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Document 52002DC0488

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho - O mercado interno da energia: Medidas coordenadas em matéria de segurança dos aprovisionamentos energéticos

/* COM/2002/0488 final */

52002DC0488

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho - O mercado interno da energia: Medidas coordenadas em matéria de segurança dos aprovisionamentos energéticos /* COM/2002/0488 final */


COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO - O mercado interno da energia: Medidas coordenadas em matéria de segurança dos aprovisionamentos energéticos

1. Objectivo: Realização do mercado interno da energia

Nos termos do artigo 14.º do Tratado CE, o mercado interno compreende um espaço sem fronteiras internas no qual é assegurada a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais. A fim de contribuir para a concretização desse objectivo essencial do Tratado de Roma, a Comunidade Europeia cria designadamente as condições necessárias para a realização de um mercado interno no domínio da energia. Estas permitirão a criação de um mercado progressivamente mais aberto, a fim de aumentar a competitividade do sector energético. O mercado interno assenta com efeito numa necessidade de solidariedade entre os Estados-Membros da União Europeia, que se manifesta mais particularmente nos sectores essenciais para o aprovisionamento energético constituídos pelo gás, o petróleo e a electricidade.

Realizações

A Comunidade adoptou, desde o início da década de 1990, uma série de medidas sob a forma de directivas que contribuem para a realização do mercado interno do gás natural e da electricidade. A realização desse objectivo deve reforçar a competitividade da economia da União Europeia e traduzir-se numa redução apreciável dos preços ao consumidor.

A abertura à concorrência do mercado do gás natural e da electricidade está enquadrada por regulamentação em matéria de acesso aos recursos e às redes de transporte e por regulamentação em matéria de concorrência, bem como de transparência, que devem nomeadamente proteger os países da União Europeia de situações em que se verifiquem falhas no seu aprovisionamento interno. Este quadro regulamentar é indispensável e permitirá evitar crises como a de 2000 na Califórnia, onde se verificaram interrupções graves no fornecimento de electricidade.

No âmbito do bom funcionamento do mercado interno da energia, a ligação das redes reveste-se de especial importância, dado desempenhar um papel fundamental na flexibilidade dos aprovisionamentos. A falta de uma infra-estrutura de redes, incluindo a manutenção da qualidade do fornecimento (estabilidade das redes), pode travar a integração dos mercados nacionais e, dessa forma, limitar a segurança dos aprovisionamentos. Em 20 de Dezembro de 2001 a Comissão propôs um conjunto de novas medidas relativas às infra-estruturas energéticas destinadas a optimizar a utilização das infra-estruturas de gás e de electricidade existentes e a incentivar a construção de novas infra-estruturas de interesse europeu. Conforme referido pelo Conselho Europeu de Barcelona nas suas conclusões, a existência de uma rede adequada e eficaz de infra-estruturas energéticas assegurará o funcionamento do mercado interno, garantindo simultaneamente uma melhor segurança do aprovisionamento energético.

Quanto ao mercado do petróleo, embora seja mais concorrencial na União Europeia que o de outros produtos energéticos, a verdade é que devem ainda ser envidados esforços para se chegar a um mercado mais aberto. No Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético adoptado pela Comissão em Novembro de 2000, a Comissão constatava que subsistiam obstáculos nos mercados a jusante, mais precisamente no da distribuição. Embora as importantes diferenças de preços dos produtos petrolíferos entre os Estados-Membros não constituam, em si mesmas, uma infracção às regras da concorrência, estas indicam todavia que a integração dos mercados ainda não está concluída. Foram aliás realizados inquéritos a nível comunitário, bem como a nível das autoridades nacionais da concorrência, sendo mesmo impostas sanções contra determinadas companhias petrolíferas.

A abertura do mercado do petróleo, nomeadamente a novos operadores, contribuirá para estabelecer as condições de uma concorrência sã, que contribuirá para assegurar um aprovisionamento interno regular dos diferentes consumidores, embora este mercado continue sujeito a contingências ligadas a uma dependência externa acrescida.

Processo a seguir

As numerosas iniciativas comunitárias destinadas à criação de um mercado interno do gás, bem como as intervenções destinadas a assegurar um mercado do petróleo mais aberto, contribuem para estabelecer uma concorrência equitativa e para reforçar a segurança interna dos aprovisionamentos energéticos.

No que diz respeito à oferta de energia, o Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético revelou contudo uma situação paradoxal: exactamente no momento em que a União Europeia se dota do mercado interno da energia mais integrado do mundo, esta realização não foi acompanhada da necessária coordenação de medidas que permitam garantir a segurança dos aprovisionamentos externos, tanto em relação ao petróleo como ao gás natural.

Na verdade, o Livro Verde salientou as fraquezas estruturais do aprovisionamento externo em energia da União Europeia e as suas fragilidades geopolíticas, económicas e sociais. Com efeito, a economia europeia assenta essencialmente nos combustíveis fósseis que representam 4/5 do seu consumo de energia, dos quais 2/3 são importados. Esta vulnerabilidade tenderá a acentuar-se no futuro com importações de energia que poderão ascender a 70% das necessidades globais dentro de 30 anos, ou até mesmo a um nível de 90% no que diz respeito ao petróleo, caso nada seja feito para travar esta tendência.

Em relação ao petróleo, o quadro da Agência Internacional da Energia (AIE) e a legislação comunitária prevêem a manutenção pelos Estados de existências de segurança de petróleo bruto e de produtos petrolíferos, bem como a possibilidade de medidas anti-crise. Todavia, estes mecanismos, criados no início da década de 1970, já não estão adaptados a um mercado petrolífero em que se verificaram numerosos desenvolvimentos no âmbito de um mercado interno da energia cada vez mais integrado. As medidas comunitárias caracterizam-se por uma ausência de solidariedade entre os Estados-Membros, que não é compatível com os objectivos do mercado interno, dado que as crises energéticas afectam o conjunto dos países da União Europeia. Mais concretamente, não existe nenhum poder de decisão comunitário que permita o escoamento das existências de petróleo para o mercado. Quanto à AIE, os elementos fundamentais do Tratado de 1974 já não são aplicáveis. Foram criados outros dispositivos que implicam contudo a unanimidade dos 26 países participantes. Por último, estes mecanismos tornaram-se obsoletos na medida em que apenas prevêem uma intervenção comum de todos os Estados-Membros em caso de ruptura física do aprovisionamento de petróleo. Não existe nenhum quadro legal que permita uma coordenação da acção em caso de ameaça de ruptura física que tenha como efeito aumentar os preços do petróleo para níveis que ultrapassem o razoável.

A legislação comunitária em matéria de existências de petróleo, cuja primeira directiva data de 1968, e a AIE, cuja criação data de 1973, constituíram um primeiro passo importante no sentido de uma melhor gestão da dependência energética externa. É todavia necessário reconhecer que estes mecanismos, cuja filosofia de acção não foi revista em profundidade nos últimos 30 anos, já não estão adaptados ao contexto energético actual. Estes mecanismos foram criados numa época em que o mercado interno da energia dava apenas seus primeiros passos. É necessário recordar que nessa época as trocas intracomunitárias de electricidade e a interdependência do sistema eléctrico eram muito fracas.

É neste contexto que a Comissão anunciara já, na sua comunicação sobre o aprovisionamento de petróleo de 4 de Outubro de 2000, a sua intenção de examinar as modalidades que poderiam presidir a um reforço do dispositivo de existências estratégicas de petróleo, através da comunitarização da sua utilização.

No que diz respeito ao gás, a indústria europeia de gás tem até à data assegurado eficazmente a segurança do aprovisionamento. O facto de anteriormente as companhias de gás serem parcial ou totalmente detidas pelos poderes públicos e de essas empresas dominantes controlarem o conjunto das infra-estruturas, controlando a oferta e a procura, tornava desnecessário o estabelecimento de regras comuns para assegurar o aprovisionamento em gás.

No novo mercado interno do gás, que impõe à indústria a sua restruturação com vista ao desenvolvimento de um mercado integrado, no qual vão participar novas empresas num ambiente cada vez mais concorrencial, a responsabilidade global pela segurança do aprovisionamento já não será necessariamente assumida por um único operador. A questão é tanto mais importante devido ao aumento sensível da dependência do sector do gás relativamente às importações que se verificará nas próximas décadas. A segurança do aprovisionamento no sector do gás já não poderia portanto ser deixada totalmente a cargo da indústria, que está ela própria dependente dos seus aprovisionamentos externos provenientes de um número extremamente limitado de países fornecedores.

Na quinta reunião realizada em Fevereiro de 2002 em Madrid, que reuniu os reguladores nacionais, os Estados-Membros, os operadores económicos do sector do gás, bem como a Comissão (Fórum Europeu de Regulamentação do Sector do Gás), foi aliás acordado que "no novo ambiente regulamentar do mercado interno de gás, caracterizado por uma multiplicidade de intervenientes e pela dissociação das actividades das companhias de gás integradas, a segurança do aprovisionamento já não pode ser considerada como a responsabilidade de uma só parte. Deve por conseguinte ser criada uma nova cadeia de responsabilidades em matéria de segurança do aprovisionamento e de planificação das infra-estruturas entre os poderes públicos e os diferentes intervenientes no mercado, a fim de oferecer garantias em relação a esta matéria. As obrigações devem ser atribuídas aos diferentes intervenientes de maneira clara e adequada em função do seu papel".

Impõe-se portanto a adopção de medidas harmonizadas que garantam uma acção solidária e coordenada em matéria de segurança do aprovisionamento de gás, nomeadamente de medidas relativas à armazenagem, bem como em matéria de infra-estruturas. Com efeito, a armazenagem e as infra-estruturas desempenham um papel essencial no aprovisionamento de gás da União Europeia e no funcionamento deste mercado, tanto em condições de funcionamento normal como em caso de emergência. Estas medidas "acompanharão" o processo de abertura do mercado europeu do gás, a fim de assegurar o bom funcionamento do mesmo.

Processo comunitário

A União Europeia continua a avançar no sentido da realização do mercado interno da energia. Na realidade, a UE será o maior mercado regional integrado e aberto do mundo. Neste mercado liberalizado, a União Europeia tem um papel importante a desempenhar, em termos de coordenação e de apoio aos Estados-Membros em matéria de segurança do aprovisionamento. Trata-se com efeito de assegurar o bom funcionamento do mercado e de garantir, neste contexto, um nível suficiente de segurança do aprovisionamento.

As medidas para melhorar a segurança do aprovisionamento em hidrocarbonetos terão pouco ou nenhum efeito se não se integrarem num quadro mais global constituído pelo mercado interno da energia. Estas medidas não terão um impacto positivo caso sejam contrariadas por manipulações dos preços ou caso o acesso às redes de transporte seja limitado. Por conseguinte, o mercado interno constitui a base necessária para medidas em matéria de segurança dos aprovisionamentos energéticos.

Em contrapartida, não é possível construir um mercado interno da energia se este objectivo não for acompanhado de regras em matéria de segurança dos aprovisionamentos. Os cortes de electricidade que afectaram gravemente a Califórnia em 2000 são disso um bom exemplo. Com efeito, esses cortes de electricidade não tinham por origem regras inadaptadas em matéria de segurança do aprovisionamento, sendo antes a consequência de um processo de liberalização do mercado da electricidade que não foi acompanhado por regras adequadas que teriam permitido garantir um nível suficiente de segurança do aprovisionamento. No novo ambiente concorrencial, a prioridade (a curto prazo) das empresas foi manter ou reforçar a sua posição no mercado da electricidade californiano. Em consequência, essas empresas não efectuaram os investimentos (a médio e longo prazo) que teriam sido necessários para garantir um aprovisionamento suficiente do conjunto dos consumidores.

As medidas destinadas a melhorar os aprovisionamentos de petróleo e gás devem, por conseguinte, assentar no bom funcionamento do mercado interno e, por seu lado, o mercado interno da energia deve assentar ele próprio em medidas adequadas que garantam a segurança dos aprovisionamentos. É preciso reconhecer que as legislações nacionais em vigor em matéria de segurança dos aprovisionamentos de petróleo, insuficientemente coordenadas ao nível comunitário, podem conduzir - e conduziram efectivamente - a distorções no mercado interno dos produtos petrolíferos.

Estas medidas em matéria de segurança dos aprovisionamentos devem integrar-se num mercado concorrencial do gás natural e do petróleo e abster-se de qualquer discriminação no que diz respeito aos direitos e obrigações das empresas do sector. As obrigações em matéria de segurança do aprovisionamento energético devem portanto ser definidas claramente e ser transparentes, não discriminatórias e controláveis. Estas não devem exceder o âmbito estritamente necessário com vista a resolver as dificuldades potenciais de aprovisionamento. Desta forma, provocarão a menor perturbação possível no funcionamento do mercado interno.

Existe por conseguinte uma necessidade clara de definir um quadro comunitário no âmbito do qual sejam implementadas medidas destinadas a assegurar a segurança externa dos aprovisionamentos energéticos, as quais deverão ser tão pouco restritivas quanto possível. Estas regras definirão claramente o papel e responsabilidades dos diferentes intervenientes no mercado dos hidrocarbonetos no que diz respeito à segurança dos aprovisionamentos. A falta de clareza relativamente a este papel e responsabilidades aumentará aliás o risco de uma crise do aprovisionamento energético.

De acordo com o princípio de subsidiariedade, estas regras formarão um quadro no âmbito do qual será oportuno que sejam os Estados-Membros a fixar determinadas modalidades de aplicação. Estas serão implementadas em estreita colaboração com a indústria.

É importante salientar que a construção de um mercado interno do petróleo não pode conceber-se sem ligação com o desenvolvimento das outras fontes de energia e, nomeadamente, do mercado do gás natural. O petróleo e o gás são dois produtos que fazem parte de um mesmo mercado energético. São aliás substituíveis e concorrentes em certas utilizações. Por outro lado, os preços do gás estão basicamente indexados nos preços do petróleo. Estas duas fontes de energia estão portanto intimamente ligadas.

2. Dependência energética da União Europeia

Contexto energético da União Europeia

A economia europeia assenta essencialmente nos combustíveis fósseis (petróleo, gás e carvão), perto de dois terços dos quais são importados. Estes combustíveis representam 80% do consumo energético da União Europeia. Se nada for feito, dentro de 20 a 30 anos o seu peso no balanço energético europeu acentuar-se-á e as importações elevar-se-ão a 70% das necessidades energéticas globais. A dependência energética externa da União poderá mesmo atingir, em 2020, 90% relativamente ao petróleo e 70% relativamente ao gás. É necessário igualmente ter em conta que 90% do petróleo é actualmente transportado por via marítima.

Os riscos ligados a esta enorme dependência estrutural da União relativamente a energias fósseis importadas são ainda agravados pela instabilidade política que reina em numerosos países produtores. Foi assim possível constatar várias vezes que os acontecimentos no Médio Oriente ou certas crises políticas que destabilizaram o poder político existente em países produtores podiam submeter o mercado energético a fortes pressões. Estas pressões conduzem, se não a problemas de ruptura física dos aprovisionamentos, no mínimo a fortes variações dos preços do petróleo que afectam inevitavelmente o crescimento económico dos países consumidores.

É importante salientar nesta fase que o objectivo, no âmbito de uma economia mundializada, não é em si mesmo o de aumentar ao máximo a autonomia energética ou de reduzir ao mínimo a dependência, mas sim de ter em conta os riscos inerentes ligados a esta dependência quando esta atinge níveis preocupantes.

A questão da segurança dos aprovisionamentos energéticos é essencial para a União Europeia. Com efeito, apesar de uma redução da condicionante petrolífera nas nossas economias, incentivada por crises sucessivas, o petróleo continua a ser uma componente económica vital dos Estados-Membros. A União Europeia consumirá em 2004 perto de 20% da produção mundial de petróleo.

A situação do sector dos transportes é reveladora quanto a este aspecto. Mercado dependente do petróleo a um nível de 98% - o que equivale a 67% da procura final de petróleo - este sector representa uma parte crescente da procura de energia. A intensidade energética do sector apresentou um aumento de 10 % entre 1985 e 1998. O crescimento do sector dos transportes deverá prosseguir ao ritmo anual de 2% durante a próxima década.

Quanto ao gás, este tornou-se um vector energético de largo espectro, penetrando em todos os sectores do consumo energético, nomeadamente na produção de electricidade e na co-geração, mas também - embora ainda num estado embrionário - nos transportes. Em 2020-2030, perto de metade da electricidade será produzida a partir do gás natural. Embora o gás natural surja actualmente como o produto de diversificação indispensável a um saudável equilíbrio energético dos consumos, susceptível de contribuir para uma diminuição das emissões de CO2, o seu crescimento rápido em mercados como o da electricidade pode prenunciar uma nova fraqueza estrutural da União Europeia em termos de dependência externa.

Estudos económicos estimam que um aumento de 10 dólares por barril de petróleo bruto é susceptível de produzir uma redução da taxa de crescimento económico dos países industrializados da ordem de 0,5%. Nos países em desenvolvimento, um tal aumento de preços representaria uma redução do crescimento económico da ordem de 0,75%. É igualmente necessário ter em conta o facto de o impacto dos preços do petróleo no crescimento económico não ser linear: aumentos bruscos dos preços, inesperados e de amplitude muito grande são susceptíveis de causar prejuízos na economia bem mais importantes que as estimativas supramencionadas. É de resto interessante verificar que as reduções importantes do crescimento económico nos Estados Unidos e na Europa foram todas precedidas, desde 1973, de aumentos brutais dos preços do petróleo bruto.

Por último, a instabilidade dos aprovisionamentos energéticos, esteja ela ligada à volatilidade dos preços, às relações com os países fornecedores ou a qualquer acontecimento fortuito, pode ser fonte de "ruptura social". Esta ruptura pode dar lugar a reivindicações sociais, a reacções corporativistas ou a mesmo conflitos. De salientar que as duas primeiras crises petrolíferas contribuíram para um forte aumento do desemprego. Neste contexto, seria inútil pretender construir um mercado interno entre os operadores económicos, cujo objectivo é de aumentar a eficácia da economia europeia, se este mercado não assentar em princípios que garantam a coesão social. Disso é prova a greve das transportadoras rodoviárias que afectou numerosos países da Europa no Outono de 2000, na sequência de um forte aumento dos preços do petróleo. Daí resultou uma grande desordem no plano fiscal, na medida em que os Estados-Membros tentaram amortecer os efeitos do aumento dos preços da energia nos sectores económicos através de reduções não coordenadas da tributação. Estas iniciativas individuais constituem um travão importante ao bom funcionamento do mercado interno, em especial no que diz respeito a uma política comum e coordenada dos transportes.

A realização do mercado interno integra, como o recordou o Conselho Europeu de Barcelona, a segurança dos aprovisionamentos energéticos da União Europeia. Este objectivo contribuirá para assegurar - tendo em vista o bem-estar dos cidadãos e o bom funcionamento da economia - a disponibilidade física e contínua de produtos energéticos no mercado, a um preço acessível para todos os consumidores, privados ou industriais.

Riscos

Neste contexto de dependência energética, a União Europeia deve enfrentar dois tipos de riscos no domínio da energia:

* Riscos físicos A ruptura física permanente pode resultar do esgotamento ou do abandono da produção de uma fonte de energia. Não é de excluir que, a prazo, a União Europeia acabará por não dispor de recursos comunitários significativos de hidrocarbonetos a custos razoáveis. De facto, os peritos consideram que as reservas de petróleo do Mar do Norte se deverão esgotar progressivamente até 2030-2050. Não é demais recordar quanto a esse aspecto o exemplo do carvão, cuja produção está a ser progressivamente abandonada nos Estados-Membros. Além disso, a União Europeia está muito sujeita a um risco de ruptura física temporária que pode resultar de acidentes graves nas infra-estruturas de transporte e de armazenagem, situadas dentro ou fora da Comunidade, que são importantes para a segurança e a continuidade dos aprovisionamento comunitários. Por outro lado, um acontecimento, por exemplo, de natureza política e/ou militar numa região de produção ou de trânsito de petróleo pode provocar, em qualquer momento, uma ruptura física temporária do aprovisionamento petrolífero mundial.

* Riscos económicos Um risco económico tem por origem a volatilidade dos mercados. Esta volatilidade pode ser nomeadamente provocada por uma ameaça de ruptura física dos aprovisionamentos. Com efeito, a análise da evolução dos mercados energéticos revela, à margem das rupturas físicas do aprovisionamento, uma outra fonte de preocupação: os movimentos de antecipação de uma ruptura potencial dos aprovisionamentos. A "percepção generalizada" por parte dos operadores de um risco de ruptura potencial futura provoca, com efeito, compras desencadeadas pelo pânico, mesmo quando existe um equilíbrio aparente da oferta e da procura. Daí resultam fortes aumentos de preços, que afectam directamente os custos das empresas, bem como o poder de compra dos consumidores privados. Estes riscos do mercado internacional são susceptíveis de pôr em causa, em qualquer momento, o crescimento da economia europeia, com graves consequências para o emprego. Na experiência recente no período entre 1998 e 2000, durante a qual se verificou uma redução ténue da oferta de petróleo de 3%, observou-se um aumento muito forte dos preços, de 10 dólares por barril até - em certos momentos - 37 dólares por barril. Pode-se considerar que uma tal amplitude de preços representa, se transposta para um ano, um agravamento do peso da factura de petróleo da ordem de 100 mil milhões de euros. Actualmente o principal risco em matéria energética é aliás de natureza económica. Uma ruptura efectiva do aprovisionamento, embora não possa ser totalmente posta de parte, só poderia resultar de circunstâncias excepcionais como um conflito importante numa zona de produção de hidrocarbonetos. O risco económico passou por conseguinte a ser o verdadeiro desafio, dado que os aumentos de preços afectam directamente os custos das empresas, bem como o poder de compra dos consumidores privados.

3. Meios de acção adequados

É vital gerir da melhor forma possível a dependência energética da União Europeia, na medida em que a boa gestão da mesma contribuirá para a construção do mercado interno da energia.

Em matéria de controlo da procura de energia, e indo mais longe do que meras propostas de incentivo ou de intercâmbio de boas práticas, a Comissão já apresentou propostas de natureza regulamentar, algumas das quais foram adoptadas pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu. Trata-se nomeadamente da directiva sobre a produção de electricidade a partir de fontes renováveis, da directiva sobre a poupança de energia no sector da construção ou do pacote sobre biocombustíveis. A aplicação destes diplomas implicará uma poupança, em termos de consumo de energias convencionais, da ordem de 10% nos próximos anos e permitirá limitar a tendência ascendente da procura de energia na União Europeia sob o efeito de um consumo acrescido por parte das famílias e do sector terciário.

No que diz respeito à oferta, o debate no âmbito do Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético revelou que a União Europeia não dispõe de meios para actuar sobre as condições da oferta de hidrocarbonetos. Revelou também os perigos para a União Europeia resultantes de uma ruptura do aprovisionamento, salientou as fraquezas estruturais dos nossos aprovisionamentos energéticos e as suas fragilidades geopolíticas, económicas e sociais. O Livro Verde salientou, mesmo antes dos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, a necessidade de integrar no conceito de segurança do aprovisionamento as questões ligadas à segurança técnica das instalações.

De acordo com a posição tomada pela União Europeia na recente Cimeira Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável realizada em Joanesburgo, neste contexto a produção interna de energias renováveis de um Estado-Membro tem como resultado um impacto positivo na segurança do aprovisionamento energético e reduz a quantidade que o Estado é obrigado a deter como existências estratégicas de gás ou de petróleo.

Harmonização insuficiente das medidas comunitárias sobre as existências de petróleo

Três directivas comunitárias organizam a constituição de reservas nacionais de petróleo bruto e de produtos petrolíferos pelos Estados-Membros. Os Estados-Membros devem manter um nível de existências equivalente a 90 dias de consumo para cada uma das três categorias principais de produtos petrolíferos de uso energético. Os Estados-Membros têm, por outro lado, a obrigação de estar preparados para actuar em caso de risco de ruptura física, ou seja de se dotarem de planos de intervenção, de órgãos adequados e de poderes que permitam, nomeadamente, colocar as existências nos mercados e restringir o consumo, assegurar o aprovisionamento dos consumidores prioritários e regulamentar os preços.

Em caso de crise, a Comissão Europeia pode, a pedido de um Estado ou por sua própria iniciativa, fixar um objectivo em termos de redução do consumo. A Comissão não dispõe todavia de nenhum poder para impor uma desarmazenagem. A decisão de desbloqueamento das existências de petróleo é da competência dos Estados, embora seja organizada uma consulta a nível comunitário para fins de coordenação. Caberá finalmente a cada Estado apreciar se é conveniente adoptar medidas de desarmazenagem. Para além do facto de as medidas tomadas individualmente por cada Estado serem fonte de desordem no mercado interno, estas iniciativas não coordenadas terão pouco ou nenhum efeito tendo em conta a dimensão do mercado petrolífero.

Não existe por conseguinte um mecanismo comunitário de utilização das existências de petróleo que crie uma solidariedade entre os Estados que participam num mesmo mercado interno, em caso de problemas no aprovisionamento.

Por outro lado, na maior parte dos países da União - e ao contrário da "reserva estratégica de petróleo" (Strategic Petroleum Reserve) dos Estados Unidos, cujas existências são detidas pelos poderes públicos - as existências de segurança são detidas pelas companhias petrolíferas e confundidas com as suas existências de exploração. Poucos foram os Estados-Membros que criaram organismos ad-hoc responsáveis pela detenção de existências de segurança. Esta fragmentação dos mecanismos de armazenagem põe em perigo o bom funcionamento do mercado interno da energia. É fonte de distorções da concorrência entre os operadores refinadores e os operadores não refinadores que dispõem de pequenas existências de exploração. Por outro lado, a quantidade de produtos petrolíferos efectivamente à disposição dos Estados-Membros em caso de crise, ou seja efectivamente mobilizável a curto prazo, é muito incerta na medida em que as existências de segurança dos operadores se confundem com as suas existências de exploração. De salientar quanto a este aspecto que as existências da "reserva estratégica de petróleo" se elevam actualmente a 545 milhões de barris e que os Estados Unidos decidiram aumentar progressivamente o seu volume para 700 milhões de barris até 2004.

Por último, a legislação comunitária em vigor não prevê regras harmonizadas de utilização das existências de segurança a não ser em caso de ruptura física no aprovisionamento de petróleo. Trata-se de um instrumento de gestão de uma escassez física existente, que não está de forma alguma vocacionado para enfrentar a volatilidade dos mercados. Esta volatilidade dos mercados, que tem nomeadamente por origem fenómenos de antecipação de uma possível ruptura física dos aprovisionamentos, é susceptível de afectar gravemente o crescimento das nossas economias.

Pode-se assim compreender, em relação à inadequação do sistema comunitário em matéria de existências de segurança de petróleo - face ao contexto energético e à evolução do mercado interno da energia - que este sistema nunca tenha funcionado. Importa portanto definir regras que contribuirão para uma aproximação das disposições nacionais e que assegurarão, em caso de crise ou de ameaça de crise do aprovisionamento em petróleo, a solidariedade e a unidade de acção necessárias para o bom funcionamento do mercado interno.

Insuficiência do enquadramento da Agência Internacional da Energia

O tratado que cria a Agência Internacional da Energia (AIE) consagra que os Estados participantes têm a obrigação de manter existências equivalentes a 90 dias de importações líquidas de petróleo ou de produtos petrolíferos. Prevê um mecanismo de reacção em caso de crise do aprovisionamento, nomeadamente, por um lado, uma obrigação de redução do consumo caso seja ultrapassado um determinado limiar de ruptura do aprovisionamento e, por outro lado, um procedimento de desarmazenagem e de distribuição do petróleo disponível pelos Estados participantes.

No início da década de 1980, a AIE considerou que os mecanismos do Tratado de 1974 já não estavam adaptados ao desenvolvimento do mercado do petróleo. O Conselho de Direcção da AIE criou um outro mecanismo de crise - o CERM (medidas coordenadas de resposta a emergências - Coordinated Emergency Response Measures) - a fim de permitir um recurso mais simples à desarmazenagem. Todas as decisões tomadas no âmbito do CERM implicam todavia a unanimidade do Conselho de Direcção composto por representantes dos 26 países participantes, cuja origem geográfica e interesses são por vezes muito diferentes, o que não facilita a procura de um consenso (figuram nomeadamente entre os países participantes os Estados Unidos da América, a Austrália, o Japão e a Coreia). Tendo em conta a ausência de um critério claro de activação deste mecanismo, bem como as divergências entre os Estados participantes, os riscos de bloqueio são evidentes.

Com efeito, o CERM foi utilizado apenas uma vez, mais de cinco meses após o desencadeamento da Guerra do Golfo, na sequência da invasão do Kuwait pelo Iraque, quando os preços do petróleo já tinham atingido os píncaros e já se tinham verificado os efeitos negativos nas economias dos países consumidores de petróleo.

Por outro lado, os mecanismos da AIE ligam a gestão das existências de petróleo da União Europeia à gestão de numerosos parceiros externos (26 Estados), cujas prioridades não são necessariamente concordantes com as da União. Por outro lado, é preciso destacar que a criação progressiva de um mercado interno da energia, tal como existe entre os Estados-Membros da União Europeia, constitui uma realização única no seu género. Nenhum outro país da AIE, incluindo os Estados Unidos, conseguiu desenvolver um sistema tão integrado.

Na situação actual do Tratado da AIE, até mesmo uma acção de desarmazenagem considerada por um grupo de países maioritários na AIE - por exemplo os países da União Europeia - poderia, tendo em conta a regra de unanimidade que rege os trabalhos do CERM, ser bloqueada por um só país. Os mecanismos criados no âmbito da AIE não permitem, por conseguinte, dotar a União Europeia, segunda potência económica mundial, do seu próprio poder de decisão num domínio tão estratégico como a energia e garantir um bom funcionamento do seu mercado interno.

Por último, tal como a legislação comunitária actual, os mecanismos da AIE foram criados apenas tendo em vista uma eventual ruptura física dos aprovisionamentos de petróleo. Os elementos básicos deste dispositivo, que datam de 1974, foram criados para responder a medidas do tipo embargo que haviam sido decididas pela OPEP em relação a certos países industrializados, no contexto político difícil do final do ano de 1973 no Médio Oriente. Este contexto está longe do que conhecemos actualmente.

Ausência de medidas coordenadas em matéria de aprovisionamento em gás

Tendo em conta a importância estratégica que o gás natural assumirá no futuro, impõe-se uma abordagem inovadora na medida em que não existe actualmente nenhum quadro comunitário que harmonize as medidas que devem garantir um nível mínimo de segurança dos aprovisionamentos em gás da União Europeia. É de assinalar quanto a esse aspecto que a AIE não prevê igualmente nenhuma acção específica destinada a garantir o aprovisionamento externo de gás dos Estados participantes. Ora, é preciso não esquecer que 40% do gás importado pela União Europeia depende de 3 fontes principais de aprovisionamento. Além disso, desde 1995 que a produção de electricidade a partir do gás representa anualmente 50 a 60% dos novos investimentos em produção de electricidade da União Europeia. A segurança do aprovisionamento em gás é por conseguinte especialmente importante para assegurar a continuidade da produção de electricidade.

A indústria europeia do gás conseguiu garantir a segurança do aprovisionamento num mercado europeu de gás em progressão constante nos últimos 40 anos. Todavia, verificam-se neste momento mudanças rápidas no mercado europeu do gás e o papel dos intervenientes tradicionais no mercado evolui igualmente.

Até à data, o trabalho de planificação e de desenvolvimento da rede de gás com vista a atingir os objectivos em matéria de segurança - frequentemente definidos pela própria indústria do gás - era relativamente simples, dado que os principais fornecedores detinham toda a infra-estrutura, os dados relativos à oferta e à procura de gás, as informações e os outros instrumentos necessários para efectuar essa planificação. Por outro lado, a intervenção directa do Estado era menos necessária pelo facto de as companhias de gás nacionais responsáveis pela segurança do aprovisionamento pertencerem frequentemente ao Estado, em parte ou na totalidade.

No novo mercado do gás liberalizado, nenhum operador será necessariamente o único responsável pela segurança, a curto e a mais longo prazo, do aprovisionamento de gás a nível nacional, devido à restruturação da indústria, à integração dos mercados nacionais, ao aparecimento de novas empresas e ao reforço da concorrência. As políticas e procedimentos em matéria de segurança do aprovisionamento devem ser, desde já, revistas e formalizadas neste novo contexto. Com efeito, num mercado concorrencial, não é certo que os fornecedores de gás darão prioridade estratégica à segurança do aprovisionamento, dado que a competitividade se torna cada vez mais o objectivo principal das companhias de gás.

A organização da segurança do aprovisionamento em gás não pode, por conseguinte, continuar a ser confiada unicamente à indústria. É necessário um novo quadro legislativo, com vista a garantir que todos os intervenientes no mercado tomem um mínimo de medidas para assegurar a realização deste objectivo.

É necessário acrescentar que é extremamente importante evitar, num mercado em evolução rápida, qualquer incerteza em matéria de responsabilidade pela segurança do aprovisionamento. A falta de clareza aumentará, com efeito, o risco de crise do aprovisionamento.

Embora a indústria do gás deva continuar a assumir a responsabilidade pela exploração, a Comunidade Europeia tem doravante um papel essencial de coordenação e de apoio em matéria de segurança energética no sector do gás. O papel da Comunidade consiste em assegurar o bom funcionamento do mercado interno e em dar aos intervenientes no mercado pontos de referência exactos que lhes permitam interpretar e gerir a mudança, garantindo ao mesmo tempo um nível suficiente de segurança do aprovisionamento em gás.

Tal como acontece com o petróleo, é portanto necessário tomar medidas mínimas para assegurar o bom funcionamento do mercado interno do gás. Tal passa por medidas harmonizadas que garantirão uma acção solidária e coordenada dos Estados-Membros em caso de crise do aprovisionamento.

4. A solução: Um quadro comunitário

Como recordava o Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético, os Estados-Membros são interdependentes tanto quanto às questões de luta contra as alterações climáticas como de realização do mercado interno da energia. Qualquer decisão em matéria de política energética, em especial de aprovisionamento em hidrocarbonetos, tomada por um Estado-Membro terá inevitavelmente repercussões no funcionamento do mercado nos outros Estados-Membros. Do mesmo modo, as operações desenvolvidas pelas empresas, facilitadas para tal pela criação progressiva de um mercado interno da energia, já não se limitam a um território nacional.

Por outro lado, uma reacção isolada de um Estado a uma modificação das condições do aprovisionamento em hidrocarbonetos terá pouco ou nenhum efeito real. Uma resposta coordenada do conjunto dos Estados-Membros, num quadro de solidariedade, constitui o único meio para encontrar soluções eficazes e úteis com vista a garantir um nível adequado de segurança, de segurança técnica/e de prevenção de crises e de acidentes graves.

Além disso, a União Europeia está empenhada num processo político fundamental que é o do seu alargamento. Perante este desafio, a UE não poderia manter o impasse quanto à gestão correcta de uma das suas necessidades vitais, nomeadamente o aprovisionamento em hidrocarbonetos.

Em consequência, nos termos previstos no artigo 5.º do Tratado CE, os objectivos da presente acção não podem ser suficientemente realizados pelos Estados-Membros e podem pois, devido à dimensão ou aos efeitos da acção proposta, ser melhor alcançados ao nível comunitário.

O Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético já considerara globalmente diferentes propostas:

* Exame das modalidades de um reforço do mecanismo de reservas de petróleo através da "comunitarização" da sua utilização;

* Possibilidade de alargamento do mecanismo de reservas de petróleo às reservas de gás natural;

* Necessidade de organizar um diálogo permanente com os países produtores que permita melhorar os mecanismos de formação de preços, a conclusão de acordos e o uso de existências de reserva no interesse mútuo;

* Reforço da integração e da diversificação das redes de aprovisionamento, bem como a garantia da sua segurança e da sua segurança técnica.

Na sua comunicação de 26 de Junho de 2002 ao Parlamento Europeu e ao Conselho, sobre o relatório final relativo ao Livro Verde sobre a segurança de aprovisionamento energético, a Comissão referiu que "as incertezas geopolíticas e a volatilidade dos preços do petróleo colocam a questão de uma melhor organização das reservas e da coordenação da sua utilização".

Objectivos a atingir

As medidas a levar a cabo, que deverão contribuir para o bom funcionamento do mercado interno da energia, visarão, numa lógica comunitária:

* Promover uma solidariedade entre os Estados-Membros da União Europeia em caso de crise energética, através da criação de medidas e mecanismos definidos antecipadamente que garantam uma acção coordenada;

* Gerir a segurança dos aprovisionamentos, prevendo mecanismos adequados que permitam dominar uma situação de ruptura física dos aprovisionamentos energéticos;

* Gerir a segurança dos aprovisionamentos e das infra-estruturas, prevendo medidas de segurança que assegurarão um máximo de fiabilidade dos fluxos de aprovisionamento provenientes dos países produtores;

* Promover a estabilidade dos mercados, em consulta com os países produtores, prevendo possíveis medidas de reacção quando os mercados antecipam uma ruptura física do aprovisionamento, a fim de restabelecer o bom funcionamento do mercado.

Estes objectivos devem ser realizados no âmbito de um mercado interno da energia, no âmbito do qual a Comissão tomará as medidas necessárias para garantir condições de concorrência equitativas. Com efeito, as medidas destinadas a melhorar o aprovisionamento em hidrocarbonetos terão pouco ou nenhum impacto positivo caso sejam contrariadas por manipulações dos preços ou caso o acesso às redes de transporte seja limitado.

Deste modo, as medidas destinadas a melhorar a segurança dos aprovisionamentos não deverão ser de modo a criar obstáculos à entrada de novos operadores no mercado europeu da energia ou a dificultar as actividades das empresas que dispõem de pequenas quotas de mercado. Será igualmente necessário velar por que a regulamentação implementada pelos Estados-Membros garanta a aplicação de condições equitativas e não discriminatórias em matéria de armazenagem, nomeadamente no que diz respeito à construção de instalações de armazenagem e ao acesso às capacidades de armazenagem.

Tendo em conta estes objectivos, e com base nas reflexões apresentadas no Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético, devem ser tomadas várias iniciativas a nível comunitário.

Harmonização da organização e promoção da utilização coordenada das existências de petróleo

1. Harmonização dos sistemas nacionais de armazenagem

Alguns Estados-Membros criaram organismos ad-hoc responsáveis pela detenção da totalidade ou de uma parte das existências de segurança. Noutros Estados, as existências são detidas pelos operadores privados.

Esta fragmentação dos mecanismos de armazenagem põe em perigo o bom funcionamento do mercado interno da energia. Com efeito, os distribuidores independentes ou os importadores de produtos refinados, que necessitam de existências de exploração limitadas, consideram que as obrigações de armazenagem constituem um custo líquido a seu cargo, enquanto as empresas de refinação disporiam de qualquer modo de existências para fins de exploração, mesmo na ausência da obrigação de armazenagem para fins de segurança. As obrigações de armazenagem podem, por conseguinte, ser fonte de distorção da concorrência. A fim de obviar a esta situação, todos os Estados-Membros deverão criar um organismo público para detenção das existências de petróleo, que deverá ser proprietário de existências que representem, pelo menos, um terço das obrigações previstas na matéria. Esta aproximação muito parcial e ainda insuficiente da regulamentação relativa a armazenagem nos Estados-Membros contribuirá para o melhor funcionamento do mercado interno, através do estabelecimento de regras que assegurarão uma melhor concorrência entre os operadores económicos. Com efeito, a criação de um organismo central para fins de armazenagem estratégica permitirá a esses distribuidores independentes ou aos importadores de produtos refinados não constituírem eles próprios essas reservas. Estes poderão dar cumprimento à sua obrigação de armazenagem através deste organismo, mediante o pagamento de uma remuneração equitativa. Estas condições de concorrência leal entre os diferentes tipos de operadores petrolíferos permitirão assegurar a manutenção de uma diversidade das fontes de aprovisionamento no mercado e, por conseguinte, contribuirão elas próprias para melhorar as condições de aprovisionamento dos consumidores.

É necessário aliás constatar que as existências de segurança apresentam actualmente uma grande falta de visibilidade e, por conseguinte, de credibilidade. Com efeito, as existências de exploração da indústria podem ser tidas em conta no âmbito da obrigação de manutenção de existências mínimas de segurança. As existências detidas em suplemento das existências de exploração, para os fins específicos de segurança do aprovisionamento, são desde logo muito difíceis de identificar. A detenção de uma parte das existências por um organismo central permitirá corrigir esta falta de visibilidade das existências de segurança e garantirá uma mobilização efectiva e eficaz dessas existências em caso de crise.

2. Utilização coordenada das existências de segurança

A legislação comunitária prevê apenas, no que diz respeito a uma acção de desarmazenagem, um simples procedimento de consultas mútuas entre peritos dos Estados-Membros, sob a égide da Comissão Europeia. Cada Estado pode portanto levar a cabo as medidas de desarmazenagem que entender.

Quanto ao mecanismo actualmente utilizado pela AIE (o CERM), é de salientar que este está sujeito à regra de unanimidade dos 26 países participantes. Por outro lado, mesmo no caso de desencadeamento de uma acção sob a égide da AIE, a grande latitude permitida aos Estados no que diz respeito ao modo como podem dar o seu contributo para a gestão da crise resulta numa falta flagrante de unidade de acção.

No futuro, é necessário que a Comunidade Europeia esteja em posição de decidir sobre uma estratégia comum que seja implementada pelo conjunto dos Estados-Membros a fim de responder eficazmente a uma ruptura física ou económica dos aprovisionamentos em petróleo. Esta estratégia especificará as medidas a tomar, os seus objectivos, a sua duração e os meios que os Estados-Membros deverão disponibilizar.

Para ser eficaz, a acção a tomar em resposta a uma ruptura no aprovisionamento em petróleo, ou a uma ameaça de ruptura que produza uma volatilidade nos mercados (risco económico), deve ser rápida. Portanto, em caso de necessidade imperiosa ligada à evolução do mercado do petróleo, a Comissão Europeia estará habilitada a tomar de urgência as medidas que se imponham, tendo em conta os objectivos gerais dos mecanismos de utilização das existências de segurança. A Comissão será assistida por um comité composto por representantes dos Estados-Membros e presidido por um representante da Comissão.

3. Harmonização dos critérios de intervenção

A legislação comunitária em vigor não prevê regras de utilização das existências de segurança a não ser em caso de ruptura física do aprovisionamento em petróleo. Trata-se de um instrumento de gestão destinado a enfrentar uma escassez física existente, que não permite reagir em caso de volatilidade dos mercados que tenha origem em fenómenos de antecipação de uma ruptura física do aprovisionamento.

A análise dos fenómenos de volatilidade dos mercados demonstra, com efeito, que a percepção pelos operadores de um risco de ruptura potencial futura provoca compras desencadeadas pelo pânico, mesmo quando existe um equilíbrio aparente entre a oferta e a procura. Além disso, o impacto dos operadores "não comerciais" terá como efeito acelerar e acentuar os efeitos nos preços decorrentes desta percepção de ruptura física.

Para além do critério clássico de intervenção das existências, nomeadamente em caso de ruptura física no aprovisionamento de petróleo, é necessário também estabelecer regras comuns para a utilização das existências de segurança, a fim de reagir de forma unificada e solidária em caso de risco económico, mais precisamente em caso de percepção generalizada de um risco de ruptura física que gere uma volatilidade dos mercados. Com efeito, acções individuais dos Estados-Membros iriam contra os objectivos do mercado interno e seriam, por outro lado, ineficazes para restabelecer uma maior liquidez do mercado do petróleo. Regras comuns contribuirão para garantir, em caso de crise, a solidariedade e a unidade de acção necessárias ao bom funcionamento do mercado interno.

Qualquer decisão de acção da Comissão será fundamentada numa convergência de factores que terão em conta as circunstâncias exactas da situação de crise energética. É evidente que o "preço" será um dos elementos fundamentais para definir uma situação de risco económico, dado que a percepção de uma ruptura do aprovisionamento terá repercussões nos preços. Neste contexto, é necessário considerar que o limiar de "alerta" potencial será atingido quando o preço do petróleo bruto nos mercados a pronto pagamento for tal que, em caso de manutenção do preço a esse nível durante 12 meses, a factura externa de petróleo da União Europeia durante os 12 meses seguintes seria aumentada num montante equivalente a mais de meio por cento do Produto Interno Bruto da União Europeia do ano precedente, relativamente à factura externa média de petróleo no decurso dos 5 anos anteriores. Por exemplo, nas circunstâncias actuais (ano 2002), os mecanismos comunitários poderiam ser aplicados pela Comissão caso fosse excedido um limiar de 30 dólares por barril de Brent (o que corresponde a um limiar cerca de 28 dólares para o cabaz OPEP).

Este limiar de alerta constitui uma condição necessária, mas não suficiente, para actuar em caso de percepção generalizada de um risco de ruptura do aprovisionamento: o facto de o limiar ser ultrapassado dá simplesmente início a uma fase de análise pela Comissão do conjunto dos elementos que contribuem para a crise, muito especialmente a natureza, a duração e a amplitude dos elementos que estão na origem dessa crise. Qualquer decisão relativa à oportunidade de uma acção será, com efeito, baseada numa convergência de vários factores, os quais permitirão concluir em que medida existe uma ameaça de ruptura dos aprovisionamentos que justifique uma reacção.

Neste novo contexto, no qual os mecanismos de utilização das existências de segurança assumirão uma importância cada vez maior, será conveniente aumentar o volume dessas existências. O actual volume mínimo de 90 dias de consumo deverá, a fim de permitir a aplicação eficaz e credível das medidas de crise, passar para 120 dias de consumo. Este aumento das existências far-se-á de maneira progressiva, tendo em conta nomeadamente as possibilidades de desenvolvimento das capacidades de armazenagem necessárias. De salientar que a média comunitária de existências de segurança se situa actualmente em cerca de 114 dias de consumo.

Quanto a este aspecto, será igualmente necessário ter em conta a situação dos países em fase de adesão à União Europeia. Se nos reportarmos ao estado actual das negociações de adesão, foram já acordados períodos transitórios com a maioria dos países candidatos até 31 de Dezembro de 2009, o que lhes permitirá constituir progressivamente existências de segurança equivalentes a 90 dias de consumo. A Comissão espera que os novos Estados-Membros adiram ao princípio de constituição de existências de segurança de um volume equivalente a 120 dias de consumo. A Comissão reconhece todavia que, em casos devidamente justificados, será necessário permitir uma introdução progressiva das novas disposições que visam reforçar as existências de petróleo, para além dos períodos transitórios já acordados.

Harmonização das medidas mínimas para a segurança dos aprovisionamento em gás

Embora as condições de armazenagem do gás sejam diferentes das condições de armazenagem do petróleo e dos produtos petrolíferos, incluindo ao nível técnico, a verdade é que o mecanismo de fixação dos preços do gás está ligado aos preços do petróleo, através de um sistema de indexação do primeiro em relação ao segundo. Os problemas que se colocam em termos de segurança do aprovisionamento, e as soluções a dar-lhes, são portanto semelhantes para estas duas fontes de energia. Daí a importância de estabelecer, como acontece com o petróleo, medidas harmonizadas que prevejam um certo nível de existências de gás, bem como capacidades de desbloqueio dessas existências. Estas novas medidas integrar-se-ão nas disposições já previstas na legislação comunitária que visam conceder a terceiros um acesso às existências de gás.

1. Definição de uma política de aprovisionamento e de clarificação das responsabilidades

A maior parte dos Estados-Membros não dispõe actualmente de uma abordagem muito coerente destinada a garantir a segurança do aprovisionamento em gás no mercado interno. É por conseguinte necessário, antes de ser adoptada qualquer outra medida, que os Estados-Membros tomem as disposições necessárias para definir uma política geral em matéria de segurança do aprovisionamento em gás. Esta política, que deve contribuir para o bom funcionamento do novo mercado aberto do gás, implica uma definição clara do papel e responsabilidades dos diferentes intervenientes no mercado em matéria de segurança do aprovisionamento.

Ao desenvolverem essa política geral de segurança do aprovisionamento, os Estados terão especialmente em conta, nomeadamente, a importância de assegurar a continuidade dos aprovisionamentos de gás em condições difíceis, mais particularmente aos consumidores que não têm possibilidade de utilização de outra fonte de energia, a necessidade de assegurar níveis adequados de armazenagem de gás ou de combustíveis de substituição, a necessidade de diversificação dos aprovisionamentos e de garantia de um equilíbrio entre as diferentes fontes de aprovisionamento em gás.

Esta política dos Estados-Membros deverá ser transparente. Para esse efeito, os Estados-Membros e a Comissão elaborarão regularmente relatórios que exporão, designadamente, os mecanismos criados para situações de emergência e imprevistos, a fim de atenuar uma crise no mercado do gás, os níveis das existências e as medidas tomadas ou a tomar para atingir os objectivos de armazenagem indicativos. A Comissão avaliará igualmente o grau de harmonização das medidas em matéria de segurança do aprovisionamento e o seu contributo para o funcionamento do mercado interno do gás.

2. Harmonização das normas mínimas de segurança do aprovisionamento em gás

Os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias de modo a que o aprovisionamento dos consumidores ininterruptíveis, que não estão em condições de substituir o gás por um outro combustível, seja assegurado em caso de perturbação na fonte de aprovisionamento de gás individualmente mais importante, durante sessenta dias em condições meteorológicas médias. Os Estados-Membros tomarão igualmente medidas harmonizadas para garantir, no novo mercado aberto do gás, a segurança do aprovisionamento em caso de ocorrência de temperaturas extremamente baixas.

Estas normas de segurança do aprovisionamento serão aplicadas através de instrumentos que os Estados utilizarão em função das circunstâncias da crise de aprovisionamento e das especificidades do mercado nacional do gás de cada Estado-Membro.

Entre as medidas a levar a cabo em resposta a uma ruptura do aprovisionamento, os Estados-Membros tomarão as disposições necessárias destinadas a assegurar que as existências de gás contribuam, com um nível mínimo, para atingir as normas de segurança do aprovisionamento. A criação ou a manutenção de um nível mínimo harmonizado de existências de gás terá em conta as possibilidades geológicas e económicas de armazenagem dos Estados-Membros. Com efeito, em alguns Estados-Membros os locais geológicos disponíveis para a construção de novas instalações subterrâneas de armazenagem de gás são limitados ou inexistentes.

3. Utilização coordenada de medidas de crise - Existências de gás

Uma reacção não coordenada dos Estados-Membros em caso de crise energética é susceptível de pôr em causa o bom funcionamento do mercado interno do gás. Para o bom funcionamento do mercado interno do gás e para a segurança do aprovisionamento é essencial a solidariedade entre os Estados-Membros em situações de aprovisionamento extraordinárias. Devem portanto ser criados mecanismos que permitam a aplicação coordenada a nível comunitário de medidas destinadas a enfrentar tais situações.

Desde logo, caberá à Comissão, em função da gravidade da situação, a missão de actuar de modo a que sejam levadas a cabo as medidas necessárias para fornecer uma assistência específica aos Estados-Membros particularmente afectados pela interrupção do aprovisionamento em gás. Neste contexto, e tendo em conta as especificidades do mercado do gás natural, parece oportuno prever um duplo mecanismo de intervenção.

Em caso de situação extraordinária de aprovisionamento em gás, nomeadamente uma interrupção grave do fornecimento de gás por parte de um dos principais fornecedores da União Europeia, a Comissão poderá formular recomendações a fim de exortar os Estados-Membros a tomarem as medidas necessárias para prestarem uma assistência específica aos Estados-Membros particularmente afectados por essa interrupção do aprovisionamento.

Caso as medidas tomadas pelos Estados-Membros sejam inadequadas tendo em conta a evolução do mercado ou caso as consequências económicas da situação extraordinária de aprovisionamento em gás se tornem extremamente graves, a Comissão poderá, através de uma decisão, obrigar os Estados-Membros a tomar medidas específicas para a prestação da assistência necessária aos Estados-Membros particularmente afectados pela interrupção do aprovisionamento em gás.

Estas medidas que serão objecto, em função das circunstâncias, quer de uma recomendação, quer de uma decisão da Comissão, poderão incluir o desbloqueio das existências de gás, a disponibilização de gasodutos para encaminhamento do gás para as regiões afectadas, a interrupção da procura interruptível, a fim de permitir a redistribuição do gás e de assegurar a flexibilidade do sistema, e os mercados a pronto pagamento.

A exemplo das medidas a tomar em matéria de existências de segurança de petróleo, a Comissão será assistida por um Comité composto por representantes dos Estados-Membros.

O novo quadro comunitário não prevê nesta fase, como acontece com as existências de petróleo, a fixação harmonizada de quantidades mínimas de existências de gás que os Estados-Membros deveriam deter a fim de garantir a segurança dos aprovisionamentos. No entanto, o novo quadro introduz requisitos quantitativos quanto às normas de segurança do aprovisionamento. Assim, o novo quadro comunitário exige nomeadamente que os Estados-Membros definam o modo como garantirão que os clientes que não têm possibilidade de mudar para combustíveis de substituição continuarão a ser abastecidos durante 60 dias em caso de falha do maior fornecedor no mercado em causa. A fim de dar cumprimento a esta obrigação de garantia do aprovisionamento durante 60 dias, cada Estado deverá implementar uma combinação de medidas, combinação essa que incluirá a armazenagem de gás, mas igualmente a interrupção da procura interruptível, a fim de permitir a redistribuição do gás e de assegurar a flexibilidade do sistema e a flexibilidade do aprovisionamento, bem como os mercados a pronto pagamento.

Esta combinação de diferentes medidas permitirá a cada Estado-Membro garantir uma segurança do aprovisionamento em gás equivalente à segurança do aprovisionamento em petróleo, para a qual contribuem as medidas obrigatórias de armazenagem de petróleo, tendo simultaneamente em conta as características próprias do mercado do gás. Com efeito, nem todos Estados-Membros têm a possibilidade de constituir existências subterrâneas devido a condições geológicas desfavoráveis, estando alguns países mesmo impossibilitados de proceder à armazenagem de gás por falta de locais apropriados.

Todavia, dada a importância da armazenagem entre as diferentes medidas que podem ser levadas a cabo, está previsto que os Estados-Membros deverão determinar os objectivos indicativos nacionais com vista a uma contribuição mínima da armazenagem de gás para as normas em matéria de segurança do aprovisionamento. Estes locais de armazenagem poderão estar situados nos Estados-Membros ou fora do respectivo território.

De salientar que as medidas em matéria de armazenagem de gás, como aliás as obrigações em matéria de armazenagem de petróleo, em nada prejudicam as medidas que poderão ser tomadas de outra forma no que respeita à segurança das instalações de armazenagem.

4. Contratos de aprovisionamento

Os contratos de aprovisionamento a longo prazo desempenharam um papel fundamental no desenvolvimento do mercado europeu do gás. São indispensáveis ao lançamento de projectos de investimento em grande escala para o desenvolvimento de jazidas e de projectos de infra-estrutura a grande distância. Aos países consumidores, estes contratos fornecem um elemento de estabilidade nas suas aquisições. Os contratos a longo prazo facilitam também a diversificação a médio prazo do aprovisionamento em gás da União Europeia e contribuem para a entrada no mercado de novas fontes de gás, o que favorece a concorrência do lado da oferta. Convém portanto velar por que uma parte adequada dos aprovisionamentos provenientes de Estados terceiros à União Europeia tenha como base contratos de importação a longo prazo. A Comissão supervisionará a evolução da estrutura de aprovisionamento em gás dos Estados-Membros e poderá, se necessário, decidir sobre medidas que se revelem necessárias.

Paralelamente aos contratos a longo prazo, os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para assegurar uma maior liquidez no mercado do gás e o desenvolvimento de preços transparentes, a fim de favorecer a segurança do aprovisionamento, de facilitar o acesso ao gás e de oferecer possibilidades de escoamento às empresas vinculadas a compromissos contratuais a longo prazo. Neste contexto, uma parte mínima dos novos aprovisionamentos em gás deverá ter como base contratos de "pronto pagamento" a curto prazo ou contratos a longo prazo cujos preços remetam para os mercados "a pronto pagamento" do gás.

Surgiu um equívoco, em primeiro lugar nas relações com a Rússia, quando certos países terceiros terão aparentemente considerado que a União Europeia já não era favorável a estes contratos de aprovisionamento a longo prazo. Contudo, a Comissão Europeia confirmou que estes contratos eram uma necessidade, visto constituírem um factor de estabilidade não só para os países produtores como também para os países consumidores. Estes contratos a longo prazo são aliás reconhecidos expressamente na legislação comunitária relativa a normas comuns para o mercado interno do gás natural.

A Comissão velará por que estes contratos não criem distorções na concorrência, seja através de cláusulas expressas nos contratos que resultariam na criação de condições restritivas no mercado, seja através da criação de posições dominantes que teriam como resultado o "encerramento" do mercado. É desde logo importante que estes contratos evoluam em função das novas componentes do mercado interno do gás.

Organização de um diálogo no domínio da energia entre países produtores e consumidores

Todas estas medidas de coordenação de meios de acção em matéria de segurança dos aprovisionamentos de petróleo e de gás apenas se concebem em coordenação, não em confrontação, com os países produtores. A União Europeia alargada tem fronteiras com as principais zonas produtoras de hidrocarbonetos (Rússia, Mar Cáspio, Norte de África). Esta vantagem geográfica do alargamento deverá ser tomada em consideração quando se tratar da questão da localização das existências de petróleo e de gás. As existências poderiam, por exemplo, ser detidas nos Estados-Membros e países candidatos à adesão à União Europeia ou igualmente estar localizadas nos países produtores ou mesmo nos países de trânsito.

A Comunidade Europeia deve por conseguinte desenvolver, institucionalizar e dar um conteúdo concreto ao diálogo em matéria de energia entre os países produtores e consumidores. Neste contexto, actuará em coordenação com o Fórum Internacional de Energia (Internacional Energy Fórum - Riade).

Um diálogo no domínio da energia entre países produtores e consumidores contribuirá para assegurar uma melhor estabilidade dos aprovisionamentos. Permitirá, além disso, a aplicação aos nossos aprovisionamentos externos das normas de segurança da União Europeia, nomeadamente em matéria de construção e exploração das infra-estruturas de petróleo e de gás ou de transporte marítimo de hidrocarbonetos e de produtos derivados de hidrocarbonetos perigosos.

Além do mais, um diálogo reforçado entre a União Europeia e os países produtores constitui uma das condições imperativas para a melhoria do mecanismo de preços e para a conclusão de acordos de aprovisionamento satisfatórios. Conforme salientado no Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento energético, um tal diálogo deve prosseguir qualquer que seja a conjuntura internacional, independentemente de os preços estarem em alta ou em baixa, e deve incidir igualmente nas condições de constituição e utilização das existências. No que diz mais especificamente respeito ao gás natural, este quadro de concertação poderia transformar-se num quadro de negociação, a fim de responder designadamente à necessidade de contratos de aprovisionamento a longo prazo.

Nesta perspectiva, o diálogo desenvolvido pela União Europeia com a Rússia pode constituir um primeiro modelo. Este visa criar, conforme decorre nomeadamente das Cimeiras de Paris e de Bruxelas, uma solidariedade nova no domínio da energia. Deste modo foi possível lançar acções em matéria de segurança das redes, de protecção dos investimentos ou de identificação de grandes projectos de interesse comum. Espera-se que este diálogo permitirá precisar a melhor utilização, no futuro, dos acordos intergovernamentais a longo prazo e dos acordos de partilha da produção.

O diálogo com a Rússia não obviará todavia a um diálogo com outros países parceiros da União Europeia, mais particularmente com a Noruega, os países do Mar Cáspio, os países euro-mediterrânicos e do Médio Oriente. É necessário ter igualmente em conta as relações com a OPEP, organização com a qual seria conveniente manter relações contínuas, incluindo quando os preços do petróleo não são anormalmente elevados.

Aquisição de especialização técnica para a aplicação das medidas

A criação do mercado interno da energia é um processo progressivo e muito complexo na medida em que implica a aplicação de regras muito técnicas. É por conseguinte importante assegurar que o novo quadro legislativo seja aplicado de forma efectiva, eficaz e uniforme por todos os intervenientes nos mercados, em condições que garantam a competitividade das empresas.

É por essa razão que as diferentes fases da realização do mercado interno do gás e da electricidade foram acompanhadas por mecanismos que permitem nomeadamente reunir os reguladores nacionais, os Estados-Membros, os operadores económicos e a Comissão em reuniões de trabalho técnicas (Fórum de Florença no que diz respeito à electricidade, Fórum de Madrid para o gás). Nestas reuniões de trabalho são analisadas as medidas mais adequadas a tomar, a fim de permitir a abertura dos mercados do gás e da electricidade, e elaboradas regularmente recomendações técnicas dirigidas à Comissão.

Do mesmo modo, o novo quadro comunitário que será implementado para coordenar, no âmbito do objectivo da realização do mercado interno da energia, as medidas de segurança dos aprovisionamentos em hidrocarbonetos implicará a realização de tarefas complexas e técnicas. Tratar-se-á nomeadamente do acompanhamento da evolução dos mercados internacionais do petróleo e do gás e da avaliação do seu impacto na segurança e na segurança técnica dos aprovisionamentos em hidrocarbonetos. A eficácia das medidas existentes deverá ser objecto de avaliação contínua. Neste contexto, será necessário supervisionar o nível das existências em hidrocarbonetos nos Estados-Membros. Com vista à execução destas tarefas serão necessários dados objectivos, fiáveis e comparáveis.

Em caso de crise energética, quando a Comissão Europeia decidir ou recomendar medidas de desarmazenagem de petróleo ou de gás, será necessário avaliar os respectivos efeitos no mercado da energia e na economia no seu conjunto.

É também de referir que se torna cada vez mais necessário desenvolver índices de preços mais fiáveis e que reflictam melhor as realidades do mercado do que os actualmente existentes. A Comissão já referira, na sua Comunicação de 4 de Outubro de 2000 sobre o aprovisionamento de petróleo da União Europeia, que seria conveniente incentivar os países produtores, bem como os operadores dos mercados e a indústria, a melhorar os indicadores de formação dos preços, nomeadamente em torno de um índice global que reflectiria o conjunto do mercado.

Parece desde logo essencial criar, dentro dos próprios serviços da Comissão, um sistema europeu de observação dos aprovisionamentos em hidrocarbonetos que reunirá as competências especializadas necessárias para responder aos aspectos altamente técnicos dessas tarefas. Este sistema fornecerá, sob a égide da Comissão, o apoio técnico e científico e um elevado nível de especialização, a fim de contribuir para a correcta aplicação da legislação comunitária no domínio dos aprovisionamentos em hidrocarbonetos.

O sistema europeu de observação será gerido pela Comissão, que deverá convidar para as reuniões representantes dos Estados-Membros, bem como representantes dos sectores em causa.

5. Conclusão

A Comunidade Europeia implementa, de forma progressiva, as condições necessárias para o estabelecimento de um mercado interno da energia. A realização desse objectivo deve reforçar a competitividade da economia da União Europeia e traduzir-se numa redução apreciável dos preços ao consumidor. Contribui além disso para reforçar a segurança dos aprovisionamentos energéticos.

A realização do mercado interno da energia deve ser acompanhada da necessária coordenação das medidas que permita garantir a segurança dos aprovisionamentos externos, tanto em relação ao petróleo como ao gás natural. Com efeito, a criação e desenvolvimento de um mercado interno da energia torna os Estados-Membros cada vez mais interdependentes no que diz respeito às questões de segurança dos seus aprovisionamentos. A ausência de regras mínimas comuns a todos os Estados-Membros em matéria de segurança dos aprovisionamentos é portanto susceptível de pôr em causa o bom funcionamento do mercado interno do petróleo e do gás.

O único meio de garantir um nível adequado de segurança e de segurança técnica dos aprovisionamentos energéticos, que contribuirá para o bom funcionamento do mercado interno da energia, é actuar ao nível da Comunidade e a um nível global. Uma reacção coordenada e solidária dos Estados que participam num mesmo mercado interno constitui, com efeito, a única resposta válida a uma crise energética.

Deve ser privilegiada a coordenação da acção comunitária com a de outros países consumidores, incluindo no âmbito da AIE. Uma acção em caso de crise ou de ameaça de crise exige, com efeito, a implementação de meios a um nível mais global.

É desde já necessário dotar a União Europeia, em coordenação com o Fórum Internacional de Energia (Riade), o conjunto dos países consumidores e os países produtores dos seus próprios meios de reacção e de intervenção em caso de crise energética. Trata-se sobretudo de estabelecer dispositivos que permitirão à União Europeia coordenar melhor as medidas em matéria de segurança dos aprovisionamentos. Estes mecanismos contribuirão para a construção do mercado interno da energia.

Esta iniciativa, que afecta uma base essencial do funcionamento das nossas economias, é tanto mais prioritária pelo facto de se integrar no processo de adesão dos novos Estados à União Europeia. Estes países estão muito dependentes das energias fósseis. A Comunidade Europeia tomará em consideração a situação de cada um dos Estados candidatos, a fim de prever, se necessário, períodos transitórios em relação a determinadas obrigações.

Medidas adequadas em matéria de segurança dos aprovisionamentos de petróleo e de gás traduzir-se-ão pela redução dos riscos de ruptura física permanentes ou temporários e dos riscos económicos ligados aos aprovisionamentos. Estes meios de acção serão implementados em cooperação com os países produtores parceiros, no âmbito de um diálogo no domínio da energia não somente com os países da OPEP como também com o parceiro privilegiado que é a Rússia.

À luz do exposto, a Comissão propõe, com base no artigo 95.º do Tratado CE, duas acções legislativas, nomeadamente:

(1) Uma proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à aproximação das medidas em matéria de segurança dos aprovisionamentos em produtos petrolíferos;

(2) Uma proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a medidas destinadas a garantir a segurança do aprovisionamento em gás natural.

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