verde representava uma remuneração «disfarçada» pela propriedade intelectual em matéria torrefação, o que não lograram fazer.

335

Ora, há que recordar que as Orientações da OCDE nas suas versões de 1995 e 2010, sobre as quais a Comissão baseia a sua análise de comparabilidade, preveem expressamente, no ponto 6.17, que a contrapartida pela utilização de um bem incorpóreo pode ser incluída no preço faturado para a venda de produtos quando, por exemplo, uma empresa vende produtos inacabados a outra empresa, disponibilizando, simultaneamente, a esta última a sua experiência para as operações de complemento de fabrico ulteriores. Neste contexto, há que referir que a Comissão sustenta, com razão, que uma diferença de preço é, em princípio, distinta de royalties, que implicam potencialmente consequências fiscais diferentes, o que é, aliás, retomado, em substância, no ponto 6.19 das Orientações da OCDE, na sua versão de 2010.

336

No caso em apreço, resulta claramente da decisão impugnada que a Starbucks tinha alegado durante o procedimento administrativo que a margem de lucro mais elevada nos custos dos grãos de café verde que a empresa transformadora 2 não filiada pagou ao grupo Starbucks constituía uma remuneração pela propriedade intelectual em matéria de torrefação.

337

Nestas circunstâncias, os argumentos dos correspondentes Starbucks, suscitados no procedimento administrativo, não podiam ser rejeitados com base na simples conclusão de que o acordo de licença de tecnologia previa que a empresa transformadora 2 não filiada não devia pagar royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

338

Em terceiro lugar, embora a Comissão sustente, com razão, que o fornecimento de grãos de café verde e a concessão de sublicenças de propriedade intelectual são transações distintas baseadas em dois contratos celebrados com contrapartidas diferentes dentro do grupo Starbucks, não é menos verdade que o acordo de licença de tecnologia entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 2 não filiada estipula, [confidencial].

339

Em quarto lugar, a Comissão acrescenta, em substância, que a diferença de preços entre os grãos de café verde comprados, respetivamente, pela empresa transformadora 2 não filiada e pela SMBV pode ter várias outras explicações, tais como, desde logo, o forte poder de negociação da Starbucks [confidencial], depois, o facto de a empresa transformadora 2 não filiada não comprar os seus grãos de café verde diretamente à SCTC, mas à Starbucks [confidencial], que os compra à SCTC e os revende à referida empresa, o que pode também levar a um aumento adicional do custo para cobrir o valor acrescentado pela Starbucks [confidencial], ou, por último, a diferença nas condições de entrega.

340

Antes de mais, importa assinalar que o argumento da Comissão segundo o qual a Starbucks [confidencial] tinha um poder de negociação tão significativo, em comparação com a empresa transformadora 2 não filiada, que lhe permitia pedir um preço muito superior ao que conseguia obter da [confidencial] SMBV não é convincente.

341

Em seguida, embora a Comissão sustente que o facto de a empresa transformadora 2 não filiada não comprar os seus grãos de café verde diretamente à SCTC, mas à Starbucks [confidencial] que os compra à SCTC e os revende à referida empresa, possa também levar a um aumento adicional do custo para cobrir [confidencial], não explica, no entanto, [confidencial]. Ora, a Starbucks retorque, a este respeito, que a SCTC assume integralmente o processo de abastecimento, que inclui o transporte dos grãos de café desde o porto de origem até ao porto de destino, onde são entregues à empresa transformadora 2 não filiada, sem qualquer transformação. Além disso, segundo a Starbucks, por razões de eficácia administrativa, [confidencial]. Por conseguinte, há que rejeitar também esse argumento da Comissão.

342

Por último, a Comissão alega que existe uma diferença nas condições de entrega dos grãos de café verde de que beneficiam a empresa transformadora 2 não filiada e a SMBV. A Comissão alega que a Starbucks [confidencial] vende os grãos de café verde à empresa transformadora 2 não filiada ao preço CSF (custo, seguro e frete) no porto de entrada do território em que exerce a sua atividade económica, enquanto os grãos de café verde que a SMBV adquire junto da SCTC são entregues ao preço FOB (free on board) no porto de Amesterdão (Países Baixos). Todavia, é forçoso constatar, por um lado, que a Comissão não quantifica a sua afirmação de que a diferença entre os custos de uma entrega a preço FOB e de uma entrega a preço CSF pode ser considerável. Por outro lado, a Starbucks sustenta, por sua vez, que a diferença entre os custos de uma entrega a preço FOB e de uma entrega a preço CSF é demasiado pequena para explicar «a margem de lucro mais elevada». Por conseguinte, a Comissão não logrou demonstrar a sua afirmação segundo a qual a «margem de lucro mais elevada» não podia representar, ainda que parcialmente, uma remuneração pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação, pelo facto de se dever inteiramente à diferença nas condições de entrega dos contratos em questão.

343

Nestas circunstâncias, nem a sucinta fundamentação dada no considerando 302 da decisão impugnada nem as outras explicações fornecidas pela Comissão, contestadas pela Starbucks, permitiam à Comissão concluir que os contratos celebrados entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 2 não filiada provavam, de forma juridicamente bastante, que essa empresa não pagava nenhuma remuneração ao grupo Starbucks pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

344

Daqui resulta que, com base no que expôs na decisão impugnada, a Comissão não logrou provar de forma juridicamente bastante que o contrato entre o grupo Starbucks e a empresa transformadora 2 não filiada permitia considerar que o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero.

345

Em síntese, decorre daí que a Comissão não logrou demonstrar, com base na sua comparação com os contratos celebrados com as dez empresas transformadoras não filiadas, que o valor dos royalties deveria ter sido igual zero. Com efeito, os contratos celebrados com as empresas transformadoras 1, 3, 4, 7, 8, 9 e 10 não filiadas foram celebrados posteriormente à adoção do APPT. Os contratos celebrados com as empresas transformadoras 5, 6 e 7 não filiadas dizem respeito, por sua vez, a empresas que não torram café. Os contratos celebrados com as empresas transformadoras 1, 4, 8, 9 e 10 não filiadas não são contratos de revenda. Os contratos celebrados com as empresas transformadoras 1, 5, 6, 7, 8 e 9 não filiadas são referentes a produtos que não o café torrado e o contrato celebrado com a empresa transformadora 3 não filiada estipula a possibilidade de pagamento de royalties. No que respeita à análise do contrato celebrado com a empresa transformadora 2 não filiada, os argumentos sucintos e especulativos da Comissão não bastam para demonstrar que essa empresa não pagava nenhuma remuneração ao grupo Starbucks pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

346

Por conseguinte, decorre das considerações expostas nos n.os 288 a 345, supra, que a Comissão não demonstrou que a aplicação do método CUP, baseada numa comparação com os contratos celebrados entre o grupo Starbucks e as dez empresas transformadoras não filiadas, teria levado à conclusão de que o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki pela propriedade intelectual em matéria de torrefação, se tivesse sido fixado em condições de mercado, deveria ter sido igual a zero.

g)   Quanto aos acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e torrefatores terceiros

347

A Comissão comparou também os royalties pagos pela SMBV à Alki com o que estava previsto em vários acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e torrefatores terceiros. A Comissão considerou que resultava dessa análise comparativa que não deveriam ter sido pagos royalties pela SMBV à Alki pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação.

348

Com efeito, decorre do considerando 309 da decisão impugnada que, para determinar se a SMBV pagou à Alki royalties conformes com o princípio da plena concorrência pela propriedade intelectual em matéria de torrefação, a Comissão comparou o acordo celebrado entre a Alki e a SMBV com vários acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e terceiros torrefatores. Neste contexto, a Comissão fez referência às respostas da Melitta, da Dallmayr e da empresa Y.

349

A Starbucks contesta a análise conduzida pela Comissão. A Starbucks considera que os acordos referentes à Melitta e à empresa X são «acordos ao abrigo dos quais o fabricante por encomenda ou contratual, ao contrário da SMBV, fornece os produtos acabados ao seu contratante e não diretamente aos clientes do contratante». Isto torna esses acordos fundamentalmente diferentes do contrato de torrefação e, consequentemente, a respetiva análise é irrelevante no caso em apreço. Há que apreciar, portanto, se essas três relações contratuais eram comparáveis ao contrato de torrefação entre a SMBV e a Alki.

350

Em primeiro lugar, relativamente à Melitta, a Comissão indicou, no considerando 306 da decisão impugnada, que essa empresa concorrente da Starbucks lhe teria explicado que não recebia royalties dos terceiros a quem subcontratou a torrefação de café, embora disponibilizasse aos mesmos as suas curvas de torrefação.

351

A este respeito, há que assinalar que decorre dos considerandos 207 e 208 da decisão impugnada que, em certas situações em que a capacidade de torrefação estava esgotada, a Melitta terá subcontratado a torrefação de café (outsourcing). Todavia, não decorre desta descrição que o torrefator terceiro tenha efetivamente vendido o café torrado a lojas ou a outros consumidores.

352

Por conseguinte, há que declarar que, de acordo com as constatações expostas na decisão impugnada, a situação da Mellita não é comparável à da SMBV.

353

Em segundo lugar, relativamente à empresa Y, que pertence a um grupo de sociedades, a Comissão indicou, nos considerandos 211 e 307 da decisão impugnada, que a referida empresa fazia torrar o café por uma empresa do grupo designada como fabricante por encomenda e que este torrefator não pagava royalties ao grupo.

354

É forçoso constatar que resulta desta descrição que o torrefator do grupo de que fazia parte a empresa Y operava enquanto fabricante por encomenda. O torrefator transformava o café verde por conta de uma outra empresa dentro do grupo a que pertencia a empresa Y. Isto significa que o torrefator não vendeu o café torrado a lojas ou a outros consumidores.

355

Decorre, por conseguinte, das constatações efetuadas na decisão impugnada que a situação da empresa Y não é comparável à da SMBV.

356

Em terceiro lugar, relativamente à Dallmayr, é exposto no considerando 308 da decisão impugnada que este concorrente referiu que considerava o pagamento de royalties por uma empresa que presta torrefação pouco habitual, uma vez que se esperaria que os clientes pagassem ao torrefator, e não o inverso. Com efeito, decorre dos considerandos 204 e 205 da decisão impugnada que a Dallmayr sustentou que a torrefação do café era desempenhada como um negócio independente ou verticalmente integrada numa empresa. A Dallmayr especificou que a função de abastecimento é «normalmente» integrada com a função de torrefação. A Dallmayr considerava, assim, pouco habitual o pagamento de royalties por um terceiro que presta os serviços de torrefação. A Dallmayr esperaria que o cliente pagasse a torrefação e não o inverso.

357

A este respeito, há que assinalar que a Dallmayr apenas afirmou que considera «pouco habitual» o pagamento de royalties no domínio da torrefação. Esta afirmação não exclui que tais royalties possam ainda assim ser previstos. As declarações da Dallmayr não contradizem, portanto, a existência de royalties como os pagos pela SMBV.

358

Por conseguinte, resulta das considerações expostas nos n.os 347 a 357, supra, que a Comissão não demonstrou que os acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e os torrefatores terceiros, identificados na decisão impugnada, eram pertinentes para efeitos da análise da situação da SMBV. Com efeito, as constatações feitas, a este respeito, na decisão impugnada não permitem concluir que esses acordos eram comparáveis ao acordo de torrefação. Portanto, mesmo supondo que efetivamente não foram pagos royalties no âmbito dos acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e os torrefatores terceiros, essa circunstância não seria suficiente para demonstrar que não deveriam ter sido pagos royalties pela SMBV à Alki pela propriedade intelectual em matéria de torrefação.

359

Pelas razões expostas nos n.os 279 a 358, supra, há que, portanto, declarar que a Comissão não demonstrou, da forma exigida pela jurisprudência referida nos n.os 194 a 196, supra, que o valor dos royalties deveria ter sido igual a zero. Por conseguinte, há que dar provimento, com base neste fundamento, aos recursos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks na medida em que dizem respeito à segunda linha de raciocínio da decisão impugnada. Deste modo, não é necessário examinar os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks através dos quais contestam a rejeição dos seus argumentos suscitados, durante o procedimento administrativo, para justificar a existência dos royalties (v. n.o 230, supra).

h)   Quanto ao argumento segundo o qual o nível dos royalties deveria ter sido menos elevado do que o nível aprovado pelo APPT

360

Conforme exposto no n.o 229, supra, a Comissão indicou, na decisão impugnada, que a natureza variável do pagamento de royalties, durante o período compreendido entre 2006 e 2014, fornecia uma «primeira indicação» de que o nível do pagamento não tinha nenhuma relação com o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação. A este respeito, a Comissão explicou, na audiência, que resultava dos considerandos 287 a 289 e da nota 146 da decisão impugnada que os royalties deveriam ter sido fixados a um nível menos elevado do que o aprovado pelo APPT.

361

Ora, antes de mais, há que salientar que, no considerando 287 da decisão impugnada, a Comissão se limitou a reproduzir certas conclusões feitas na decisão de início do procedimento, sem, contudo, tirar qualquer consequência para a decisão impugnada. Em seguida, no considerando 288 da decisão impugnada, a Comissão explicou que, para o período compreendido entre 2006 e 2014, calculou quanto representava o montante anual dos royalties pagos à Alki pela SMBV em termos de percentagem das vendas anuais de café torrado da SMBV às lojas, o que teria confirmado as suas dúvidas relativas às flutuações dos royalties. Por último, no considerando 289 da decisão impugnada, a Comissão acrescentou que a natureza variável do pagamento de royalties fornecia uma «primeira indicação» de que o nível do pagamento não tinha nenhuma relação com o valor da propriedade intelectual pela qual estava a ser efetuado. A nota 146 da decisão impugnada menciona, em substância, que, «[a] título de exemplo, […] [e]ntre todos os contratos [examinados pela Comissão], não foi identificado nenhum contrato em que tenha sido paga remuneração por tecnologia de torrefação de café licenciada no mercado».

362

É forçoso constatar, por conseguinte, que nem os considerandos 287 a 289 da decisão impugnada nem a nota 146 da referida decisão contêm qualquer argumento segundo o qual o nível dos royalties deveria ter sido menos elevado do que o nível aprovado pelo APPT. Com efeito, esses considerandos limitam‑se a referir, por um lado, que a variabilidade dos royalties indica que não estavam relacionados com o valor da propriedade intelectual em matéria de torrefação e, por outro, que os referidos royalties não deveriam ter sido pagos.

363

Em contrapartida, há que referir que resulta, designadamente, dos considerandos 290, 318, 339 e 445 da decisão impugnada que a Comissão declarou que o valor dos royalties deveria ser exatamente igual a zero. A fortiori, no considerando 340 da decisão impugnada, a Comissão precisou que os royalties não necessitavam de ser estimados e que, por outras palavras, os lucros pagos como royalties pela SMBV à Alki pela propriedade intelectual em matéria de torrefação deveriam ter sido plenamente tributáveis nos Países Baixos.

364

Decorre destas considerações que a decisão impugnada não contém nenhuma consideração que fosse identificável pelo Reino dos Países Baixos e a Starbucks segundo a qual os royalties deveriam ter sido fixados a um nível menos elevado do que o aprovado pelo APPT.

365

Em todo o caso, mesmo supondo que resulte de forma suficientemente clara da decisão impugnada que os royalties deveriam ter sido fixados a um nível menos elevado do que o nível aprovado pelo APPT, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks contestam, em substância, o argumento da Comissão de que o nível dos royalties é dissociado do seu valor económico.

366

Neste contexto, há que salientar que, sem dúvida, não se pode negar que a natureza variável dos royalties levanta questões sobre a racionalidade económica dos royalties. Com efeito, no caso vertente, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks não apresentaram nenhuma explicação convincente que justifique a escolha de um método inabitual para determinar o nível dos royalties.

367

No entanto, o caráter residual dos referidos royalties implica simplesmente que foram calculados, em princípio, a partir da determinação do nível dos outros encargos e rendimentos pertinentes, bem como de uma estimativa do nível do lucro tributável da SMBV. Se os referidos parâmetros fossem corretamente identificados, o mero caráter residual dos royalties não excluiria que o nível dos royalties residuais possa corresponder ao seu valor económico.

368

É forçoso referir que as constatações feitas nos considerandos 287 a 289 da decisão impugnada não eram suficientes para demonstrar que os royalties deveriam ter sido fixados a um nível menos elevado do que o aprovado pelo APPT durante todo o período compreendido entre 2006 e 2014, nomeadamente pelo facto de a decisão impugnada não precisar qual o nível de royalties que a Comissão teria considerado apropriado.

369

Além disso, há que salientar que, no contexto da conclusão efetuada no considerando 289 da decisão impugnada, a Comissão fez referência à nota 146 da decisão impugnada, na qual foi indicado o seguinte:

«[U]ma análise utilizando a RoyaltyStat, no segundo trimestre de 2015, mostra que, dos 168 acordos disponíveis através da base de dados em todos os setores em que apenas foi licenciada tecnologia, o valor médio d[o]s royalties era de 5 % das vendas (com base em 143 destes acordos em que a taxa de licença foi determinada como uma percentagem do valor das vendas em vez de um montante pago por unidade vendida). Entre todos os contratos disponíveis através da base de dados RoyaltyStat, não foi identificado nenhum contrato em que tenha sido paga remuneração por tecnologia de torrefação de café licenciada no mercado. Essa tecnologia foi apenas licenciada em certos casos em combinação com marcas.»

370

A este respeito, há que referir, em primeiro lugar, que essas considerações foram feitas apenas «a título de exemplo», em segundo lugar, que, embora a Comissão alegue que foram pagos royalties nos «setores em que apenas foi licenciada tecnologia» e que havia exemplos de que «[e]ssa tecnologia foi […] licenciada […] em combinação com marcas», não explica, porém, qual seria o nível apropriado desses royalties e, em terceiro lugar, que a Comissão não explicou as razões pelas quais considerava que os dados relativos ao ano de 2015 eram razoavelmente previsíveis no momento da conclusão do APPT em 2008.

371

Por conseguinte, a Comissão não provou de forma juridicamente bastante a sua afirmação de que, durante todo o período compreendido entre 2006 e 2014, o nível dos royalties não estava relacionado com o valor da propriedade intelectual pela qual tinham sido pagos e que, deste modo, tinha sido conferida uma vantagem económica à SMBV.

372

Decorre daí que há que rejeitar o argumento da Comissão segundo o qual teria demonstrado na decisão impugnada que os royalties deveriam ter sido fixados a um nível menos elevado do que o aprovado pelo APPT.

373

Por conseguinte, há que julgar procedente a segunda parte do terceiro fundamento no processo T‑760/15 e a quarta parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, na medida em que o Reino dos Países Baixos e a Starbucks contestam que a Comissão tenha demonstrado, no âmbito da segunda linha de raciocínio, que o valor dos royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ter sido igual a zero e que daí resultava uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, sem que seja necessário apreciar o argumento da Starbucks segundo o qual a Comissão era obrigada a determinar um intervalo de plena concorrência para os royalties.

3.   Quanto à determinação anual dos custos dos grãos de café verde (terceira linha de raciocínio)

374

O Reino dos Países Baixos e a Starbucks suscitam, em substância, duas alegações contra a análise feita pela Comissão no âmbito da terceira linha de raciocínio da decisão impugnada, segundo a qual o nível do preço dos grãos de café verde estava sobreavaliado, ao passo que a questão de saber se este nível era conforme com o princípio da plena concorrência não foi objeto de exame no APPT. Com a primeira alegação, a Starbucks sustenta que a terceira linha de raciocínio incide sobre um elemento dos custos da SMBV que estava fora do alcance da medida controvertida, tal como definida na decisão impugnada. Com a segunda alegação, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks contestam a conclusão de que o nível da margem percentual aplicada aos custos dos grãos de café verde vendidos pela SCTC à SMBV não era conforme com um nível de plena concorrência.

a)   Quanto à questão de saber se o preço dos grãos de café verde estava fora do alcance da medida controvertida

375

No que respeita à primeira alegação, a Starbucks sustenta, em substância, que a terceira linha de raciocínio da Comissão, referente ao preço dos grãos de café verde, visa um elemento dos custos da SMBV que estava fora do alcance da medida controvertida, tal como definida na decisão impugnada. Com efeito, a Starbucks assinala que a Comissão não examinou a questão do preço do café verde colocando‑se no momento da conclusão do APPT, ou seja, em abril de 2008. A Starbucks acrescenta, no âmbito da réplica, que certos argumentos invocados na contestação no processo T‑636/16 indicam que as vantagens fiscais identificadas pela Comissão resultantes do preço dos grãos de café verde para os anos de 2011 a 2014 não podem ser atribuídas ao APPT. Com efeito, as alegadas vantagens fiscais resultantes do preço dos grãos de café verde não podem ser atribuídas ao APPT, mas às declarações anuais que aprovam esses preços e estão, portanto, fora do alcance da «decisão impugnada».

376

A Comissão alega que resulta claramente da decisão impugnada e da contestação no processo T‑636/16 que o preço dos grãos de café verde deveria ter sido examinado a fim de determinar se o nível desse preço era demasiado elevado e conduzia a uma redução do lucro tributável da SMBV.

377

No que respeita ao alcance da medida controvertida, tal como estabelecida na decisão impugnada, há que referir que, nos termos do artigo 1.o da decisão impugnada, a medida que constitui um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e que foi executada pelo Reino dos Países Baixos em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE é o APPT, que foi «celebrado pelos Países Baixos em 28 de abril de 2008 com a [SMBV]». Resulta dessa disposição e da definição constante do considerando 40 da decisão impugnada que a medida controvertida é, portanto, constituída apenas pelo APPT.

378

A este respeito, é forçoso constatar que decorre das disposições do APPT (v. n.o 12 a 16, supra) que este determina o método de cálculo da remuneração da SMBV pelas suas atividades de produção e de distribuição, que serve para estabelecer a matéria coletável para efeitos de pagamento pela SMBV do imposto sobre as sociedades neerlandês. Neste contexto, se o APPT faz referência ao preço dos grãos de café verde pago pela SMBV à SCTC, ao referir que esses custos estão excluídos da base de custos da SMBV, não resolve a questão de saber a que nível deveriam ser fixados os preços de transferência para a compra dos grãos de café verde. Com efeito, há que distinguir a questão de saber se o custo dos grãos de café verde faz parte da base de custos para o cálculo da matéria coletável da de saber qual é o montante do preço de transferência dessas transações que foi efetivamente estabelecido para um determinado ano. Ora, o APPT não contém nenhum elemento que permita determinar esse montante, de modo que as autoridades neerlandesas não validaram, no âmbito do APPT, nenhum método de determinação dos preços de transferência, nem do nível de preços, no que diz respeito aos grãos de café verde.

379

Há que precisar que, na falta de determinação do nível do preço para a compra dos grãos de café verde no APPT, a fixação anual do preço dos grãos de café, designadamente para os anos de 2011 a 2014, deveria ter sido efetuada, sendo caso disso, no âmbito dos avisos de liquidação anuais.

380

Resulta daí que a determinação anual do nível dos custos dos grãos de café verde não foi abrangida pelo APPT e estava, por conseguinte, fora do alcance da medida controvertida. Esta constatação não é posta em causa pelos argumentos da Comissão.

381

Em primeiro lugar, a Comissão considera que o APPT, que constitui a medida controvertida, deveria ter predeterminado o preço de transferência dos grãos de café verde a contar do exercício fiscal de 2011. Com efeito, de acordo com o considerando 447 da decisão impugnada, o lucro contabilístico da SMBV resultante dos custos dos grãos de café verde para os anos fiscais a contar de 2011 deveria ter sido determinado a um nível mais elevado. Com efeito, resulta dos considerandos 360 e 361 da decisão impugnada que, segundo a Comissão, o Relatório sobre os preços de transferência não examinou a questão de saber se o preço dos grãos de café verde, pago pela SMBV à SCTC, era de plena concorrência. Segundo a Comissão, isto «significa» que a metodologia proposta nesse relatório para a determinação dos lucros tributáveis da SMBV confere uma vantagem seletiva a esta última. Além disso, a Comissão sustentou, no considerando 348 da decisão impugnada que o APPT deveria ter fixado um preço de plena concorrência em 2008 do qual não teria sido possível qualquer desvio em 2011, incluindo um aumento na margem de lucro, a menos que o APPT fosse substituído ou alterado.

382

No entanto, há que referir que o Relatório sobre os preços de transferência não contém nenhuma análise dos preços de transferência aplicáveis em transações específicas, tais como o preço dos grãos de café verde pedido pela SCTC à SMBV. Em contrapartida, esse relatório expõe o método de cálculo da remuneração da SMBV para as suas atividades de produção e de distribuição, que constitui a matéria coletável para efeitos de imposto sobre as sociedades neerlandês.

383

O APPT consiste apenas na obtenção de uma confirmação, a montante, do tratamento fiscal de um contribuinte. Ora, uma decisão antecipativa, como o APPT, não abrange necessariamente a totalidade dos aspetos do tratamento fiscal de um contribuinte, mas pode limitar‑se a tratar de determinadas questões precisas. Aliás, decorre da página 28 do Relatório sobre os preços de transferência que o consultor fiscal do Grupo Starbucks considerou que as transações relativas ao café verde eram diferentes daquelas para as quais o APPT tinha sido solicitado.

384

Ora, por um lado, a Comissão não apresentou nenhum elemento indicativo de que, em direito neerlandês, que é o direito pertinente a este respeito, deveria ter sido analisada no APPT a questão de saber se o nível do preço dos grãos de café verde pago pela SMBV à SCTC era de plena concorrência.

385

Por outro lado, o simples facto de o APPT não predeterminar um nível de preços de transferência para os grãos de café verde não significa, em si, que o APPT, ao fixar o método para a determinação da remuneração da SMBV, teria conferido uma vantagem à SMBV para as suas atividades de produção e de distribuição.

386

Em segundo lugar, a Comissão assinala, nos seus articulados, que a aplicação técnica do APPT, através dos avisos de liquidação anuais, constitui também a concessão de um auxílio. Todavia, essa conclusão não decorre da decisão impugnada. A Comissão refere‑se, a este respeito, ao artigo 1.o da decisão impugnada, que faz referência ao facto de o APPT permitir à SMBV «determinar a sua sujeição ao imposto sobre as sociedades [no Reino dos] Países Baixos numa base anual por um período de dez anos». A Comissão acrescenta que a decisão impugnada contém inúmeras referências ao lucro tributável da SMBV, tal como determinado pelo APPT. Em seu entender, o APPT não tem nenhum valor, exceto se for utilizado para a «preparação das declarações fiscais». A este respeito, a Comissão invoca o considerando 225 da decisão impugnada, que enuncia que o APPT implica uma aceitação por parte da Administração Fiscal neerlandesa de uma afetação dos lucros proposta pela Starbucks com base na qual a SMBV determina o montante da sua sujeição ao imposto sobre as sociedades nos Países Baixos numa base anual.

387

Contrariamente às afirmações da Comissão acima descritas, há que referir que os avisos de liquidação anuais referentes à SMBV não aplicam o APPT de forma puramente técnica. Se é sem dúvida verdade que o APPT e o Relatório sobre os preços de transferência em que se baseia predeterminam o método para o cálculo do lucro tributável da SMBV a título de imposto sobre as sociedades neerlandês, estes não permitiam prever os rendimentos e os encargos anuais que eram declarados pela SMBV atendendo às transações reais que ocorreram durante o ano em causa.

388

Além disso, a afirmação da Comissão segundo a qual a aplicação técnica do APPT através dos avisos de liquidação anuais constitui também a concessão de um auxílio é errada. Com efeito, os avisos anuais que aplicam o APPT não fazem parte da medida em causa, tal como definida pela Comissão, a saber, o APPT, conforme decorre do artigo 1.o da decisão impugnada. Mais especificamente, o APPT não determinou o lucro tributável da SMBV com base nos custos dos grãos de café verde e também não tratou da questão da determinação anual dos custos dos grãos de café verde. Além disso, a Comissão não censurou, em nenhuma parte da decisão impugnada, as autoridades neerlandesas por terem concedido uma vantagem à SMBV pela exclusão dos custos dos grãos de café verde na matéria coletável, mas limitou‑se a contestar o facto de o nível do preço dos grãos de café verde não ter sido fiscalizado pelas autoridades fiscais neerlandesas.

389

Em todo o caso, há que referir que nada teria impedido a Comissão de definir a medida controvertida de forma mais ampla, de modo que os avisos de liquidação anuais referentes à SMBV fossem abrangidos pela mesma. Ora, a Comissão limitou o alcance da medida controvertida apenas ao APPT.

390

Ademais, foi exposto no n.o 248, supra, que o APPT podia ser revogado ou alterado durante o seu período de validade, compreendido entre 2007 e 2017. Há que assinalar que, na decisão impugnada, a Comissão não considerou que o facto de as autoridades neerlandesas não terem revogado ou alterado o APPT durante o seu período de vigência, devido aos custos excessivos dos grãos de café verde, tinha conferido uma vantagem à SMBV.

391

Por conseguinte, há que julgar procedente a alegação segundo a qual a terceira linha de raciocínio incide sobre um elemento dos custos da SMBV que estava fora do alcance da medida controvertida. Uma vez que o nível dos custos dos grãos de café verde para os anos fiscais a contar de 2011 não fazia parte da medida controvertida, a Comissão não podia solicitar ao Reino dos Países Baixos, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da decisão impugnada, lida em conjugação com os seus considerandos 447 e 448, a recuperação da diferença entre o montante efetivamente pago a título de imposto sobre as sociedades e o montante que teria sido devido se o lucro contabilístico da SMBV resultante dos custos dos grãos de café verde para os anos fiscais a contar de 2011 tivesse sido determinado a um nível mais elevado.

b)   Quanto à questão de saber se o nível da margem de lucro aplicada aos custos dos grãos de café verde vendidos pela SCTC à SMBV não era conforme com um nível de plena concorrência

392

Em todo o caso, mesmo supondo que a terceira linha de raciocínio incidisse sobre um elemento dos custos da SMBV abrangido pela medida controvertida, é forçoso constatar que haveria também que julgar procedente a segunda alegação exposta no n.o 374, supra. Com efeito, desde já, importa recordar que o custo dos grãos de café verde adquiridos pela SMBV está excluído da base de custos da SMBV determinada no APPT. Em substância, o preço dos grãos de café verde a pagar pela SMBV à SCTC é composto pelos custos da mercadoria da SCTC e por uma margem de lucro sobre esses custos.

393

A decisão impugnada explica que a margem de lucro média sobre os custos dos grãos de café verde fornecidos pela SCTC para o período de 2005 a 2010 é de [confidencial] %, em comparação com uma margem de lucro média de cerca de [confidencial] % durante o período de 2011 a 2014. A margem bruta média sobre o custo dos produtos vendidos correspondente para o período de 2005 a 2010 é de cerca de [confidencial] %, em comparação com uma margem bruta média sobre o custo dos produtos vendidos de cerca de [confidencial] % durante o período de 2011 a 2014. De acordo com a decisão impugnada, a Starbucks sustentou que a margem de lucro de [confidencial] % aplicável, em média, para o período de 2005 a 2010 corresponde a uma margem de lucro de plena concorrência. A Comissão presumiu, em seguida, que o aumento da margem de lucro a partir de 2011 poderia constituir uma remuneração registada pela SMBV nas atividades de torrefação de café. Encontrando‑se a margem de lucro [confidencial] % igualmente dentro do intervalo de remuneração da função de fornecimento apresentada pela Starbucks no procedimento administrativo, a Comissão concluiu que a margem de lucro de [confidencial] % sobre os custos dos grãos de café verde durante o período de 2005 a 2010 se encontrava em condições de plena concorrência. Uma vez que a Starbucks não apresentou, segundo a decisão impugnada, nenhuma justificação «válida» para o aumento da margem de lucro média para [confidencial] % a partir de 2011, a Comissão considerou que não devia ser aceite nenhuma dedução correspondente aos lucros contabilísticos da SMBV em resultado desse aumento a partir desse período.

394

Todavia, para chegar a uma aproximação fiável de uma margem de lucro de plena concorrência para o período a partir de 2011, a Comissão aceitou que a margem de lucro média de [confidencial] % para o período de 2005 a 2010 fosse aumentada pelos custos do programa «C.A.F.E. Practices» e até ao montante dos custos da designação do [confidencial]. Segundo a Comissão, esses custos [confidencial] % representavam [confidencial] % dos custos dos grãos de café verde adquiridos pela SCTC no final de 2014 e traduziu‑se em [confidencial] % do preço cobrado à SMBV. Uma margem de lucro de plena concorrência registada pela SCTC relativamente ao período a partir de 2011 seria, por conseguinte, de até [confidencial] % dos custos dos grãos de café verde adquiridos pela SCTC, correspondendo a uma margem bruta de [confidencial] % sobre o custo dos produtos vendidos da SCTC, cobrada pela SCTC à SMBV.

395

A Comissão concluiu que a margem de lucro média de [confidencial] % sobre os custos de grãos de café verde fornecidos pela SCTC à SMBV efetivamente aplicada de 2011 a 2014 não reflete uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado em conformidade com o princípio da plena concorrência.

396

Por um lado, há que referir que, conforme indicado nos n.os 243 a 251, supra, nas circunstâncias do caso vertente, a Comissão era obrigada a abster‑se de qualquer apreciação baseada numa situação posterior à conclusão do APPT. Ora, a Comissão não explica, na decisão impugnada, de que modo o nível elevado dos custos dos grãos de café verde para os anos fiscais a contar de 2011, a que se refere nos considerandos 342 a 359 dessa decisão, teria sido previsível no momento da adoção do APPT, quando se trata da situação da SMBV a partir de 2011. Por conseguinte, a Comissão não demonstrou que tinha o direito de se basear no facto de a SCTC ter aplicado uma margem de lucro mais elevada sobre os custos dos grãos de café verde nos anos fiscais a contar de 2011.

397

Por outro lado, mesmo supondo que o desenvolvimento da margem de lucro a partir de 2011 fosse previsível no momento da conclusão do APPT, há que referir que a abordagem da Comissão não convence. Com efeito, conforme sustenta, com razão, a Starbucks, a Comissão sugere que a margem de lucro da SCTC deveria ter sido fixada ao nível do lucro médio antes do imposto da SCTC sobre as vendas intragrupo durante os exercícios anteriores a 2008, quando tais transações «controladas» (intragrupo) anteriores não podem servir para efeitos de análise comparativa dos preços de transferência «baseada no mercado».

398

A este respeito, há que assinalar que a Comissão sustenta que o preço pago pela SMBV à SCTC era demasiado elevado a partir de 2011. Há que relembrar que se trata de um preço pago dentro do grupo Starbucks. Ora, para determinar um preço de transferência, a Comissão deveria ter comparado o preço pago pela SMBV à SCTC com um preço que teria pagado no mercado uma empresa autónoma por grãos de café verde. A Comissão deveria ter determinado um intervalo de preços para os grãos de café verde que um torrefator autónomo numa situação comparável à da SMBV teria pagado no mercado. Contudo, em vez de determinar e analisar essa transação não controlada, a Comissão limitou a sua análise à transação controlada em questão e verificou simplesmente a plausibilidade da estrutura dos custos e das margens de lucro da outra parte (integrada) na transação controlada em questão, a saber, da SCTC.

399

A título ilustrativo, importa recordar que as Orientações da OCDE, na sua versão de 2010, às quais a Comissão faz referência inúmeras vezes na decisão impugnada, enunciam nos seus pontos 3.24 e 3.25 o seguinte:

«3.24

Uma transação comparável no mercado livre é uma transação entre duas partes independentes que é comparável à transação controlada em análise. Pode tratar‑se de uma transação comparável entre uma parte da transação controlada e uma parte independente (“comparável interna”) ou entre duas empresas independentes que não estão envolvidas na transação controlada (“comparável externa”).

3.25

A comparação das transações controladas de um contribuinte com outras transações controladas efetuadas pelo mesmo grupo multinacional ou por outro grupo não é pertinente para a aplicação do princípio da plena concorrência e não deveria, portanto, ser utilizada por uma Administração Fiscal como base para proceder a um ajustamento dos preços de transferência ou por um contribuinte para apoiar a sua política em matéria de preços de transferência.»

400

Neste contexto, a Comissão admite que, nos considerandos 342 a 361 da decisão impugnada, não tinha por finalidade realizar uma análise rigorosa da fixação dos preços de transferência a fim de determinar o preço de plena concorrência para o café verde no momento em que o APPT foi pedido. Todavia, conforme exposto no n.o 154, supra, incumbia à Comissão justificar a escolha do método de determinação dos preços de transferência que considerava apropriada no caso vertente a fim de examinar o nível dos preços de transferência para uma transação intragrupo.

401

A afirmação da Comissão segundo a qual, para efeitos da sua apreciação, não tinha necessidade de recensear as transações externas comparáveis referentes aos grãos de café verde porque tinha «compreendido» que a margem de lucro média de [confidencial] % para o período de 2005 a 2010 correspondia a uma margem de lucro de plena concorrência em 2008 não basta como justificação a este respeito. Com efeito, a comparação da transação controlada com transações externas comparáveis, para o período posterior ao ano de 2011, tem por finalidade determinar se esta era de plena concorrência e o facto de outra transação controlada ser presumida como sendo de plena concorrência, para o período compreendido entre 2005 e 2010, não permite evitar o exame de transações externas comparáveis para o período posterior ao ano de 2011. O simples facto de, segundo a Comissão, os correspondentes Starbucks não terem apresentado nenhuma justificação válida para o aumento da margem de lucro a partir de 2011 não demonstra que o preço dos grãos de café verde pago pela SMBV à SCTC para os anos fiscais a contar de 2011 tenha sido fixado a um nível superior aos preços que outros operadores comparáveis no mercado deveriam ter pagado.

402

Estas considerações bastam para concluir que há também que julgar procedente a segunda alegação exposta no n.o 374, supra.

403

Por conseguinte, conforme exposto nos n.os 391 e 402, supra, há que julgar procedente a alegação segundo a qual a terceira linha de raciocínio incide sobre um elemento dos custos da SMBV que estava fora do alcance da medida controvertida e que, a título exaustivo, a Comissão não demonstrou, através desta linha de raciocínio, a existência de uma vantagem, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a favor da SMBV.

404

Por conseguinte, há que julgar procedente o fundamento relativo ao facto de, no âmbito da sua primeira a terceira linhas de raciocínio, a Comissão não ter demonstrado que o APPT tinha conferido uma vantagem à SMBV, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

E. Quanto à contestação do raciocínio subsidiário relativo à existência de uma vantagem fiscal a favor da SMBV (considerandos 362 a 408 da decisão impugnada)

405

O quarto fundamento no processo T‑760/15 e a terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16 têm por objeto o raciocínio subsidiário da Comissão relativo à existência de uma vantagem, que consiste em demonstrar que, mesmo supondo que o MMLT pudesse ser utilizado para efeitos de determinação do lucro tributável da SMBV, as modalidades de aplicação desse método à SMBV, tal como validadas no APPT, seriam erradas.

406

Este raciocínio subsidiário divide‑se em duas partes. Na primeira parte, a Comissão considerou que a escolha da SMBV como «parte testada» para efeitos de aplicação do MMLT, em vez da Alki, era errada (quarta linha de raciocínio). Na segunda parte, a Comissão entendeu que, mesmo supondo que a parte a testar fosse efetivamente a SMBV, a margem de lucro da SMBV obtida após a aplicação do MMLT não é conforme com a plena concorrência. Por um lado, a Comissão considerou que a escolha dos custos de exploração como indicador do nível de lucro era errada (quinta linha de raciocínio). Por outro lado, a Comissão entendeu que, de qualquer modo, os ajustamentos aplicados à margem de lucro a fim de aumentar a comparabilidade da SMBV com as empresas comparáveis eram inapropriados (sexta linha de raciocínio).

407

O MMLT, a que a Comissão faz referência nos considerandos 72 a 74 da decisão impugnada, é um método indireto de determinação dos preços de transferência. O MMLT consiste em determinar, a partir de uma base adequada, o lucro líquido realizado por um contribuinte no âmbito de uma transação controlada ou de transações controladas que são estreitamente ligadas ou contínuas. Para determinar essa base adequada, deve ser escolhido um indicador do nível de lucro, tal como os custos, as vendas ou os ativos. O indicador do lucro líquido obtido pelo contribuinte numa transação controlada deve ser determinado por referência ao indicador do lucro líquido que o mesmo contribuinte ou uma empresa independente realiza em transações comparáveis no mercado livre. O MMLT implica identificar uma parte na transação para a qual um indicador é testado.

408

O Reino dos Países Baixos e a Starbucks, que sustentam que o MMLT foi corretamente aplicado, contestam o conjunto das críticas formuladas pela Comissão no âmbito do seu raciocínio subsidiário relativo à existência de uma vantagem.

409

Em primeiro lugar, a primeira parte do quarto fundamento no processo T‑760/15 e a primeira alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16 têm por objeto a identificação da SMBV como entidade menos complexa.

410

Em segundo lugar, a segunda e terceira partes do quarto fundamento no processo T‑760/15 e a segunda alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16 dizem respeito à identificação das funções principais da SMBV e à determinação do lucro da SMBV com base nos custos de exploração.

411

Em terceiro lugar, a quarta parte do quarto fundamento no processo T‑760/15 e a terceira alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16 referem‑se à escolha dos ajustamentos destinados a aumentar a comparabilidade da SMBV com as empresas comparáveis. Há que apreciar, sucessivamente, cada uma destas alegações.

412

Além disso, a Starbucks alega que o raciocínio subsidiário da Comissão relativo à existência de uma vantagem (considerandos 362 a 408 da decisão impugnada) enferma de falta de fundamentação. A Starbucks acusa a Comissão de ter criticado a forma como o MMLT foi aplicado sem demonstrar que uma melhor aplicação deste método teria resultado num lucro mais elevado para a SMBV.

1.   Quanto à identificação da SMBV como entidade mais complexa (quarta linha de raciocínio)

413

Na primeira parte do quarto fundamento no processo T‑760/15, o Reino dos Países Baixos alega que o argumento da Comissão segundo o qual, por ser a entidade mais complexa, a SMBV não podia ser identificada como parte a testar para efeitos de aplicação do MMLT, é errado. Com efeito, o Reino dos Países Baixos alega que era correto escolher a SMBV para aplicar o MMLT. Por um lado, a simples circunstância de a Alki ser titular da propriedade intelectual em matéria de torrefação e da marca Starbucks para a Região EMEA justificava que não fosse designada como parte a testar para efeitos de aplicação do MMLT. Por outro lado, as funções da SMBV são menos complexas do que as da Alki. Nenhum dos argumentos invocados pela Comissão na decisão impugnada relativamente às funções e riscos assumidos pela SMBV é suscetível de pôr em causa essa constatação. Além disso, o Reino dos Países Baixos sustenta que a Comissão não calculou o lucro que deveria ter sido imputado à Alki se lhe tivesse sido aplicado o MMLT e, consequentemente, não demonstrou que a aplicação do MMLT que preconiza teria resultado num lucro superior para a SMBV.

414

No âmbito da primeira alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, a Starbucks alega que a SMBV foi qualificada, corretamente, no Relatório sobre os preços de transferência, de entidade menos complexa em relação à Alki. Por um lado, a Starbucks sustenta que a SMBV presta atividades rotineiras de torrefação e de acondicionamento do café de baixo risco e de apoio administrativo e logístico. Por outro lado, a Starbucks considera que a Alki é necessariamente a entidade mais complexa, uma vez que explora os direitos de propriedade intelectual em matéria de torrefação, o que a Comissão não contesta, e suporta os riscos relacionados com as atividades da SMBV, em conformidade com as disposições do contrato de torrefação. A Starbucks acusa a Comissão de não ter procedido a uma análise apropriada das funções da SMBV, nem das da Alki.

415

Além disso, a Starbucks sustenta que a decisão impugnada enferma de falta de fundamentação. A Starbucks alega que a Comissão não demonstrou que o facto de ter identificado, erradamente, a SMBV como entidade menos complexa lhe teria conferido uma vantagem. A Starbucks sustenta que a decisão impugnada não precisa qual teria sido o lucro tributável da SMBV se a Alki tivesse sido designada como entidade menos complexa, nem a forma como o MMLT deveria ter sido aplicado à Alki.

416

A Comissão contesta esses argumentos. A Comissão sustenta que provou, de forma juridicamente bastante, na decisão impugnada, que a escolha da SMBV como entidade a testar para efeitos de aplicação do MMLT era errada e não permitia chegar a uma aproximação fiável de resultados de plena concorrência.

417

Em primeiro lugar, a Comissão sustenta que o facto de o Relatório sobre os preços de transferência não conter uma análise funcional completa da SMBV e da Alki é suficiente para considerar que o método adotado no APPT não permite chegar a um resultado de plena concorrência. Em segundo lugar, a Comissão alega que as Orientações da OCDE não permitem sustentar a posição do Reino dos Países Baixos e da Starbucks sobre a escolha da parte a testar. Em terceiro lugar, a Comissão invoca que a complexidade da parte a testar é relativa à da outra entidade envolvida na transação a testar e que, nesta perspetiva, a Alki é menos complexa do que a SMBV. Em quarto lugar, a Comissão alega que o argumento de que não realizou uma análise funcional adequada da SMBV e da Alki é inadmissível, na medida em que se trata de um argumento novo, apresentado pela primeira vez na fase da réplica. A Comissão sublinha que, em todo o caso, esse argumento é infundado.

418

Em quinto lugar, no que respeita à falta de fundamentação invocada pela Starbucks, a Comissão retorque que concluiu, no considerando 377 da decisão impugnada, que, pelo facto de assentar num pressuposto errado, a aplicação do MMLT não permitia chegar a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado e conferia, assim, uma vantagem à SMBV. A Comissão precisa que, se a Alki tivesse sido considerada a entidade mais complexa, a análise das suas funções teria demonstrado que não teria direito a uma remuneração, pelo que todos os lucros deveriam ter sido atribuídos à SMBV.

419

Em substância, as partes opõem‑se, por um lado, na questão de saber se o Relatório sobre os preços de transferência, conforme validado no APPT, identificou corretamente a SMBV como entidade a testar para efeitos do MMLT e, por outro, se a Comissão fundamentou suficientemente as razões pelas quais considerou que o erro na identificação da entidade a testar conduziu a uma diminuição do lucro tributável da SMBV.

420

Em primeiro lugar, há que apreciar, independentemente da questão de saber se a entidade a testar era a SMBV ou a Alki, se a Comissão cumpriu o seu dever de fundamentação.

421

A este respeito, decorre de jurisprudência constante que a fundamentação exigida pelo artigo 296.o, n.o 2, TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar de forma clara e inequívoca o raciocínio da instituição autora do ato, de forma que permita aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o, n.o 2, TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. Acórdãos de 15 de julho de 2004, Espanha/Comissão, C‑501/00, EU:C:2004:438, n.o 73 e jurisprudência referida, e de 22 de janeiro de 2013, Salzgitter/Comissão, T‑308/00 RENV, EU:T:2013:30, n.os 112 e 113 e jurisprudência referida).

422

No caso em apreço, a Comissão expôs, na secção 9.2.3.4 da decisão impugnada, que a escolha da SMBV como entidade a testar, para efeitos de aplicação do MMLT, tinha conferido uma vantagem à SMBV.

423

Antes de mais, a Comissão salientou, no considerando 364 da decisão impugnada, que o Relatório sobre os preços de transferência deveria ter realizado uma comparação de cada uma das partes nas transações conexas.

424

Em seguida, a Comissão considerou, nos considerandos 365 a 368 da decisão impugnada, que a escolha da SMBV, como parte testada, não é conforme com as prescrições das Orientações da OCDE nas suas versões de 1995 e de 2010, ao abrigo das quais a parte a testar é a que tem funções menos complexas de entre as entidades que são partes na transação controlada.

425

Por último, após uma análise das funções da SMBV e da Alki, a Comissão concluiu que o Relatório sobre os preços de transferência designou erradamente a SMBV como tendo a função menos complexa em relação à Alki (considerandos 369 a 376 da decisão impugnada).

426

No considerando 377 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que, uma vez que a metodologia para a determinação da matéria coletável da SMBV no Relatório sobre os preços de transferência assentava no pressuposto errado de que a SMBV deveria ser a parte testada na aplicação do MMLT, essa metodologia não resultou numa aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência. A Comissão acrescenta que, dado que a aprovação pelo APPT dessa metodologia conduz a uma redução da dívida fiscal da SMBV ao abrigo do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades em relação a empresas autónomas cujo lucro tributável ao abrigo desse sistema é determinado pelo mercado, deve‑se considerar que o APPT confere à SMBV uma vantagem seletiva na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do TFUE.

427

Ora, conforme exposto no n.o 201, supra, a simples constatação da inobservância das prescrições metodológicas em matéria de determinação dos preços de transferência não basta para demonstrar a existência de um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o TFUE. É preciso que a Comissão demonstre que os erros metodológicos que identificou não permitem chegar a uma aproximação de resultados de plena concorrência e conduziram a uma redução do lucro tributável comparativamente ao lucro que teria sido calculado em conformidade com o princípio da plena concorrência.

428

Por conseguinte, no âmbito da apreciação da vantagem na aceção do artigo 107.o TFUE, a fim de cumprir o seu dever de fundamentação, conforme exposto no n.o 421, supra, a Comissão era obrigada a expor as razões pelas quais tinha considerado que o erro relativo à escolha da entidade a testar tinha tido por efeito diminuir o nível de lucro tributável da SMBV em proporções tais que este não correspondia a uma aproximação fiável de resultados de plena concorrência, conduzindo assim a uma diminuição da carga fiscal da SMBV.

429

Ora, há que declarar que é com razão que a Starbucks sustenta que a decisão impugnada não contém nenhum elemento que permita compreender as razões pelas quais a Comissão considerou que o erro na identificação da entidade a testar, para efeitos de aplicação do MMLT, teria conferido uma vantagem à SMBV.

430

Por um lado, embora a Comissão tenha indicado no considerando 377 da decisão impugnada que o erro sobre a entidade a testar conferiu uma vantagem à SMBV, esse considerando não contém uma fundamentação suficiente. Com efeito, conforme resulta do n.o 422, supra, a Comissão limitou‑se a afirmar que o erro relativo à determinação da entidade a testar conduzia a uma diminuição do lucro tributável. A Comissão não apresenta nenhum elemento suscetível de demonstrar que a aplicação do MMLT à Alki e a afetação dos lucros residuais à SMBV teriam resultado num lucro tributável mais elevado para a SMBV.

431

Por outro lado, os outros considerandos da decisão impugnada não contêm nenhum elemento que permita compreender as razões pelas quais a Comissão considerou que o lucro tributável da SMBV teria sido mais elevado se o MMLT tivesse sido aplicado à Alki e não à SMBV.

432

À luz destas considerações, há que declarar que a Comissão não expôs as razões pelas quais considerou que a escolha da SMBV como parte a testar, para efeitos de aplicação do MMLT, tinha conduzido a uma diminuição do lucro tributável da SMBV. Consequentemente, a Comissão não demonstrou de que forma esse erro conferia uma vantagem à SMBV, violando, assim, o seu dever de fundamentação, tal como decorre do artigo 296.o, n.o 2, TFUE.

433

Em todo o caso, há também que declarar que o raciocínio da Comissão referente à escolha da entidade a testar é errado. Com efeito, mesmo supondo que a Comissão pudesse fiscalizar o APPT à luz das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995, tais como disponíveis em abril de 2008, e que pudesse deduzir a existência de uma vantagem da não conformidade com as prescrições contidas nessas orientações, estas últimas não preveem uma regra estrita sobre a identificação da parte a testar.

434

Mais especificamente, conforme alegam com razão o Reino dos Países Baixos e a Starbucks, o ponto 3.43 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995, indica que a empresa associada, à qual é aplicado o MMLT, deve ser a empresa relativamente à qual podem ser identificados dados fiáveis sobre as transações mais estreitamente comparáveis. É, a seguir, especificado que isso implica frequentemente escolher a empresa associada que é a menos complexa das empresas envolvidas na transação e que não possui ativos incorpóreos de valor ou ativos únicos. Decorre daí que as orientações não impõem necessariamente a escolha da entidade menos complexa, mas aconselham apenas a escolher a entidade relativamente à qual está disponível o maior número de dados fiáveis.

435

Ora, a Comissão não demonstra que estivessem disponíveis dados mais fiáveis para aplicar o MMLT à Alki. Há que sublinhar, nomeadamente, que, por um lado, o objetivo do APPT é determinar o nível de lucro tributável da SMBV e não o da Alki e que, por outro, a Alki era um terceiro no processo que visava determinar a situação fiscal nos Países Baixos da SMBV.

436

Por outro lado, a existência dessa recomendação não significa que a escolha de uma ou de outra entidade como entidade a testar terá necessariamente uma influência sobre o preço de transferência obtido e que a escolha da entidade mais complexa como entidade a testar não permite chegar a um resultado de plena concorrência.

437

Com efeito, se a escolha da entidade menos complexa como parte a testar tende a limitar os erros, não se mostra de todo excluído que a aplicação do MMLT à entidade mais complexa possa conduzir a um resultado de plena concorrência. Além disso, na medida em que os lucros residuais são atribuídos à outra parte, o resultado deveria, em teoria, ser o mesmo, quer se teste uma ou outra entidade.

438

Por conseguinte, há que julgar procedente a primeira parte do quarto fundamento no processo T‑760/15 e a primeira alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, sem que seja necessário apreciar o argumento da Starbucks destinado a contestar a admissibilidade de certos argumentos apresentados pela Comissão.

2.   Quanto à análise das funções da SMBV e à determinação do lucro da SMBV com base nos custos de exploração (quinta linha de raciocínio)

439

Na segunda e terceira partes do quarto fundamento no processo T‑760/15, o Reino dos Países Baixos alega que a Comissão considerou erradamente, por um lado, que as principais funções da SMBV eram a revenda de produtos derivados do café e não relacionados com café em vez da torrefação e, por outro, que os custos de exploração não eram um indicador apropriado do nível de lucro.

440

Em primeiro lugar, o Reino dos Países Baixos invoca, em substância, que a Comissão considerou erradamente que a função principal da SMBV era a revenda em vez da torrefação. Em segundo lugar, o Reino dos Países Baixos sustenta que, uma vez que a Comissão considerou erradamente que a função principal da SMBV era a revenda, a sua constatação de que as vendas eram o indicador do nível de lucro apropriado também é incorreta. Em terceiro lugar, o Reino dos Países Baixos alega que a análise de comparabilidade alternativa proposta pela Comissão nos considerandos 395 a 398 da decisão impugnada não demonstra que a determinação do lucro da SMBV com base no volume de negócios teria resultado num lucro tributável mais elevado para a SMBV.

441

No âmbito da segunda alegação da terceira parte do seu segundo fundamento, a Starbucks acusa também a Comissão de ter erradamente considerado que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café em vez da torrefação de café e de deduzir daí que as vendas, e não os custos de exploração, eram o indicador do nível de lucro apropriado. A Starbucks sustenta, a este respeito, que os custos de exploração constituem o indicador certo do nível de lucro da SMBV. Além disso, a Starbucks alega que a Comissão não demonstrou que o erro na determinação das funções da SMBV lhe tinha conferido uma vantagem, na medida em que a análise de comparabilidade da Comissão enferma de erros significativos.

442

A Comissão sustenta que demonstrou corretamente que a função principal da SMBV era a revenda e que, portanto, o indicador do nível de lucro pertinente para a SMBV era as vendas e não os custos de exploração.

443

Em primeiro lugar, a Comissão alega que a SMBV atua principalmente na qualidade de revendedor.

444

Em segundo lugar, a Comissão contesta os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks destinados a demonstrar que considerou erradamente que as vendas eram o indicador do nível de lucro pertinente. A Comissão alega que, dado que demonstrou que a função principal da SMBV era a revenda, censurou com razão as autoridades neerlandesas por terem validado a utilização dos custos de exploração como indicador do nível de lucro e pôde considerar que o indicador do nível de lucro pertinente era as vendas.

445

Além disso, a Comissão assinala que o lucro das vendas de produtos não relacionados com café deve ser imputado à SMBV e não pode ser transferido, através de royalties, à Alki, que não está numa posição que lhe permita obter lucros a partir da revenda dos produtos não relacionados com café.

446

Em terceiro lugar, a Comissão contesta os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks de que a sua análise dos pontos de comparação enferma de vários erros.

447

Em quarto lugar, a Comissão contesta as críticas formuladas pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks, segundo as quais não demonstrou que uma melhor aplicação do MMLT teria resultado num lucro tributável mais elevado para a SMBV.

448

Por um lado, a Comissão alega que essas críticas são irrelevantes para a apreciação da validade da decisão impugnada. Com efeito, não lhe pareceu necessário propor um método de recuperação para o seu raciocínio subsidiário, uma vez que não concordou com a utilização do MMLT no caso da SMBV.

449

Por outro lado, a Comissão sustenta que essas observações são infundadas, dado que efetuou uma análise com base na função de revendedor da SMBV e calculou uma remuneração para a SMBV com base numa margem sobre as vendas. O considerando 400 da decisão impugnada, no qual a Comissão admitiu que esse cômputo não se destinava a calcular a remuneração de plena concorrência da SMBV, não põe em causa o facto de a sua análise comparativa ter sido realizada para demonstrar que uma melhor aplicação do MMLT teria resultado num lucro tributável mais elevado para a SMBV.

450

Em substância, as partes opõem‑se na questão de saber se a Comissão demonstrou que os erros por ela identificados referentes à análise das funções da SMBV e à escolha do indicador do nível de lucro conferiam uma vantagem à SMBV.

451

A título preliminar, importa referir que, embora, na petição do processo T‑760/15, estas questões sejam objeto de duas alegações distintas tratadas em secções separadas, as questões da identificação das funções da SMBV e da escolha do indicador do nível de lucro são indissociáveis. Com efeito, resulta dos considerandos 386 e 400 da decisão impugnada que estas duas questões fazem parte de uma única e mesma demonstração de que o APPT teria conferido uma vantagem à SMBV.

452

Com efeito, numa primeira fase, a Comissão declarou que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café, e não a torrefação de café (considerandos 380 a 386 da decisão impugnada).

453

Numa segunda fase, com base nessa constatação, a Comissão afirmou que as vendas eram um indicador do nível de lucro mais apropriado do que os custos de exploração (considerandos 387 a 391 da decisão impugnada). A Comissão considerou, em substância, que, para o período compreendido entre 2008 e 2014, a escolha dos custos de exploração como indicador do nível de lucro não traduzia o forte aumento das vendas e, assim, do lucro da SMBV resultante da sua atividade de revenda. A Comissão deduziu daí que os lucros resultantes das vendas eram indevidamente transferidos para a Alki através dos royalties, quando esta última não estava em condições de gerar os referidos proveitos.

454

O caráter indissociável das duas fases expostas nos n.os 452 e 453, supra, resulta, por um lado, do facto de a Comissão não retirar nenhuma conclusão sobre a existência de uma vantagem seletiva a partir da constatação do simples erro na identificação das funções da SMBV e, por outro, do facto de a Comissão deduzir o erro na escolha do indicador do nível de lucro da SMBV do erro na identificação das funções da SMBV.

455

Numa terceira fase, a Comissão procurou também «ilustrar» a incidência do erro na determinação das principais funções da SMBV e a escolha do indicador do nível de lucro sobre o nível de lucro da SMBV. Para tal, a Comissão conduziu a sua própria análise funcional partindo da premissa de que a função principal da SMBV era a revenda (considerandos 392 a 400 da decisão impugnada).

456

Por motivos de clareza, há que assinalar que, com esse raciocínio, por um lado, a Comissão não põe em causa a escolha do MMLT no caso vertente e que, por outro, não alega que o indicador do nível de lucro adotado no APPT, a saber, os custos de exploração, deveria ter incluído outros elementos de custo, mas sustenta que um indicador do nível de lucro totalmente distinto dos custos deveria ter sido utilizado no âmbito do APPT.

457

A fim de apreciar se a Comissão logrou demonstrar que a escolha do indicador do nível de lucro tinha conduzido a um resultado não conforme com o princípio da plena concorrência, há que, portanto, examinar, antes de mais, a demonstração da Comissão realizada no âmbito das primeira e segunda fases (considerandos 380 a 391 da decisão impugnada), e depois a sua análise de comparabilidade efetuada no âmbito da terceira fase do seu raciocínio (considerandos 392 a 400 da decisão impugnada).

a)   Quanto à escolha do indicador do nível de lucro

458

Na decisão impugnada, a Comissão considerou que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café. A Comissão baseou principalmente esse raciocínio no facto de, em 2007, apenas [confidencial] % dos rendimentos da SMBV terem resultado da venda do café torrado. Em comparação, [confidencial] % dos rendimentos da SMBV foram retirados da venda de produtos não relacionados com café, que corresponde ao que a Starbucks identifica como atividade de prestação de serviços logísticos e administrativos, e uma parte substancial do pessoal da SMBV estava afeta a esta atividade.

459

Com base nessa constatação, a Comissão considerou que as vendas eram o indicador do nível de lucro apropriado. No considerando 387 da decisão impugnada, a Comissão salientou, desde logo, que, de acordo com o ponto 2.87 das Orientações da OCDE, na sua versão de 2010, as vendas ou os custos operacionais de distribuição podiam ser um indicador apropriado do nível de lucro. Em seguida, no considerando 388 da decisão impugnada, a Comissão declarou que, no caso em apreço, as vendas são um indicador mais adaptado da rendibilidade da função de revenda da SMBV devido ao facto de os lucros desta última serem gerados e registados através de uma margem sobre os produtos distribuídos. Além disso, segundo a Comissão, entre 2008 e 2014, as vendas totais da SMBV quase triplicaram, enquanto a «margem bruta» mais do que duplicou durante esse mesmo período e, em comparação, os custos de exploração da SMBV aumentaram apenas 6 %. Daí a Comissão deduziu, então, que os custos de exploração não podiam ser um indicador do nível de lucro adequado. Com base nessa constatação, no considerando 389 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que o pagamento de royalties à Alki, que corresponde ao lucro residual, tinha por efeito transferir parte do lucro da SMBV relacionado com a revenda à Alki, quando esta última, devido às suas capacidades operacionais limitadas, não estava em condições de gerar lucros relativamente a esta atividade. A Comissão concluiu então que a totalidade dos lucros deveria ter sido atribuída à SMBV.

460

No entanto, há que referir que, mesmo supondo que a Comissão não tivesse cometido um erro ao considerar que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café, a sua análise não basta para demonstrar que um indicador do nível de lucro baseado nos custos de exploração não podia conduzir a um resultado de plena concorrência.

461

Em primeiro lugar, há que salientar que, como a própria Comissão declarou no considerando 387 da decisão impugnada, resulta do ponto 2.87 das Orientações da OCDE, na sua versão de 2010, que as vendas ou os custos de exploração ligados à distribuição podiam ser um indicador do nível de lucro apropriado. Decorre daí que, mesmo supondo que a premissa da Comissão, segundo a qual a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café, fosse correta, não se exclui, por princípio, que os custos de exploração possam constituir um indicador do nível de lucro apropriado.

462

Na medida em que o Reino dos Países Baixos contesta a apreciação da Comissão

463

segundo a qual a revenda de produtos não relacionados com café constituía uma base apropriada para a determinação do lucro líquido da SMBV, importa recordar que resulta das Orientações da OCDE, sobre as quais a Comissão baseou a sua análise e, designadamente, dos pontos 1.42, 3.2 e 3.26, na sua versão de 1995, que correspondem, em substância, aos pontos 2.57, 2.58 e 3.9, na sua versão de 2010, que o MMLT consiste em determinar, a partir de uma base adequada, o lucro líquido realizado por um contribuinte no âmbito de uma transação controlada ou de transações controladas que são estreitamente ligadas ou contínuas. Decorre daí que o MMLT serve para determinar o nível de preço de transferência para um tipo de transação ou para transações estreitamente ligadas ou contínuas com base numa análise das funções principais relacionadas com essa transação ou essas transações. Todavia, o MMLT não tem por objetivo determinar o nível do lucro da atividade global de uma empresa, que consiste em vários tipos de transações, com base na identificação de uma única função principal, ignorando as outras funções desempenhadas por essa empresa. Tal procedimento não seria conforme com o ponto 3.4 das Orientações da OCDE, na sua versão de 1995, que corresponde ao ponto 2.7 das Orientações da OCDE, na sua versão de 2010, que prevê o seguinte:

«Os métodos transacionais de lucros não devem, em caso algum, ser utilizados de modo a resultarem numa sobretributação das empresas porque estas simplesmente realizam lucros inferiores à média ou, pelo contrário, numa subtributação das empresas que realizam lucros superiores à média. No âmbito do princípio da plena concorrência, não há razão para impor uma carga fiscal adicional a empresas que sejam menos eficientes do que a média ou, pelo contrário, para subtributar as empresas que sejam mais eficientes do que a média, quando os motivos do seu sucesso ou insucesso são imputáveis a fatores comerciais.»

464

Neste contexto, por um lado, há que salientar que, na decisão impugnada, a Comissão sustentou que as funções da SMBV ligadas à revenda de produtos relacionados com café e as ligadas à torrefação não tinham uma importância negligenciável. Por conseguinte, estas duas funções, e não uma ou outra, deviam ser tidas em consideração para efeitos de determinação da remuneração da SMBV.

465

Por outro lado, em todo o caso, a Comissão não demonstrou na decisão impugnada que, nas circunstâncias do caso em apreço, todas as transações intragrupo da SMBV que eram pertinentes para a determinação do seu lucro tributável fossem estreitamente ligadas ou contínuas, de modo que apenas pudesse ser determinado um único nível de preço para a sua remuneração.

466

Esta constatação basta para rejeitar a posição da Comissão segundo a qual as vendas de produtos não relacionados com café eram um indicador do nível de lucro que podia ser utilizado para a globalidade da atividade da SMBV.

467

Em segundo lugar, de qualquer modo, os argumentos da Comissão destinados a excluir, no caso vertente, a utilização dos custos de exploração como indicador do nível de lucro não são convincentes.

468

Por um lado, há que referir que a análise da Comissão, efetuada nos considerandos 388 e 389 da decisão impugnada, se baseia em dados posteriores à conclusão do APPT. Ora, conforme referido no n.o 251, supra, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão não podia basear a sua análise em informações que não eram disponíveis ou razoavelmente previsíveis no momento da conclusão do APPT, ou seja, em abril de 2008. No caso vertente, a Comissão não demonstrou que os dados relativos às vendas da SMBV e aos seus custos referentes ao período compreendido entre 2008 e 2014 eram razoavelmente previsíveis, de modo que a Comissão não podia basear a sua análise nestes dados.

469

Por outro lado, mesmo supondo que os dados relativos à atividade da SMBV entre 2008 e 2014 pudessem ser utilizados pela Comissão, há que referir que a afirmação segundo a qual as vendas efetuadas pela SMBV tinham triplicado ao passo que os custos de exploração apenas progrediram 6 % nesse mesmo período não basta para pôr em causa a escolha dos custos de exploração como indicador do nível de lucro.

470

Com efeito, há que recordar que, conforme referido no n.o 458, supra, a argumentação da Comissão assenta na premissa de que a função principal da SMBV é a revenda de produtos não relacionados com café. Ora, por um lado, os valores invocados pela Comissão dizem respeito, como ela própria indica, às vendas totais e à «margem bruta» da SMBV, o que inclui necessariamente as vendas de café e de produtos relacionados com café. Além disso, no que respeita à «margem bruta», esta corresponde ao lucro bruto, isto é, à diferença entre o volume de negócios das vendas e os custos das mercadorias vendidas, dividido pelas vendas (v. nota 70 da decisão impugnada) e não constitui, portanto, um índice indicativo da rendibilidade das vendas antes da dedução dos custos fixos. Ora, a Comissão não explica de que forma esses valores seriam utilizáveis ou pertinentes no caso em apreço. Além disso, a Comissão não apresenta nenhum elemento de prova que sustente esses dados numéricos, nem qualquer indicação quanto à sua fonte.

471

Em terceiro lugar, o indicador do nível de lucro proposto pela Comissão, a saber, as vendas totais, também não se afigura apropriado para efeitos de determinação da remuneração da SMBV.

472

Com efeito, conforme exposto no n.o 458, supra, a Comissão baseou a sua argumentação na premissa de que [confidencial] % dos rendimentos da SMBV seriam derivados da função de revenda dos produtos não relacionados com café. A Comissão deduziu daí que essa função era a função principal da SMBV.

473

Todavia, importa salientar que esse dado numérico, sobre o qual a Comissão baseou o seu raciocínio, diz respeito aos rendimentos e não aos lucros da SMBV. Ora, é forçoso constatar que uma elevada proporção de rendimentos não se traduz necessariamente numa elevada proporção de lucros, pelo que essa simples constatação não basta para provar que a função principal da SMVB é a revenda dos produtos não relacionados com café.

474

Além disso, o valor probatório desse dado numérico é tanto mais discutível que, conforme referido nos n.os 275 a 277, supra, a Comissão deveria ter tido em consideração o facto de uma parte dos rendimentos e dos lucros ser retirada da venda de café torrado por terceiros.

475

À luz das constatações feitas nos n.os 458 a 473, supra, há que declarar que a Comissão não provou de forma juridicamente bastante que a escolha dos custos de exploração como indicador do nível de lucro não permitia chegar a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado.

476

Uma vez que a Comissão não provou que a escolha do indicador do nível de lucro estava errada, não podia considerar, no considerando 389 da decisão impugnada, que uma parte do lucro da SMBV, relativo à sua atividade de revenda, era indevidamente transferida para a Alki através dos royalties. Com efeito, a Comissão não demonstrou que o lucro da SMBV deveria ter sido superior ao nível de lucro determinado em aplicação do APPT.

b)   Quanto à análise de comparabilidade da Comissão

477

Conforme indicado no n.o 455, supra, há que referir que a Comissão efetuou, nos considerandos 392 a 399 da decisão impugnada, a sua própria análise de comparabilidade, partindo da premissa de que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café.

478

Com efeito, a Comissão procurou determinar o intervalo de plena concorrência para a SMBV, comparando‑a a empresas cuja função principal é a venda grossista de produtos derivados do café e retendo como indicador do nível de lucro as vendas.

479

Para tal, a Comissão reproduziu a análise do consultor fiscal com um grupo de empresas comparáveis corrigido, ao qual se referiu como «grupo de pares corrigido», identificado com base nas funções de revenda da SMBV, e, em seguida, calculou, a partir do grupo de pares corrigido, o intervalo de rendimento das vendas que correspondia, à luz da sua análise, a um resultado de plena concorrência. O intervalo interquartílico obtido pelo retorno das vendas correspondia a um intervalo compreendido entre 1,5 e 5,5 %. A Comissão aplicou‑o então aos resultados da SMBV obtidos entre 2007 e 2014. A Comissão referiu que, para cada ano abrangido pelo APPT, a matéria coletável da SMBV calculada com base no APPT era inferior ao quartil inferior da matéria coletável da SMBV, tal como resultou da aplicação do método por ela adotado.

480

A abordagem da Comissão que consiste, por um lado, em efetuar a sua própria análise e, por outro, em comparar a situação da SMBV ao abrigo do APPT com os resultados da sua análise é suscetível de satisfazer as exigências que pesam sobre a Comissão relativamente à demonstração da existência de uma vantagem. Com efeito, os resultados da análise da Comissão demonstram que o lucro tributável da SMBV resultante da aplicação do APPT, para os anos de 2007 a 2014, é inferior ao lucro tributável da SMBV calculado, para os anos de 2007 a 2014, em aplicação do intervalo de plena concorrência obtido pela Comissão, a partir do grupo de pares corrigido.

481

No entanto, em primeiro lugar, há que referir que, conforme alegam o Reino dos Países Baixos e a Starbucks, a análise de comparabilidade da Comissão carece de fiabilidade.

482

Antes de mais, importa salientar que, no considerando 400 da decisão impugnada, a Comissão precisou que a análise que efetuou «não consist[ia] em calcular uma remuneração em condições de plena concorrência para as funções desempenhadas pela SMBV dentro do grupo Starbucks». Assim, a Comissão «reconhece[u] que o intervalo apresentado acima não [era] apoiado por uma análise de comparabilidade suficiente». Ora, tal precisão, formulada pela própria Comissão, enfraquece o caráter probatório da sua análise para demonstrar que os erros identificados, referentes às funções da SMBV e à escolha do indicador do nível de lucro, conduziram à concessão de uma vantagem à SMBV.

483

Em segundo lugar, a impossibilidade, alegada pela Starbucks, de reproduzir a pesquisa do grupo de pares corrigido, feita pela Comissão, e de obter os mesmos resultados que a Comissão é suscetível de confirmar a falta de fiabilidade da análise de comparabilidade da Comissão. Com efeito, quando o consultor fiscal da Starbucks procurou reproduzir a análise de comparabilidade da Comissão utilizando os mesmos critérios que a Comissão, obteve uma lista de 87 empresas. Ora, das doze empresas identificadas pela Comissão para efeitos da sua análise de comparação, apenas três constavam na lista das 87 empresas.

484

É certo que a Comissão tentou reproduzir, na fase da contestação no processo T‑636/16, a pesquisa do grupo de pares corrigido, a fim de demonstrar a fiabilidade da sua análise de comparabilidade. Todavia, e mesmo supondo que a utilização da base de dados «Orbis» em substituição da base de dados «Amadeus» não tenha nenhuma incidência, na medida em que a primeira base de dados engloba os mesmos dados que a segunda, há que referir que cinco das empresas identificadas no considerando 394 da decisão impugnada não apareceram quando a Comissão reproduziu a sua pesquisa de empresas comparáveis. O que, aliás, foi admitido pela Comissão, no ponto 179 da sua contestação no processo T‑636/16.

485

Ora, os argumentos invocados pela Comissão para justificar essa diferença de resultados entre a sua própria análise de comparabilidade e a reprodução desta análise não permitem, portanto, infirmar a constatação da falta de credibilidade e de fiabilidade da sua análise de comparabilidade. Com efeito, a Comissão sustenta que a referida diferença de resultados se explica pelo facto de a classificação dessas cinco empresas na base de dados ter sido alterada posteriormente à sua análise de comparabilidade.

486

Ora, por um lado, resulta da réplica da Starbucks, que não foi contraditada neste ponto pela Comissão na tréplica no processo T‑636/16, que é possível consultar as versões históricas das bases de dados «Orbis» e «Amadeus», pelo que a evolução da situação das empresas não devia ter nenhuma incidência na reprodutibilidade da análise de comparabilidade da Comissão. Por conseguinte, uma vez que essas versões históricas da base de dados «Amadeus» não são atualizadas de forma retroativa, os resultados não podiam ser diferentes dos obtidos na análise da comparabilidade da Comissão.

487

Por outro lado, a Starbucks precisa que a Comissão utilizou, tanto para efeitos da sua própria análise de comparabilidade como para a reprodução da análise de comparabilidade, versões das bases de dados «Amadeus» e «Orbis» que eram datadas, respetivamente, de 2015 e 2017, o que a Comissão não põe em causa. Decorre daí que a análise da Comissão assenta em versões das bases de dados posteriores ao ano de 2008. Ora, na medida em que, como alega a própria Comissão, a classificação das empresas pode variar consoante as versões das bases de dados, os resultados da análise de comparabilidade podiam ser falseados pela utilização de uma versão mais recente. Além disso, conforme resulta dos n.os 243 a 251, supra, apenas as informações disponíveis no dia da adoção da medida controvertida podiam ser tidas em conta pela Comissão.

488

Por conseguinte, a circunstância, por um lado, de a Comissão não ter sido capaz de reproduzir a sua análise de comparabilidade e, por outro, de essas cinco empresas representarem uma parte substancial do grupo de pares corrigido, utilizado para efeitos da análise de comparabilidade, bem como a impossibilidade que daí decorre para o Reino dos Países Baixos e a Starbucks ou para o Tribunal Geral de conhecer o método exato utilizado pela Comissão no seu raciocínio e de reproduzir essa análise a fim de fiscalizar se as empresas comparáveis foram corretamente identificadas, são suscetíveis de pôr em causa a fiabilidade e a credibilidade da referida análise.

489

Em segundo lugar, em todo o caso, há que declarar que, conforme alegam o Reino dos Países Baixos e a Starbucks, a análise da Comissão enferma de vários erros.

490

Em primeiro lugar, há que referir que o grupo de pares corrigido utilizado pela Comissão para efeitos da sua análise de comparabilidade é incoerente à luz das suas conclusões sobre as funções da SMBV e não permite demonstrar que os erros identificados pela Comissão conduziram a uma redução do lucro tributável da SMBV.

491

Com efeito, por um lado, importa constatar que a Comissão considerou, na decisão impugnada, que a função principal da SMBV era a revenda de produtos não relacionados com café. Com efeito, no considerando 382 da decisão impugnada, a Comissão expôs claramente que a função principal da SMBV era a revenda, uma vez que [confidencial] % dos rendimentos da sociedade em 2007 eram derivados dessa atividade. No considerando 384 da referida decisão, a Comissão clarificou a sua posição segundo a qual o essencial das atividades da SMBV tinha por objeto a venda ou revenda de produtos não relacionados com café, tais como copos e guardanapos de papel. Esta constatação é, aliás, corroborada pelos articulados da Comissão, nos quais afirma que a função principal da SMBV é a revenda de produtos não relacionados com café e que esta é a principal razão pela qual criticou o consultor fiscal do grupo Starbucks por ter escolhido os custos de exploração como indicador do nível de lucro.

492

Por outro lado, a Comissão expôs nos considerandos 393 e 394 da decisão impugnada que, uma vez que as funções da SMBV foram incorretamente identificadas no Relatório sobre os preços de transferência, o grupo de pares utilizado para aplicar o MMLT, identificado a partir do código da Nomenclatura Geral das Atividades Económicas nas Comunidades Europeias (NACE) «transformação do chá e do café», era inapropriado. A Comissão reproduziu então a análise efetuada no Relatório sobre os preços de transferência utilizando o grupo de pares corrigido, identificado a partir do código NACE «venda por grosso de café, chá, cacau e especiarias». Em seguida, a Comissão excluiu do grupo de pares corrigido as sociedades que distribuem principalmente produtos que não o chá e o café. Resultou daí um grupo de pares corrigido composto por doze sociedades, exercendo todas uma atividade de torrefação, conforme referiu a Comissão no considerando 394 da decisão impugnada.

493

Ora, é forçoso constatar que as sociedades que compõem o grupo de pares corrigido têm funções diferentes da função principal da SMBV, tal como identificada pela Comissão, a saber, a revenda de produtos não relacionados com café. Isto implica que essas sociedades não estão numa situação comparável à da SMBV. Essas empresas não podem, portanto, ser consideradas pertinentes para calcular o lucro realizado pela SMBV em condições de mercado. Por conseguinte, a análise de comparabilidade alternativa que consiste em reproduzir a análise do consultor fiscal com um grupo de pares corrigido que tem por atividade a venda de café e a torrefação é necessariamente errada.

494

Em segundo lugar, há que referir, conforme alega a Starbucks, que, mesmo supondo que o grupo de pares corrigido pudesse ser utilizado pela Comissão, os resultados da análise de comparabilidade efetuada pela Comissão são necessariamente falseados, uma vez que a Comissão comparou dados não comparáveis, a saber, os lucros de exploração das empresas comparáveis com o lucro tributável da SMBV.

495

A este respeito, por um lado, há que salientar que é pacífico entre as partes que o intervalo interquartílico calculado pela Comissão para o período de 2005 a 2007, que corresponde a um intervalo compreendido entre 1,5 e 5,5 % das vendas, o foi com base nos lucros de exploração das sociedades que compõem o grupo de pares corrigido. Esta afirmação é, aliás, sustentada pelo quadro 12 da decisão impugnada. Por outro lado, é ponto assente que é o lucro tributável da SMBV, determinado ao abrigo do APPT, e não o seu lucro de exploração, que a Comissão comparou com o lucro de exploração das empresas comparáveis do grupo de pares corrigido, o que resulta, aliás, do quadro 13 da decisão impugnada.

496

Ora, a Comissão não contesta que os lucros de exploração não são comparáveis aos lucros antes dos impostos, mas limita‑se a afirmar que reproduziu a análise do consultor fiscal do grupo Starbucks. Ademais, há que referir que os lucros de exploração e os lucros tributáveis são dois conceitos distintos que se traduzem, em princípio, na inscrição de montantes diferentes nas linhas contabilísticas correspondentes, como resulta do considerando 82 da decisão impugnada e do quadro 1 da referida decisão.

497

O facto de a Comissão ter afirmado, no considerando 397 da decisão impugnada, que tinha comparado o lucro tributável da SMBV calculado com base no APPT com o lucro tributável calculado com base no intervalo determinado pela Comissão, não pode pôr em causa a constatação efetuada no n.o 493, supra. Com efeito, uma vez que o intervalo interquartílico foi calculado com base nos lucros de exploração das empresas comparáveis, o resultado obtido para a SMBV, em aplicação desse intervalo, não corresponde ao seu lucro tributável, mas sim ao seu lucro de exploração.

498

Decorre daí que a comparação do lucro tributável da SMBV com o intervalo interquartílico obtido a partir do lucro de exploração das sociedades do grupo de pares corrigido é necessariamente falseada.

499

Além disso, para o ano 2007‑2008, o valor de 1,2 % é bastante próximo do extremo inferior do intervalo calculado pela Comissão. Atendendo às numerosas aproximações na análise da Comissão, esse resultado não demonstra uma situação claramente contrária às condições de mercado. Com efeito, há que referir que, quando fiscaliza se o lucro tributável de uma empresa integrada, em aplicação de uma medida fiscal, corresponde a uma aproximação fiável de um lucro tributável gerado em condições de mercado, a Comissão só pode declarar a existência de uma vantagem, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se a discrepância entre os dois fatores de comparação for além das imprecisões inerentes ao método aplicado para obter a referida aproximação.

500

Além disso, mesmo supondo que o erro que consiste em comparar o lucro tributável da SMBV com o lucro de exploração das empresas comparáveis constasse efetivamente do Relatório sobre os preços de transferência da Starbucks, o que a Starbucks contesta, a existência do referido erro no Relatório sobre os preços de transferência não obsta a que o Tribunal Geral verifique que a decisão impugnada não enferme de erro. Além disso, se a Comissão tivesse considerado problemático o facto de os lucros de exploração serem comparados aos lucros tributáveis, cabia‑lhe examinar essa questão na decisão impugnada.

501

Há, portanto, que considerar, com base nas constatações efetuadas nos n.os 480 a 499, supra, que a análise comparativa realizada pela Comissão nos considerandos 392 a 399 da decisão impugnada, por um lado, carece de fiabilidade e, por outro, enferma de vários erros.

502

Por conseguinte, à luz das considerações expostas nos n.os 457 a 500, supra, há que julgar procedentes as alegações do Reino dos Países Baixos e da Starbucks segundo as quais a Comissão não demonstrou que a validação pelo APPT da identificação das funções da SMBV e da escolha do indicador do nível de lucro, propostas no Relatório sobre os preços de transferência, tenha conferido uma vantagem à SMBV. Deste modo, deixa de ser necessário apreciar se a Comissão considerou corretamente que a identificação das funções da SMBV e a escolha do indicador do nível de lucro acolhidos no APPT eram erradas. Consequentemente, é também desnecessário apreciar o argumento da Starbucks que contesta a admissibilidade de certos argumentos apresentados pela Comissão.

3.   Quanto à escolha dos ajustamentos (sexta linha de raciocínio)

503

No âmbito da quarta parte do quarto fundamento no processo T‑760/15 e da terceira alegação da terceira parte do segundo fundamento no processo T‑636/16, o Reino dos Países Baixos e a Starbucks alegam, em substância, que a Comissão não demonstrou que os ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência a fim de aumentar a comparabilidade entre a SMBV e as empresas comparáveis tenham sido suscetíveis de conferir uma vantagem à SMBV.

504

O Reino dos Países Baixos alega que a Comissão considerou erradamente que dois dos ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência a fim de aumentar a comparabilidade entre a SMBV e as vinte empresas independentes comparáveis não permitiam chegar a uma aproximação de resultados de plena concorrência. Por um lado, a exclusão, da base de custos pertinentes, dos custos dos produtos relacionados e não relacionados com café é, designadamente, justificada pelo facto de a SMBV atuar como prestador de serviços, não exercer nenhuma função de compra e não suportar os riscos ligados às existências, contrariamente às empresas comparáveis. Por outro lado, o ajustamento da margem de lucro justifica‑se pelo facto de a margem de lucro antes da correção dizer respeito aos lucros de exploração, ao passo que o APPT tem por objeto determinar os lucros tributáveis. Esse ajustamento teve por efeito aumentar a margem de lucro.

505

Por um lado, a Starbucks acrescenta que, na decisão impugnada, a Comissão não pôs em causa os ajustamentos aplicados à base de custos, escolhida como indicador do nível de lucro. Deste modo, o argumento da Comissão, desenvolvido no n.o 183 da contestação no processo T‑636/16, segundo o qual o ajustamento da base de custos é inapropriado devido à inexistência de transferência de riscos da SMBV para a Alki, é inadmissível por não constar da decisão impugnada. Por outro lado, a Starbucks considera que os dados numéricos, apresentados pela Comissão nos n.os 184 e 185 da contestação no processo T‑636/16, destinados a demonstrar que o rendimento tributável da SMBV teria sido mais elevado se tivesse sido aplicada uma margem de lucro sobre os custos totais, também são inadmissíveis por não constarem da decisão impugnada.

506

No que respeita aos ajustamentos em causa, a Starbucks invoca a falta de fundamentação. A Comissão limitou‑se a afirmar que os ajustamentos não eram adaptados, sem demonstrar em quê o lucro tributável da SMBV teria sido mais elevado com ajustamentos apropriados.

507

A Comissão contesta esses argumentos. A Comissão sustenta que os dois ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência não são adequados e resultam numa diminuição do lucro tributável da SMBV. A Comissão alega que o Reino dos Países Baixos e a Starbucks não demonstraram que tinha cometido um erro de apreciação.

508

Em primeiro lugar, no que respeita aos ajustamentos aplicados à base de custos, a Comissão sustenta que contestou efetivamente esse ponto, nos considerandos 319 a 332 da decisão impugnada, ao afirmar que a Alki não pode suportar nenhum risco empresarial da SMBV. A Comissão remete também para os considerandos 59 e 159 da decisão impugnada, nos quais é exposto que o ajustamento da base de custos se justifica, segundo o Relatório sobre os preços de transferência, devido à qualidade de fabricante por encomenda, que não assume nenhum risco, da SMBV. Além disso, a Comissão contesta os argumentos do Reino dos Países Baixos e da Starbucks segundo os quais o lucro da SMBV podia ser calculado com base nos custos de exploração e não nos custos totais.

509

Em segundo lugar, a Comissão assinala que, embora a margem de lucro corrigida tivesse resultado numa percentagem mais elevada, essa percentagem foi aplicada a uma base de custos nitidamente inferior. A Comissão acrescenta que, uma vez que o custo dos grãos de café verde, as remunerações pagas a terceiros e os produtos não relacionados com café deveriam ter sido incluídos na base de custos, o «ajustamento do capital de exploração» não tinha de ser aplicado. Mesmo supondo que o consultor fiscal do grupo Starbucks que preparou o Relatório sobre os preços de transferência não tenha cometido nenhum erro ao excluir esses diferentes custos da base de custos, o «ajustamento do capital de exploração» também não era adaptado. Além disso, a Comissão alega que explicou suficientemente, nos considerandos 402 a 406 da decisão impugnada, de que forma o «ajustamento do capital de exploração», conjugado com o ajustamento da base de custos, reduziu o imposto sobre as sociedades de que é normalmente devedora a SMBV.

a)   Observações preliminares

510

Antes de mais, há que referir que, nos considerandos 407 e 408 da decisão impugnada, a Comissão considerou que, mesmo supondo que as funções da SMBV e o indicador do nível de lucro tivessem sido corretamente identificados, dois ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência tiveram como consequência que o método proposto nesse relatório não permitiu chegar a um resultado de plena concorrência.

511

Com base na constatação de que os dois ajustamentos eram errados, a Comissão concluiu que, ao aceitar esse método que conduzia a uma redução do imposto devido pela SMBV ao abrigo do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades em comparação com empresas autónomas cujo lucro era determinado em condições de mercado ao abrigo desse regime, o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

512

Assim, há que salientar que resulta dos considerandos 407 e 408 da decisão impugnada que a abordagem da Comissão, que consiste em comparar o lucro tributável da SMBV em aplicação do APPT com o de uma empresa autónoma, cujo lucro é determinado em condições de mercado ao abrigo do regime geral neerlandês do imposto sobre as sociedades, parece, à primeira vista, satisfazer as exigências que impendem sobre a Comissão relativamente à prova da existência de uma vantagem.

513

Todavia, há que recordar que decorre das considerações expostas nos n.os 151 e 152, supra, que, para determinar se o APPT conferiu uma vantagem à SMBV no caso em apreço, cabe à Comissão demonstrar que o método de determinação dos preços de transferência aprovado no APPT conduziu a uma diminuição da carga fiscal da SMBV e, mais especificamente, demonstrar que o nível de lucro da SMBV, calculado em aplicação do método de determinação dos preços de transferência, é diminuído em proporções tais que este não pode ser considerado uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado. Com efeito, conforme referido no n.o 498, supra, quando fiscaliza se o lucro tributável de uma empresa integrada, em aplicação de uma medida fiscal, corresponde a uma aproximação fiável de um lucro tributável gerado em condições de mercado, a Comissão só pode declarar a existência de uma vantagem, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se a discrepância entre os dois fatores de comparação for além das imprecisões inerentes ao método aplicado para obter a referida aproximação.

514

Portanto, há que apreciar se a Comissão demonstrou suficientemente que os dois ajustamentos efetuados pelo consultor fiscal do grupo Starbucks tinham conferido uma vantagem à SMBV.

b)   Quanto ao ajustamento que incide sobre a base de custos

515

O primeiro ajustamento proposto no Relatório sobre os preços de transferência incide sobre a base de custos (a seguir «ajustamento da base de custos»). Este ajustamento consiste na exclusão de determinados custos da base de custos utilizada como indicador do nível de lucro para efeitos de aplicação do MMLT. Todavia, há que referir que resulta dos considerandos 406 e 407 da decisão impugnada que as críticas identificadas pela Comissão são explicitamente limitadas à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada da base de custos retida para a aplicação do MMLT. Em substância, a Comissão declarou que não havia nenhuma explicação para que os custos da empresa transformadora 1 não filiada fossem excluídos, quando tinham sido tidos em conta no APPT precedente.

516

Em primeiro lugar, há que recordar que, contrariamente ao que a Comissão sustenta, a conclusão feita no considerando 407 da decisão impugnada, segundo a qual os ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência e validados no APPT conferem uma vantagem à SMBV, é explicitamente limitada à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada da base de custos da SMBV. Com efeito, não resulta do texto da decisão impugnada que a Comissão tenha declarado a existência da vantagem com fundamento na exclusão de outros custos da base de custos utilizada como indicador do nível de lucro da SMBV.

517

A circunstância, invocada pela Comissão, de esta última ter posto em causa, no âmbito dos considerandos 319 a 332 da decisão impugnada, o facto de os riscos empresariais da SMBV terem sido transferidos para a Alki não permite concluir que tivesse considerado, por esses motivos, que determinados custos tinham sido erradamente excluídos da base de custos utilizada como indicador do nível de lucro. Esta constatação é reforçada pela circunstância de a questão dos ajustamentos ser apresentada pela própria Comissão como sendo uma linha de raciocínio subsidiária (v. considerando 407 da decisão impugnada) à linha de raciocínio examinada no âmbito dos considerandos 319 a 332 da decisão impugnada.

518

Além disso, contrariamente ao que sustenta, em substância, a Comissão, não resulta dos considerandos 59 e 159 da decisão impugnada que tivesse fundamentado a sua conclusão de que o APPT tinha conferido uma vantagem à SMBV com base nos ajustamentos da base de custos. Relativamente ao considerando 59 da decisão impugnada, há que referir que, embora faça efetivamente referência aos referidos ajustamentos, trata‑se apenas de uma apresentação do teor do Relatório sobre os preços de transferência. No que respeita ao considerando 159 da decisão impugnada, este — que faz parte da secção de apresentação do procedimento administrativo — limita‑se a indicar que a Comissão expressou dúvidas sobre os ajustamentos propostos no Relatório sobre os preços de transferência, sem que fosse possível deduzir daí a posição da Comissão no âmbito da decisão impugnada.

519

Com base nas constatações feitas nos n.os 515 a 517, supra, há que declarar, portanto, que a Comissão não afirmou, nem a fortiori demonstrou, na decisão impugnada, que o ajustamento da base de custos, que não a exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada, tenha conferido uma vantagem à SMBV. Por conseguinte, há que rejeitar os argumentos da Comissão, apresentados na fase da contestação, segundo os quais a utilização dos custos de exploração em vez dos custos totais (que incluem o custo dos grãos de café, as remunerações pagas a terceiros e os custos dos produtos não relacionados com café) conduziu a uma diminuição da matéria coletável da SMBV.

520

Em segundo lugar, relativamente à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada, a Comissão entendeu, no considerando 406 da decisão impugnada, que o Relatório sobre os preços de transferência tinha aceitado uma redução considerável da base de custos, ao excluir os referidos custos.

521

Ora, a Comissão limitou‑se a afirmar, no considerando 406 da decisão impugnada, que esses custos tinham sido tomados em conta no anterior modo de determinação da matéria coletável da SMBV, utilizado antes da conclusão do APPT, e que a exclusão desses custos não tinha sido fundamentada, e isto sem qualquer outra precisão. Não resulta claramente do texto da decisão impugnada a que se refere a Comissão quando invoca uma falta de fundamentação da exclusão dos custos e, nomeadamente, se considera que tais explicações deveriam ter constado do APPT ou sido dadas durante o procedimento administrativo.

522

A este respeito, em primeiro lugar, importa referir que declarar que o ajustamento foi insuficientemente fundamentado, quer pelos correspondentes Starbucks quer pelas autoridades neerlandesas, não basta para demonstrar, enquanto tal, que esse ajustamento era errado, nem que conduzia a uma redução da carga fiscal da SMBV.

523

Em segundo lugar, em todo o caso, importa observar que decorre do considerando 407 da decisão impugnada que a apreciação do caráter errado da exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada, efetuada pela Comissão, é uma análise subsidiária, que se inscreve na hipótese de a função principal da SMBV ser efetivamente a torrefação de café.

524

Ora, por um lado, resulta da contestação da Comissão no processo T‑636/16 que a empresa transformadora 1 não filiada fabricava principalmente produtos tais como o café aromatizado, o pó para um produto à base de café beneficiando de uma marca registada ou o café solúvel, e que apenas torrava grãos de café verde em «volumes limitados». Todavia, a Comissão não explicou de que forma os custos da empresa transformadora 1 não filiada eram pertinentes para calcular o lucro tributável da SMBV, enquanto torrefator.

525

Por outro lado, há que referir que os argumentos apresentados pela Comissão nos seus articulados a propósito da exclusão de custos da empresa transformadora 1 não filiada assentam na premissa de que a atividade principal da SMBV é a revenda. Por conseguinte, há que rejeitar esses diferentes argumentos.

526

Em terceiro lugar, resulta do Relatório sobre os preços de transferência que o consultor fiscal excluiu da base de custos, utilizada para efeitos de aplicação do MMLT, os custos relacionados com atividades para as quais a SMBV não traz valor acrescentado. O Reino dos Países Baixos e a Starbucks alegam, aliás, nos seus respetivos articulados, que a exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada se justifica pelo facto de a SMBV não trazer nenhum valor acrescentado. Ambos sustentam que os custos ligados à transação entre a SMBV e a empresa transformadora 1 não filiada apenas transitam pelas contas da SMBV, mas não são imputáveis à atividade da SMBV. A compra dos produtos da empresa transformadora 1 não filiada constitui, portanto, uma transação neutra para a determinação do lucro tributável desta última.

527

A este respeito, há que referir que não é de excluir que os rendimentos provenientes dos produtos fornecidos pela empresa transformadora 1 não filiada sejam equivalentes aos custos desta mesma empresa, de modo que a SMBV não tire nenhum lucro a partir dos produtos da empresa transformadora 1 não filiada. Ora, a Comissão não demonstrou que a SMBV tivesse acrescentado mais‑valia aos produtos da empresa transformadora 1 não filiada e que tivesse efetivamente gerado um lucro a partir da exploração desses produtos, de modo que os custos da empresa transformadora 1 não filiada devessem necessariamente ser tidos em conta para efeitos de aplicação do MMLT.

528

A Comissão também não demonstra que as diferenças invocadas no Relatório sobre os preços de transferência, entre as funções da SMBV e das 20 empresas com base nas quais foi efetuada a análise comparativa, não justificam a aplicação do ajustamento quanto à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada.

529

Uma vez que não apresenta elementos que permitam considerar que a SMBV gerou um lucro a partir da transação com a empresa transformadora 1 não filiada ou que a margem de lucro deveria aplicar‑se a uma base de custos que incluísse os custos da empresa transformadora 1 não filiada, há que declarar que a Comissão não podia concluir que a exclusão dos referidos custos era errada e tinha conduzido a uma diminuição do lucro da SMBV.

530

Em terceiro lugar, há que referir que, conforme sustenta a Starbucks, os dados numéricos constantes do quadro apresentado no n.o 184 da contestação da Comissão no processo T‑636/16, que são cálculos baseados em valores constantes do quadro 3 da decisão impugnada, não podem ser tidos em conta em apoio da posição da Comissão. Por um lado, os referidos dados dizem respeito aos custos totais (despesas de exploração e custos das mercadorias vendidas) da SMBV e não apenas aos custos de exploração aos quais teriam sido adicionados os custos da empresa transformadora 1 não filiada. Por outro lado, esses dados só demonstram que o nível de lucro teria sido mais elevado se a base de custos tivesse sido maior e não permitem sustentar a tese de que a SMBV teria gerado um lucro a partir da exploração dos produtos da empresa transformadora 1 não filiada.

531

Em quarto lugar, há que salientar que a exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada foi conjugada com o ajustamento em alta da margem de rendimento. Por conseguinte, não se pode necessariamente concluir que os ajustamentos aplicados no APPT, considerados no seu conjunto, conduziam forçosamente a uma redução da base tributável da SMBV. Ora, a Comissão não quantificou os custos da empresa transformadora 1 não filiada, ou, pelo menos, a parte que representam entre os custos da SMBV. Por conseguinte, não decorre da decisão impugnada que os custos da empresa transformadora 1 não filiada representam uma parte dos custos da SMBV cuja simples exclusão teria tamanha incidência nos lucros da SMBV que o seu nível deixaria de ser representativo de um lucro resultante de uma situação de plena concorrência.

532

À luz destas observações, há que declarar que a Comissão não logrou provar que a exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada conferiu uma vantagem à SMBV, sem que haja que apreciar se a decisão da Comissão enferma de falta de fundamentação.

c)   Quanto ao «ajustamento do capital de exploração»

1) Quanto ao alcance do ajustamento em causa

533

No que respeita ao alcance do segundo ajustamento em causa, há que referir que, no considerando 407 da decisão impugnada, a Comissão sustentou que a aplicação do «ajustamento do capital de exploração» (working capital adjustment) teve como consequência que o método proposto no Relatório sobre os preços de transferência não permitiu uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, em conformidade com o princípio da plena concorrência. A este respeito, há que assinalar que nem o Relatório sobre os preços de transferência nem o APPT utilizam a expressão «ajustamento do capital de exploração».

534

Antes de mais, na decisão impugnada, a Comissão sustentou que, no Relatório sobre os preços de transferência, o consultor fiscal do grupo Starbucks propunha um ajustamento da margem de conversão, apresentado pelas autoridades neerlandesas como um «ajustamento do capital de exploração» (considerando 401 da decisão impugnada). Decorre desta constatação que a expressão «ajustamento do capital de exploração», tal como utilizada na decisão impugnada, deve ser entendida no sentido utilizado pelas autoridades neerlandesas durante o procedimento administrativo.

535

Em seguida, resulta do considerando 403 da decisão impugnada que a Comissão expressou dúvidas sobre o «ajustamento do capital de exploração» nos considerandos 101 a 113 da decisão de início do procedimento. Por um lado, há que assinalar que, nos considerandos 101 e 102 da decisão de início do procedimento, a Comissão discutiu o «ajustamento relativo aos custos das matérias‑primas» (raw material cost mark‑up), ao passo que o ajustamento relativo à exclusão dos custos do café verde da base de custos era discutido nos considerandos 99 e 100 da decisão de início do procedimento. A decisão impugnada não faz, portanto, referência, no seu considerando 403, a este último ajustamento. Esta constatação é, aliás, confortada pelo considerando 269, alínea iii), e pela nota 130 da decisão impugnada.

536

É certo que os considerandos 103 a 113 da decisão de início do procedimento também dizem respeito, em parte, ao ajustamento relativo à exclusão dos custos do café verde da base de custos. Todavia, de acordo com o considerando 107 da decisão de início do procedimento, os argumentos das autoridades neerlandesas referentes aos «ajustamentos do capital de exploração» estão expostos no considerando 59 da mesma decisão. Ora, segundo o considerando 59 da decisão de início do procedimento, as autoridades neerlandesas declararam que «[o] ajustamento no caso em apreço [era] uma conjugação de dois ajustamentos de comparabilidade; combin[ava] um ajustamento do capital de exploração para o inventário de matérias‑primas nos rendimentos das sociedades comparáveis com um ajustamento para os custos das matérias‑primas na base de custos das sociedades comparáveis». Resulta da descrição dos argumentos do Reino dos Países Baixos durante o procedimento administrativo que, para este, a expressão «ajustamento do capital de exploração» apenas diz respeito ao «ajustamento relativo aos custos das matérias‑primas», identificado no Relatório sobre os preços de transferência.

537

Por último, há que referir que, no considerando 407 da decisão impugnada, a própria Comissão faz uma distinção entre o «ajustamento do capital de exploração» e a exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada da matéria coletável da SMBV.

538

Por conseguinte, há que concluir que a expressão «ajustamento do capital de exploração», utilizada no considerando 407 da decisão impugnada, se refere ao «ajustamento relativo aos custos das matérias‑primas», identificado no Relatório sobre os preços de transferência.

539

Em todo o caso, mesmo supondo que a expressão «ajustamento do capital de exploração», utilizada no considerando 407 da decisão impugnada, devesse também ser entendida no sentido de fazer referência ao ajustamento para os custos das matérias‑primas na base de custos da SMBV, é forçoso constatar que os considerandos 401 a 406 da decisão impugnada não contêm nenhum argumento referente à base de custos além do argumento referente à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada. Ora, já foi referido, nos n.os 514 a 531, supra, que a Comissão não logrou demonstrar que a exclusão desses custos tenha conferido uma vantagem à SMBV. Nos considerandos 404 e 405 da decisão impugnada, a Comissão rejeita simplesmente os argumentos do Reino dos Países Baixos quanto à pertinência de um estudo de comparabilidade com base nos custos totais e de um artigo científico. Além disso, os considerandos 401 a 403 da decisão impugnada não contêm nenhuma referência à base de custos da SMBV.

2) Quanto à alegação relativa à inexistência de uma redução na carga fiscal da SMBV

540

Em primeiro lugar, há que salientar que, uma vez que, por um lado, o «ajustamento do capital de exploração» corresponde ao ajustamento para os custos das matérias‑primas na base de custos, identificado no Relatório sobre os preços de transferência (v. n.o 537, supra) e, por outro, o argumento referente à exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada foi rejeitado (v. n.os 514 a 531, supra), este ajustamento traduziu‑se num aumento da margem de lucro da base de custos de [confidencial] % a [confidencial] %. Ora, a utilização de uma margem de lucro mais elevada para efeitos de determinação do lucro tributável da SMBV não pôde conduzir a uma diminuição do lucro tributável da SMBV. Este único ajustamento, considerado isoladamente, não é, portanto, suscetível de conferir uma vantagem à SMBV.

541

Decorre daí que a Comissão não logrou provar que o «ajustamento do capital de exploração» tivesse por efeito baixar o nível dos lucros da SMBV, nem, por conseguinte, que este ajustamento lhe tivesse conferido uma vantagem.

542

Em segundo lugar, há que referir que o raciocínio da Comissão relativo ao «ajustamento do capital de exploração», exposto nos considerandos 401 a 405 da decisão impugnada, não é suscetível de demonstrar que o «ajustamento do capital de exploração» tivesse por efeito baixar o nível dos lucros da SMBV e que, por conseguinte, lhe tivesse conferido uma vantagem.

543

Antes de mais, na medida em que a Comissão baseou o seu raciocínio na constatação de que o método utilizado para a determinação do «ajustamento do capital de exploração» não tinha em conta o nível do capital de exploração das empresas comparáveis, nem o da SMBV, basta referir que a Comissão não explica de que forma esse facto seria suscetível de demonstrar uma redução do nível dos lucros da SMBV.

544

Em seguida, embora a Comissão tenha considerado que não existia nenhuma relação constante entre os custos das vendas utilizados no ajustamento e as necessidades de capital de exploração, há que referir que a Comissão não explicou de que forma esse facto seria suscetível de demonstrar concretamente uma diminuição do nível dos lucros da SMBV.

545

Além disso, com as suas afirmações de que o «ajustamento do capital de exploração», efetuado pelo consultor fiscal do grupo Starbucks, não se adapta ao objetivo avançado de ajustamento das diferenças na utilização do capital de exploração, a Comissão limita‑se a considerações gerais e aproximativas, tais como as que afirmam que esse ajustamento «não se adapta» ou ainda que «uma empresa com um montante elevado de custos de matérias‑primas pode ter necessidades de capital de exploração baixas se processar as suas existências de forma eficiente».

546

Por último, relativamente à constatação, feita nos considerandos 402 a 405 da decisão impugnada, segundo a qual nenhum dos factos apresentados no Relatório sobre os preços de transferência e nenhum dos argumentos suscitados pelo Reino dos Países Baixos no âmbito do procedimento administrativo forneceram qualquer justificação para o «ajustamento do capital de exploração», há que referir que a simples constatação da falta de tal justificação também não demonstra que o «ajustamento do capital de exploração» tenha conduzido a uma diminuição do lucro tributável da SMBV.

547

Daqui resulta que, contrariamente ao que a Comissão concluiu no considerando 407 da decisão impugnada, esta não provou que o «ajustamento do capital de exploração» tivesse conduzido a uma diminuição do lucro tributável da SMBV.

548

Esta conclusão não é suscetível de ser posta em causa pelos argumentos da Comissão. Com efeito, importa referir que resulta do considerando 407 da decisão impugnada que o exame do «ajustamento do capital de exploração», efetuado pela Comissão, é uma análise subsidiária que se inscreve na hipótese de a função principal da SMBV ser efetivamente a torrefação de café. Ora, os argumentos apresentados pela Comissão, nos seus articulados, a propósito do «ajustamento do capital de exploração», assentam na premissa de que a atividade principal da SMBV é a revenda. Por conseguinte, há que rejeitar esses diferentes argumentos.

549

À luz das considerações expostas nos n.os 502 a 547, supra, há que julgar procedentes as alegações do Reino dos Países Baixos e da Starbucks, segundo as quais a Comissão não demonstrou que a validação pelo APPT dos ajustamentos do capital de exploração e da exclusão dos custos da empresa transformadora 1 não filiada tenha conferido uma vantagem à SMBV.

550

Por conseguinte, há que julgar procedente o fundamento relativo ao facto de, no âmbito da sua quarta a sexta linhas de raciocínio, a Comissão não ter demonstrado que o APPT tivesse conferido uma vantagem à SMBV, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

F. Quanto à questão de saber se o APPT derrogava o artigo 8.o‑B da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência (raciocínio à luz do sistema de referência restrito, considerandos 409 a 412 da decisão impugnada)

551

O Reino dos Países Baixos alega que os seus fundamentos relativos à inexistência de uma vantagem são invocados, no caso em apreço, tanto contra a posição principal da Comissão, isto é, as seis primeiras linhas de raciocínio, como contra o seu raciocínio à luz do sistema de referência restrito, no qual a Comissão concluiu pela existência de uma vantagem, no caso vertente, atendendo ao artigo 8.o‑B da LIS e ao Decreto sobre os Preços de Transferência. A Starbucks sustenta, por sua vez, que a Comissão deveria ter examinado o APPT à luz do artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e do Decreto sobre os Preços de Transferência, o que não fez.

552

A Comissão sustenta que examinou, nos considerandos 409 a 412 da decisão impugnada, o APPT à luz do artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e que declarou, na sequência dessa análise, que o APPT conferia uma vantagem seletiva à SMBV.

553

A este respeito, há que referir que, a título infinitamente secundário, na secção 9.2.4 da decisão impugnada, intitulada: «Linha de raciocínio secundária: Vantagem seletiva devido a uma derrogação do decreto» (considerandos 409 a 412 da decisão impugnada), a Comissão considerou que o APPT conferia uma vantagem à SMBV ao abrigo do quadro de referência mais limitado do artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e do Decreto sobre os Preços de Transferência (considerando 412 da decisão impugnada).

554

Com efeito, no considerando 410 da decisão impugnada, a Comissão expôs que, «numa linha de raciocínio secundária, […] o APPT SMBV também conced[ia] uma vantagem seletiva à SMBV no contexto do sistema de referência mais restrito constituído por empresas inseridas num grupo que aplicam a fixação dos preços de transferência a que [eram] aplicáveis o artigo 8.o‑B, n.o 1, [da Lei do] IRC e o decreto». No considerando 411 da decisão impugnada, a Comissão recordou que o artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência são tidos em consideração para determinar «o “princípio da plena concorrência” ao abrigo do direito fiscal neerlandês, de acordo com o qual as transações intragrupo entre empresas devem ser remuneradas como se fossem acordadas por empresas independentes». Nesse mesmo considerando, a Comissão salientou que o preâmbulo do Decreto sobre os Preços de Transferência precisava que as Orientações da OCDE se aplicavam diretamente aos Países Baixos. No considerando 412 da decisão impugnada, a Comissão remeteu para o raciocínio exposto nos considerandos 268 a 274 da decisão impugnada, que resumem a primeira a sexta linhas de raciocínio, para concluir que o APPT conferia também uma vantagem seletiva ao abrigo do quadro de referência mais limitado composto pelo artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e pelo Decreto sobre os Preços de Transferência.

555

Resulta dessas constatações que a Comissão concluiu que o APPT em causa conferia uma vantagem seletiva à SMBV, dado que conduzia a uma diminuição do imposto exigível em comparação com a situação em que o princípio da plena concorrência, enunciado no artigo 8.o‑B da Lei do IRS e no Decreto sobre os Preços de Transferência, tivesse sido corretamente aplicado.

556

Ora, é forçoso constatar que a Comissão baseou essa conclusão no exame do APPT que efetuou no âmbito da sua análise realizada a título principal. A Comissão afirmou, assim, que já tinha demonstrado, no âmbito da secção 9.2.3.1 da decisão impugnada, que o APPT não permitia chegar a uma aproximação fiável de resultados de plena concorrência.

557

É certo que o raciocínio exposto nos considerandos 409 a 412 da decisão impugnada diz respeito, antes de mais, a um argumento do Reino dos Países Baixos e da Starbucks quanto à escolha do sistema de referência, que faz parte da análise da seletividade da medida em causa.

558

Todavia, há que observar que o Reino dos Países Baixos e a Comissão consideram que o considerando 412 da decisão impugnada deve ser interpretado no sentido de que esta última concluiu, com base numa análise à luz do direito nacional pertinente, a saber, o artigo 8.o‑B, n.o 1, da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência, que o APPT conferia uma vantagem à SMBV, aplicando‑se, mutatis mutandis, a análise efetuada pela Comissão na primeira a sexta linhas de raciocínio. Esta constatação é, aliás, confortada pela redação do considerando 416 da decisão impugnada.

559

Sem que seja necessário, no caso em apreço, tomar posição sobre a natureza e o alcance exatos do raciocínio à luz do sistema de referência restrito da Comissão, exposto nos considerandos 409 a 412 da decisão impugnada, basta declarar que, mesmo supondo que, através dele, a Comissão tenha examinado os erros por ela identificados no âmbito da primeira a sexta linhas de raciocínio ao abrigo do artigo 8.o‑B da Lei do IRS e do Decreto sobre os Preços de Transferência, que são tidos em consideração para determinar o princípio da plena concorrência no direito neerlandês, a Comissão não demonstrou, pelas mesmas razões que as expostas nos n.os 173 a 549, supra, que se aplicam mutatis mutandis a esse exame, que o APPT tivesse conferido uma vantagem à SMBV, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

G. Conclusão

560

Por um lado, decorre dos n.os 404 e 549, supra, que as seis linhas de raciocínio da decisão impugnada não bastavam para demonstrar que o APPT tinha conferido uma vantagem à SMBV, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

561

Por outro lado, resulta dos n.os 550 a 558, supra, que a Comissão não provou que o APPT derrogava o artigo 8.o‑B da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência e que tinha, assim, conferido uma vantagem à SMBV, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

562

Decorre, portanto, de tudo o que precede que nenhuma das linhas de raciocínio expostas na decisão impugnada permitiu à Comissão lograr provar de forma juridicamente bastante a existência de uma vantagem na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, há que anular a decisão impugnada na íntegra, sem que seja necessário apreciar os outros fundamentos invocados pelo Reino dos Países Baixos e pela Starbucks.

IV. Quanto às despesas

563

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas do Reino dos Países Baixos e da Starbucks, em conformidade com os pedidos destes.

564

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a Irlanda suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada)

decide:

 

1)

Os processos T‑760/15 e T‑636/16 são apensados para efeitos do presente acórdão.

 

2)

A Decisão (UE) 2017/502 da Comissão, de 21 de outubro de 2015, relativa ao auxílio estatal SA.38374 (2014/C ex 2014/NN) concedido pelos Países Baixos à Starbucks é anulada.

 

3)

A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas do Reino dos Países Baixos, da Starbucks Corp. e da Starbucks Manufacturing Emea BV.

 

4)

A Irlanda suportará as suas próprias despesas.

 

Van der Woude

Tomljenović

Bieliūnas

Marcoulli

Kornezov

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 24 de setembro de 2019.

Assinaturas

Índice

 

I. Antecedentes do litígio e quadro jurídico

 

A. Sobre o quadro jurídico nacional

 

B. Quanto ao acordo prévio em matéria de preços

 

C. Antecedentes do litígio

 

1. Quanto ao procedimento administrativo na Comissão

 

2. Quanto à decisão impugnada

 

a) Quanto à descrição da medida contestada

 

b) Quanto à apreciação da medida contestada

 

c) Quanto à recuperação do auxílio de Estado

 

d) Conclusão

 

II. Tramitação processual e pedidos das partes

 

A. Quanto à fase escrita do processo T‑760/15

 

1. Quanto à composição da formação de julgamento e ao tratamento prioritário

 

2. Quanto às intervenções

 

3. Quanto aos pedidos de tratamento confidencial

 

4. Quanto aos pedidos das partes

 

B. Quanto à fase escrita do processo T‑636/16

 

1. Quanto à composição da formação de julgamento e ao tratamento prioritário

 

2. Quanto aos pedidos de tratamento confidencial

 

3. Quanto aos pedidos das partes

 

C. Quanto à apensação para efeitos da fase oral e à fase oral do processo

 

III. Questão de direito

 

A. Questões processuais

 

1. Quanto à apensação dos presentes processos para efeitos da decisão que põe termo à instância

 

2. Quanto ao pedido de desentranhamento dos autos das observações da Starbucks sobre o relatório para audiência

 

3. Quanto à admissibilidade do anexo A.7 da petição no processo T‑760/15

 

B. Quanto aos fundamentos invocados e à estrutura do exame dos presentes recursos

 

C. Quanto à existência de um princípio da plena concorrência no domínio da fiscalização dos auxílios de Estado e quanto ao respeito do princípio da autonomia fiscal dos Estados‑Membros

 

D. Quanto à contestação do raciocínio principal relativo à existência de uma vantagem fiscal a favor da SMBV (considerandos 275 a 361 da decisão impugnada)

 

1. Quanto à escolha do MMLT no caso vertente e ao facto de não ter sido examinada a transação intragrupo para a qual o APPT foi efetivamente pedido (primeira linha de raciocínio)

 

a) Observações preliminares

 

b) Quanto ao ónus da prova

 

c) Quanto ao nível de fiscalização a efetuar pelo Tribunal Geral

 

d) Quanto à falta de identificação e de análise dos royalties pagos pela SMBV à Alki no APPT

 

e) Quanto ao imperativo de privilegiar o método CUP em detrimento do MMLT

 

2. Quanto à questão de saber se os royalties pagos pela SMBV à Alki deveria ser igual a zero (segunda linha de raciocínio)

 

a) Observações preliminares

 

b) Quanto às funções da SMBV relacionadas com os royalties

 

c) Quanto às regras normais de tributação em direito neerlandês

 

d) Quanto à utilização de elementos invocados pela Comissão que eram indisponíveis no momento da conclusão do APPT

 

e) Quanto à questão de saber se a propriedade intelectual em matéria de torrefação representava um valor para a SMBV

 

1) Quanto à questão de saber se a SMBV explorava a propriedade intelectual em matéria de torrefação diretamente no mercado.

 

2) Quanto à questão de saber se a SMBV registou perdas nas suas atividades de torrefação

 

f) Quanto à comparação com contratos de torrefação de café celebrados pela Starbucks com terceiros e em relação a acordos de licenças semelhantes «no mercado»

 

1) Quanto aos contratos celebrados posteriormente ao APPT

 

2) Quanto aos contratos celebrados com empresas que não torram café

 

3) Quanto aos contratos com empresas que não procederam à venda de café torrado a lojas ou consumidores

 

4) Quanto aos contratos referentes a produtos diferentes do café torrado

 

5) Quanto ao contrato que prevê o pagamento de royalties pela utilização da propriedade intelectual em matéria de torrefação

 

6) Quanto ao contrato celebrado com a empresa transformadora 2 não filiada

 

g) Quanto aos acordos celebrados entre os concorrentes da Starbucks e torrefatores terceiros

 

h) Quanto ao argumento segundo o qual o nível dos royalties deveria ter sido menos elevado do que o nível aprovado pelo APPT

 

3. Quanto à determinação anual dos custos dos grãos de café verde (terceira linha de raciocínio)

 

a) Quanto à questão de saber se o preço dos grãos de café verde estava fora do alcance da medida controvertida

 

b) Quanto à questão de saber se o nível da margem de lucro aplicada aos custos dos grãos de café verde vendidos pela SCTC à SMBV não era conforme com um nível de plena concorrência

 

E. Quanto à contestação do raciocínio subsidiário relativo à existência de uma vantagem fiscal a favor da SMBV (considerandos 362 a 408 da decisão impugnada)

 

1. Quanto à identificação da SMBV como entidade mais complexa (quarta linha de raciocínio)

 

2. Quanto à análise das funções da SMBV e à determinação do lucro da SMBV com base nos custos de exploração (quinta linha de raciocínio)

 

a) Quanto à escolha do indicador do nível de lucro

 

b) Quanto à análise de comparabilidade da Comissão

 

3. Quanto à escolha dos ajustamentos (sexta linha de raciocínio)

 

a) Observações preliminares

 

b) Quanto ao ajustamento que incide sobre a base de custos

 

c) Quanto ao «ajustamento do capital de exploração»

 

1) Quanto ao alcance do ajustamento em causa

 

2) Quanto à alegação relativa à inexistência de uma redução na carga fiscal da SMBV

 

F. Quanto à questão de saber se o APPT derrogava o artigo 8.o‑B da LIS e o Decreto sobre os Preços de Transferência (raciocínio à luz do sistema de referência restrito, considerandos 409 a 412 da decisão impugnada)

 

G. Conclusão

 

IV. Quanto às despesas


( *1 ) Línguas de processo: neerlandês e inglês.

( 1 ) Dados confidenciais ocultados.

Top