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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62008TJ0304

Acórdão do Tribunal Geral (Primeira Secção) de 10 de julho de 2012.
Smurfit Kappa Group plc contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Produtos de embalagem canelados — Auxílio à construção de uma fábrica papeleira — Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado comum — Admissibilidade — Regularidade do mandato conferido por uma pessoa coletiva aos seus advogados — Adoção de uma decisão no final da fase preliminar de exame — Legitimidade — Direitos processuais das partes interessadas — Dificuldades sérias que justificam o início do procedimento formal de investigação — Exercício, pela Comissão, do seu poder de apreciação — Artigo 87.°, n.° 3, alínea a), CE — Artigo 88.°, n.os 2 e 3, CE — Artigo 4.° do Regulamento (CE) n.° 659/1999 — Artigo 44.°, n.os 5 e 6, do Regulamento de Processo.
Processo T‑304/08.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:T:2012:351

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

10 de julho de 2012 ( *1 )

«Auxílios de Estado — Produtos de embalagem canelados — Auxílio à construção de uma fábrica papeleira — Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado comum — Admissibilidade — Regularidade do mandato conferido por uma pessoa coletiva aos seus advogados — Adoção de uma decisão no final da fase preliminar de exame — Legitimidade — Direitos processuais das partes interessadas — Dificuldades sérias que justificam o início do procedimento formal de investigação — Exercício, pela Comissão, do seu poder de apreciação — Artigo 87.o, n.o 3, alínea a), CE — Artigo 88.o, n.os 2 e 3, CE — Artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 659/1999 — Artigo 44.o, n.os 5 e 6, do Regulamento de Processo»

No processo T-304/08,

Smurfit Kappa Group plc, com sede em Dublim (Irlanda), representada por T. Ottervanger e E. Henny, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por B. Martenczuk e C. Urraca Caviedes, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Propapier PM 2 GmbH, anteriormente Propapier PM2 GmbH & Co. KG, com sede em Eisenhüttenstadt (Alemanha), representada por H.-J. Niemeyer e C. Herrmann, advogados,

interveniente,

que tem por objeto um pedido de anulação da decisão C (2008) 1107 da Comissão, de 2 de abril de 2008, que declara compatível com o mercado comum o auxílio com finalidade regional que as autoridades alemãs tencionam conceder à Propapier PM2 para a construção de uma fábrica papeleira em Eisenhüttenstadt (Região de Brandeburgo — Nordeste) (auxílio estatal N 582/2007 — Alemanha),

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, S. Frimodt Nielsen (relator) e A. Popescu, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 28 de novembro de 2011,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1

A recorrente, Smurfit Kappa Group plc, é uma empresa internacional com sede na Irlanda. Exerce as suas atividades no setor da embalagem, principalmente na Europa e na América Latina. Fabrica e comercializa produtos de embalagem canelados (a seguir «produtos CCM»), folhas de cartão canelado e de cartão compacto, caixas em cartão canelado e em cartão compacto, cartões gráficos e cartões especiais. Procede igualmente à recuperação de resíduos de papel reciclado.

2

Por carta de 8 de outubro de 2007, as autoridades alemãs notificaram a Comissão Europeia da sua intenção de conceder à Propapier PM2 GmbH & Co. KG uma subvenção ao investimento no montante de 82509500 euros (ou seja, de 72154700 euros no valor atual) (a seguir «auxílio em causa»), para a construção de uma papeleira e de um grupo eletrogéneo em Eisenhüttenstadt, na Região de Brandeburgo — Nordeste (Alemanha). A Comissão registou essa notificação sob a referência N 582/2007.

3

A papeleira financiada pelo auxílio em causa destinava-se a fabricar dois tipos de produtos CCM, a saber, por um lado, folhas de cartão liso de uma gramagem até 150 g/m2 e, por outro, caneluras fabricadas a partir de fibras recicladas. A construção da instalação devia decorrer entre o mês de dezembro de 2007 e a primeira metade do ano de 2010.

4

Em 9 de novembro de 2007, a recorrente apresentou à Comissão uma denúncia confidencial relativa ao auxílio em causa.

5

Por carta de 7 de dezembro de 2007, a Comissão dirigiu à República Federal da Alemanha um pedido de informações complementares. As autoridades alemãs responderam a este pedido de informações por carta de 3 de janeiro de 2008.

6

Em 25 de janeiro de 2008, teve lugar uma reunião entre os serviços da Comissão e as autoridades alemãs, com a presença de representantes da interveniente.

7

Em 29 de janeiro de 2008, duas denúncias formais foram registadas pela Comissão e transmitidas à República Federal da Alemanha para observações.

8

Por carta de 1 de fevereiro de 2008, a Comissão dirigiu um novo pedido de informações à República Federal da Alemanha.

9

Por cartas de 6 e 14 de fevereiro de 2008, a República Federal da Alemanha respondeu, respetivamente, às denúncias acima mencionadas no n.o 7 assim como ao pedido de informações mencionado no n.o 8 supra.

10

Em 20 de fevereiro de 2008, a Comissão recebeu uma terceira denúncia formal. Esta não foi comunicada ao Estado-Membro, dado que se baseava nos mesmos argumentos que as duas primeiras.

11

Em 2 de abril de 2008, sem dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE, a Comissão adotou a decisão C (2008) 1107, que declara compatível com o mercado comum o auxílio em causa (a seguir «decisão impugnada»).

12

Na decisão impugnada, a Comissão constatou, designadamente, que o auxílio em causa não ultrapassava os limiares previstos no n.o 68 das Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para o período 2007-2013 (JO 2006, C 54, p. 13), que é do seguinte teor:

«Quando o montante total do auxílio proveniente de todas as fontes ultrapassar 75% do montante máximo de auxílio suscetível de ser concedido a um investimento cujas despesas elegíveis se elevem a 100 milhões de euros, aplicando o limite máximo de auxílio normal em vigor para as grandes empresas no mapa de auxílios com finalidade regional aprovado, na data em que o auxílio será concedido, e quando

(a)

O beneficiário do auxílio é responsável por mais de 25% das vendas do(s) produto(s) em questão no(s) mercado(s) em causa antes do investimento ou será responsável por mais de 25% após o investimento, ou

(b)

A capacidade de produção criada pelo projeto é superior a 5% da dimensão do mercado, calculada utilizando os dados relativos ao consumo aparente do produto em causa, exceto se a taxa de crescimento média anual do consumo aparente durante os últimos cinco anos for superior à taxa de crescimento média anual do PIB do Espaço Económico Europeu,

a Comissão apenas aprovará auxílios ao investimento com finalidade regional após ter verificado, de forma circunstanciada, na sequência do início do procedimento previsto no n.o 2 do artigo 88.o [CE], que o auxílio é necessário para proporcionar um efeito de incentivo ao investimento e que os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência del[e] resultante e o efeito sobre [o] comércio entre os Estados-Membros.»

13

Na nota de pé de página n.o 63 do referido número, precisa-se que a Comissão pretendia elaborar, antes da entrada em vigor das orientações, isto é, 1 de janeiro de 2007, novas diretrizes sobre os critérios que entende dever tomar em consideração para avaliar se o auxílio é necessário para produzir um efeito de incentivo ao investimento e se os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência e os efeitos sobre o comércio entre os Estados-Membros que daí resultem.

14

Nos considerandos 119 e 120 da decisão impugnada, a Comissão rejeitou os argumentos apresentados nas denúncias que tinha recebido sobre o auxílio em causa (v. n.os 4, 7 e 10 supra), indicando que se considerava vinculada pelas orientações, as quais, em seu entender, a impediam de dar início ao procedimento formal de investigação nos processos nos quais não foram ultrapassados os limiares fixados no n.o 68 das referidas orientações. A este respeito, segundo a Comissão, os referidos limiares de quotas de mercado e de aumento das capacidades de produção garantem para qualquer projeto subsidiado, por um lado, que a distorção de concorrência previsível não exceda os benefícios esperados e, por outro, que seja dada uma contribuição suficiente para o objetivo de desenvolvimento regional.

Tramitação processual e pedidos das partes

15

Por petição registada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de agosto de 2008, a recorrente interpôs o presente recurso.

16

Por requerimento registado na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de dezembro de 2008, a Propapier PM2 GmbH & Co. KG, que, no decurso do procedimento, se converteu na Propapier PM 2 GmbH, pediu para intervir no presente processo em apoio da Comissão. Por despacho de 21 de abril de 2009, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral admitiu essa intervenção.

17

Em 14 de maio de 2009, a interveniente contestou que lhe tivessem sido integralmente transmitidos os autos do processo. Após ter recebido uma carta da Secretaria que a assegurava do contrário, a interveniente não manteve a sua contestação.

18

Como a recorrente solicitou que certas partes dos articulados trocados durante a fase escrita do processo fossem tratadas confidencialmente quanto à interveniente, e como esta contestou alguns desses pedidos, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral, por despacho de 5 de julho de 2010, deferiu parcialmente o pedido da recorrente. Deste modo, certas informações suplementares foram comunicadas à interveniente e esta foi autorizada a completar as suas alegações de intervenção.

19

Tendo a composição das Secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz-relator inicialmente designado foi afetado à Primeira Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, distribuído. Por se encontrar impedido um dos membros da Primeira Secção, o presidente do Tribunal Geral designou outro juiz para completar a Secção, nos termos do artigo 32.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

20

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão e a interveniente nas despesas.

21

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

22

A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

23

Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral e, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.o do Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes.

24

Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões do Tribunal Geral na audiência de 28 de novembro de 2011.

25

Na audiência, a Comissão e a interveniente não contestaram a admissibilidade da petição quanto ao cumprimento da obrigação prevista no artigo 44.o, n.o 5, alínea a), do Regulamento de Processo, tal como consta da ata da audiência.

26

No fim da audiência, o Tribunal fixou um prazo de três semanas contadas a partir da notificação da ata da audiência, para a recorrente apresentar qualquer elemento de prova que considerasse necessário para demonstrar a regularidade do mandato conferido aos seus advogados.

27

Os documentos apresentados pela recorrente no prazo que lhe foi dado foram comunicados à Comissão e à interveniente, para que pudessem formular as suas observações. Em 25 de janeiro de 2012, após ter recebido essas observações, o Tribunal encerrou a fase oral do processo.

Questões de direito

Quanto à admissibilidade

28

A Comissão e a interveniente contestam, por um lado, a admissibilidade da petição atendendo às exigências previstas no artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo. A Comissão contesta igualmente, por outro lado, a legitimidade ativa da recorrente para impugnar a decisão.

Quanto à regularidade do mandato conferido pela recorrente aos seus advogados

29

Nos termos do artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo, se o recorrente for uma pessoa coletiva de direito privado, deve juntar à petição a prova de que o mandato conferido ao advogado foi regularmente outorgado por um representante com poderes para o efeito. Nos termos do artigo 44.o, n.o 6, do referido regulamento, se a petição não preencher o requisito referido, o secretário fixa ao recorrente um prazo razoável para a regularizar ou apresentar os documentos acima referidos. Na falta de regularização ou apresentação dos documentos no prazo fixado, o Tribunal Geral decide se a inobservância daqueles requisitos importa o não recebimento da petição por vício de forma.

30

Decorre dessas disposições que o secretário do Tribunal Geral tem de solicitar a uma pessoa coletiva de direito privado que proceda à regularização da sua petição caso essa pessoa coletiva não cumpra a obrigação que lhe incumbe de provar a regularidade do mandato conferido aos seus advogados e que só se a recorrente não der cumprimento ao convite do secretário no prazo que lhe é fixado é que o Tribunal Geral tem a faculdade de declarar a inadmissibilidade do recurso.

31

O presente recurso foi interposto em 5 de agosto de 2008, em nome da recorrente, por T. Ottervanger e E. Henny, advogados de Amesterdão (Países Baixos). A recorrente juntou à sua petição um mandato que autorizava os referidos advogados a interpor o presente recurso. Esse mandato tinha sido outorgado por O’Riordan, na qualidade de secretário-geral do grupo.

32

Em aplicação do artigo 44.o, n.o 6, do Regulamento de Processo, o secretário fixou à recorrente um prazo para fornecer a prova de que o mandante tinha poder para adotar o referido ato em nome da sociedade. Dentro do prazo que lhe tinha sido fixado, a recorrente, embora mantendo que o secretário-geral do grupo era competente, em virtude da lei irlandesa, para conferir mandato aos advogados para agir em juízo por conta da sociedade, apresentou um segundo mandato, datado de 28 de agosto de 2008 e outorgado por G. McGann, na qualidade de administrador.

33

Dado que a interveniente e a Comissão tinham contestado a competência de O’Riordan e de G. McGann, a recorrente apresentou, antes do encerramento da fase oral do processo, uma resolução, adotada em 8 de dezembro de 2011 pelo conselho de administração da sociedade, na qual se confirmava que G. McGann, como diretor-geral e um dos administradores da sociedade, era competente para outorgar o segundo mandato.

34

Em primeiro lugar, a interveniente contesta que, em caso de incumprimento da obrigação prevista no artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo, exista a possibilidade de uma regularização no decurso da instância. Essa alegação deve ser rejeitada, dado que essa possibilidade de regularização está prevista no artigo 44.o, n.o 6, do mesmo regulamento, o qual prevê que o secretário fixará um prazo para a regularização da petição e que, na falta de regularização no prazo fixado, o Tribunal Geral deve apreciar a questão de saber se esse facto importa a inadmissibilidade do recurso (v. n.o 29 supra).

35

No caso em apreço, como foi acima recordado no n.o 32, a recorrente apresentou o segundo mandato no prazo fixado pelo secretário do Tribunal Geral. Importa, por isso, examinar, em segundo lugar, se o segundo mandato satisfaz as exigências do artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo.

36

A este respeito, a Comissão e a interveniente sustentam que os artigos 66.° a 68.° dos estatutos em anexo à regularização da petição, que já não contestam que sejam os estatutos da recorrente, estabelecem que a decisão de agir em juízo e de conferir mandato a advogados em nome da sociedade é da competência colegial do conselho de administração e que pode ser delegada num ou vários administradores. A Comissão e a interveniente sustentam, por isso, que, não tendo sido provada a existência de uma deliberação do conselho de administração no sentido de encarregar T. Ottervanger e E. Henny de interpor recurso de anulação da decisão impugnada ou de uma deliberação delegando esse poder em G. McGann, a recorrente não cumpriu a obrigação prevista no artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo.

37

Embora o Tribunal não possa dar por provado que G. McGann podia, à data, outorgar o segundo mandato, uma vez que a recorrente não apresentou uma deliberação anterior do conselho de administração da sociedade no sentido de interpor o presente recurso ou de conferir a G. McGann o poder de decidir intentar tais ações, há que constatar, em qualquer caso, que o conselho de administração confirmou, por deliberação de 8 de dezembro de 2011, que G. McGann, diretor-geral e administrador da sociedade, era competente para esse efeito (v. n.o 33 supra).

38

Sendo certo que, como alega a interveniente, esta confirmação teve lugar mais de três anos após a interposição do presente recurso e que é possível que a composição do conselho de administração da sociedade se tenha modificado após a data do segundo mandato, não existe, pelo contrário, nenhuma dúvida quanto à vontade da recorrente, que está juridicamente vinculada em face de terceiros pelas deliberações do seu conselho de administração, de prosseguir o presente recurso.

39

Assim, não deve ser acolhida a exceção de inadmissibilidade formulada pela interveniente e pela Comissão e baseada em que a petição não satisfaz as exigências que decorrem do artigo 44.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de Processo (v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de maio de 1989, Maurissen e Union syndicale/Tribunal de Contas, 193/87 e 194/87, Colet., p. 1045, n.os 33 e 34).

Quanto à legitimidade ativa da recorrente

40

A Comissão, apoiada pela interveniente, alega que, embora a recorrente seja uma parte interessada, a decisão impugnada não lhe diz individualmente respeito. Por conseguinte, entende que a recorrente não tem legitimidade para contestar a justeza das apreciações relativas à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum que constam da decisão impugnada. Ora, todos os argumentos apresentados na petição visam pôr em causa a justeza destas apreciações relativas à compatibilidade do auxílio controvertido com o mercado comum e não sustentar que foram violados os direitos processuais garantidos à recorrente pelo artigo 88.o, n.o 2, CE.

41

Por outro lado, a Comissão afirma que a alegação da recorrente segundo a qual a duração do procedimento administrativo demonstra a existência de dificuldades sérias que teriam tornado necessário dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE foi apresentada pela primeira vez na réplica e é, por isso, igualmente inadmissível. Daqui decorre, segundo a Comissão, que nenhum dos fundamentos do recurso é admissível.

42

Antes de mais, importa assinalar que, apesar da entrada em vigor no decurso da instância, mais concretamente em 1 de dezembro de 2009, do artigo 263.o TFUE, a questão da admissibilidade do pedido de anulação da decisão impugnada deve ser resolvida apenas com base no artigo 230.o, quarto parágrafo, CE (v., neste sentido, despachos do Tribunal Geral de 7 de setembro de 2010, Norilsk Nickel Harjavalta e Umicore/Comissão, T-532/08, Colet., p. II-3959, n.os 68 a 75, e Etimine e Etiproducts/Comissão, T-539/08, Colet., p. II-4017, n.os 74 a 81), o que não é contestado pelas partes.

43

Nos termos do artigo 230.o, quarto parágrafo, CE, uma pessoa singular ou coletiva só pode interpor recurso de uma decisão dirigida a outra pessoa se a referida decisão lhe disser direta e individualmente respeito.

44

Segundo jurisprudência assente, os sujeitos que não sejam destinatários de uma decisão só podem alegar que esta lhes diz individualmente respeito se os prejudicar em razão de determinadas qualidades que lhes são específicas ou de uma situação de facto que os caracterize relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando-os, por isso, de forma idêntica à do destinatário dessa decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colet.,1962-1964, pp. 279, 284; de 19 de maio de 1993, Cook/Comissão, C-198/91, Colet., p. I-2487, n.o 20; de 15 de junho de 1993, Matra/Comissão, C-225/91, Colet., p. I-3203, n.o 14; de 13 de dezembro de 2005, Comissão/Aktionsgemeinschaft Recht und Eigentum, C-78/03 P, Colet., p. I-10737, n.o 33; e de 11 de setembro de 2008, Alemanha e o./Kronofrance, C-75/05 P e C-80/05 P, Colet., p. I-6619, n.o 36).

45

Dado que o presente recurso diz respeito a uma decisão da Comissão em matéria de auxílios estatais, importa recordar que, no âmbito do procedimento de controlo desses auxílios, é preciso distinguir entre, por um lado, a fase preliminar de investigação dos auxílios instituída pelo n.o 3 do artigo 88.o CE, que tem apenas por objetivo permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade parcial ou total do auxílio em causa, e, por outro, a fase da investigação a que se refere o n.o 2 do mesmo artigo. É apenas no âmbito desta fase, que se destina a permitir à Comissão ter uma informação completa sobre todos os dados do caso, que o Tratado prevê a obrigação da Comissão de dar aos interessados a oportunidade de apresentarem as suas observações (v., neste sentido, acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

46

Daqui resulta que, quando, sem iniciar o procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE, a Comissão concluir, através de uma decisão adotada com base no n.o 3 do mesmo artigo, que um auxílio é compatível com o mercado comum, os beneficiários dessas garantias processuais só podem conseguir que elas sejam respeitadas se tiverem a possibilidade de impugnar essa decisão perante o juiz da União. Por estas razões, este último julga admissível um recurso de anulação de tal decisão, interposto por um interessado na aceção do artigo 88.o, n.o 2, CE, quando o autor desse recurso pretenda, com a sua interposição, salvaguardar os direitos processuais que lhe são conferidos por esta última disposição (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 38 e jurisprudência aí referida).

47

Em virtude do artigo 1.o, alínea h), do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° CE] (JO L 83, p. 1), consideram-se partes interessadas na aceção do artigo 88.o, n.o 2, CE todas as pessoas, empresas ou associações de empresas cujos interesses podem ser afetados pela concessão de um auxílio, ou seja, em particular, empresas concorrentes do beneficiário desse auxílio. Segundo a jurisprudência, trata-se, por outras palavras, de um conjunto indeterminado de destinatários (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C-83/09 P, Colet., p. I-4441, n.o 63; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de novembro de 1984, Intermills/Comissão, 323/82, Recueil, p. 3809, n.o 16).

48

Em contrapartida, se o recorrente põe em causa a justeza da decisão de apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado comum, o simples facto de poder ser considerado interessado, na aceção do artigo 88.o, n.o 2, CE, não basta para a admissibilidade do recurso. Deve também demonstrar que tem um estatuto particular, na aceção do acórdão Plaumann/Comissão, referido no n.o 44 supra. Será esse o caso, nomeadamente, se a posição do recorrente no mercado for substancialmente afetada pelo auxílio objeto da decisão em causa (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 40 e jurisprudência aí referida).

49

No que diz respeito à conclusão de que a posição da recorrente no mercado em causa foi substancialmente afetada, a simples circunstância de um ato ser suscetível de exercer uma certa influência sobre as relações de concorrência existentes no mercado pertinente e de a empresa em causa se encontrar numa qualquer relação de concorrência com o beneficiário desse ato não é suficiente. Assim, uma empresa não pode invocar unicamente a sua qualidade de concorrente da empresa beneficiária, mas deve provar, além disso, que está numa posição de facto que a individualiza de forma análoga à do destinatário da decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C-525/04 P, Colet., p. I-9947, n.os 32 e 33, e de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C-487/06 P, Colet., p. I-10515, n.os 47 e 48).

50

Por último, em conformidade com jurisprudência assente, não compete ao juiz da União interpretar um recurso que põe exclusivamente em causa a justeza de uma decisão de apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado comum visando, na realidade, salvaguardar os direitos processuais do recorrente baseados no artigo 88.o, n.o 2, CE, se o recorrente não tiver expressamente alegado um fundamento com essa finalidade. Nessa hipótese, a interpretação do fundamento do recurso conduziria de facto a uma requalificação do seu objeto (acórdão Comissão/Kronoply e Kronotex, referido no n.o 47 supra, n.o 55; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de novembro de 2007, Stadtwerke Schwäbisch Hall e o./Comissão, C-176/06 P, não publicado na Coletânea, n.o 25).

51

Todavia, esse limite ao poder de interpretação dos fundamentos do recurso não tem o efeito de impedir o juiz da União de analisar os argumentos de mérito apresentados por um recorrente, a fim de verificar se os mesmos trariam também elementos em apoio a um fundamento, que sustenta expressamente a existência de dificuldades sérias que teriam justificado a abertura do procedimento visado no artigo 88.o, n.o 2, CE (acórdão Comissão/Kronoply e Kronotex, referido no n.o 47 supra, n.o 56).

52

Com efeito, quando um recorrente pede a anulação de uma decisão de não levantar objeções, põe em causa essencialmente o facto de a decisão da Comissão sobre o auxílio em causa ter sido adotada sem que essa instituição tenha dado início ao procedimento formal de investigação, violando assim os seus direitos processuais. Para que o seu pedido de anulação proceda, o recorrente pode invocar todos os fundamentos que demonstrem que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispõe, na fase preliminar de análise da medida notificada, deveria ter suscitado dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum. A utilização desses argumentos não pode ter por efeito alterar o objeto do recurso nem alterar os pressupostos da sua admissibilidade. Pelo contrário, a existência de dúvidas sobre essa compatibilidade é precisamente a prova que deve ser apresentada para demonstrar que a Comissão devia ter dado início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE e no artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999 (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2011, Áustria/Scheucher-Fleisch e o., C-47/10 P, Colet., p. I-10707, n.o 50 e jurisprudência aí referida).

53

É à luz destes princípios que importa examinar a situação processual da recorrente.

54

A este respeito, importa precisar desde logo, como a Comissão e a interveniente concordaram, que a recorrente é uma parte interessada na aceção do artigo 88.o, n.o 2, CE. Com efeito, sustenta que é uma concorrente direta da interveniente, sem ser contrariada pela Comissão, nem pela interveniente, nem pelos documentos do processo. Pelo contrário, as partes estão em desacordo quanto à questão de saber se a decisão impugnada diz individualmente respeito à recorrente e se, nesta base, ela pode contestar a justeza das apreciações da decisão impugnada sobre a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, independentemente da salvaguarda dos seus direitos processuais.

55

Ora, se a recorrente forneceu elementos suficientes para demonstrar que a sua situação concorrencial era suscetível de ser afetada pelo auxílio em causa, não provou contudo que a sua posição no mercado seria substancialmente afetada no sentido da jurisprudência acima recordada nos n.os 48 e 49.

56

Em primeiro lugar, a recorrente invoca a sua participação no procedimento administrativo, no qual apresentou denúncia de maneira confidencial após a notificação do auxílio em causa. Contudo, a participação de uma empresa na fase de análise preliminar prevista no artigo 4.o do Regulamento n.o 659/1999 não permite provar, com base apenas na sua qualidade de denunciante, que a decisão adotada no fim do referido procedimento lhe diz individualmente respeito (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de julho de 2009, 3F/Comissão, C-319/07 P, Colet., p. I-5963, n.os 94 e 95).

57

Em segundo lugar, a recorrente alega que o mercado dos produtos CCM é um mercado integrado e que qualquer auxílio de Estado concedido a um produtor tem efeitos sobre o conjunto dos seus concorrentes no Espaço Económico Europeu (EEE). Contudo, resulta das indicações fornecidas pela recorrente na sua denúncia confidencial que o setor dos produtos CCM no EEE agrupa aproximadamente 130 sociedades. Este argumento da recorrente destaca assim o facto de que o auxílio concedido influenciará as relações de concorrência entre os operadores, mas não é suficiente para provar que a posição concorrencial da recorrente será substancialmente afetada de maneira a distingui-la da generalidade dos operadores.

58

Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que o auxílio em causa permitirá a construção da maior fábrica de produtos CCM na Europa e que a entrada em funcionamento dessa instalação terá necessariamente um impacto sensível no nível dos preços. Do mesmo modo que a anterior, esta alegação, que é contestada pela interveniente, é, de qualquer modo, insuficiente para demonstrar que a decisão impugnada diz individualmente respeito à recorrente, uma vez que não invoca nenhuma particularidade da sua situação suscetível de provar que seria afetada pela abertura dessa fábrica de maneira distinta da generalidade dos outros concorrentes da interveniente.

59

Em quarto lugar, a recorrente indica que o mercado dos produtos CCM se encontra numa situação de desequilíbrio estrutural caracterizada por capacidades de produção excedentárias e que foi obrigada a encerrar um grande número das suas próprias instalações. Não obstante, como alegam a interveniente e a Comissão, o encerramento das instalações pode ser explicado pelo facto de a recorrente ter tomado decisões de gestão autónomas, como a adaptação das suas instalações existentes ao progresso técnico ou a racionalização do seu sistema produtivo, e a recorrente não apresentou nenhum elemento de prova suscetível de demonstrar que não encerrou as suas instalações devido ao seu caráter vetusto. De qualquer modo, e mesmo admitindo que a recorrente tivesse sido forçada a reduzir as suas capacidades de produção devido a um desequilíbrio estrutural entre a oferta e a procura de produtos CCM, isso não teria sido causado pela instalação subsidiada pelo auxílio em causa e, por si só, não seria suscetível de distinguir a recorrente dos outros concorrentes da interveniente (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 18 de novembro de 2009, Scheucher-Fleisch e o./Comissão, T-375/04, Colet., p. II-4155, n.os 59 e 60).

60

Em quinto lugar, e por último, o argumento da recorrente segundo o qual possui seis instalações num raio de 800 km a 1 000 km da instalação subsidiada pelo auxílio em causa e isto daria lugar a que a interveniente se tornaria na sua principal concorrente direta parece à primeira vista contradizer o seu segundo argumento, segundo o qual, como o mercado dos produtos CCM é perfeitamente concorrencial e integrado, qualquer subsídio concedido a qualquer produtor afetará necessariamente o nível dos preços do conjunto dos seus concorrentes no EEE. De qualquer modo, a mera circunstância de a recorrente possuir seis instalações na proximidade da instalação subsidiada e de o auxílio em causa permitir à interveniente produzir até cerca de um milhão de toneladas por ano de produtos CCM, ao passo que, em comparação, a produção da recorrente nessas seis fábricas atinge aproximadamente uma capacidade anual total de cerca de [confidencial] ( 1 ), não permite concluir que a posição da recorrente no mercado é substancialmente afetada. Com efeito, a interveniente, afirmou, sem ter sido contestada, que a recorrente não é a sua concorrente mais direta, que os mercados geográficos de ambas são diferentes e que, mesmo admitindo que o critério da proximidade geográfica das instalações seja o mais pertinente, outros concorrentes distintos da recorrente têm instalações mais próximas que a que deve ser construída em Eisenhüttenstadt.

61

Resulta do exposto que a recorrente não demonstrou que o auxílio em causa era suscetível de afetar de maneira substancial a sua posição no mercado. Nestas condições, a recorrente, na sua qualidade de parte interessada, só pode procurar a proteção dos direitos processuais que lhe são garantidos pelo artigo 88.o, n.o 2, CE e contestar a recusa da Comissão de dar início ao procedimento formal de investigação, mas não pôr em causa a justeza das apreciações com base nas quais a Comissão conclui que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum. Deste modo, dado que a Comissão e a interveniente alegam que nenhum dos fundamentos do presente recurso visa salvaguardar os direitos processuais de uma parte interessada, há que examinar a natureza dos fundamentos aduzidos pela recorrente.

62

Em virtude da jurisprudência acima referida nos n.os 50 a 52, o facto de a recorrente não ter conseguido demonstrar que a sua posição no mercado seria substancialmente afetada pelo auxílio em causa não obsta a que, para demonstrar que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto à compatibilidade desse auxílio com o mercado comum que justificavam o início do procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE, apresente argumentos relativos à justeza da apreciação realizada pela Comissão, desde que pelo menos um dos fundamentos do seu recurso assente no incumprimento, pela Comissão, da sua obrigação de dar início ao procedimento formal de investigação. A este respeito, há ainda que recordar que a Comissão deve dar início ao procedimento formal de investigação designadamente se, à luz das informações obtidas no decurso da análise preliminar, continuar confrontada com dificuldades sérias de apreciação da medida considerada. Esta obrigação resulta diretamente do artigo 88.o, n.o 3, CE, conforme foi interpretado pela jurisprudência, bem como do artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 659/1999, quando a Comissão constata, após a análise preliminar, que a medida ilegal suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum (acórdão do Tribunal Geral de 12 de fevereiro de 2008, BUPA e o./Comissão, T-289/03, Colet., p. II-81, n.o 328).

63

Ora, a recorrente precisa, a título liminar, que contesta o facto de que a Comissão acreditava poder adotar uma decisão positiva sem dar início ao procedimento formal de investigação. Considera, designadamente, que a Comissão não podia invocar os limiares que definiu nas suas orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para recusar proceder a uma apreciação concreta dos efeitos da medida em causa. Assim, esta ponderação dos efeitos decorrentes da medida controvertida exigiria a abertura do procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE. Além disso, a recorrente alega que o facto de não ter sido iniciado o procedimento formal de investigação a impediu de exercer os seus direitos processuais.

64

A este respeito, o primeiro fundamento do recurso baseia-se no incumprimento, pela Comissão, da obrigação que lhe incumbia, no caso vertente, de dar início ao procedimento formal de investigação, em violação do artigo 88.o, n.o 2, CE e do artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 659/1999.

65

Assim, pelo menos um dos fundamentos do recurso visa expressamente a salvaguarda dos direitos processuais da recorrente. Nestas condições, contrariamente ao que é sustentado pela Comissão e pela interveniente, os argumentos apresentados pela recorrente, embora digam respeito à justeza das apreciações relativas à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, devem ser examinados apenas na medida em que visam demonstrar que a Comissão não chegou a superar as dificuldades sérias com as quais foi confrontada durante a fase de análise preliminar (v. n.o 52 supra). Daqui resulta que a exceção de inadmissibilidade formulada pela Comissão contra a totalidade do recurso não pode ser acolhida, devendo ser examinada caso por caso a admissibilidade dos fundamentos formulados pela recorrente e dos argumentos apresentados no quadro de cada um desses fundamentos.

Quanto ao mérito

66

O primeiro fundamento do recurso baseia-se no incumprimento, pela Comissão, da obrigação que lhe incumbia, no caso vertente, de dar início ao procedimento formal de investigação, em violação do artigo 88.o, n.o 2, CE e do artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 659/1999. Embora não tenha sido formalmente articulado em duas partes, esse fundamento inclui duas acusações distintas. Por um lado, a recorrente critica, no essencial, a Comissão por ter cometido um erro de direito quando deduziu do n.o 68 das orientações que, como os limiares aí previstos não tinham sido ultrapassados, podia concluir que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum, e não tinha de dar início ao procedimento formal de investigação. Por outro, a recorrente aduz vários argumentos suscetíveis de demonstrar que a Comissão se deparou com dificuldades de apreciação dos critérios previstos no n.o 68 das orientações que teriam justificado a abertura do procedimento formal de investigação.

Quanto à admissibilidade do primeiro fundamento

67

A Comissão contesta a admissibilidade do primeiro fundamento, uma vez que a recorrente invoca, no âmbito deste, argumentos que visam pôr em causa a justeza das apreciações realizadas na decisão impugnada.

68

Importa, contudo, recordar que a recorrente, na sua qualidade de parte interessada, pode alegar que a Comissão deveria ter dado início ao procedimento formal de investigação. Para este fim, a recorrente pode igualmente apresentar, em apoio desse fundamento, argumentos suscetíveis de demonstrar que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha na fase de análise preliminar do auxílio em causa deveria ter suscitado dúvidas quanto à compatibilidade deste com o mercado comum (v., neste sentido, acórdão Áustria/Scheucher-Fleisch e o., referido no n.o 52 supra, n.o 50).

69

Ora, importa recordar que, na decisão impugnada, a Comissão atribuiu importância decisiva, ao apreciar a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, ao facto de que os limiares previstos no n.o 68 das orientações não tinham sido ultrapassados.

70

A recorrente pode, por isso, para salvaguardar os seus direitos processuais, contestar o erro de direito que, em seu entender, a Comissão cometeu por ter deduzido a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum do facto de que os limiares previstos no n.o 68 das orientações não tinham sido ultrapassados e pôr em causa as apreciações factuais que permitiram à Comissão afirmar com certeza que esses limiares não tinham sido ultrapassados no caso vertente.

71

A Comissão, ao invés, tem razão quando afirma que a acusação, apresentada pela primeira vez na réplica, baseada na duração da fase preliminar de análise, é um fundamento novo e não está relacionada com os argumentos contidos na petição. Esta última acusação é, por conseguinte, inadmissível de acordo com o artigo 48.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, nos termos do qual é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

72

Resulta do exposto que não deve ser acolhida a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão contra o primeiro fundamento, salvo no que respeita à acusação baseada na duração da fase de análise preliminar.

Quanto à procedência do primeiro fundamento

73

No primeiro fundamento, a recorrente alega que decorre do artigo 88.o, n.o 2, CE e do artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 659/1999 que a Comissão é obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação quando não consegue eliminar todas as dúvidas quanto à compatibilidade de um auxílio estatal com o mercado comum no quadro da análise preliminar prevista no artigo 88.o, n.o 3, CE. Ora, em seu entender, a compatibilidade com o mercado comum da medida controvertida não era evidente e certas dificuldades de apreciação deveriam ter levado a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação, uma vez que considera que teria sido necessário um exame mais aprofundado e obter mais informações.

74

Em particular, a recorrente considera que a Comissão cometeu um erro de direito por ter considerado, por um lado, que a circunstância de não terem sido ultrapassados os limiares previstos no n.o 68 das orientações a impedia de proceder a um exame aprofundado da compatibilidade da medida em causa com o mercado comum e, por outro, que estava vinculada por esta interpretação errada da referida disposição.

75

A este respeito, importa recordar que, em virtude do artigo 88.o, n.o 3, CE, a Comissão procede a um exame dos auxílios de Estado previstos, que tem por objeto permitir-lhe formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade parcial ou total dos auxílios em causa com o mercado comum. O procedimento formal de investigação previsto pelo artigo 88.o, n.o 2, CE destina-se, por sua vez, a proteger os direitos de terceiros interessados e deve, além disso, permitir à Comissão ficar completamente esclarecida sobre todos os elementos do processo antes de tomar a sua decisão, nomeadamente mediante a recolha das observações de terceiros interessados e dos Estados-Membros. Embora o seu poder seja vinculado no que toca à decisão de dar início a este procedimento, a Comissão goza, contudo, de uma certa margem de apreciação na identificação e no exame das circunstâncias do caso em apreço, a fim de determinar se estas suscitam dificuldades sérias. Em conformidade com o objetivo do artigo 88.o, n.o 3, CE e com o dever de boa administração que lhe incumbe, a Comissão pode, designadamente, dar início a um diálogo com o Estado que procedeu à notificação ou com terceiros a fim de superar, na fase preliminar, as dificuldades que eventualmente tenha encontrado (v. acórdão do Tribunal Geral de 10 de fevereiro de 2009, Deutsche Post e DHL International/Comissão, T-388/03, Colet., p. II-199, n.o 87 e jurisprudência aí referida).

76

Segundo jurisprudência constante, o procedimento previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE reveste-se de caráter indispensável sempre que a Comissão depare com dificuldades sérias para apreciar se um auxílio é compatível com o mercado comum (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 88 e jurisprudência aí referida).

77

Assim, compete à Comissão determinar, em função das circunstâncias de facto e de direito de cada caso, se as dificuldades encontradas no exame da compatibilidade do auxílio impõem a abertura desse procedimento. Esta apreciação deve satisfazer três requisitos (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 89 e jurisprudência aí referida).

78

Em primeiro lugar, o artigo 88.o CE circunscreve o poder da Comissão de se pronunciar sobre a compatibilidade de um auxílio com o mercado comum no termo da fase preliminar apenas às medidas que não suscitam dificuldades sérias, pelo que este critério reveste caráter exclusivo. Assim, a Comissão não se pode recusar a dar início ao procedimento formal de investigação invocando outras circunstâncias, como o interesse de terceiros, considerações de economia processual ou qualquer outra razão de conveniência administrativa ou política (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 90 e jurisprudência aí referida).

79

Em segundo lugar, quando depara com dificuldades sérias, a Comissão está obrigada a dar início ao procedimento formal e não goza, a este respeito, de qualquer poder discricionário (acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 91).

80

Em terceiro lugar, o conceito de dificuldades sérias reveste caráter objetivo. A existência de tais dificuldades deve ser apreciada tanto em função das circunstâncias da adoção do ato impugnado como do seu conteúdo, de modo objetivo, relacionando as razões da decisão com os elementos de que a Comissão dispunha quando se pronunciou sobre a compatibilidade dos auxílios controvertidos com o mercado comum. Daqui resulta que a fiscalização da legalidade efetuada pelo Tribunal Geral no que toca à existência de dificuldades sérias excede, por natureza, a verificação de um erro manifesto de apreciação (v., neste sentido, acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 92 e jurisprudência aí referida).

81

Resulta igualmente da jurisprudência que o caráter insuficiente ou incompleto do exame levado a cabo pela Comissão no processo de investigação preliminar constitui um indício da existência de dificuldades sérias (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.o 75 supra, n.o 95 e jurisprudência aí referida).

82

Quando a Comissão aprecia a compatibilidade dos auxílios estatais com o mercado comum à luz da derrogação prevista no artigo 87.o, n.o 3, alínea a), CE, deve ter em conta o interesse comunitário e não pode deixar de avaliar a incidência dessas medidas no mercado ou mercados pertinentes do conjunto do EEE. Neste caso, a Comissão é obrigada não só a verificar que estas medidas são suscetíveis de contribuir efetivamente para o desenvolvimento económico das regiões em causa mas igualmente a avaliar o impacto dos seus auxílios nas trocas comerciais entre os Estados-Membros, designadamente a apreciar as repercussões setoriais que eles são suscetíveis de ter a nível comunitário (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de setembro de 2002, Espanha/Comissão, C-113/00, Colet., p. I-7601, n.o 67).

83

Nos termos do artigo 87.o, n.o 3, CE, a Comissão goza de um amplo poder de apreciação, cujo exercício implica complexas apreciações de ordem económica e social, que devem ser efetuadas num contexto comunitário. Neste quadro, a fiscalização jurisdicional aplicada ao exercício desse poder de apreciação limita-se à verificação do cumprimento das regras processuais e de fundamentação, bem como ao controlo da exatidão material dos factos considerados e de que não existe erro de direito, erro manifesto na apreciação dos factos ou desvio de poder (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 59 e jurisprudência aí referida).

84

No entanto, ao adotar regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que essas regras dizem respeito, a Comissão autolimita-se no exercício do seu poder de apreciação e não pode desrespeitar essas regras sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação de princípios gerais do direito, tais como os da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima, a menos que apresente razões para justificar, à luz desses princípios, o não cumprimento das suas próprias regras (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C-189/02 P, C-202/02 P, C-205/02 P a C-208/02 P e C-213/02 P, Colet., p. I-5425, n.o 211, e Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 60 e jurisprudência aí referida).

85

Importa recordar, a este respeito, que o n.o 68 das orientações estabelece um limiar de quotas de mercado (25%) e, para os setores cuja taxa de crescimento não é duravelmente superior à taxa de crescimento média do produto interno bruto do EEE, tais como o do cartão canelado, um limiar de aumento das capacidades de produção (5%) cuja ultrapassagem obriga a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE.

86

Na decisão impugnada, a Comissão entendeu que podia deduzir dessa disposição que, como tinha constatado no presente caso que os referidos limiares não seriam ultrapassados, estava obrigada a considerar o auxílio em causa compatível com o mercado comum, sem dar início ao procedimento formal de investigação. Por isso, cumpre examinar se, como a recorrente defende, a Comissão, ao fazê-lo, cometeu um erro de direito suscetível de a impedir de eliminar todas as dúvidas quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum.

87

A Comissão, como ela própria confirmou na audiência, considerou que, no caso vertente, estava obrigada a não dar início ao procedimento formal de investigação, por não terem sido ultrapassados os limiares fixados no n.o 68 das orientações. Por esta mesma razão, a Comissão considerou igualmente que os argumentos dos denunciantes deviam, de qualquer modo, ser rejeitados.

88

Ora, embora o n.o 68 das orientações estabeleça uma obrigação processual sem exceção para a Comissão, de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.o, n.o 2, CE quando os limiares são ultrapassados, mesmo se, a priori, a Comissão entender que o auxílio em causa é compatível com o mercado comum, não resulta, porém, do n.o 68 que não se deva dar início ao procedimento formal de investigação quando esses limiares não foram ultrapassados. Na verdade, esta disposição tem exclusivamente por efeito obrigar a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação no caso de os referidos limiares serem ultrapassados, mas não, de modo algum, de o impedir quando os limiares em questão não são ultrapassados. Nessa hipótese, a Comissão tem, é certo, a faculdade de não dar início ao procedimento formal de investigação, mas não pode justificar esta decisão alegando que é obrigada a tomá-la por força do n.o 68 das orientações.

89

Logo, ao deduzir a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum do facto de terem sido respeitados os limiares previstos no n.o 68 das orientações, a Comissão equivocou-se quanto ao alcance desta norma.

90

Por outro lado, como a recorrente alega, acertadamente, como resultado desse erro, a Comissão não exerceu a plenitude do seu poder de apreciação da compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, como estava obrigada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 14 de julho de 2011, Freistaat Sachsen/Comissão, T-357/02 RENV, Colet., p. II-5415, n.o 45).

91

A este respeito, segundo a jurisprudência (v. n.os 82 e 83 supra), a Comissão está obrigada a exercer o seu amplo poder de apreciação, de que dispõe em virtude do artigo 87.o, n.o 3, CE, da compatibilidade de um auxílio estatal concedido numa região em dificuldades, para determinar se os benefícios esperados em termos de desenvolvimento regional ultrapassam a distorção de concorrência e o efeito do projeto subsidiado no comércio entre os Estados-Membros.

92

Ora, não resulta da decisão impugnada que a Comissão tenha efetivamente procedido a esta apreciação para concluir que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum. Com efeito, no considerando 119 da decisão impugnada, a Comissão indicou que, como os limiares previstos no n.o 68 das orientações não foram atingidos, estava obrigada a não realizar uma análise aprofundada da questão de saber se os benefícios de uma medida de auxílio ultrapassam a distorção de concorrência que ela é suscetível de causar. Além disso, no considerando 120 da decisão impugnada, a Comissão considerou que o respeito das orientações era suficiente, por si só, para garantir a contribuição de uma medida de auxílio para o desenvolvimento regional.

93

A este respeito, as condições cujo cumprimento garante a aplicação das orientações, além do respeito dos limiares relativos às quotas de mercado e do aumento das capacidades de produção previstas no n.o 68, limitam-se aos elementos seguintes: em primeiro lugar, se a região onde se situa o projeto subsidiado pode efetivamente receber auxílios estatais «destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego» [artigo 87.o, n.o 3, alínea a), CE]; em segundo lugar, o respeito de um limite máximo da intensidade do auxílio, o qual depende do grau das limitações regionais; em terceiro e último lugar, o preenchimento de um certo número de requisitos processuais, como a apresentação pelo beneficiário de um pedido de subsídio antes do início das obras, e a garantia de que o beneficiário continuará a explorar a instalação subsidiada durante um período mínimo de cinco anos. Contudo, o facto de uma medida cumprir os referidos requisitos não basta para demonstrar que terá um efeito positivo a nível do desenvolvimento regional.

94

Na verdade, a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação no que toca à identificação e exame das circunstâncias em causa para determinar se um auxílio estatal pode ser declarado compatível com o mercado comum (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.o 44 supra, n.o 59 e jurisprudência aí referida). Não obstante, no caso vertente, a Comissão limitou-se a verificar que os inconvenientes causados pelo projeto subsidiado em termos de distorção de concorrência seriam mantidos a um nível limitado, mas não verificou se os benefícios em termos de desenvolvimento regional ultrapassariam os seus inconvenientes, por mínimos que fossem.

95

A este respeito, importa recordar que a Comissão tencionava adotar, antes de 1 de janeiro de 2007, novas diretrizes para completar as contidas nas orientações, nas quais ela indica os critérios que pretende tomar em consideração para apreciar se os auxílios examinados são necessários para proporcionar um efeito de incentivo ao investimento e se os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência dele resultante e o efeito sobre o comércio entre os Estados-Membros (v. n.o 13 supra).

96

Deste modo, a recorrente tem razão ao afirmar que as apreciações realizadas na decisão impugnada não podiam, por si sós, permitir à Comissão eliminar qualquer dúvida quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum à luz da derrogação prevista no artigo 87.o, n.o 3, alínea a), CE. Com efeito, como foi acima recordado no n.o 91, a aplicação dessa derrogação pressupõe que as vantagens da medida em causa ultrapassem os seus inconvenientes, por mínimos que sejam (v., neste sentido, acórdão Espanha/Comissão, referido no n.o 82 supra, n.o 67).

97

Decorre do exposto que a Comissão, ao deduzir do facto de que o auxílio em causa respeitava as orientações, sem apreciar a importância do projeto subsidiado em termos de desenvolvimento regional, que este era compatível com o mercado comum e que estava obrigada a não dar início ao procedimento formal de investigação, não só se equivocou quanto ao alcance das orientações como omitiu ainda o exercício do seu poder de apreciação. A recorrente tem, portanto, razão ao sustentar que, não tendo tomado em conta os critérios que deviam guiar a sua apreciação, a Comissão não fez tudo o que era necessário para eliminar completamente as dúvidas quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum.

98

Logo, sem que seja necessário apreciar a admissibilidade dos outros argumentos do recurso nem decidir sobre a sua procedência, importa constatar que a decisão impugnada deve ser anulada.

Quanto às despesas

99

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Uma vez que a Comissão e a interveniente foram vencidas, há que condená-las nas despesas, em conformidade com o pedido da recorrente.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

 

1)

É anulada a decisão C (2008) 1107 da Comissão, de 2 de abril de 2008, que declara compatível com o mercado comum o auxílio com finalidade regional que as autoridades alemãs tencionam conceder à Propapier PM2 para a construção de uma fábrica papeleira em Eisenhüttenstadt (Região de Brandeburgo — Nordeste) (auxílio estatal N 582/2007 — Alemanha).

 

2)

A Comissão Europeia e a Propapier PM 2 GmbH são condenadas nas despesas.

 

Azizi

Frimodt Nielsen

Popescu

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de julho de 2012.

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

( 1 ) Dado confidencial ocultado.

Início

Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória

Partes

No processo T-304/08,

Smurfit Kappa Group plc, com sede em Dublim (Irlanda), representada por T. Ottervanger e E. Henny, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por B. Martenczuk e C. Urraca Caviedes, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Propapier PM 2 GmbH, anteriormente Propapier PM2 GmbH & Co. KG, com sede em Eisenhüttenstadt (Alemanha), representada por H.-J. Niemeyer e C. Herrmann, advogados,

interveniente,

que tem por objeto um pedido de anulação da decisão C (2008) 1107 da Comissão, de 2 de abril de 2008, que declara compatível com o mercado comum o auxílio com finalidade regional que as autoridades alemãs tencionam conceder à Propapier PM2 para a construção de uma fábrica papeleira em Eisenhüttenstadt (Região de Brandeburgo — Nordeste) (auxílio estatal N 582/2007 — Alemanha),

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, S. Frimodt Nielsen (relator) e A. Popescu, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 28 de novembro de 2011,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão

Antecedentes do litígio

1. A recorrente, Smurfit Kappa Group plc, é uma empresa internacional com sede na Irlanda. Exerce as suas atividades no setor da embalagem, principalmente na Europa e na América Latina. Fabrica e comercializa produtos de embalagem canelados (a seguir «produtos CCM»), folhas de cartão canelado e de cartão compacto, caixas em cartão canelado e em cartão compacto, cartões gráficos e cartões especiais. Procede igualmente à recuperação de resíduos de papel reciclado.

2. Por carta de 8 de outubro de 2007, as autoridades alemãs notificaram a Comissão Europeia da sua intenção de conceder à Propapier PM2 GmbH & Co. KG uma subvenção ao investimento no montante de 82 509 500 euros (ou seja, de 72 154 700 euros no valor atual) (a seguir «auxílio em causa»), para a construção de uma papeleira e de um grupo eletrogéneo em Eisenhüttenstadt, na Região de Brandeburgo — Nordeste (Alemanha). A Comissão registou essa notificação sob a referência N 582/2007.

3. A papeleira financiada pelo auxílio em causa destinava-se a fabricar dois tipos de produtos CCM, a saber, por um lado, folhas de cartão liso de uma gramagem até 150 g/m² e, por outro, caneluras fabricadas a partir de fibras recicladas. A construção da instalação devia decorrer entre o mês de dezembro de 2007 e a primeira metade do ano de 2010.

4. Em 9 de novembro de 2007, a recorrente apresentou à Comissão uma denúncia confidencial relativa ao auxílio em causa.

5. Por carta de 7 de dezembro de 2007, a Comissão dirigiu à República Federal da Alemanha um pedido de informações complementares. As autoridades alemãs responderam a este pedido de informações por carta de 3 de janeiro de 2008.

6. Em 25 de janeiro de 2008, teve lugar uma reunião entre os serviços da Comissão e as autoridades alemãs, com a presença de representantes da interveniente.

7. Em 29 de janeiro de 2008, duas denúncias formais foram registadas pela Comissão e transmitidas à República Federal da Alemanha para observações.

8. Por carta de 1 de fevereiro de 2008, a Comissão dirigiu um novo pedido de informações à República Federal da Alemanha.

9. Por cartas de 6 e 14 de fevereiro de 2008, a República Federal da Alemanha respondeu, respetivamente, às denúncias acima mencionadas no n.° 7 assim como ao pedido de informações mencionado no n.° 8 supra.

10. Em 20 de fevereiro de 2008, a Comissão recebeu uma terceira denúncia formal. Esta não foi comunicada ao Estado-Membro, dado que se baseava nos mesmos argumentos que as duas primeiras.

11. Em 2 de abril de 2008, sem dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, a Comissão adotou a decisão C (2008) 1107, que declara compatível com o mercado comum o auxílio em causa (a seguir «decisão impugnada»).

12. Na decisão impugnada, a Comissão constatou, designadamente, que o auxílio em causa não ultrapassava os limiares previstos no n.° 68 das Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para o período 2007-2013 (JO 2006, C 54, p. 13), que é do seguinte teor:

«Quando o montante total do auxílio proveniente de todas as fontes ultrapassar 75% do montante máximo de auxílio suscetível de ser concedido a um investimento cujas despesas elegíveis se elevem a 100 milhões de euros, aplicando o limite máximo de auxílio normal em vigor para as grandes empresas no mapa de auxílios com finalidade regional aprovado, na data em que o auxílio será concedido, e quando

(a) O beneficiário do auxílio é responsável por mais de 25% das vendas do(s) produto(s) em questão no(s) mercado(s) em causa antes do investimento ou será responsável por mais de 25% após o investimento, ou

(b) A capacidade de produção criada pelo projeto é superior a 5% da dimensão do mercado, calculada utilizando os dados relativos ao consumo aparente do produto em causa, exceto se a taxa de crescimento média anual do consumo aparente durante os últimos cinco anos for superior à taxa de crescimento média anual do PIB do Espaço Económico Europeu,

a Comissão apenas aprovará auxílios ao investimento com finalidade regional após ter verificado, de forma circunstanciada, na sequência do início do procedimento previsto no n.° 2 do artigo 88.° [CE], que o auxílio é necessário para proporcionar um efeito de incentivo ao investimento e que os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência del[e] resultante e o efeito sobre [o] comércio entre os Estados-Membros.»

13. Na nota de pé de página n.° 63 do referido número, precisa-se que a Comissão pretendia elaborar, antes da entrada em vigor das orientações, isto é, 1 de janeiro de 2007, novas diretrizes sobre os critérios que entende dever tomar em consideração para avaliar se o auxílio é necessário para produzir um efeito de incentivo ao investimento e se os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência e os efeitos sobre o comércio entre os Estados-Membros que daí resultem.

14. Nos considerandos 119 e 120 da decisão impugnada, a Comissão rejeitou os argumentos apresentados nas denúncias que tinha recebido sobre o auxílio em causa (v. n. os  4, 7 e 10 supra ), indicando que se considerava vinculada pelas orientações, as quais, em seu entender, a impediam de dar início ao procedimento formal de investigação nos processos nos quais não foram ultrapassados os limiares fixados no n.° 68 das referidas orientações. A este respeito, segundo a Comissão, os referidos limiares de quotas de mercado e de aumento das capacidades de produção garantem para qualquer projeto subsidiado, por um lado, que a distorção de concorrência previsível não exceda os benefícios esperados e, por outro, que seja dada uma contribuição suficiente para o objetivo de desenvolvimento regional.

Tramitação processual e pedidos das partes

15. Por petição registada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de agosto de 2008, a recorrente interpôs o presente recurso.

16. Por requerimento registado na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de dezembro de 2008, a Propapier PM2 GmbH & Co. KG, que, no decurso do procedimento, se converteu na Propapier PM 2 GmbH, pediu para intervir no presente processo em apoio da Comissão. Por despacho de 21 de abril de 2009, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral admitiu essa intervenção.

17. Em 14 de maio de 2009, a interveniente contestou que lhe tivessem sido integralmente transmitidos os autos do processo. Após ter recebido uma carta da Secretaria que a assegurava do contrário, a interveniente não manteve a sua contestação.

18. Como a recorrente solicitou que certas partes dos articulados trocados durante a fase escrita do processo fossem tratadas confidencialmente quanto à interveniente, e como esta contestou alguns desses pedidos, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral, por despacho de 5 de julho de 2010, deferiu parcialmente o pedido da recorrente. Deste modo, certas informações suplementares foram comunicadas à interveniente e esta foi autorizada a completar as suas alegações de intervenção.

19. Tendo a composição das Secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz-relator inicialmente designado foi afetado à Primeira Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, distribuído. Por se encontrar impedido um dos membros da Primeira Secção, o presidente do Tribunal Geral designou outro juiz para completar a Secção, nos termos do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

20. A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾ anular a decisão impugnada;

¾ condenar a Comissão e a interveniente nas despesas.

21. A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾ negar provimento ao recurso;

¾ condenar a recorrente nas despesas.

22. A interveniente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾ negar provimento ao recurso;

¾ condenar a recorrente nas despesas.

23. Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral e, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes.

24. Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões do Tribunal Geral na audiência de 28 de novembro de 2011.

25. Na audiência, a Comissão e a interveniente não contestaram a admissibilidade da petição quanto ao cumprimento da obrigação prevista no artigo 44.°, n.° 5, alínea a), do Regulamento de Processo, tal como consta da ata da audiência.

26. No fim da audiência, o Tribunal fixou um prazo de três semanas contadas a partir da notificação da ata da audiência, para a recorrente apresentar qualquer elemento de prova que considerasse necessário para demonstrar a regularidade do mandato conferido aos seus advogados.

27. Os documentos apresentados pela recorrente no prazo que lhe foi dado foram comunicados à Comissão e à interveniente, para que pudessem formular as suas observações. Em 25 de janeiro de 2012, após ter recebido essas observações, o Tribunal encerrou a fase oral do processo.

Questões de direito

Quanto à admissibilidade

28. A Comissão e a interveniente contestam, por um lado, a admissibilidade da petição atendendo às exigências previstas no artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo. A Comissão contesta igualmente, por outro lado, a legitimidade ativa da recorrente para impugnar a decisão.

Quanto à regularidade do mandato conferido pela recorrente aos seus advogados

29. Nos termos do artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo, se o recorrente for uma pessoa coletiva de direito privado, deve juntar à petição a prova de que o mandato conferido ao advogado foi regularmente outorgado por um representante com poderes para o efeito. Nos termos do artigo 44.°, n.° 6, do referido regulamento, se a petição não preencher o requisito referido, o secretário fixa ao recorrente um prazo razoável para a regularizar ou apresentar os documentos acima referidos. Na falta de regularização ou apresentação dos documentos no prazo fixado, o Tribunal Geral decide se a inobservância daqueles requisitos importa o não recebimento da petição por vício de forma.

30. Decorre dessas disposições que o secretário do Tribunal Geral tem de solicitar a uma pessoa coletiva de direito privado que proceda à regularização da sua petição caso essa pessoa coletiva não cumpra a obrigação que lhe incumbe de provar a regularidade do mandato conferido aos seus advogados e que só se a recorrente não der cumprimento ao convite do secretário no prazo que lhe é fixado é que o Tribunal Geral tem a faculdade de declarar a inadmissibilidade do recurso.

31. O presente recurso foi interposto em 5 de agosto de 2008, em nome da recorrente, por T. Ottervanger e E. Henny, advogados de Amesterdão (Países Baixos). A recorrente juntou à sua petição um mandato que autorizava os referidos advogados a interpor o presente recurso. Esse mandato tinha sido outorgado por O’Riordan, na qualidade de secretário-geral do grupo.

32. Em aplicação do artigo 44.°, n.° 6, do Regulamento de Processo, o secretário fixou à recorrente um prazo para fornecer a prova de que o mandante tinha poder para adotar o referido ato em nome da sociedade. Dentro do prazo que lhe tinha sido fixado, a recorrente, embora mantendo que o secretário-geral do grupo era competente, em virtude da lei irlandesa, para conferir mandato aos advogados para agir em juízo por conta da sociedade, apresentou um segundo mandato, datado de 28 de agosto de 2008 e outorgado por G. McGann, na qualidade de administrador.

33. Dado que a interveniente e a Comissão tinham contestado a competência de O’Riordan e de G. McGann, a recorrente apresentou, antes do encerramento da fase oral do processo, uma resolução, adotada em 8 de dezembro de 2011 pelo conselho de administração da sociedade, na qual se confirmava que G. McGann, como diretor-geral e um dos administradores da sociedade, era competente para outorgar o segundo mandato.

34. Em primeiro lugar, a interveniente contesta que, em caso de incumprimento da obrigação prevista no artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo, exista a possibilidade de uma regularização no decurso da instância. Essa alegação deve ser rejeitada, dado que essa possibilidade de regularização está prevista no artigo 44.°, n.° 6, do mesmo regulamento, o qual prevê que o secretário fixará um prazo para a regularização da petição e que, na falta de regularização no prazo fixado, o Tribunal Geral deve apreciar a questão de saber se esse facto importa a inadmissibilidade do recurso (v. n.° 29 supra ).

35. No caso em apreço, como foi acima recordado no n.° 32, a recorrente apresentou o segundo mandato no prazo fixado pelo secretário do Tribunal Geral. Importa, por isso, examinar, em segundo lugar, se o segundo mandato satisfaz as exigências do artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo.

36. A este respeito, a Comissão e a interveniente sustentam que os artigos 66.° a 68.° dos estatutos em anexo à regularização da petição, que já não contestam que sejam os estatutos da recorrente, estabelecem que a decisão de agir em juízo e de conferir mandato a advogados em nome da sociedade é da competência colegial do conselho de administração e que pode ser delegada num ou vários administradores. A Comissão e a interveniente sustentam, por isso, que, não tendo sido provada a existência de uma deliberação do conselho de administração no sentido de encarregar T. Ottervanger e E. Henny de interpor recurso de anulação da decisão impugnada ou de uma deliberação delegando esse poder em G. McGann, a recorrente não cumpriu a obrigação prevista no artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo.

37. Embora o Tribunal não possa dar por provado que G. McGann podia, à data, outorgar o segundo mandato, uma vez que a recorrente não apresentou uma deliberação anterior do conselho de administração da sociedade no sentido de interpor o presente recurso ou de conferir a G. McGann o poder de decidir intentar tais ações, há que constatar, em qualquer caso, que o conselho de administração confirmou, por deliberação de 8 de dezembro de 2011, que G. McGann, diretor-geral e administrador da sociedade, era competente para esse efeito (v. n.° 33 supra ).

38. Sendo certo que, como alega a interveniente, esta confirmação teve lugar mais de três anos após a interposição do presente recurso e que é possível que a composição do conselho de administração da sociedade se tenha modificado após a data do segundo mandato, não existe, pelo contrário, nenhuma dúvida quanto à vontade da recorrente, que está juridicamente vinculada em face de terceiros pelas deliberações do seu conselho de administração, de prosseguir o presente recurso.

39. Assim, não deve ser acolhida a exceção de inadmissibilidade formulada pela interveniente e pela Comissão e baseada em que a petição não satisfaz as exigências que decorrem do artigo 44.°, n.° 5, alínea b), do Regulamento de Processo (v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de maio de 1989, Maurissen e Union syndicale/Tribunal de Contas, 193/87 e 194/87, Colet., p. 1045, n. os  33 e 34).

Quanto à legitimidade ativa da recorrente

40. A Comissão, apoiada pela interveniente, alega que, embora a recorrente seja uma parte interessada, a decisão impugnada não lhe diz individualmente respeito. Por conseguinte, entende que a recorrente não tem legitimidade para contestar a justeza das apreciações relativas à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum que constam da decisão impugnada. Ora, todos os argumentos apresentados na petição visam pôr em causa a justeza destas apreciações relativas à compatibilidade do auxílio controvertido com o mercado comum e não sustentar que foram violados os direitos processuais garantidos à recorrente pelo artigo 88.°, n.° 2, CE.

41. Por outro lado, a Comissão afirma que a alegação da recorrente segundo a qual a duração do procedimento administrativo demonstra a existência de dificuldades sérias que teriam tornado necessário dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE foi apresentada pela primeira vez na réplica e é, por isso, igualmente inadmissível. Daqui decorre, segundo a Comissão, que nenhum dos fundamentos do recurso é admissível.

42. Antes de mais, importa assinalar que, apesar da entrada em vigor no decurso da instância, mais concretamente em 1 de dezembro de 2009, do artigo 263.° TFUE, a questão da admissibilidade do pedido de anulação da decisão impugnada deve ser resolvida apenas com base no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE (v., neste sentido, despachos do Tribunal Geral de 7 de setembro de 2010, Norilsk Nickel Harjavalta e Umicore/Comissão, T-532/08, Colet., p. II-3959, n. os  68 a 75, e Etimine e Etiproducts/Comissão, T-539/08, Colet., p. II-4017, n. os  74 a 81), o que não é contestado pelas partes.

43. Nos termos do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, uma pessoa singular ou coletiva só pode interpor recurso de uma decisão dirigida a outra pessoa se a referida decisão lhe disser direta e individualmente respeito.

44. Segundo jurisprudência assente, os sujeitos que não sejam destinatários de uma decisão só podem alegar que esta lhes diz individualmente respeito se os prejudicar em razão de determinadas qualidades que lhes são específicas ou de uma situação de facto que os caracterize relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando-os, por isso, de forma idêntica à do destinatário dessa decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colet.,1962-1964, pp. 279, 284; de 19 de maio de 1993, Cook/Comissão, C-198/91, Colet., p. I-2487, n.° 20; de 15 de junho de 1993, Matra/Comissão, C-225/91, Colet., p. I-3203, n.° 14; de 13 de dezembro de 2005, Comissão/Aktionsgemeinschaft Recht und Eigentum, C-78/03 P, Colet., p. I-10737, n.° 33; e de 11 de setembro de 2008, Alemanha e o./Kronofrance, C-75/05 P e C-80/05 P, Colet., p. I-6619, n.° 36).

45. Dado que o presente recurso diz respeito a uma decisão da Comissão em matéria de auxílios estatais, importa recordar que, no âmbito do procedimento de controlo desses auxílios, é preciso distinguir entre, por um lado, a fase preliminar de investigação dos auxílios instituída pelo n.° 3 do artigo 88.° CE, que tem apenas por objetivo permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade parcial ou total do auxílio em causa, e, por outro, a fase da investigação a que se refere o n.° 2 do mesmo artigo. É apenas no âmbito desta fase, que se destina a permitir à Comissão ter uma informação completa sobre todos os dados do caso, que o Tratado prevê a obrigação da Comissão de dar aos interessados a oportunidade de apresentarem as suas observações (v., neste sentido, acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 37 e jurisprudência aí referida).

46. Daqui resulta que, quando, sem iniciar o procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, a Comissão concluir, através de uma decisão adotada com base no n.° 3 do mesmo artigo, que um auxílio é compatível com o mercado comum, os beneficiários dessas garantias processuais só podem conseguir que elas sejam respeitadas se tiverem a possibilidade de impugnar essa decisão perante o juiz da União. Por estas razões, este último julga admissível um recurso de anulação de tal decisão, interposto por um interessado na aceção do artigo 88.°, n.° 2, CE, quando o autor desse recurso pretenda, com a sua interposição, salvaguardar os direitos processuais que lhe são conferidos por esta última disposição (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 38 e jurisprudência aí referida).

47. Em virtude do artigo 1.°, alínea h), do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° CE] (JO L 83, p. 1), consideram-se partes interessadas na aceção do artigo 88.°, n.° 2, CE todas as pessoas, empresas ou associações de empresas cujos interesses podem ser afetados pela concessão de um auxílio, ou seja, em particular, empresas concorrentes do beneficiário desse auxílio. Segundo a jurisprudência, trata-se, por outras palavras, de um conjunto indeterminado de destinatários (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C-83/09 P, Colet., p. I-4441, n.° 63; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de novembro de 1984, Intermills/Comissão, 323/82, Recueil, p. 3809, n.° 16).

48. Em contrapartida, se o recorrente põe em causa a justeza da decisão de apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado comum, o simples facto de poder ser considerado interessado, na aceção do artigo 88.°, n.° 2, CE, não basta para a admissibilidade do recurso. Deve também demonstrar que tem um estatuto particular, na aceção do acórdão Plaumann/Comissão, referido no n.° 44 supra. Será esse o caso, nomeadamente, se a posição do recorrente no mercado for substancialmente afetada pelo auxílio objeto da decisão em causa (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 40 e jurisprudência aí referida).

49. No que diz respeito à conclusão de que a posição da recorrente no mercado em causa foi substancialmente afetada, a simples circunstância de um ato ser suscetível de exercer uma certa influência sobre as relações de concorrência existentes no mercado pertinente e de a empresa em causa se encontrar numa qualquer relação de concorrência com o beneficiário desse ato não é suficiente. Assim, uma empresa não pode invocar unicamente a sua qualidade de concorrente da empresa beneficiária, mas deve provar, além disso, que está numa posição de facto que a individualiza de forma análoga à do destinatário da decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C-525/04 P, Colet., p. I-9947, n. os  32 e 33, e de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C-487/06 P, Colet., p. I-10515, n. os  47 e 48).

50. Por último, em conformidade com jurisprudência assente, não compete ao juiz da União interpretar um recurso que põe exclusivamente em causa a justeza de uma decisão de apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado comum visando, na realidade, salvaguardar os direitos processuais do recorrente baseados no artigo 88.°, n.° 2, CE, se o recorrente não tiver expressamente alegado um fundamento com essa finalidade. Nessa hipótese, a interpretação do fundamento do recurso conduziria de facto a uma requalificação do seu objeto (acórdão Comissão/Kronoply e Kronotex, referido no n.° 47 supra, n.° 55; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de novembro de 2007, Stadtwerke Schwäbisch Hall e o./Comissão, C-176/06 P, não publicado na Coletânea, n.° 25).

51. Todavia, esse limite ao poder de interpretação dos fundamentos do recurso não tem o efeito de impedir o juiz da União de analisar os argumentos de mérito apresentados por um recorrente, a fim de verificar se os mesmos trariam também elementos em apoio a um fundamento, que sustenta expressamente a existência de dificuldades sérias que teriam justificado a abertura do procedimento visado no artigo 88.°, n.° 2, CE (acórdão Comissão/Kronoply e Kronotex, referido no n.° 47 supra, n.° 56).

52. Com efeito, quando um recorrente pede a anulação de uma decisão de não levantar objeções, põe em causa essencialmente o facto de a decisão da Comissão sobre o auxílio em causa ter sido adotada sem que essa instituição tenha dado início ao procedimento formal de investigação, violando assim os seus direitos processuais. Para que o seu pedido de anulação proceda, o recorrente pode invocar todos os fundamentos que demonstrem que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispõe, na fase preliminar de análise da medida notificada, deveria ter suscitado dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum. A utilização desses argumentos não pode ter por efeito alterar o objeto do recurso nem alterar os pressupostos da sua admissibilidade. Pelo contrário, a existência de dúvidas sobre essa compatibilidade é precisamente a prova que deve ser apresentada para demonstrar que a Comissão devia ter dado início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE e no artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999 (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2011, Áustria/Scheucher-Fleisch e o., C-47/10 P, Colet., p. I-10707, n.° 50 e jurisprudência aí referida).

53. É à luz destes princípios que importa examinar a situação processual da recorrente.

54. A este respeito, importa precisar desde logo, como a Comissão e a interveniente concordaram, que a recorrente é uma parte interessada na aceção do artigo 88.°, n.° 2, CE. Com efeito, sustenta que é uma concorrente direta da interveniente, sem ser contrariada pela Comissão, nem pela interveniente, nem pelos documentos do processo. Pelo contrário, as partes estão em desacordo quanto à questão de saber se a decisão impugnada diz individualmente respeito à recorrente e se, nesta base, ela pode contestar a justeza das apreciações da decisão impugnada sobre a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, independentemente da salvaguarda dos seus direitos processuais.

55. Ora, se a recorrente forneceu elementos suficientes para demonstrar que a sua situação concorrencial era suscetível de ser afetada pelo auxílio em causa, não provou contudo que a sua posição no mercado seria substancialmente afetada no sentido da jurisprudência acima recordada nos n. os  48 e 49.

56. Em primeiro lugar, a recorrente invoca a sua participação no procedimento administrativo, no qual apresentou denúncia de maneira confidencial após a notificação do auxílio em causa. Contudo, a participação de uma empresa na fase de análise preliminar prevista no artigo 4.° do Regulamento n.° 659/1999 não permite provar, com base apenas na sua qualidade de denunciante, que a decisão adotada no fim do referido procedimento lhe diz individualmente respeito (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de julho de 2009, 3F/Comissão, C-319/07 P, Colet., p. I-5963, n. os  94 e 95).

57. Em segundo lugar, a recorrente alega que o mercado dos produtos CCM é um mercado integrado e que qualquer auxílio de Estado concedido a um produtor tem efeitos sobre o conjunto dos seus concorrentes no Espaço Económico Europeu (EEE). Contudo, resulta das indicações fornecidas pela recorrente na sua denúncia confidencial que o setor dos produtos CCM no EEE agrupa aproximadamente 130 sociedades. Este argumento da recorrente destaca assim o facto de que o auxílio concedido influenciará as relações de concorrência entre os operadores, mas não é suficiente para provar que a posição concorrencial da recorrente será substancialmente afetada de maneira a distingui-la da generalidade dos operadores.

58. Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que o auxílio em causa permitirá a construção da maior fábrica de produtos CCM na Europa e que a entrada em funcionamento dessa instalação terá necessariamente um impacto sensível no nível dos preços. Do mesmo modo que a anterior, esta alegação, que é contestada pela interveniente, é, de qualquer modo, insuficiente para demonstrar que a decisão impugnada diz individualmente respeito à recorrente, uma vez que não invoca nenhuma particularidade da sua situação suscetível de provar que seria afetada pela abertura dessa fábrica de maneira distinta da generalidade dos outros concorrentes da interveniente.

59. Em quarto lugar, a recorrente indica que o mercado dos produtos CCM se encontra numa situação de desequilíbrio estrutural caracterizada por capacidades de produção excedentárias e que foi obrigada a encerrar um grande número das suas próprias instalações. Não obstante, como alegam a interveniente e a Comissão, o encerramento das instalações pode ser explicado pelo facto de a recorrente ter tomado decisões de gestão autónomas, como a adaptação das suas instalações existentes ao progresso técnico ou a racionalização do seu sistema produtivo, e a recorrente não apresentou nenhum elemento de prova suscetível de demonstrar que não encerrou as suas instalações devido ao seu caráter vetusto. De qualquer modo, e mesmo admitindo que a recorrente tivesse sido forçada a reduzir as suas capacidades de produção devido a um desequilíbrio estrutural entre a oferta e a procura de produtos CCM, isso não teria sido causado pela instalação subsidiada pelo auxílio em causa e, por si só, não seria suscetível de distinguir a recorrente dos outros concorrentes da interveniente (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 18 de novembro de 2009, Scheucher-Fleisch e o./Comissão, T-375/04, Colet., p. II-4155, n. os  59 e 60).

60. Em quinto lugar, e por último, o argumento da recorrente segundo o qual possui seis instalações num raio de 800 km a 1 000 km da instalação subsidiada pelo auxílio em causa e isto daria lugar a que a interveniente se tornaria na sua principal concorrente direta parece à primeira vista contradizer o seu segundo argumento, segundo o qual, como o mercado dos produtos CCM é perfeitamente concorrencial e integrado, qualquer subsídio concedido a qualquer produtor afetará necessariamente o nível dos preços do conjunto dos seus concorrentes no EEE. De qualquer modo, a mera circunstância de a recorrente possuir seis instalações na proximidade da instalação subsidiada e de o auxílio em causa permitir à interveniente produzir até cerca de um milhão de toneladas por ano de produtos CCM, ao passo que, em comparação, a produção da recorrente nessas seis fábricas atinge aproximadamente uma capacidade anual total de cerca de [ confidencial ] (1), não permite concluir que a posição da recorrente no mercado é substancialmente afetada. Com efeito, a interveniente, afirmou, sem ter sido contestada, que a recorrente não é a sua concorrente mais direta, que os mercados geográficos de ambas são diferentes e que, mesmo admitindo que o critério da proximidade geográfica das instalações seja o mais pertinente, outros concorrentes distintos da recorrente têm instalações mais próximas que a que deve ser construída em Eisenhüttenstadt.

61. Resulta do exposto que a recorrente não demonstrou que o auxílio em causa era suscetível de afetar de maneira substancial a sua posição no mercado. Nestas condições, a recorrente, na sua qualidade de parte interessada, só pode procurar a proteção dos direitos processuais que lhe são garantidos pelo artigo 88.°, n.° 2, CE e contestar a recusa da Comissão de dar início ao procedimento formal de investigação, mas não pôr em causa a justeza das apreciações com base nas quais a Comissão conclui que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum. Deste modo, dado que a Comissão e a interveniente alegam que nenhum dos fundamentos do presente recurso visa salvaguardar os direitos processuais de uma parte interessada, há que examinar a natureza dos fundamentos aduzidos pela recorrente.

62. Em virtude da jurisprudência acima referida nos n. os  50 a 52, o facto de a recorrente não ter conseguido demonstrar que a sua posição no mercado seria substancialmente afetada pelo auxílio em causa não obsta a que, para demonstrar que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto à compatibilidade desse auxílio com o mercado comum que justificavam o início do procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, apresente argumentos relativos à justeza da apreciação realizada pela Comissão, desde que pelo menos um dos fundamentos do seu recurso assente no incumprimento, pela Comissão, da sua obrigação de dar início ao procedimento formal de investigação. A este respeito, há ainda que recordar que a Comissão deve dar início ao procedimento formal de investigação designadamente se, à luz das informações obtidas no decurso da análise preliminar, continuar confrontada com dificuldades sérias de apreciação da medida considerada. Esta obrigação resulta di retamente do artigo 88.°, n.° 3, CE, conforme foi interpretado pela jurisprudência, bem como do artigo 4.°, n.° 4, do Regulamento n.° 659/1999, quando a Comissão constata, após a análise preliminar, que a medida ilegal suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum (acórdão do Tribunal Geral de 12 de fevereiro de 2008, BUPA e o./Comissão, T-289/03, Colet., p. II-81, n.° 328).

63. Ora, a recorrente precisa, a título liminar, que contesta o facto de que a Comissão acreditava poder adotar uma decisão positiva sem dar início ao procedimento formal de investigação. Considera, designadamente, que a Comissão não podia invocar os limiares que definiu nas suas orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para recusar proceder a uma apreciação concreta dos efeitos da medida em causa. Assim, esta ponderação dos efeitos decorrentes da medida controvertida exigiria a abertura do procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. Além disso, a recorrente alega que o facto de não ter sido iniciado o procedimento formal de investigação a impediu de exercer os seus direitos processuais.

64. A este respeito, o primeiro fundamento do recurso baseia-se no incumprimento, pela Comissão, da obrigação que lhe incumbia, no caso vertente, de dar início ao procedimento formal de investigação, em violação do artigo 88.°, n.° 2, CE e do artigo 4.°, n.° 4, do Regulamento n.° 659/1999.

65. Assim, pelo menos um dos fundamentos do recurso visa expressamente a salvaguarda dos direitos processuais da recorrente. Nestas condições, contrariamente ao que é sustentado pela Comissão e pela interveniente, os argumentos apresentados pela recorrente, embora digam respeito à justeza das apreciações relativas à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, devem ser examinados apenas na medida em que visam demonstrar que a Comissão não chegou a superar as dificuldades sérias com as quais foi confrontada durante a fase de análise preliminar (v. n.° 52 supra ). Daqui resulta que a exceção de inadmissibilidade formulada pela Comissão contra a totalidade do recurso não pode ser acolhida, devendo ser examinada caso por caso a admissibilidade dos fundamentos formulados pela recorrente e dos argumentos apresentados no quadro de cada um desses fundamentos.

Quanto ao mérito

66. O primeiro fundamento do recurso baseia-se no incumprimento, pela Comissão, da obrigação que lhe incumbia, no caso vertente, de dar início ao procedimento formal de investigação, em violação do artigo 88.°, n.° 2, CE e do artigo 4.°, n.° 4, do Regulamento n.° 659/1999. Embora não tenha sido formalmente articulado em duas partes, esse fundamento inclui duas acusações distintas. Por um lado, a recorrente critica, no essencial, a Comissão por ter cometido um erro de direito quando deduziu do n.° 68 das orientações que, como os limiares aí previstos não tinham sido ultrapassados, podia concluir que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum, e não tinha de dar início ao procedimento formal de investigação. Por outro, a recorrente aduz vários argumentos suscetíveis de demonstrar que a Comissão se deparou com dificuldades de apreciação dos critérios previstos no n.° 68 das orientações que teriam justificado a abertura do procedimento formal de investigação.

Quanto à admissibilidade do primeiro fundamento

67. A Comissão contesta a admissibilidade do primeiro fundamento, uma vez que a recorrente invoca, no âmbito deste, argumentos que visam pôr em causa a justeza das apreciações realizadas na decisão impugnada.

68. Importa, contudo, recordar que a recorrente, na sua qualidade de parte interessada, pode alegar que a Comissão deveria ter dado início ao procedimento formal de investigação. Para este fim, a recorrente pode igualmente apresentar, em apoio desse fundamento, argumentos suscetíveis de demonstrar que a apreciação das informações e dos elementos de que a Comissão dispunha na fase de análise preliminar do auxílio em causa deveria ter suscitado dúvidas quanto à compatibilidade deste com o mercado comum (v., neste sentido, acórdão Áustria/Scheucher-Fleisch e o., referido no n.° 52 supra, n.° 50).

69. Ora, importa recordar que, na decisão impugnada, a Comissão atribuiu importância decisiva, ao apreciar a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, ao facto de que os limiares previstos no n.° 68 das orientações não tinham sido ultrapassados.

70. A recorrente pode, por isso, para salvaguardar os seus direitos processuais, contestar o erro de direito que, em seu entender, a Comissão cometeu por ter deduzido a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum do facto de que os limiares previstos no n.° 68 das orientações não tinham sido ultrapassados e pôr em causa as apreciações factuais que permitiram à Comissão afirmar com certeza que esses limiares não tinham sido ultrapassados no caso vertente.

71. A Comissão, ao invés, tem razão quando afirma que a acusação, apresentada pela primeira vez na réplica, baseada na duração da fase preliminar de análise, é um fundamento novo e não está relacionada com os argumentos contidos na petição. Esta última acusação é, por conseguinte, inadmissível de acordo com o artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, nos termos do qual é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

72. Resulta do exposto que não deve ser acolhida a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão contra o primeiro fundamento, salvo no que respeita à acusação baseada na duração da fase de análise preliminar.

Quanto à procedência do primeiro fundamento

73. No primeiro fundamento, a recorrente alega que decorre do artigo 88.°, n.° 2, CE e do artigo 4.°, n.° 4, do Regulamento n.° 659/1999 que a Comissão é obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação quando não consegue eliminar todas as dúvidas quanto à compatibilidade de um auxílio estatal com o mercado comum no quadro da análise preliminar prevista no artigo 88.°, n.° 3, CE. Ora, em seu entender, a compatibilidade com o mercado comum da medida controvertida não era evidente e certas dificuldades de apreciação deveriam ter levado a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação, uma vez que considera que teria sido necessário um exame mais aprofundado e obter mais informações.

74. Em particular, a recorrente considera que a Comissão cometeu um erro de direito por ter considerado, por um lado, que a circunstância de não terem sido ultrapassados os limiares previstos no n.° 68 das orientações a impedia de proceder a um exame aprofundado da compatibilidade da medida em causa com o mercado comum e, por outro, que estava vinculada por esta interpretação errada da referida disposição.

75. A este respeito, importa recordar que, em virtude do artigo 88.°, n.° 3, CE, a Comissão procede a um exame dos auxílios de Estado previstos, que tem por objeto permitir-lhe formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade parcial ou total dos auxílios em causa com o mercado comum. O procedimento formal de investigação previsto pelo artigo 88.°, n.° 2, CE destina-se, por sua vez, a proteger os direitos de terceiros interessados e deve, além disso, permitir à Comissão ficar completamente esclarecida sobre todos os elementos do processo antes de tomar a sua decisão, nomeadamente mediante a recolha das observações de terceiros interessados e dos Estados-Membros. Embora o seu poder seja vinculado no que toca à decisão de dar início a este procedimento, a Comissão goza, contudo, de uma certa margem de apreciação na identificação e no exame das circunstâncias do caso em apreço, a fim de determinar se estas suscitam dificuldades sérias. Em conformidade com o objetivo do artigo 88.°, n.° 3, CE e com o dever de boa administração que lhe incumbe, a Comissão pode, designadamente, dar início a um diálogo com o Estado que procedeu à notificação ou com terceiros a fim de superar, na fase preliminar, as dificuldades que eventualmente tenha encontrado (v. acórdão do Tribunal Geral de 10 de fevereiro de 2009, Deutsche Post e DHL International/Comissão, T-388/03, Colet., p. II-199, n.° 87 e jurisprudência aí referida).

76. Segundo jurisprudência constante, o procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE reveste-se de caráter indispensável sempre que a Comissão depare com dificuldades sérias para apreciar se um auxílio é compatível com o mercado comum (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 88 e jurisprudência aí referida).

77. Assim, compete à Comissão determinar, em função das circunstâncias de facto e de direito de cada caso, se as dificuldades encontradas no exame da compatibilidade do auxílio impõem a abertura desse procedimento. Esta apreciação deve satisfazer três requisitos (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 89 e jurisprudência aí referida).

78. Em primeiro lugar, o artigo 88.° CE circunscreve o poder da Comissão de se pronunciar sobre a compatibilidade de um auxílio com o mercado comum no termo da fase preliminar apenas às medidas que não suscitam dificuldades sérias, pelo que este critério reveste caráter exclusivo. Assim, a Comissão não se pode recusar a dar início ao procedimento formal de investigação invocando outras circunstâncias, como o interesse de terceiros, considerações de economia processual ou qualquer outra razão de conveniência administrativa ou política (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 90 e jurisprudência aí referida).

79. Em segundo lugar, quando depara com dificuldades sérias, a Comissão está obrigada a dar início ao procedimento formal e não goza, a este respeito, de qualquer poder discricionário (acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 91).

80. Em terceiro lugar, o conceito de dificuldades sérias reveste caráter objetivo. A existência de tais dificuldades deve ser apreciada tanto em função das circunstâncias da adoção do ato impugnado como do seu conteúdo, de modo objetivo, relacionando as razões da decisão com os elementos de que a Comissão dispunha quando se pronunciou sobre a compatibilidade dos auxílios controvertidos com o mercado comum. Daqui resulta que a fiscalização da legalidade efetuada pelo Tribunal Geral no que toca à existência de dificuldades sérias excede, por natureza, a verificação de um erro manifesto de apreciação (v., neste sentido, acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 92 e jurisprudência aí referida).

81. Resulta igualmente da jurisprudência que o caráter insuficiente ou incompleto do exame levado a cabo pela Comissão no processo de investigação preliminar constitui um indício da existência de dificuldades sérias (v. acórdão Deutsche Post e DHL International/Comissão, referido no n.° 75 supra, n.° 95 e jurisprudência aí referida).

82. Quando a Comissão aprecia a compatibilidade dos auxílios estatais com o mercado comum à luz da derrogação prevista no artigo 87.°, n.° 3, alínea a), CE, deve ter em conta o interesse comunitário e não pode deixar de avaliar a incidência dessas medidas no mercado ou mercados pertinentes do conjunto do EEE. Neste caso, a Comissão é obrigada não só a verificar que estas medidas são suscetíveis de contribuir efetivamente para o desenvolvimento económico das regiões em causa mas igualmente a avaliar o impacto dos seus auxílios nas trocas comerciais entre os Estados-Membros, designadamente a apreciar as repercussões setoriais que eles são suscetíveis de ter a nível comunitário (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de setembro de 2002, Espanha/Comissão, C-113/00, Colet., p. I-7601, n.° 67).

83. Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE, a Comissão goza de um amplo poder de apreciação, cujo exercício implica complexas apreciações de ordem económica e social, que devem ser efetuadas num contexto comunitário. Neste quadro, a fiscalização jurisdicional aplicada ao exercício desse poder de apreciação limita-se à verificação do cumprimento das regras processuais e de fundamentação, bem como ao controlo da exatidão material dos factos considerados e de que não existe erro de direito, erro manifesto na apreciação dos factos ou desvio de poder (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 59 e jurisprudência aí referida).

84. No entanto, ao adotar regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que essas regras dizem respeito, a Comissão autolimita-se no exercício do seu poder de apreciação e não pode desrespeitar essas regras sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação de princípios gerais do direito, tais como os da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima, a menos que apresente razões para justificar, à luz desses princípios, o não cumprimento das suas próprias regras (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C-189/02 P, C-202/02 P, C-205/02 P a C-208/02 P e C-213/02 P, Colet., p. I-5425, n.° 211, e Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 60 e jurisprudência aí referida).

85. Importa recordar, a este respeito, que o n.° 68 das orientações estabelece um limiar de quotas de mercado (25%) e, para os setores cuja taxa de crescimento não é duravelmente superior à taxa de crescimento média do produto interno bruto do EEE, tais como o do cartão canelado, um limiar de aumento das capacidades de produção (5%) cuja ultrapassagem obriga a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE.

86. Na decisão impugnada, a Comissão entendeu que podia deduzir dessa disposição que, como tinha constatado no presente caso que os referidos limiares não seriam ultrapassados, estava obrigada a considerar o auxílio em causa compatível com o mercado comum, sem dar início ao procedimento formal de investigação. Por isso, cumpre examinar se, como a recorrente defende, a Comissão, ao fazê-lo, cometeu um erro de direito suscetível de a impedir de eliminar todas as dúvidas quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum.

87. A Comissão, como ela própria confirmou na audiência, considerou que, no caso vertente, estava obrigada a não dar início ao procedimento formal de investigação, por não terem sido ultrapassados os limiares fixados no n.° 68 das orientações. Por esta mesma razão, a Comissão considerou igualmente que os argumentos dos denunciantes deviam, de qualquer modo, ser rejeitados.

88. Ora, embora o n.° 68 das orientações estabeleça uma obrigação processual sem exceção para a Comissão, de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE quando os limiares são ultrapassados, mesmo se, a priori, a Comissão entender que o auxílio em causa é compatível com o mercado comum, não resulta, porém, do n.° 68 que não se deva dar início ao procedimento formal de investigação quando esses limiares não foram ultrapassados. Na verdade, esta disposição tem exclusivamente por efeito obrigar a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação no caso de os referidos limiares serem ultrapassados, mas não, de modo algum, de o impedir quando os limiares em questão não são ultrapassados. Nessa hipótese, a Comissão tem, é certo, a faculdade de não dar início ao procedimento formal de investigação, mas não pode justificar esta decisão alegando que é obrigada a tomá-la por força do n.° 68 das orientações.

89. Logo, ao deduzir a compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum do facto de terem sido respeitados os limiares previstos no n.° 68 das orientações, a Comissão equivocou-se quanto ao alcance desta norma.

90. Por outro lado, como a recorrente alega, acertadamente, como resultado desse erro, a Comissão não exerceu a plenitude do seu poder de apreciação da compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum, como estava obrigada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 14 de julho de 2011, Freistaat Sachsen/Comissão, T-357/02 RENV, Colet., p. II-5415, n.° 45).

91. A este respeito, segundo a jurisprudência (v. n. os  82 e 83 supra ), a Comissão está obrigada a exercer o seu amplo poder de apreciação, de que dispõe em virtude do artigo 87.°, n.° 3, CE, da compatibilidade de um auxílio estatal concedido numa região em dificuldades, para determinar se os benefícios esperados em termos de desenvolvimento regional ultrapassam a distorção de concorrência e o efeito do projeto subsidiado no comércio entre os Estados-Membros.

92. Ora, não resulta da decisão impugnada que a Comissão tenha efetivamente procedido a esta apreciação para concluir que o auxílio em causa era compatível com o mercado comum. Com efeito, no considerando 119 da decisão impugnada, a Comissão indicou que, como os limiares previstos no n.° 68 das orientações não foram atingidos, estava obrigada a não realizar uma análise aprofundada da questão de saber se os benefícios de uma medida de auxílio ultrapassam a distorção de concorrência que ela é suscetível de causar. Além disso, no considerando 120 da decisão impugnada, a Comissão considerou que o respeito das orientações era suficiente, por si só, para garantir a contribuição de uma medida de auxílio para o desenvolvimento regional.

93. A este respeito, as condições cujo cumprimento garante a aplicação das orientações, além do respeito dos limiares relativos às quotas de mercado e do aumento das capacidades de produção previstas no n.° 68, limitam-se aos elementos seguintes: em primeiro lugar, se a região onde se situa o projeto subsidiado pode efetivamente receber auxílios estatais «destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego» [artigo 87.°, n.° 3, alínea a), CE]; em segundo lugar, o respeito de um limite máximo da intensidade do auxílio, o qual depende do grau das limitações regionais; em terceiro e último lugar, o preenchimento de um certo número de requisitos processuais, como a apresentação pelo beneficiário de um pedido de subsídio antes do início das obras, e a garantia de que o beneficiário continuará a explorar a instalação subsidiada durante um período mínimo de cinco anos. Contudo, o facto de uma medida cumprir os referidos requisitos não basta para demonstrar que terá um efeito positivo a nível do desenvolvimento regional.

94. Na verdade, a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação no que toca à identificação e exame das circunstâncias em causa para determinar se um auxílio estatal pode ser declarado compatível com o mercado comum (v. acórdão Alemanha e o./Kronofrance, referido no n.° 44 supra, n.° 59 e jurisprudência aí referida). Não obstante, no caso vertente, a Comissão limitou-se a verificar que os inconvenientes causados pelo projeto subsidiado em termos de distorção de concorrência seriam mantidos a um nível limitado, mas não verificou se os benefícios em termos de desenvolvimento regional ultrapassariam os seus inconvenientes, por mínimos que fossem.

95. A este respeito, importa recordar que a Comissão tencionava adotar, antes de 1 de janeiro de 2007, novas diretrizes para completar as contidas nas orientações, nas quais ela indica os critérios que pretende tomar em consideração para apreciar se os auxílios examinados são necessários para proporcionar um efeito de incentivo ao investimento e se os benefícios do auxílio ultrapassam a distorção da concorrência dele resultante e o efeito sobre o comércio entre os Estados-Membros (v. n.° 13 supra ).

96. Deste modo, a recorrente tem razão ao afirmar que as apreciações realizadas na decisão impugnada não podiam, por si sós, permitir à Comissão eliminar qualquer dúvida quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum à luz da derrogação prevista no artigo 87.°, n.° 3, alínea a), CE. Com efeito, como foi acima recordado no n.° 91, a aplicação dessa derrogação pressupõe que as vantagens da medida em causa ultrapassem os seus inconvenientes, por mínimos que sejam (v., neste sentido, acórdão Espanha/Comissão, referido no n.° 82 supra, n.° 67).

97. Decorre do exposto que a Comissão, ao deduzir do facto de que o auxílio em causa respeitava as orientações, sem apreciar a importância do projeto subsidiado em termos de desenvolvimento regional, que este era compatível com o mercado comum e que estava obrigada a não dar início ao procedimento formal de investigação, não só se equivocou quanto ao alcance das orientações como omitiu ainda o exercício do seu poder de apreciação. A recorrente tem, portanto, razão ao sustentar que, não tendo tomado em conta os critérios que deviam guiar a sua apreciação, a Comissão não fez tudo o que era necessário para eliminar completamente as dúvidas quanto à compatibilidade do auxílio em causa com o mercado comum.

98. Logo, sem que seja necessário apreciar a admissibilidade dos outros argumentos do recurso nem decidir sobre a sua procedência, importa constatar que a decisão impugnada deve ser anulada.

Quanto às despesas

99. Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Uma vez que a Comissão e a interveniente foram vencidas, há que condená-las nas despesas, em conformidade com o pedido da recorrente.

(1) .

(1) – Dado confidencial ocultado.

Parte decisória

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1) É anulada a decisão C (2008) 1107 da Comissão, de 2 de abril de 2008, que declara compatível com o mercado comum o auxílio com finalidade regional que as autoridades alemãs tencionam conceder à Propapier PM2 para a construção de uma fábrica papeleira em Eisenhüttenstadt (Região de Brandeburgo — Nordeste) (auxílio estatal N 582/2007 — Alemanha).

2) A Comissão Europeia e a Propapier PM 2 GmbH são condenadas nas despesas.

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