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Document 62009CJ0272

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 8 de Dezembro de 2011.
KME Germany AG, KME France SAS e KME Italy SpA contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral - Concorrência - Acordos, decisões e práticas concertadas - Mercado dos tubos sanitários de cobre - Coimas - Dimensão do mercado, duração da infracção e cooperação que podem ser tomadas em consideração - Recurso jurisdicional efectivo.
Processo C-272/09 P.

European Court Reports 2011 -00000

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:810

Processo C‑272/09 P

KME Germany AG e o.

contra

Comissão Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral – Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado dos tubos industriais de cobre – Coimas – Dimensão do mercado, duração da infracção e cooperação que podem ser tomadas em consideração – Recurso jurisdicional efectivo»

Sumário do acórdão

1.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Obrigação de ter em consideração o impacto concreto no mercado – Carácter quantificável – Alcance

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, n.° 1 A, primeiro parágrafo)

2.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Volume de negócios global da empresa em causa – Volume de negócios realizado com as mercadorias que são objecto da infracção – Respectiva tomada em consideração – Limites

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

3.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade e duração da infracção – Aumento do montante de partida em razão da duração da infracção – Ausência de necessidade de estabelecer uma relação directa entre esta duração e um prejuízo acrescido causado às regras de concorrência

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, n.° 1 B)

4.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Apreciação económica complexa – Margem de apreciação da Comissão – Fiscalização jurisdicional – Fiscalização da legalidade – Alcance

(Artigo 263.° TFUE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

5.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade e duração da infracção

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

6.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Aplicação das orientações para o cálculo das coimas – Fundamentação da decisão – Alcance

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

7.        Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Poder de apreciação da Comissão – Fiscalização jurisdicional – Competência de plena jurisdição do juiz da União – Alcance

(Artigo 261.° TFUE; Regulamentos n.° 17 do Conselho, artigo 17.° e n.° 1/2003, artigo 31.°)

8.        Direito da União – Princípios – Direito a uma protecção jurisdicional efectiva – Fiscalização jurisdicional das decisões tomadas pela Comissão em matéria da concorrência – Fiscalização da legalidade e de plena jurisdição, tanto de direito como de facto – Violação – Inexistência

(Artigo 263.° TFUE; Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 47.°; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 31.°)

1.        Segundo o ponto 1, A, das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, a apreciação do critério da gravidade da infracção deve levar em consideração o impacto concreto que esta tenha tido no mercado unicamente quando possa ser medido. A determinação do impacto concreto de um cartel no mercado pressupõe, com efeito, uma comparação entre a situação do mercado que resultou do cartel e a que teria resultado do livre jogo da concorrência. Tal comparação implica necessariamente o recurso a hipóteses, dada a multiplicidade das variáveis susceptíveis de ter um impacto no mercado.

(cf. n.os 30, 31)

2.        Embora seja possível, com vista à determinação da coima por infracção às regras da concorrência, ter em conta tanto o volume de negócios global da empresa, que constitui uma indicação da sua dimensão e do seu poder económico, como a parte desse volume que provém das mercadorias objecto da infracção e que, por conseguinte, pode dar uma indicação da amplitude da mesma, todavia, o volume de negócios global de uma empresa apenas constitui uma indicação aproximativa e imperfeita da dimensão desta última. Além disso, não há que atribuir a um ou outro destes valores uma importância desproporcionada relativamente aos outros elementos de apreciação da gravidade da infracção.

(cf. n.os 50, 51)

3.        Quando, em conformidade com o n.° 1 B das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, o montante considerado relativamente à gravidade da infracção é aumentado para levar em conta a duração desta, não é necessário estabelecer materialmente uma relação directa entre esta duração e um prejuízo acrescido causado aos objectivos da União visados pelas regras de concorrência. Com efeito, para aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE, a tomada em consideração dos efeitos concretos de um acordo é supérflua, a partir do momento em que se verifique que este tem por objecto restringir, impedir ou falsear a concorrência. Tal é nomeadamente o caso dos acordos que incluem restrições patentes à concorrência, como a fixação dos preços e a repartição do mercado.

(cf. n.os 64, 65)

4.        Apesar de a Comissão dispor de uma margem de apreciação em matéria económica em domínios que originam apreciações económicas complexas, tais como a determinação do montante das coimas aplicadas por infracção às regras da concorrência, tal não implica que o juiz da União se deva abster de fiscalizar a interpretação, feita pela Comissão, de dados de natureza económica. Com efeito, no âmbito da fiscalização da legalidade, o juiz da União deve designadamente verificar não só a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se estes elementos constituem o conjunto dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram.

Compete ao juiz da União efectuar a fiscalização da legalidade que lhe incumbe com base nos elementos apresentados pelo recorrente para alicerçar os fundamentos invocados. Nesta fiscalização, o juiz não se pode apoiar na margem de apreciação de que dispõe a Comissão nem relativamente à escolha dos elementos a levar em conta no momento da aplicação dos critérios mencionados nas orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, nem relativamente à avaliação destes elementos, renunciando ao exercício de uma fiscalização aprofundada, tanto de direito como de facto.

(cf. n.os 94, 102)

5.        Para a determinação dos montantes das coimas por infracção às regras da concorrência, há que ter em conta a duração das infracções e todos os elementos que podem entrar na apreciação da gravidade daquelas, tais como o comportamento de cada uma das empresas, o papel desempenhado por cada uma delas no estabelecimento das práticas concertadas, o benefício que retiraram dessas práticas, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que as infracções deste tipo representam para os objectivos da Comunidade Europeia. Elementos objectivos, como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afectado e a deterioração sofrida pela ordem pública económica, devem ser tidos em conta. A análise deve igualmente tomar em consideração a importância relativa e a quota de mercado das empresas responsáveis, bem como uma eventual reincidência.

(cf. n.os 96, 97)

6.        No interesse da transparência, a Comissão adoptou as orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, nas quais indica a que título levará em consideração tal ou tal circunstância da infracção e as consequências que daí poderão resultar para o montante da coima. Estas orientações, que estabelecem uma regra de conduta indicativa da prática a seguir da qual a administração não se pode afastar, num caso específico, sem indicar razões que sejam compatíveis com o princípio da igualdade de tratamento, limitam‑se a descrever o método do exame da infracção seguido pela Comissão e os critérios que esta se obrigou a tomar em consideração para a fixação do montante da coima. Importa recordar o dever de fundamentação dos actos da União. Incumbe, pois, à Comissão fundamentar a sua decisão e, nomeadamente, explicar a ponderação e a avaliação que fez dos elementos tomados em consideração.

(cf. n.os 99, 101)

7.        No tocante à determinação do montante das coimas aplicadas por infracção às regras da concorrência, a competência de plena jurisdição que era reconhecida ao juiz da União pelo artigo 17.° do Regulamento n.° 17 é actualmente reconhecida pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, em conformidade com o artigo 261.° TFUE. Esta competência habilita o juiz, para além da simples fiscalização da legalidade da punição, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, deste modo, a suprimir, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada.

Porém, o exercício da competência de plena jurisdição não equivale a uma fiscalização a título oficioso e a tramitação processual nos órgãos jurisdicionais da União é contraditória. Com excepção dos fundamentos de ordem pública que o juiz tem o dever de suscitar oficiosamente, como a inexistência de fundamentação da decisão impugnada, é ao recorrente que compete suscitar fundamentos contra esta última e apresentar elementos de prova que alicercem estes fundamentos. Este requisito de ordem processual não contraria a regra segundo a qual, no tocante às infracções às regras de concorrência, é à Comissão que compete apresentar a prova das infracções que constata e apresentar elementos de prova adequados para demonstrar, de modo jurídico bastante, a existência dos factos constitutivos de uma infracção. Com efeito, o que é exigido ao recorrente, no âmbito de um recurso jurisdicional, é que identifique os elementos contestados da decisão impugnada, formule alegações a esse respeito e apresente provas, as quais podem ser constituídas por indícios sérios, destinadas a demonstrar que as suas alegações são procedentes.

(cf. n.os 103‑105)

8.        A fiscalização das decisões tomadas pela Comissão em matéria da concorrência prevista pelos Tratados implica que o juiz da União exerça uma fiscalização tanto de direito como de facto e que tem o poder de apreciar as provas, de anular a decisão impugnada e de alterar o montante das coimas. Por conseguinte, não se verifica que a fiscalização da legalidade prevista no artigo 263.° TFUE, completada pela competência de plena jurisdição a respeito do montante da coima, prevista no artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, seja contrária às exigências do princípio da protecção jurisdicional efectiva que figura no artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

(cf. n.° 106)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

8 de Dezembro de 2011 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral – Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado dos tubos industriais de cobre – Coimas – Dimensão do mercado, duração da infracção e cooperação que podem ser tomadas em consideração – Recurso jurisdicional efectivo»

No processo C‑272/09 P,

que tem por objecto um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (actualmente Tribunal Geral), nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, interposto em 15 de Julho de 2009,

KME Germany AG, anteriormente KM Europa Metal AG, com sede em Osnabrück (Alemanha),

KME France SAS, anteriormente Tréfimétaux SA, com sede em Courbevoie (França),

KME Italy SpA, anteriormente Europa Metalli SpA, com sede em Florença (Itália),

representadas por M. Siragusa, avvocato, A. Winckler, avocat, G. C. Rizza, avvocato, T. Graf, advokat, e M. Piergiovanni, avvocato,

recorrentes,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por E. Gippini Fournier e J. Bourke, na qualidade de agentes, assistidos por C. Thomas, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas (relator), A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 6 de Outubro de 2010,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 10 de Fevereiro de 2011,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso, a KME Germany AG, anteriormente KM Europa Metal AG, a KME France SAS, anteriormente Tréfimétaux SA, e a KME Italy SpA, anteriormente Europa Metalli SpA (a seguir, conjuntamente, «grupo KME»), pedem a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 6 de Maio de 2009, KME Germany e o./Comissão (T‑127/04, Colect., p. II‑1167, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao seu pedido de anulação ou de redução do montante das coimas que lhes foram aplicadas por força do artigo 2.°, alíneas c) a e), da Decisão C(2003) 4820 final da Comissão, de 16 de Setembro de 2003, relativa a um procedimento de aplicação do artigo [81.° CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/E 1/38.240 – Tubos industriais) (a seguir «decisão controvertida»).

 Quadro jurídico

2        O artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.°] e [82.°] do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), dispunha:

«A Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas e associações de empresas [coimas] de mil unidades de conta, no mínimo, a um milhão de unidades de conta, podendo este montante ser superior desde que não exceda dez por centro do volume de negócios realizado, durante o exercício social anterior, por cada uma das empresas que tenha participado na infracção sempre que, deliberada ou negligentemente:

a)      cometam uma infracção ao disposto no n.° 1 do artigo [81.° CE], ou no artigo [82.° CE], ou

b)      não cumpram uma obrigação imposta por força do n.° 1 do artigo 8.°

Para determinar o montante da [coima], deve tomar‑se em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma.»

3        O artigo 17.° do Regulamento n.° 17 dispunha:

«O Tribunal de Justiça decidirá com plena jurisdição, na acepção do artigo [229.° CE], os recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada uma [coima] ou uma adstrição pela Comissão; o Tribunal pode suprimir, reduzir ou aumentar a [coima] ou a adstrição aplicadas.»

4        O Regulamento n.° 17 foi revogado e substituído pelo Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1), aplicável a partir de 1 de Maio de 2004. O artigo 31.° deste regulamento é equivalente ao artigo 17.° do Regulamento n.° 17.

5        A comunicação da Comissão intitulada «Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA» (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações»), aplicável à época da adopção da decisão controvertida, enunciava no seu preâmbulo:

«Os princípios enunciados nas [...] orientações deverão permitir assegurar a transparência e o carácter objectivo das decisões da Comissão, quer em relação às empresas, quer em relação ao Tribunal de Justiça, reafirmando, simultaneamente, a margem de discricionariedade deixada pelo legislador à Comissão em matéria de fixação de coimas, no limite de 10% do volume de negócios global das empresas. Esta margem de discricionariedade deverá, contudo, ser exercida segundo uma linha de política coerente e não discriminatória, adaptada aos objectivos prosseguidos pela repressão das infracções às regras de concorrência.

A nova metodologia aplicável ao montante das coimas pautar‑se‑á doravante pelo esquema a seguir apresentado que se baseia na fixação de um montante de base ajustado através de majorações, para ter em conta circunstâncias agravantes, e de diminuições, para ter em conta circunstâncias atenuantes.»

6        Nos termos do ponto 1 das orientações, «[esse] montante de base é determinado em função da gravidade e da duração da infracção, que constituem os únicos critérios referidos no n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17».

7        No que diz respeito à gravidade, o ponto 1, A, das orientações prevê que a avaliação do critério de gravidade da infracção deve ter em conta a natureza da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado quando este for quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência. As infracções são classificadas em três categorias: as infracções pouco graves, as infracções graves e as infracções muito graves.

8        Segundo as orientações, as infracções muito graves são nomeadamente as restrições horizontais de tipo «cartel de preços» e quotas de repartição dos mercados. O montante de base da coima prevista é «superior a 20 milhões de [euros]». As orientações expõem a necessidade de diferenciar esse montante de base para que seja levada em conta a natureza da infracção cometida, a capacidade económica efectiva dos autores da infracção de causarem um dano importante aos outros operadores, nomeadamente aos consumidores, o efeito dissuasivo da coima assim como os conhecimentos e as infra‑estruturas jurídico‑económicas das empresas que lhes permitem apreciar o carácter de infracção do seu comportamento. É igualmente esclarecido que, no caso de infracções em que participam várias empresas, poderá ser conveniente ter em conta o peso específico e, portanto, o impacto real do comportamento ilícito de cada empresa na concorrência, nomeadamente se existir uma considerável disparidade em termos de dimensão das empresas que cometeram uma infracção da mesma natureza.

9        No que diz respeito à duração das infracções, as orientações distinguem entre infracções de curta duração, em geral inferior a um ano, de duração média, em geral de um a cinco anos, e de longa duração, em geral mais de cinco anos. Quanto a estas últimas, está previsto um montante adicional da coima, o qual pode ser fixado relativamente a cada ano em 10% do montante considerado em relação à gravidade da infracção. As orientações prevêem igualmente um reforço das majorações para as infracções de longa duração, no sentido de punir efectivamente as restrições que produziram de forma duradoura efeitos nocivos em relação aos consumidores e de aumentar o incentivo à denúncia da infracção ou à cooperação com a Comissão.

10      Nos termos do ponto 2 das orientações, o montante de base da coima pode ser aumentado caso existam circunstâncias agravantes, como, nomeadamente, a reincidência da mesma empresa ou das mesmas empresas numa infracção do mesmo tipo. Segundo o ponto 3 das referidas orientações, esse montante de base pode ser diminuído caso existam circunstâncias atenuantes específicas, como o papel exclusivamente passivo ou seguidista de uma empresa na realização da infracção, a não aplicação efectiva dos acordos ou a colaboração efectiva da empresa no processo, fora do âmbito da Comunicação da Comissão sobre a não aplicação ou a redução de coimas nos processos relativos a acordos, decisões e práticas concertadas (JO 1996, C 207, p. 4, a seguir «comunicação sobre a cooperação»).

11      As orientações foram substituídas, a contar de 1 de Setembro de 2006, pelas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2, alínea a), do artigo 23.° do Regulamento n.° 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2).

12      A comunicação sobre a cooperação define as condições em que as empresas que cooperem com a Comissão durante as suas investigações sobre um cartel poderão ficar isentas ou beneficiar de uma redução da coima que, em princípio, lhes seria aplicada. Segundo o título B desta comunicação, beneficiará de uma redução de, pelo menos, 75% do montante da coima ou da não aplicação total da mesma, nomeadamente, a empresa que denuncie o cartel à Comissão antes desta ter procedido a uma verificação e sem que a Comissão disponha previamente de informações suficientes para provar a existência do cartel denunciado ou que é a primeira a fornecer elementos determinantes que provem a sua existência. Segundo o título D da referida comunicação, uma empresa poderá beneficiar de uma redução de 10% a 50% do montante da coima, nomeadamente quando, antes do envio da comunicação das acusações, fornecer à Comissão informações, documentação ou outras provas que contribuam para confirmar a existência da infracção cometida.

13      A comunicação sobre a cooperação foi substituída, a contar de 14 de Fevereiro de 2002, pela Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3). No entanto, no presente caso, a Comissão aplicou a comunicação sobre a cooperação, uma vez que foi esta comunicação que as empresas tomaram em consideração quando colaboraram com ela.

 Antecedentes do litígio

14      Com outras empresas, a saber, a Wieland Werke AG, bem como a Outokumpu Oyj e a Outokumpu Copper Products Oy (a seguir, conjuntamente, «grupo Outokumpu»), produtoras de produtos semiacabados de cobre e ligas de cobre, as recorrentes participaram num cartel que visava a fixação dos preços e a repartição dos mercados no sector dos tubos industriais, particularmente, os tubos de cobre fornecidos em bobinas de cobre recozido.

15      Após verificações e inquéritos, a Comissão adoptou, em 16 de Setembro de 2003, a decisão controvertida, cujo resumo está publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 28 de Abril de 2004 (JO L 125, p. 50).

16      Para efeitos do presente recurso, os números pertinentes do acórdão recorrido nos quais o Tribunal de Primeira Instância sintetizou a parte da decisão controvertida relativa ao cálculo da coima são os seguintes:

«11      No que diz respeito, em primeiro lugar, à fixação do montante de partida da coima, a Comissão considerou que a infracção, que consistia essencialmente em fixar os preços e em repartir os mercados, era, pela sua própria natureza, uma infracção muito grave (considerando 294 da decisão [controvertida]).

12      Para determinar a gravidade da infracção, a Comissão também levou em conta o facto de o cartel ter afectado a totalidade do território do Espaço Económico Europeu (EEE) (considerando 316 da decisão [controvertida]). A Comissão analisou, além disso, os efeitos reais da infracção e concluiu que o acordo, ‘globalmente, produziu efeitos no mercado’ (considerando 314 da decisão [controvertida]).

[...]

14      Por último, ainda no âmbito da determinação da gravidade da infracção, a Comissão levou em conta o facto de o mercado dos tubos industriais de cobre ser um sector importante, cujo valor foi estimado em 288 milhões de euros ao nível do EEE (considerando 318 da decisão [controvertida]).

15      Tendo em conta todas estas circunstâncias, a Comissão concluiu que a infracção em causa devia ser considerada muito grave (considerando 320 da decisão [controvertida]).

[...]

19      Em quarto lugar, a Comissão qualificou a duração da infracção, que se prolongou pelo período compreendido entre 3 de Maio de 1988 e 22 de Março de 2001, como ‘longa’. Assim, a Comissão considerou adequado agravar de 10% por ano de participação no cartel o montante de partida das coimas aplicadas às empresas envolvidas. [...]

[...]

21      Em sexto lugar, por efeito de circunstâncias atenuantes, a Comissão referiu que, sem a cooperação da Outokumpu, só teria podido demonstrar a existência da infracção pelo período de quatro anos e, por conseguinte, reduziu o montante de base da respectiva coima em 22,22 milhões de euros, de modo a que o montante de base correspondesse à coima que lhe teria sido aplicada por esse período de quatro anos (considerando 386 da decisão [controvertida]).

22      Em sétimo e último lugar, a Comissão, nos termos do título D da comunicação sobre a cooperação […], procedeu a uma redução do montante das coimas de 50% para a Outokumpu, de 20% para a Wieland [Werke AG] e de 30% para o grupo KME (considerandos 402, 408 e 423 da decisão [controvertida]).»

 Tramitação processual no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

17      As recorrentes invocaram cinco fundamentos, todos relacionados com a fixação do montante da coima que lhes foi aplicada. Eram relativos, respectivamente, à inadequada tomada em consideração do impacto concreto do cartel para o cálculo do montante de partida da coima, à inadequada avaliação da dimensão do sector afectado pela infracção, ao errado aumento do montante de partida da coima em função da duração do cartel, à não tomada em conta de determinadas circunstâncias atenuantes e à insuficiente redução do montante da coima ao abrigo da comunicação sobre a cooperação.

18      O Tribunal de Primeira Instância julgou improcedente cada um destes fundamentos e negou provimento ao recurso na íntegra.

 Pedidos das partes

19      Com o seu recurso, o grupo KME conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        na medida do possível, com base nos factos apresentados no Tribunal de Justiça, anular parcialmente a decisão controvertida e reduzir o montante da coima que lhe foi aplicada;

–        condenar a Comissão nas despesas do presente processo, bem como nas despesas efectuadas no Tribunal de Primeira Instância; ou

–        a título subsidiário, anular o acórdão recorrido, incluindo no respeitante à sua condenação nas despesas efectuadas no Tribunal de Primeira Instância, e remeter o processo ao Tribunal Geral.

20      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso; e

–        condenar o grupo KME nas despesas.

 Quanto ao presente recurso

21      O grupo KME invoca cinco fundamentos, relativos, respectivamente, a diversos erros de direito no que respeita ao impacto da infracção no mercado, à tomada em consideração do volume de negócios, à duração da infracção e à cooperação dos recorrentes e, por último, à violação do direito a um recurso jurisdicional efectivo.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo a diversos erros de direito no que respeita ao impacto da infracção no mercado

 Argumentos das partes

22      As recorrentes indicam que o seu primeiro fundamento visa os n.os 60 a 74 do acórdão recorrido. Estes números são precedidos de uma síntese dos argumentos das partes e de uma tomada de posição do Tribunal de Primeira Instância sobre a admissibilidade de dois novos relatórios económicos apresentados pelas recorrentes para demonstrar a inexistência de impacto real da infracção no mercado, concluindo o mesmo Tribunal, no n.° 59 do acórdão recorrido, pela admissibilidade dos referidos relatórios.

23      Os n.os 60 a 74 do acórdão recorrido têm o seguinte teor:

«60      Quanto ao mérito do presente fundamento, há que referir que as recorrentes contestam, através dele, tanto a avaliação, pela Comissão, da gravidade da infracção [...] como o tratamento diferenciado que esta operou com base nas quotas de mercados das empresas envolvidas [...].

61      No que diz respeito, em primeiro lugar, ao tratamento diferenciado das empresas em causa, a fundamentação da Comissão na decisão [controvertida] nesta matéria faz menção, nomeadamente, de uma preocupação de levar em conta o ‘peso específico de cada empresa, e portanto os efeitos reais do seu comportamento ilícito sobre a concorrência’ (considerando 322 da decisão [controvertida]). No entanto, há que salientar que, mesmo sem provas dos efeitos concretos da infracção no mercado, a Comissão pode proceder a um tratamento diferenciado, em função das quotas detidas no mercado de referência, tal como é descrito nos considerandos 326 a 329 da decisão [controvertida].

62      Resulta, com efeito, da jurisprudência[…] que a quota de mercado de cada uma das empresas envolvidas no mercado que foi objecto de uma prática restritiva constitui um elemento objectivo que dá a correcta medida da responsabilidade de cada uma delas no que diz respeito à nocividade potencial da referida prática para o jogo normal da concorrência (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 197).

63      Do mesmo modo, no que diz respeito à apreciação da gravidade da infracção, há igualmente que referir que, mesmo que a Comissão não tivesse provado que o cartel teve um impacto concreto no mercado, isso não teria quaisquer efeitos sobre a qualificação da infracção como ‘muito grave’ e, portanto, sobre o montante da coima.

64      A este respeito, importa referir que resulta do sistema comunitário de sanções pelas violação das regras da concorrência, tal como instituído pelo Regulamento n.° 17 e interpretado pela jurisprudência, que devem ser aplicadas aos cartéis, devido à sua natureza própria, as coimas mais elevadas. O seu eventual impacto concreto no mercado, nomeadamente a questão de saber em que medida a restrição da concorrência originou um preço de mercado superior ao que se teria imposto no caso de o cartel não existir, não é um critério determinante para a fixação do nível das coimas (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.os 120 e 129; de 17 de Julho de 1997, Ferriere Nord/Comissão, C‑219/95 P, Colect., p. I‑4411, n.° 33; de 16 de Novembro de 2000, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, C‑286/98 P, Colect., p. I‑9925, n.os 68 a 77, e de 25 de Janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, Colect., p. I‑829, n.os 129 e 130; acórdão Tokai Carbon e o./Comissão, já referido no n.° 62, n.° 225; v., igualmente, conclusões do advogado‑geral J. Mischo no processo C‑283/98 P, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Mo och Domsjö/Comissão, Colect., p. I‑9855, I‑9858, n.os 95 a 101).

65      Há que acrescentar que resulta das orientações que os acordos ou práticas concertadas que têm por objecto, nomeadamente, como no caso em apreço, a fixação dos preços e a repartição da clientela podem, unicamente com base na sua natureza própria, ser qualificados como ‘muito graves’, não sendo necessário caracterizar tais comportamentos por um impacto ou uma extensão geográfica particulares. Esta conclusão é corroborada pelo facto de, apesar de a descrição das infracções ‘graves’ mencionar expressamente o impacto no mercado e os efeitos sobre as zonas alargadas do mercado comum, a das infracções ‘muito graves’, em contrapartida, não mencionar nenhuma exigência relativa ao impacto concreto no mercado nem aos efeitos sobre uma área geográfica particular (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colect., p. II‑4407, n.° 150).

66      Para ser exaustivo, o Tribunal acrescenta que a Comissão fez prova bastante de que o cartel teve um impacto concreto no mercado em causa.

67      Neste contexto, há que salientar que a premissa das recorrentes segundo a qual a Comissão, quando invoca um impacto concreto do cartel para fixar o montante da coima, é obrigada a fazer prova científica de que se verificaram efeitos económicos tangíveis no mercado e de que há um nexo de causa e efeito entre o impacto e a infracção não é aceite pela jurisprudência.

68      Com efeito, o Tribunal declarou em várias ocasiões que o impacto concreto de um acordo no mercado deve considerar‑se suficientemente demonstrado se a Comissão puder fornecer indícios concretos e credíveis que indiquem, com probabilidade razoável, que o acordo teve impacto no mercado (v., nomeadamente, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância [de 18 de Julho de 2005,] Scandinavian Airlines System/Comissão, [T‑241/01, Colect., p. II‑2917], n.° 122; de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, Colect., p. II‑3627, n.os 159 a 161; Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colect., p. II‑3435, n.os 153 a 155; Archer Daniels Midland/Comissão, T‑329/01, Colect., p. II‑3255, n.os 176 a 178; Roquette Frères/Comissão, T‑322/01, Colect., p. II‑3137, n.os 73 a 75).

69      A este respeito, há que observar que as recorrentes não contestaram a materialidade dos factos, acima expostos no n.° 13, em que a Comissão se baseou para concluir pela existência de um impacto concreto do cartel no mercado, ou seja, o facto de os preços terem baixado nos períodos em que o acordo colusório foi pouco respeitado e terem aumentado significativamente noutros períodos, a criação de um sistema de troca de informações relativas aos volumes de vendas e aos níveis de preços, a significativa quota de mercado detida pela totalidade dos membros do cartel e o facto de as quotas de mercado respectivas dos participantes no cartel se terem mantido relativamente estáveis durante todo o período durante o qual foi perpetrada a infracção. As recorrentes apenas alegaram que os referidos factos não eram susceptíveis de demonstrar que a infracção em causa tinha tido um impacto concreto no mercado.

70      Ora, resulta da jurisprudência que a Comissão pode legitimamente deduzir, com base nos indícios referidos no número anterior, que a infracção teve um impacto concreto no mercado (v., neste sentido, acórdãos[, já referidos, Jungbunzlauer/Comissão, n.° 159; Roquette Frères/Comissão, n.° 78; de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, n.° 165; Archer Daniels Midland/Comissão, T‑329/01, n.° 181]; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão, T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colect., p. II‑5169, n.os 285 a 287).

71      Quanto ao argumento das recorrentes segundo o qual o processo contém exemplos de casos em que os acordos colusórios não foram respeitados, há que referir que o facto de os acordos não terem sido sempre respeitados pelos membros do cartel não basta para excluir um impacto no mercado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância, Groupe Danone/Comissão, [já referido], n.° 148).

72      Os argumentos das recorrentes relativos ao seu próprio comportamento também não podem ser acolhidos. Com efeito, o comportamento efectivo que uma empresa alega ter adoptado não é pertinente para avaliar o impacto de um cartel no mercado, apenas devendo ser levados em conta os efeitos resultantes da infracção no seu todo (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, T‑224/00, Colect., p. II‑2597, n.° 167). De igual modo, a Comissão não pode ser censurada pelo facto de ter referido, no considerando 303 da decisão [controvertida], que o relatório inicial não permitia refutar as suas conclusões relativas aos efeitos reais da infracção no mercado. Com efeito, a análise econométrica que consta desse relatório apenas trata de dados numéricos relativos às recorrentes.

73      Por conseguinte, tendo em conta as considerações precedentes, há que julgar o presente fundamento improcedente.

74      Além disso, o Tribunal considera, no âmbito da sua competência de plena jurisdição e à luz das considerações anteriores, que não há que pôr em causa a fixação do montante de partida da coima em função da gravidade efectuada pela Comissão.»

24      As recorrentes sustentam que o Tribunal de Primeira Instância fundamentou de forma ilógica e inadequada o acórdão recorrido e cometeu um erro de direito quando considerou que a Comissão estava autorizada, para a fixação do montante de partida da coima que lhes foi aplicada devido à gravidade da infracção, a levar em conta o impacto do cartel no mercado relevante, sem estar obrigada a demonstrar que os acordos tiveram realmente tal impacto e, em todo o caso, ao deduzir este impacto a partir de simples indicadores. Além disso, tendo concluído que a Comissão tinha demonstrado de forma bastante que os acordos tiveram um impacto no mercado, o Tribunal de Primeira Instância desvirtuou manifestamente os factos e os elementos de prova de natureza económica que o grupo KME lhe tinha submetido.

25      A Comissão alegou, antes de mais, que o primeiro fundamento é inoperante. Com efeito, as recorrentes não desenvolveram qualquer argumentação contra os n.os 60 a 65 do acórdão recorrido, através dos quais o Tribunal de Primeira Instância concluiu não ser necessário demonstrar a incidência concreta da infracção no mercado tanto no respeitante ao tratamento diferenciado das empresas em causa como à gravidade da infracção. Apenas impugnaram o raciocínio superabundante do Tribunal de Primeira Instância com o qual este, nos n.os 67 e seguintes do acórdão recorrido, concluiu que a Comissão tinha demonstrado de forma bastante que os acordos tiveram um impacto no mercado em causa.

26      A Comissão salienta que, em todo o caso, o primeiro fundamento é inadmissível, uma vez que tem por objecto a apreciação dos factos e dos elementos de prova.

27      Sustenta em seguida que, em seu entender, o Tribunal de Primeira Instância apreciou correctamente os elementos de prova.

28      Por último, afirma que o Tribunal de Primeira Instância fundamentou correctamente o acórdão recorrido, nomeadamente o seu n.° 72, no qual rejeitou os argumentos e as provas apresentadas pelas recorrentes.

 Apreciação do Tribunal

29      As recorrentes não contestam as conclusões do Tribunal de Primeira Instância relativas à classificação da infracção entre as «infracções muito graves» na acepção das orientações nem a diferenciação introduzida entre as empresas, em função das partes que detinham no mercado em causa, para que fosse levado em conta o peso específico de cada empresa e, portanto, o efeito real do seu comportamento ilícito na concorrência. Contestam unicamente as conclusões desse Tribunal que respeitam ao impacto concreto do cartel no mercado como elemento tomado em consideração para a determinação do montante de base da coima.

30      Segundo o ponto 1, A, das orientações, a apreciação do critério da gravidade da infracção deve levar em consideração o impacto concreto que esta tenha tido no mercado unicamente quando possa ser medida.

31      A determinação do impacto concreto de um cartel no mercado pressupõe, com efeito, uma comparação entre a situação do mercado que resultou do cartel e a que teria resultado do livre jogo da concorrência. Tal comparação implica necessariamente o recurso a hipóteses, dada a multiplicidade das variáveis susceptíveis de ter um impacto no mercado.

32      No considerando 300 da decisão controvertida, a Comissão assinalou a impossibilidade de determinar de que forma teriam evoluído os preços, caso não existisse um cartel, durante o período de mais de doze anos em que durou a infracção. Após ter refutado os argumentos defendidos pelas recorrentes, apresentou os indícios que lhe permitiram concluir, no considerando 314 dessa decisão, que o sistema anticoncorrencial produziu, globalmente, efeitos no mercado, apesar de ser impossível quantificá‑los com precisão.

33      Assim, resulta da decisão controvertida que, no presente caso, a Comissão não considerou possível, para efeitos do cálculo da coima, levar em conta o elemento facultativo que é o impacto concreto da infracção no mercado, uma vez que não podia ser medido. Essa conclusão não foi infirmada no acórdão recorrido.

34      O Tribunal de Primeira Instância recordou, nos n.os 68 e 70 do acórdão recorrido, a jurisprudência relativa às exigências de prova do impacto concreto de um cartel no mercado. Além disso, fiscalizou, nos n.os 69 e 71 a 73 desse acórdão, se a Comissão tinha demonstrado de forma jurídica bastante um impacto concreto do cartel no mercado em causa. Todavia, procedeu a esta fiscalização a título superabundante, como indicou no n.° 66 do referido acórdão, e isto após ter correctamente recordado, no n.° 64 do mesmo acórdão, que o impacto dos cartéis no mercado não é um critério decisivo para a determinação do nível das coimas. Daqui resulta que o fundamento dirigido pelas recorrentes contra esta parte do raciocínio do Tribunal de Primeira Instância é inoperante.

35      Em todo o caso, o raciocínio do Tribunal de Primeira Instância relativo à fundamentação da decisão controvertida responde ao argumento das recorrentes, sintetizado na última frase do n.° 38 do acórdão recorrido, segundo o qual o raciocínio e a conclusão que constam da decisão controvertida a respeito do impacto concreto do cartel no mercado estão errados, não estão corroborados e são contraditórios. O Tribunal de Primeira Instância concluiu pela presença de elementos que permitiam estabelecer a existência de tal impacto, mas sem colocar em causa a impossibilidade de o medir de modo preciso.

36      Assim, esse Tribunal não se contradisse quando, por um lado, recordou o princípio segundo o qual o impacto concreto da infracção no mercado não é um critério decisivo para a determinação do montante das coimas e, por outro, fiscalizou a fundamentação da decisão controvertida relativa à existência de tal impacto.

37      Por conseguinte, é erradamente que as recorrentes, como resulta do teor do seu primeiro fundamento, deduzem da fiscalização realizada pelo Tribunal de Primeira Instância a consequência de que o impacto concreto da infracção no mercado deveria ter sido levado em conta para efeitos do cálculo do montante de partida da coima que lhes foi aplicada. Este argumento assenta numa premissa errada.

38      Quanto à crítica da desvirtuação, por parte do Tribunal de Primeira Instância, das provas económicas que as recorrentes neste apresentaram, não se alega que esse Tribunal tenha feito uma leitura dos relatórios económicos manifestamente contrária à sua redacção (v., neste sentido, acórdão de 10 de Fevereiro de 2011, Activision Blizzard Germany/Comissão, C‑260/09 P, Colect., p. I‑0000, n.° 57), mas que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de apreciação do conteúdo destes relatórios. Em todo o caso, as recorrentes não indicaram de forma precisa quais são as partes destes relatórios cujo sentido claro e preciso tenha sido mal interpretado por esse Tribunal. Daqui decorre que este argumento é inadmissível.

39      Resulta destes elementos que o primeiro fundamento não pode ser acolhido.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a diversos erros de direito no que respeita à tomada em consideração do volume de negócios

 Argumentos das partes

40      O segundo fundamento diz respeito aos n.os 85 a 94 do acórdão recorrido. Visa essencialmente os seus n.os 90 a 94, que têm a seguinte redacção:

«90      As recorrentes alegam, a este respeito, por um lado, que o preço do cobre escapa ao controlo dos fabricantes de tubos industriais, uma vez que é fixado de acordo com a [London Metal Exchange] e, por outro, que são os próprios adquirentes de tubos industriais que decidem a que preço o metal é adquirido. As recorrentes salientam igualmente que as flutuações do preço do metal não têm nenhuma influência sobre o seu lucro.

91      No entanto, não se pode deixar de referir que nenhuma razão válida impõe que o volume de negócios de um mercado pertinente seja calculado excluindo certos custos de produção. Como correctamente afirmou a Comissão, em todos os sectores industriais há custos inerentes ao produto final que o fabricante não pode controlar mas que, no entanto, constituem um elemento essencial das suas actividades e que, por conseguinte, não podem ser excluídos do seu volume de negócios aquando da fixação do montante de partida da coima (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colect., p. II‑491, n.os 5030 e 5031). O facto de o preço do cobre constituir uma parte significativa do preço final dos tubos industriais ou de o risco de flutuações dos preços do cobre ser muito mais elevado do que quando se trata de outras matérias‑primas não infirma esta conclusão.

92      Por último, no que diz respeito aos argumentos das recorrentes de acordo com os quais estas afirmam que, em vez de recorrer ao critério do volume de negócios do mercado pertinente, seria mais adequado, na perspectiva da finalidade dissuasiva das coimas e do princípio da igualdade de tratamento, fixar o respectivo montante em função da rentabilidade do sector afectado ou do valor acrescentado correspondente, há que referir que não são pertinentes. A este respeito, importa observar, antes de mais, que a gravidade da infracção é determinada com base em numerosos factores, relativamente aos quais a Comissão dispõe de uma margem de apreciação (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2007, BASF/Comissão, T‑101/05 e T‑111/05, Colect., p. II‑4949, n.° 65), não tendo sido estabelecida uma lista vinculativa nem taxativa de critérios que devam obrigatoriamente ser levados em conta (acórdão Dalmine/Comissão, [já referido], n.° 129), e que não compete ao juiz comunitário, mas à Comissão, escolher, no âmbito da sua margem de apreciação e de acordo com os limites decorrentes do princípio da igualdade de tratamento e do Regulamento n.° 17, os factores e os dados numéricos que levará em conta para executar uma política que assegure o respeito das proibições previstas no artigo 81.° CE.

93      Em segundo lugar, é incontestável que o volume de negócios de uma empresa ou de um mercado é, enquanto factor de avaliação da gravidade da infracção, necessariamente vago e imperfeito. Não faz distinção nem entre os sectores de grande valor acrescentado e os sectores de pequeno valor acrescentado, nem entre as empresas lucrativas e as menos lucrativas. Todavia, apesar da sua natureza aproximativa, o volume de negócios é considerado, actualmente, tanto pelo legislador comunitário como pela Comissão e pelo Tribunal de Justiça, um critério adequado, no âmbito do direito da concorrência, para apreciar a dimensão e o poder económico das empresas em causa [v., nomeadamente, acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, [já referido] n.° 121; artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, considerando 10 e artigos 14.° e 15.° do Regulamento (CE) n.° 139/2004 do Conselho, de 20 de Janeiro de 2004, relativo ao controlo das concentrações de empresas (JO L 24, p. 1)].

94      Face ao exposto, há que concluir que a Comissão agiu correctamente ao levar em conta o preço do cobre para determinar a dimensão do mercado de referência.»

41      No entender das recorrentes, o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário e fundamentou de forma inadequada o acórdão recorrido quando aprovou a referência da Comissão, para a apreciação da dimensão do mercado afectado pela infracção para efeitos de determinação do elemento da gravidade da coima, a um valor do mercado que incluía, erradamente, as receitas das vendas efectuadas num mercado a montante, distinto do mercado ao qual respeitava o cartel, apesar de os membros do cartel não estarem verticalmente integrados nesse mercado a montante.

42      Expõem que a indústria da transformação do cobre tem características específicas. Nomeadamente, é o cliente que determina o momento da compra do metal no London Metal Exchange e, por conseguinte, o seu preço. Embora este preço seja facturado pelo produtor de tubos ao cliente acrescido da margem de transformação, tomá‑lo em consideração para o cálculo do volume de negócios da empresa seria ignorar a realidade económica do mercado, que se caracteriza, nomeadamente, pela parte importante que representa a matéria‑prima no custo do produto e as importantes variações do preço dessa matéria‑prima. Estes factos foram apurados pelo Tribunal de Primeira Instância.

43      Segundo as recorrentes, esse Tribunal cometeu um erro de direito, pois não considerou que a Comissão deveria ter tido em conta a jurisprudência do Tribunal Geral e a sua própria prática decisória, segundo as quais, quando a Comissão calcula o montante de partida da coima e/ou aplica o limiar de 10% do volume de negócios, está obrigada a tomar em consideração as características do mercado em causa.

44      Além disso, alegam que, não tendo distinguido as recorrentes de outras empresas cujo volume de negócios não é tão influenciado pelo preço da matéria‑prima, o Tribunal de Primeira Instância violou o princípio da não discriminação, que impõe que se tratem de forma diferente as situações diferentes.

45      Por último, as recorrentes contestam a jurisprudência em que se apoiou o Tribunal de Primeira Instância, baseada na margem de apreciação da Comissão. Consideram que esse Tribunal não examinou se os critérios utilizados pela Comissão para estabelecer a gravidade do cartel eram pertinentes e adequados.

46      A Comissão sustenta que, na medida em que as recorrentes convidam o Tribunal de Justiça a proceder a uma apreciação diferente da que foi feita pelo Tribunal de Primeira Instância a respeito do carácter ímpar, ou não, do sector dos tubos industriais, o fundamento é inadmissível. Além disso, contesta os factos como são descritos pelo grupo KME, a saber, que os produtores de tubos actuavam frequentemente na qualidade de agentes dos clientes quando adquiriam o cobre, e contesta que o Tribunal de Primeira Instância se tenha pronunciado a esse respeito.

47      Em todo o caso, foi de modo juridicamente correcto que o Tribunal de Primeira Instância indicou, no n.° 91 do acórdão recorrido, que em todos os sectores industriais há custos inerentes ao produto final que o fabricante não pode controlar, mas que, no entanto, constituem um elemento essencial do conjunto das suas actividades e que, por conseguinte, não podem ser excluídos do seu volume de negócios quando da fixação do montante de partida da coima.

48      De igual modo, foi acertadamente que o Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 93 do acórdão recorrido, que, apesar da sua natureza aproximativa, o volume de negócios é considerado, actualmente, tanto pelo legislador comunitário como pela Comissão e pelo Tribunal de Justiça, um critério adequado, no âmbito do direito da concorrência, para apreciar a dimensão e o poder económico das empresas em causa.

 Apreciação do Tribunal

49      Resulta de jurisprudência assente que, para apreciar a gravidade de uma infracção, se deve ter em consideração um grande número de elementos, cujo carácter e importância variam segundo o tipo e as circunstâncias especiais da infracção em causa. Conforme o caso, entre esses elementos podem figurar o volume e o valor das mercadorias que são objecto da infracção, bem como a dimensão e o poder económico da empresa e, portanto, a influência que ela pôde exercer no mercado (v., neste sentido, acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 120).

50      Embora o Tribunal de Justiça tenha concluído que é possível, com vista à determinação da coima, ter em conta tanto o volume de negócios global da empresa, que constitui uma indicação da sua dimensão e do seu poder económico, como a parte desse volume que provém das mercadorias que são objecto da infracção e que, por conseguinte, pode dar uma indicação da amplitude da mesma, reconheceu, no entanto, que o volume de negócios global de uma empresa apenas constitui uma indicação aproximativa e imperfeita da sua dimensão (acórdãos Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 121; de 17 de Dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C‑185/95 P, Colect., p. I‑8417, n.° 139; de 28 de Junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colect., p. I‑5425, n.° 243; de 18 de Maio de 2006, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, C‑397/03 P, Colect., p. I‑4429, n.° 100; e de 19 de Março de 2009, Archer Daniels Midland/Comissão, C‑510/06 P, Colect., p. I‑1843, n.° 74).

51      Além disso, assinalou em diversas ocasiões que não há que atribuir a nenhum desses valores uma importância desproporcionada relativamente aos outros elementos de apreciação da gravidade da infracção (acórdãos, já referidos, Musique Diffusion française e o./Comissão, n.° 121; Dansk Rørindustri e o./Comissão, n.° 243; de 18 de Maio de 2006, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, n.° 100; e de 19 de Março de 2009, Archer Daniels Midland/Comissão, n.° 74).

52      Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu qualquer erro de direito quando recordou, no n.° 93 do acórdão recorrido, que o volume de negócios, ainda que vago e imperfeito, continua a ser um critério adequado para apreciar a dimensão e o poder económico das empresas em causa.

53      Por outro lado, foi também sem cometer qualquer erro de direito que o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 91 do acórdão recorrido, que nenhuma razão válida impõe que o volume de negócios de um mercado relevante seja calculado excluindo certos custos de produção. Como observou a advogada‑geral no n.° 141 das suas conclusões, não levar em conta o volume de negócios bruto em certos casos, e levá‑lo em consideração noutros, imporia que se estabelecesse um limite, na forma de uma proporção entre o volume de negócios líquido e bruto, que seria difícil de aplicar e poderia dar origem a disputas intermináveis e irresolúveis, incluindo alegações de discriminação.

54      Por último, o Tribunal de Primeira Instância fundamentou o acórdão recorrido de forma adequada e exerceu a fiscalização que lhe incumbe. Assim, tendo as recorrentes contestado a utilização do volume de negócios para avaliar a dimensão do mercado em causa, esse Tribunal rejeitou, no n.° 88 do acórdão recorrido, a afirmação da Comissão segundo a qual o montante de partida da coima aplicada às recorrentes não teria sido necessariamente inferior a 35 milhões de euros se o preço do cobre tivesse sido deduzido do volume de negócios do mercado. Em seguida, averiguou, nos n.os 90 e 91 do acórdão recorrido, se a Comissão, na avaliação da dimensão do mercado, tinha cometido um erro ao levar em conta o preço do cobre.

55      Resulta destas considerações que o Tribunal de Primeira Instância realizou a fiscalização que lhe incumbia, respondeu ao fundamento invocado pelas recorrentes e não cometeu qualquer erro de direito quando concluiu, no n.° 94 do acórdão recorrido, que foi de modo juridicamente correcto que a Comissão levou em conta o preço do cobre para efeitos da determinação da dimensão do mercado em causa.

56      Relativamente à crítica de que esse Tribunal não examinou se os critérios utilizados pela Comissão para determinar a gravidade do cartel eram pertinentes e adequados, importa recordar que, num recurso de uma decisão em matéria de concorrência, é ao recorrente que incumbe formular fundamentos a este respeito, não incumbindo ao Tribunal Geral fiscalizar oficiosamente a ponderação dos elementos levados em consideração pela Comissão para a determinação do montante da coima.

57      Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo a diversos erros de direito no que respeita à tomada em consideração da duração da infracção

 Argumentos das partes

58      As recorrentes indicam que o seu terceiro fundamento visa os n.os 100 a 105 do acórdão recorrido. Sustentam que o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário e fundamentou de forma confusa, ilógica e inadequada esse acórdão, tendo confirmado a parte da decisão controvertida na qual a Comissão aplicou erradamente as orientações e violou os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, impondo a percentagem máxima do aumento do montante de partida da coima em função da duração da infracção.

59      Segundo as recorrentes, resulta do ponto 1, B, das orientações que a finalidade da majoração da coima em função da duração da infracção consiste em «sancionar efectivamente as restrições que produziram de forma duradoura efeitos nocivos em relação aos consumidores». O nexo que deve existir entre a duração da infracção e o seu efeito nocivo resulta igualmente da jurisprudência. Ora, o Tribunal de Primeira Instância não verificou se a Comissão, na apreciação da gravidade da infracção, concedeu efectivamente a importância devida ao facto de a intensidade e a eficácia do cartel terem variado no tempo. Por conseguinte, esse Tribunal considerou erradamente, no n.° 104 do acórdão recorrido, que uma majoração de 125% do montante de partida da coima não é manifestamente desproporcionada.

60      A Comissão salienta que o Tribunal de Justiça não é competente para substituir a apreciação do montante da coima efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância pela sua própria. Este fundamento é, pois, inadmissível.

61      Em todo o caso, esse Tribunal forneceu uma explicação clara e lógica para a sua apreciação, que respondeu a todos os fundamentos de direito invocados pelo grupo KME.

 Apreciação do Tribunal

62      Com o seu terceiro fundamento, as recorrentes contestam tanto o princípio de um aumento da coima para ter em conta a duração da infracção como o resultado da aplicação desse princípio no que lhes diz respeito, a saber, o aumento em 125% do montante de partida da coima, fixado em 35 milhões de euros, para ter em conta uma duração da infracção de 12 anos e 10 meses, correspondendo cada ano de participação a 10% deste aumento. O montante de base foi, assim, elevado para 56,88 milhões de euros.

63      Como referiu a advogada‑geral no n.° 162 das suas conclusões, a crítica deste resultado assenta na premissa errada de que a taxa de aumento foi de 125%, quando foi unicamente de 62,51% (56,88/35 = 1,6251).

64      No tocante ao princípio do aumento da coima para levar em conta a duração da infracção, não é necessário estabelecer materialmente uma relação directa entre esta duração e um prejuízo acrescido causado aos objectivos comunitários visados pelas regras de concorrência.

65      Com efeito, para aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE, a tomada em consideração dos efeitos concretos de um acordo é supérflua, a partir do momento em que se verifique que este tem por objecto restringir, impedir ou falsear a concorrência (v., neste sentido, acórdão de 13 de Julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, Colect. 1965‑1968, p. 423). Tal é nomeadamente o caso, como no presente, dos acordos que incluem restrições patentes à concorrência, como a fixação dos preços e a repartição do mercado. Se um cartel fixa o estado do mercado no momento em que é celebrado, a sua longa duração pode tornar rígidas as estruturas, diminuindo o incentivo à inovação e ao desenvolvimento para os participantes no cartel. O regresso ao estado de livre concorrência será assim tanto mais difícil e longo quanto a própria duração do cartel foi longa.

66      Mesmo se a intensidade e a eficácia do cartel variarem no tempo, a verdade é que o referido cartel continuará a existir e, por conseguinte, a tornar ainda mais rígidas as estruturas do mercado.

67      No caso de uma total falta de implementação de um acordo, há que recordar que o ponto 3 das orientações prevê que a não aplicação efectiva dos acordos ou das práticas ilícitas pode constituir uma circunstância atenuante que pode conduzir a uma diminuição do montante de base da coima. Todavia, não se verifica que tal aconteça no presente caso, não tendo as recorrentes contestado a implementação do cartel no que lhes diz respeito, mas unicamente a não tomada em consideração da intensidade variável desta implementação e do impacto concreto e objectivo do cartel nos consumidores.

68      Além disso, pode ser difícil quantificar o prejuízo real para o consumidor, atendendo às múltiplas variáveis que intervêm, nomeadamente, na formação dos preços de um produto manufacturado.

69      Em todo o caso, a duração da infracção é mencionada pelo legislador como um elemento que deve, enquanto tal, ser tomado em consideração para a fixação do montante das coimas.

70      Vistos estes elementos, foi de modo juridicamente correcto que, no n.° 105 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância julgou improcedente o fundamento relativo à majoração do montante da coima a título da duração do cartel.

71      Resulta de todos estes elementos que o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a diversos erros de direito no que respeita à tomada em consideração da cooperação das recorrentes

 Argumentos das partes

72      As recorrentes indicam que o seu quarto fundamento visa os n.os 123 a 134 do acórdão recorrido. Sustentam que o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário quando confirmou a parte da decisão controvertida na qual a Comissão lhes recusou o benefício de uma redução da coima devido à sua cooperação fora do âmbito de aplicação da comunicação sobre a cooperação, violando assim o ponto 3, sexto travessão, das orientações, bem como os princípios da equidade e da igualdade de tratamento.

73      Segundo as recorrentes, só elas deveriam ter beneficiado da redução da coima, pois apresentaram uma prova da duração da infracção, ao invés do grupo Outokumpu, que apenas apresentou uma informação relativa à duração total do cartel.

74      A Comissão sustenta que, uma vez que o grupo KME convida o Tribunal de Justiça a substituir a apreciação do Tribunal de Primeira Instância pela sua própria apreciação, o fundamento é inadmissível.

75      Além disso, este fundamento deve ser julgado improcedente. A Comissão alega que o Tribunal de Primeira Instância forneceu uma explicação clara e lógica para a sua apreciação dos casos nos quais pode ser concedida uma imunidade parcial, em resposta a todos os argumentos jurídicos avançados pelo grupo KME.

76      No tocante à concessão da redução da coima ao grupo Outokumpu, a Comissão refere que a informação por este comunicada lhe permitiu investigar e procurar provas. As recorrentes facilitaram esta tarefa ao apresentar provas, mais de dezasseis meses após o grupo Outokumpu, mas não mais do que isto. Contrariamente ao que sugerem as recorrentes no seu recurso, também não teriam podido beneficiar de uma imunidade parcial, em conformidade com a comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis, porquanto tal imunidade visa as provas de «factos anteriormente desconhecidos da Comissão», o que não era o caso relativamente à duração total do cartel.

77      A Comissão salienta, por último, que a aplicação de uma imunidade parcial na hipótese evocada pelas recorrentes seria contrária ao título D da comunicação sobre a cooperação, o qual prevê já uma redução da coima quando a empresa forneça à Comissão informações, documentação ou outros elementos de prova que contribuam para confirmar a existência da infracção cometida.

 Apreciação do Tribunal

78      Há que recordar que, segundo a comunicação sobre a cooperação, beneficia da não aplicação de coima, ou de uma redução significativa do seu montante, unicamente a primeira empresa a fornecer os elementos determinantes para a prova da existência do cartel.

79      Nos n.os 144 e 145 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância examinou as circunstâncias da cooperação das recorrentes e da do grupo Outokumpu. Trata‑se, porém, de observações e de apreciações relativas a matéria de facto que não compete ao Tribunal de Justiça fiscalizar no âmbito de um recurso de decisão desse Tribunal.

80      Além disso, tendo em conta a constatação segundo a qual a cooperação das recorrentes foi posterior à do grupo Outokumpu, foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 147 do acórdão recorrido, que as recorrentes não se encontravam numa situação comparável à do grupo Outokumpu e, consequentemente, não tinham sido discriminadas.

81      Por último, as recorrentes não indicam a razão pela qual o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito no raciocínio desenvolvido nos n.os 130 e 131 do acórdão recorrido e, nomeadamente, não explicam por que razão a apresentação de elementos de prova de factos já conhecidos pela Comissão justificava em maior medida a redução da coima por circunstâncias atenuantes do que a anterior apresentação de uma informação que era nova para a Comissão. Daqui decorre que este argumento é inadmissível, pois é demasiado impreciso.

82      Resulta destas considerações que o quarto fundamento é parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do direito a um recurso jurisdicional efectivo

 Argumentos das partes

83      As recorrentes sustentam que o Tribunal de Primeira Instância violou o direito comunitário e o seu direito fundamental a um recurso jurisdicional efectivo e sem entraves, na medida em que não examinou com atenção e cuidado os seus argumentos e remeteu de forma excessiva e irrazoável para o poder de apreciação da Comissão.

84      Expõem que a doutrina da «margem de apreciação» e da «deferência judiciária» não deve ser aplicada actualmente, visto que o direito comunitário é presentemente caracterizado pelo enorme montante das coimas aplicadas pela Comissão, um desenvolvimento que é frequentemente designado como a «penalização» de facto do direito europeu da concorrência.

85      Por outro lado, a aplicabilidade directa da excepção prevista no artigo 81.°, n.° 3, CE, introduzida pelo Regulamento n.° 1/2003, que substitui o regime anterior de autorização, exclui, por definição, qualquer margem de apreciação da Comissão na aplicação das regras de concorrência e, por conseguinte, impõe unicamente um grau muito reduzido de deferência judiciária por parte dos órgãos jurisdicionais que fiscalizam a sua aplicação pela Comissão em casos específicos.

86      As recorrentes alegam, além disso, que a margem de apreciação da Comissão não deve ser justificada pela pretensa melhor competência da Comissão para a avaliação de factos complexos ou de questões económicas. A este respeito, referem que tanto o Tribunal de Justiça como o Tribunal Geral têm realizado, com sucesso, fiscalizações jurisdicionais particularmente intensas de casos complexos.

87      De igual modo, tendo em conta a competência de plena jurisdição conferida ao Tribunal de Primeira Instância pelos artigos 229.° CE e 31.° do Regulamento n.° 1/2003, esse Tribunal não deve reconhecer à Comissão nenhuma margem de apreciação, não apenas no que diz respeito ao carácter apropriado e proporcional do montante de uma coima mas também quanto ao método de trabalho adoptado pela Comissão para efectuar os seus cálculos. Segundo as recorrentes, o Tribunal de Primeira Instância deve examinar, em cada caso específico, de que forma apreciou a Comissão a gravidade e a duração de um comportamento ilegal e, por conseguinte, pode substituir pela sua própria apreciação a efectuada pela Comissão, anulando, reduzindo ou aumentando a coima.

88      As recorrentes também recordam que, para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, a aplicação do direito administrativo por meio de decisões administrativas e de aplicação de coimas não viola, por si só, o artigo 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»). Todavia, esta aplicação deve ser regida por garantias processuais suficientemente fortes e ser acompanhada por um regime de fiscalização jurisdicional efectiva que inclua uma competência de plena jurisdição para a fiscalização das decisões administrativas. O direito a um «recurso efectivo perante um tribunal» foi igualmente inserido no artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

89      A Comissão alega, antes de mais, que o quinto fundamento é demasiado geral e impreciso para ser examinado pelo Tribunal de Justiça. Em seguida, afirma que o grupo KME não contesta a estrutura fundamental da fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão e não fornece nenhum elemento que permita explicar por que razão as referências do Tribunal de Primeira Instância à margem de apreciação da Comissão provam que esse Tribunal não fiscalizou de forma adequada a legalidade da decisão controvertida à luz do segundo a quarto fundamentos invocados pelo grupo KME nesse Tribunal.

90      Por último, segundo a Comissão, o grupo KME limitou‑se a aludir às «acusações penais» e ao artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, mas não examinou as consequências que daí se devem retirar.

 Apreciação do Tribunal

91      Com o seu quinto fundamento, as recorrentes contestam simultaneamente o modo como o Tribunal de Primeira Instância declarou dever ter em conta a ampla margem de apreciação da Comissão e o modo como efectivamente fiscalizou a decisão controvertida. Invocam o artigo 6.° da CEDH e a Carta sem, no entanto, estabelecer de forma precisa se contestam a este respeito os princípios da fiscalização jurisdicional ou o modo como o Tribunal de Primeira Instância exerceu esta fiscalização no presente caso.

92      O princípio da protecção jurisdicional efectiva constitui um princípio geral do direito da União, que se encontra actualmente consagrado no artigo 47.° da Carta (v. acórdão de 22 de Dezembro de 2010, DEB, C‑279/09, Colect., p. I‑0000, n.os 30 e 31; despacho de 1 de Março de 2011, Chartry, C‑457/09, Colect., p. I‑0000, n.° 25; e acórdão de 28 de Julho de 2011, Samba Diouf, C‑69/10, Colect., p. I‑0000, n.° 49).

93      A fiscalização jurisdicional das decisões das instituições foi organizada pelos Tratados fundadores. Além da fiscalização da legalidade, prevista actualmente no artigo 263.° TFUE, foi prevista uma fiscalização de plena jurisdição no que respeita às sanções estabelecidas nos regulamentos.

94      No tocante à fiscalização da legalidade, o Tribunal de Justiça já declarou que, apesar de a Comissão dispor de uma margem de apreciação em matéria económica, em domínios que originam apreciações económicas complexas, tal não implica que o juiz da União se deva abster de fiscalizar a interpretação, feita pela Comissão, de dados de natureza económica. Com efeito, o juiz da União deve designadamente verificar não só a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência mas também fiscalizar se estes elementos constituem o conjunto dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram (v. acórdãos de 15 de Fevereiro de 2005, Comissão/Tetra Laval, C‑12/03 P, Colect., p. I‑987, n.° 39, e de 22 de Novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C‑525/04 P, Colect., p. I‑9947, n.os 56 e 57).

95      No que respeita à punição das infracções ao direito da concorrência, o artigo 15.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 17 prevê que, para a determinação do montante da coima, se deve tomar em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma.

96      O Tribunal de Justiça já declarou que, para a determinação dos montantes das coimas, há que ter em conta a duração das infracções e todos os elementos que podem entrar na apreciação da gravidade daquelas, tais como o comportamento de cada uma das empresas, o papel desempenhado por cada uma delas no estabelecimento das práticas concertadas, o benefício que retiraram dessas práticas, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que as infracções deste tipo representam para os objectivos da Comunidade Europeia (acórdãos Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.° 129; Dansk Rørindustri e o./Comissão, já referido, n.° 242; e de 3 de Setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão, C‑534/07 P, Colect., p. I‑7415, n.° 96).

97      O Tribunal de Justiça indicou igualmente que elementos objectivos, como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afectado e a deterioração sofrida pela ordem pública económica, devem ser tidos em conta. A análise deve igualmente tomar em consideração a importância relativa e a quota de mercado das empresas responsáveis, bem como uma eventual reincidência (acórdão de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 91).

98      Este grande número de elementos impõe à Comissão um exame aprofundado das circunstâncias da infracção.

99      No interesse da transparência, a Comissão adoptou as orientações, nas quais indica a que título levará em consideração tal ou tal circunstância da infracção e as consequências que daí poderão resultar para o montante da coima.

100    As orientações, relativamente às quais o Tribunal de Justiça já declarou que estabelecem uma regra de conduta indicativa da prática a seguir da qual a administração não se pode afastar, num caso específico, sem indicar razões que sejam compatíveis com o princípio da igualdade de tratamento (acórdão de 18 de Maio de 2006, Archer Daniels Midland e Archer Daniels Midland Ingredients/Comissão, já referido, n.° 91), limitam‑se a descrever o método do exame da infracção seguido pela Comissão e os critérios que esta se obrigou a tomar em consideração para a fixação do montante da coima.

101    Importa recordar o dever de fundamentação dos actos comunitários. No presente caso, este dever reveste particular importância. Incumbe à Comissão fundamentar a sua decisão e, nomeadamente, explicar a ponderação e a avaliação que fez dos elementos tomados em consideração (v., neste sentido, acórdão Prym e Prym Consumer/Comissão, já referido, n.° 87). A existência de fundamentação deve ser verificada oficiosamente pelo juiz.

102    Além disso, compete ao juiz da União efectuar a fiscalização da legalidade que lhe incumbe com base nos elementos apresentados pelo recorrente para alicerçar os fundamentos invocados. Nesta fiscalização, o juiz não se pode apoiar na margem de apreciação de que dispõe a Comissão nem relativamente à escolha dos elementos a levar em conta no momento da aplicação dos critérios mencionados nas orientações nem relativamente à avaliação destes elementos, renunciando ao exercício de uma fiscalização aprofundada, tanto de direito como de facto.

103    A fiscalização da legalidade é completada pela competência de plena jurisdição que era reconhecida ao juiz da União pelo artigo 17.° do Regulamento n.° 17 e o é actualmente pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, em conformidade com o artigo 261.° TFUE. Esta competência habilita o juiz, para além da simples fiscalização da legalidade da punição, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, deste modo, a suprimir, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada (v., neste sentido, acórdão de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375, n.° 692).

104    Porém, impõe‑se realçar que o exercício da competência de plena jurisdição não equivale a uma fiscalização a título oficioso e recordar que a tramitação processual nos órgãos jurisdicionais da União é contraditória. Com excepção dos fundamentos de ordem pública que o juiz tem o dever de suscitar oficiosamente, como a inexistência de fundamentação da decisão impugnada, é ao recorrente que compete suscitar fundamentos contra essa decisão e apresentar elementos de prova que alicercem estes fundamentos.

105    Este requisito de ordem processual não contraria a regra segundo a qual, no tocante às infracções às regras de concorrência, é à Comissão que compete apresentar a prova das infracções que constata e apresentar elementos de prova adequados para demonstrar, de modo jurídico bastante, a existência dos factos constitutivos de uma infracção. Com efeito, o que é exigido ao recorrente, no âmbito de um recurso jurisdicional, é que identifique os elementos contestados da decisão impugnada, formule alegações a esse respeito e apresente provas, as quais podem ser constituídas por indícios sérios, destinadas a demonstrar que as suas alegações são procedentes.

106    A fiscalização prevista pelos Tratados implica, pois, que o juiz da União exerça uma fiscalização tanto de direito como de facto e que tem o poder de apreciar as provas, de anular a decisão impugnada e de alterar o montante das coimas. Por conseguinte, não se verifica que a fiscalização da legalidade prevista no artigo 263.° TFUE, completada pela competência de plena jurisdição a respeito do montante da coima, prevista no artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, seja contrária às exigências do princípio da protecção jurisdicional efectiva que figura no artigo 47.° da Carta.

107    Daqui resulta que, na medida em que visa as regras da fiscalização jurisdicional à luz do princípio da protecção jurisdicional efectiva, o quinto fundamento é improcedente.

108    Na medida em que visa o modo como o Tribunal de Primeira Instância efectuou a fiscalização da decisão controvertida, o quinto fundamento confunde‑se com o segundo a quarto fundamentos do presente recurso e, por conseguinte, foi já objecto de apreciação pelo Tribunal de Justiça.

109    A este respeito, importa salientar que, apesar de, por diversas ocasiões, nomeadamente nos n.os 35 a 37, 92, 103, 115, 118, 129 e 141 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância se ter referido ao «poder de apreciação», à «margem de apreciação substancial» ou à «ampla margem de apreciação» da Comissão, tais menções não o impediram de exercer a fiscalização plena e integral, de direito e de facto, a que está obrigado.

110    Resulta do conjunto destes elementos que o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

111    Por conseguinte, nenhum dos fundamentos invocados pelo grupo KME em apoio do seu recurso pode ser acolhido e, consequentemente, há que lhe negar provimento.

 Quanto às despesas

112    Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do seu artigo 118.°, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do grupo KME e tendo este sido vencido no tocante aos seus fundamentos, há que condená‑lo nas despesas da presente instância.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A KME Germany AG, a KME France SAS e a KME Italy SpA são condenadas nas despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.

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