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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62014CC0148

    Conclusões do advogado-geral Wahl apresentadas em 5 de Fevereiro de 2015.
    Bundesrepublik Deutschland contra Nordzucker AG.
    Pedido de decisão prejudicial: Bundesverwaltungsgericht - Alemanha.
    Reenvio prejudicial - Ambiente - Diretiva 2003/87/CE - Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na União - Determinação do alcance da obrigação de devolução de licenças de emissão - Sanções - Artigo 16.º, n.os 1 e 3.
    Processo C-148/14.

    Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2015:64

    Conclusões do Advogado-Geral

    Conclusões do Advogado-Geral

    1. A Diretiva 2003/87/CE (2) é um dos principais instrumentos jurídicos através do qual a União Europeia e os seus Estados‑Membros se propõem cumprir os seus compromissos, no âmbito do Protocolo de Quioto, de redução das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa. A diretiva destina‑se a contribuir para esse objetivo através da implementação de um mercado europeu de licenças de emissão de gases com efeito de estufa que seja eficiente que prejudique o menos possível o desenvolvimento económico e do emprego (3) .

    2. O presente pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht alemão (Supremo Tribunal Administrativo Federal), convida o Tribunal de Justiça a clarificar que sanções devem, quando necessário, ser aplicadas aos operadores que, até 30 de abril de determinado ano, tiverem devolvido um número de licenças que se verificou, de acordo com o artigo 15.° da Diretiva, ser equivalente às suas emissões durante o ano anterior, mas que, na sequência de controlos posteriores efetuados pela autoridade nacional competente, se revelou insuficiente para cobrir todas as suas emissões.

    3. No essencial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se tal conduta deve ser, se for caso disso, sujeita a sanções nacionais, de acordo com o artigo 16.°, n.° 1, da diretiva, ou à sanção automática prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva

    4. De seguida, explicarei as razões por que sou da opinião que a primeira abordagem é a correta.

    I – Quadro jurídico

    A – Direito da União Europeia

    5. À data dos factos (4), o artigo 6.° da diretiva, sob a epígrafe «Condições e conteúdo do título de emissão de gases com efeito de estufa», dispunha:

    «1. O título de emissão de gases com efeito de estufa, pelo qual é permitida a emissão de gases com efeito de estufa de uma parte ou da totalidade de uma instalação, é emitido pela autoridade competente mediante prova de que o operador é capaz de monitorizar e comunicar as emissões.

    […]

    2. Os títulos de emissão de gases com efeito de estufa devem incluir os seguintes elementos:

    […]

    e) A obrigação de devolver licenças de emissão equivalentes ao total das emissões da instalação em cada ano civil, verificadas em conformidade com o artigo 15.°, no prazo de quatro meses a contar do termo do ano em causa.

    6. Nos termos do artigo 12.°, n.° 3, da diretiva:

    «Os Estados‑Membros devem assegurar a devolução pelo operador de cada instalação, até 30 de abril de cada ano, de um número de licenças de emissão equivalente ao total das emissões provenientes dessa instalação durante o ano civil anterior, tal como verificadas nos termos do artigo 15.°, e a sua consequente anulação.»

    7. O artigo 15.° da diretiva, sob a epígrafe «Verificação», dispunha, no que tem de relevante para o presente caso:

    «Os Estados‑Membros devem assegurar que os relatórios apresentados pelos operadores, nos termos do n.° 3 do artigo 14.°, sejam verificados em conformidade com os critérios estabelecidos no anexo V e que as autoridades competentes sejam informadas dos resultados da verificação.

    […]»

    8. De acordo com o artigo 16.° da diretiva, sob a epígrafe «Sanções»:

    «1. Os Estados‑Membros devem estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis em caso de infração às disposições nacionais aprovadas por força da presente diretiva e tomar todas as medidas necessárias para garantir a sua aplicação. As sanções impostas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas. […]

    2. Os Estados‑Membros devem assegurar a publicação dos nomes dos operadores que não devolvam licenças de emissão suficientes nos termos do n.° 3 do artigo 12.°

    3. Os Estados‑Membros devem assegurar que os operadores de instalações que não devolvam, até 30 de abril de cada ano, licenças de emissão suficientes para cobrir as suas emissões no ano anterior sejam obrigados a pagar uma multa pelas emissões excedentárias. A multa por emissões excedentárias será igual a 100 euros por cada tonelada de equivalente dióxido de carbono emitida pela instalação relativamente à qual o operador não tenha devolvido licenças. O pagamento da multa por emissões excedentárias não dispensa o operador da obrigação de devolver uma quantidade de licenças de emissão equivalente às emissões excedentárias aquando da devolução das licenças de emissão relativas ao ano civil subsequente.

    […]»

    B – Direito nacional

    9. As disposições pertinentes do direito alemão constam da Gesetz überden Handel mit Berechtigungen zur Emission von Treibhausgasen (Lei sobre o comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, a seguir «TEHG»), de 8 de julho de 2004 (5) .

    10. O § 4 da TEHG, sob a epígrafe «Autorização de emissões», dispõe:

    «(1) A emissão de gases com efeito de estufa decorrente de uma atividade na aceção desta lei carece de autorização.

    […]

    (5) A autorização contém as seguintes informações e disposições:

    […]

    5. Uma obrigação de devolução de licenças de emissão nos termos do § 6.

    […]

    (8) Caso o responsável não cumpra as obrigações referidas no § 5, as medidas previstas nos §§ 17 e 18 da presente lei prevalecem sobre as medidas previstas no § 17 da Bundes‑Immissionsschutzgesetz (Lei federal sobre o controlo de emissões). Em caso de violação das obrigações previstas no § 5, não se aplicam os §§ 20 e 21 da Bundes‑Immissionsschutzgesetz. Caso o operador responsável não cumpra as obrigações referidas no § 6, n.° 1, aplicam‑se exclusivamente as disposições da presente lei.»

    11. Nos termos do § 6 da TEHG, sob a epígrafe «Licenças»:

    «(1) A partir de 2006, o responsável deve devolver à autoridade competente, até 30 de abril de cada ano, o número de licenças de emissão equivalente às emissões geradas pela sua atividade no ano civil anterior.

    […]»

    12. O capítulo 5 da TEHG é relativo às sanções. O § 18 da referida lei dispõe:

    «(1) Caso o operador responsável não cumpra a obrigação decorrente do § 6, n.° 1, a autoridade competente impõe uma obrigação de pagamento de 100 euros, ou de 40 euros durante o primeiro período de atribuição de licenças, por cada tonelada de equivalente de dióxido de carbono emitida em relação à qual o mesmo operador responsável não tenha devolvido licenças de emissão. A obrigação de pagamento pode não ser imposta se o operador responsável não tiver cumprido a sua obrigação decorrente do § 6, n.° 1, por motivos de força maior.

    (2) Caso o operador responsável não comunique corretamente as emissões geradas pela sua atividade, a autoridade competente procede a uma estimativa das emissões geradas pela atividade no ano civil anterior. A estimativa constitui uma base irrefutável para a obrigação prevista no § 6, n.° 1. Não se procede à estimativa caso o operador responsável cumpra corretamente a sua obrigação de apresentação do relatório no âmbito da audição relativa à decisão de imposição de pagamento nos termos do n.° 1.

    (3) O operador responsável fica obrigado à devolução das licenças em falta, no caso previsto no n.° 2, de acordo com a estimativa, até 30 de abril do ano seguinte. [...]»

    II – Factos na origem do litígio, processo principal e questão prejudicial

    13. Até ao seu encerramento em março de 2008, a Nordzucker AG (a seguir «Nordzucker») explorava uma refinaria de açúcar. O estabelecimento incluía um gerador de vapor e uma unidade de secagem para a desidratação térmica de polpa de beterraba sacarina.

    14. Após a introdução do regime de comércio de licenças de emissão e em resposta a um pedido do Verein der Zuckerindustrie (Associação alemã da Indústria Açucareira), o Bundesministerium für Umwelt, Naturschutz und Reaktorsicherheit (Ministério Federal do Ambiente, da Conservação da Natureza e da Segurança Nuclear, a seguir «Ministério») informou aquela associação, por carta de 17 de junho de 2004, que as unidades de secagem, enquanto equipamentos necessários ao funcionamento da indústria açucareira, não estavam sujeitas ao comércio de emissões obrigatório. Pelo contrário, uma caldeira utilizada para a produção de vapor e eletricidade, enquanto dispositivo complementar ligado a uma determinada unidade de produção ou refinaria de açúcar, estava sujeita ao comércio de emissões obrigatório quando a potência térmica do equipamento excedesse o limite mínimo.

    15. A Nordzucker elaborou um relatório de emissões relativo a 2005. O relatório indicava que o gerador de vapor produziu um total de 40 288 toneladas de emissões dióxido de carbono. Esta quantidade não incluía as emissões resultantes da geração de vapor necessária para o funcionamento da unidade de secagem. Um perito verificou o relatório, considerou‑o satisfatório e aprovou a inscrição das emissões no registo tal como declaradas. Em 16 de março de 2006, o relatório foi enviado para a Deutsche Emissionshandelsstelle (Autoridade Alemã do Comércio de Emissões da Agência Federal do Ambiente, a seguir «Emissionshandelsstelle») através da autoridade competente do Land. A 30 de abril de 2006, a Nordzucker devolveu à Emissionshandelsstelle um número de licenças correspondente à quantidade de emissões declarada no relatório.

    16. Subsequentemente, a Emissionshandlsstelle examinou o relatório de emissões e convidou a Nordzucker a revê‑lo tendo em conta, inter alia , as emissões imputadas às unidades de secagem. A Nordzucker explicou que, com base na carta do Ministério, considerou que as unidades de secagem não estavam sujeitas ao comércio de emissões obrigatório e que, por isso, não estava obrigada a declarar as emissões imputáveis a um gerador de vapor utilizado no funcionamento de tal equipamento. No entanto, a Nordzucker corrigiu o seu relatório de emissões conforme solicitado pela Emissionshandelsstelle. Em resultado disso, a Nordzucker declarou um total de 42 961 toneladas de emissões de dióxido de carbono e, em 24 de abril de 2007, devolveu licenças correspondentes a mais 2 673 toneladas.

    17. Por decisão de 7 de dezembro de 2007, as autoridades alemãs aplicaram à Nordzucker, nos termos do § 18, n.° 1, primeira frase, da TEHG, uma coima no valor de 106 920 euros. Por decisão de 14 de abril de 2009, a reclamação apresentada contra essa decisão foi indeferida.

    18. A Nordzucker impugnou essa decisão no Verwaltungsgericht (Tribunal Administrativo), o qual, por sentença de 11 de junho de 2010, anulou a decisão impugnada. Por acórdão de 20 de outubro de 2011, o Oberverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Superior) negou provimento ao recurso interposto pelas autoridades alemãs contra a sentença proferida em primeira instância. Subsequentemente, as autoridades alemãs recorreram do acórdão do Oberverwantungsgericht perante o Bundesverwaltungsgericht.

    19. Tendo dúvidas sobre a interpretação do artigo 16.° da diretiva, o Bundesverwaltungsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Deve o artigo 16.°, n. os  3 e 4, da Diretiva 2003/87 ser interpretado no sentido de que as sanções por emissões excedentárias também devem ser aplicadas quando o operador tiver devolvido, até 30 de abril de determinado ano, um número suficiente de licenças correspondent[e] às emissões totais indicadas no seu relatório de emissões da instalação referente ao ano anterior, que foi considerado satisfatório pelo verificador, mas a autoridade competente tiver concluído, após 30 de abril, que a quantidade total de emissões foi declarada por defeito no relatório de emissões objeto de verificação, tendo o relatório sido corrigido e tendo o operador devolvido as restantes licenças dentro do novo prazo fixado?»

    20. Foram apresentadas observações escritas pela Nordzucker, pela Emissionshandelsstelle, pelos Governos alemão, checo, neerlandês e do Reino Unido, e pela Comissão. O Tribunal de Justiça decidiu não realizar a audiência.

    III – Análise

    21. Com a sua questão, o tribunal de reenvio procura saber, em substância, se a sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva é aplicável a um operador que, a 30 de abril de um determinado ano, tenha devolvido um número de licenças igual às suas emissões durante o ano anterior, verificadas de acordo com o disposto no artigo 15.° da diretiva, mas que, após uma verificação subsequente pela autoridade competente, se revelou ser insuficiente para cobrir todas as emissões do operador no ano anterior.

    22. Na sua detalhada decisão de reenvio, o Bundesverwaltungsgericht explica que são possíveis duas abordagens diferentes e que vê argumentos convincentes para ambas. No entanto, esse tribunal considera, sobretudo com base no texto das disposições pertinentes da diretiva e tendo em conta o princípio da proporcionalidade, que a resposta à questão prejudicial deverá ser negativa.

    23. Essas duas abordagens foram também discutidas pelas partes que apresentaram observações neste processo. Por um lado, a Nordzucker, os Governos checo, neerlandês e do Reino Unido e a Comissão defendem, no essencial, que o artigo 16.°, n.° 3, da diretiva deve ser interpretado restritivamente. Consequentemente, esta disposição não deve ser considerada aplicável à situação descrita pelo tribunal de reenvio.

    24. Por outro lado, o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle propõem que o Tribunal de Justiça responda afirmativamente à questão prejudicial. No seu entender, podem ser traçados paralelismos entre a situação pendente no tribunal de reenvio e aquela que foi julgada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Billerud Karlsnorg e Billerud Skärblacka (6) . Nesse processo, o Tribunal de Justiça confirmou que a sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva se aplicava diretamente aos operadores que, até 30 de abril de determinado ano, não tivessem devolvido um número suficiente de licenças e clarificou que o montante da sanção não poderia ser alterado por um tribunal nacional.

    25. Como irei agora explicar, sou da opinião que, não obstante a redação um tanto ambígua do artigo 16.°, n.° 3, da diretiva, uma interpretação sistemática e teleológica dessa disposição apoia os argumentos apresentados pela Nordzucker, pelos Governos checo, neerlandês e do Reino Unido e pela Comissão. Embora compreenda as preocupações subjacentes à interpretação daquela disposição defendida pelo Governo alemão e pela Emissionshandlsstelle, não acredito que, em última análise, essas preocupações sejam procedentes. De igual modo, não considero que o acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka corrobore a posição adotada por estas partes.

    26. Para começar, importa reconhecer que o texto do artigo 16.°, n.° 3, da diretiva não está isento de ambiguidade quanto à natureza da obrigação que deve ser cumprida sob pena da sanção aí prevista. De facto, aquela disposição obriga os Estados‑Membros a imporem uma sanção por excesso de emissões aos «operadores […] que não devolvam, até 30 de abril de cada ano, licenças de emissão suficientes para cobrir as suas emissões no ano anterior».

    27. Como o órgão jurisdicional de reenvio assinala com razão, nenhuma das interpretações propostas é, prima facie , incompatível com a redação do artigo 16.°, n.° 3, da diretiva. Consequentemente, esta disposição pode ser entendida no sentido de que se refere às emissões geradas durante o ano precedente, conforme verificadas nos termos do artigo 15.°, ou, alternativamente, às emissões geradas durante o ano anterior, conforme estabelecido em relatório final, eventualmente após controlos adicionais pelas autoridades nacionais competentes.

    28. Contudo, quando o artigo 16.°, n.° 3, da diretiva é interpretado no seu contexto adequado, torna‑se claro, no meu entender, que a primeira interpretação é a correta.

    29. Há que realçar, em primeiro lugar, que um dos pilares em que o sistema estabelecido pela diretiva se baseia é a obrigação de os operadores devolverem um número de licenças equivalente ao total das suas emissões durante o ano civil anterior. Cabe a cada operador reportar as suas emissões às autoridades competentes, respeitando as regras e princípios definidos nas orientações ad hoc adotadas pela Comissão (7) (artigo 14.°, n.° 3, da diretiva).

    30. Não obstante, dada a importância deste exercício e as potenciais vantagens financeiras para os operadores se declararem uma quantidade de emissões inferior às suas emissões reais, o legislador da União decidiu que os relatórios transmitidos pelos operadores não podem ser aceites automaticamente pelas autoridades, mas devem primeiro passar por um processo específico de verificação. Nos termos do artigo 15.°, primeiro parágrafo, da diretiva e do seu anexo V, o verificador deve ser «independente do operador, realizar as suas atividades com profissionalismo, probidade e objetividade» e ser qualificado para a tarefa. Deve ter em conta os relatórios submetidos pelos operadores e os sistemas de monitorização durante o ano anterior, com vista — em particular — a verificar a sua «fiabilidade, credibilidade e precisão».

    31. Esta verificação constitui uma fase‑chave do procedimento. Se, em resultado da verificação, um relatório não for considerado satisfatório, o procedimento é interrompido. O operador não pode fazer mais transferências de licenças até que o relatório seja considerado satisfatório (artigo 15.°, segundo parágrafo). Se, pelo contrário, a verificação der um resultado positivo, o operador, como referido acima, tem até 30 de abril do mesmo ano para devolver as licenças equivalentes ao total de emissões geradas. Com efeito, os artigos 6.°, n.° 2, alínea e), e 12.°, n.° 3, da diretiva estipulam expressamente que a obrigação de devolver licenças se refere às licenças correspondentes às emissões «verificadas em conformidade com o artigo 15.°».

    32. A diretiva não prevê, pelo menos explicitamente, nenhum controlo ou verificação subsequentes do número de licenças já verificadas nos termos do artigo 15.°, nem contém uma disposição que imponha a devolução de quotas adicionais depois de 30 de abril, no caso de as autoridades nacionais determinarem — por qualquer motivo — que aquelas licenças não cobrem o total de emissões.

    33. Claramente, a diretiva não pode ser interpretada no sentido de que preclude os controlos subsequentes pelas autoridades competentes ou a possibilidade de um operador devolver licenças adicionais depois de 30 de abril de modo a cumprir a sua obrigação de devolver um número suficiente de licenças de emissões. Pelo contrário, parece‑me que as disposições nacionais que permitem ambas as possibilidades apenas reforçam o sistema estabelecido pela diretiva.

    34. Contudo, a sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva está necessariamente relacionada com o incumprimento da obrigação que essa disposição expressamente impõe ao operador: devolver, até 30 de abril, o número de licenças devido, conforme verificado por um perito. Seria contrário ao sentido comum interpretar a diretiva como exigindo a aplicação automática de uma sanção por violação de uma obrigação que não está claramente especificada na mesma diretiva.

    35. O facto de o número de licenças, conforme verificado nos termos do artigo 15.°, ser determinante para o funcionamento do sistema estabelecido pela diretiva é também confirmado pelas orientações publicadas nos termos do artigo 14.°, n.° 1, da diretiva (8) . O ponto 7.4 das orientações dispõe que «[a] autoridade competente utilizará o valor correspondente às emissões totais de uma instalação constante do relatório considerado satisfatório para verificar se o operador entregou um número de licenças suficiente para cobrir as emissões da instalação em causa» (9) .

    36. Esta interpretação parece ser corroborada pelos trabalhos preparatórios da diretiva. O ponto 17 da exposição de motivos que acompanha a proposta de diretiva apresentada pela Comissão, em 23 de outubro de 2001, dispõe que «[o]s casos que envolvam violações da obrigação de restituir direitos de emissão suficientes para cobrir as emissões verificadas devem ser objeto de medidas rigorosas e coerentes em toda a [União] Europeia. Para tal, serão impostas penalidades financeiras […]» (10) .

    37. Curiosamente, o artigo 16.°, n.° 2, da diretiva, relativo à publicação dos nomes dos operadores que não cumpriram a obrigação de devolver licenças suficientes, referia explicitamente na sua versão original, aplicável aos factos do caso, a obrigação «nos termos do n.° 3 do artigo 12.°» da diretiva (11) . Claramente, pode defender‑se que os n. os  2 e 3 do artigo 16.° da diretiva, na medida em que tinham, e ainda têm, uma redação diferente, respeitam a infrações diferentes. De facto, o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle alegam, em substância, que o artigo 16.°, n.° 3, da diretiva tem um âmbito mais alargado que o artigo 16.°, n.° 2.

    38. Contudo, essa interpretação não é corroborada pelos trabalhos preparatórios. A diferença entre os textos dos dois números é antes explicada pelo facto de que, na proposta inicialmente apresentada pela Comissão, o artigo 16.°, n.° 2, da diretiva se destinava a ser aplicado a todas as violações da legislação nacional adotada para transpor a diretiva, enquanto o n.° 3 se destinava a punir a falta de devolução de um número de licenças suficiente. No entanto, o Parlamento considerou — e a Comissão aceitou — que um regime em que o infrator é exposto publicamente era desproporcionado no caso de vários tipos de infração da diretiva, incluindo as infrações que dizem respeito às medidas nacionais de transposição, e que, consequentemente, esse regime deveria ser limitado às situações em que os operadores não tivessem devolvido um número suficiente de licenças (12) .

    39. A génese legislativa da diretiva parece, assim, indicar que a diferença de redação entre os dois números não reflete uma decisão por parte do legislador da União de estabelecer uma distinção entre os tipos de infração respetivamente cobertos.

    40. Esta interpretação encontra ainda confirmação no acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, no qual o Tribunal de Justiça declarou que a obrigação, prevista nos artigos 6.°, n.° 2, alínea e), e 12.°, n.° 3, da diretiva, de devolver um número de licenças equivalente ao total de emissões durante o ano civil anterior conforme verificado nos termos do artigo 15.° é « a única cujo incumprimento a própria Diretiva 2003/87 sujeita a uma sanção precisa, ao passo que a sanção de outros comportamentos contrários às suas disposições é deixada, nos termos do artigo 16.° desta diretiva, à descrição dos Estados‑Membros» (13) .

    41. Além disso, uma interpretação diferente do artigo 16.°, n.° 3, da diretiva colocaria um problema em relação à proporcionalidade da sanção estabelecida nessa disposição.

    42. Com efeito, no acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, o Tribunal de Justiça também declarou que a sanção fixa e automática prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva era proporcionada, designadamente pelo facto de os operadores estarem em posição de saber o número exato de licenças a devolver (em virtude da verificação nos termos do artigo 15.°) e de lhes ser concedido um prazo razoável para dar cumprimento à obrigação. É evidente que um operador prudente não adiaria o cumprimento da sua obrigação até ao último momento. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não considerou que, por força do princípio da proporcionalidade, os tribunais nacionais devessem poder alterar o montante da sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva, mesmo no caso em que o incumprimento pelos operadores pudesse ser devido a um «problema administrativo interno» (14) .

    43. Contudo, o presente processo parece — com base na informação que pode ser retirada da decisão de reenvio — bastante diferente do processo acima referido. De facto, a Nordzucker alega que o seu erro se deveu ao facto de a empresa se ter baseado na carta do Ministério que explicava que o tipo de instalação que a Nordzucker utilizava (os equipamentos de secagem) não estava abrangido pelo regime de comércio de licenças de emissão. Além disso, o relatório foi também devidamente verificado por um perito independente nos termos do artigo 15.° da diretiva. Apenas mais tarde — isto é, depois de 30 de abril —, as autoridades alemãs informaram a Nordzucker de que o número de licenças devolvidas era insuficiente, na medida em que as emissões produzidas pelos equipamentos de secagem também tinham de ser tomadas em consideração para efeitos da diretiva.

    44. Ainda que a conduta da Nordzucker deva ser sujeita a alguma sanção — questão que incumbe ao tribunal nacional apreciar — pelo menos, antes de 30 de abril, a Nordzucker não podia saber com suficiente certeza o número total de licenças a devolver. A imposição automática de uma pesada coima nessas circunstâncias poderia assim levantar sérios problemas de proporcionalidade.

    45. Segundo o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle, seria, pelo contrário, desproporcionado aplicar essa sanção a qualquer incumprimento da obrigação prevista nos artigos 6.°, n.° 2, alínea e), e 12.°, n.° 3, da diretiva, quando os operadores que pudessem ter induzido em erro o perito que verificou o relatório (por exemplo, comunicando‑lhe dados falseados ou adotando outro comportamento fraudulento) escapariam à aplicação da sanção.

    46. Não estou de acordo. O facto de a sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da diretiva não se aplicar não significa que não possa ser aplicada a esses operadores nenhuma sanção. Com efeito, o artigo 16.°, n.° 1, da diretiva estipula que os Estados‑Membros devem estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis em caso de infração às disposições nacionais aprovadas por força da diretiva, e que essas sanções devem ser « efetivas, proporcionadas e dissuasivas » (15) .

    47. Cabe, assim, às autoridades nacionais estabelecer as sanções que podem ser aplicadas aos operadores que, apesar de cumprirem a obrigação estabelecida nos artigos 6.°, n.° 2, alínea e), e 12.°, n.° 3, da diretiva, cometam outros tipos de infrações que dificultem o correto funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão estabelecido pela diretiva. Essas sanções devem, por um lado, ser efetivas e dissuasivas: isto significa, na minha opinião, que o comportamento fraudulento como o referido pelo Governo alemão e pela Emissionshandelsstelle pode (e deve) ser sujeito a sanções severas. Por outro lado, essas sanções devem ser proporcionadas: isto implica que situações como aquela em que se encontra a Nordzucker devem ser objeto de uma apreciação na qual todas as circunstâncias de facto pertinentes sejam tidas em conta para decidir sobre o an debeatur e o quantum debeatur da sanção (como, designadamente, a boa‑fé da empresa ou se a empresa foi induzida em erro pelas próprias autoridades).

    48. Por conseguinte, concluo que o tipo de incumprimento cometido pela Nordzucker não é abrangido pelo artigo 16.°, n.° 3, da diretiva mas entra, se for caso disso, no âmbito de aplicação do artigo 16.°, n.° 1, dessa diretiva.

    IV – Conclusão

    49. Pelo exposto, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial submetida pelo Bundesverwaltungsgericht nos seguintes termos:

    «A sanção prevista no artigo 16.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho, não é aplicável a um operador que, até 30 de abril de determinado ano, tenha devolvido um número licenças equivalente às suas emissões durante o ano anterior conforme verificadas nos termos do artigo 15.° da diretiva, mas que, na sequência de um controlo posterior efetuado pela autoridade nacional competente, se revelou insuficiente para cobrir todas as emissões desse operador durante o ano anterior. Cabe aos Estados‑Membros estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis, quando adequado, a esses tipos de infrações. As sanções previstas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.»

    (1) .

    (2)  — Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (a seguir «diretiva») (JO L 275, p. 32).

    (3)  — V. considerandos 3 a 5 da Diretiva 2003/87.

    (4)  — A Diretiva 2003/87 foi, entretanto, alterada diversas vezes. No entanto, verifica‑se que nenhuma das alterações subsequentes tem pertinência no âmbito do presente processo.

    (5) — BGB1 I, p. 1578.

    (6)  — Acórdão C‑203/12, EU:C:2013:664.

    (7)  — Decisão 2004/156/CE da Comissão, de 29 de janeiro de 2004, que estabelece orientações para a monitorização e a comunicação de informações relativas às emissões de gases com efeito de estufa, nos termos da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 59, p. 1) (a seguir «orientações»).

    (8)  — Ibid.

    (9)  — O sublinhado é meu. Neste contexto, importa realçar que as orientações foram adotadas não como um ato de «soft law» mas, como mencionado na nota 6, através de uma decisão da Comissão, ou seja, na forma de um ato com efeitos jurídicos.

    (10)  — COM(2001) 581 final. O sublinhado é meu.

    (11)  — Na sua versão atual, o artigo 16.°, n.° 2, da diretiva refere a «obrigação de devolver licenças de emissão suficientes nos termos da presente diretiva» (o sublinhado é meu). Esta alteração foi introduzida pela Diretiva 2008/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, que altera a Diretiva 2003/87/CE de modo a incluir as atividades da aviação no regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade (JO 2009, L 8, p. 2), que estendeu o regime de comércio de licenças de emissão às atividades de aviação. Esta alteração destinava‑se a refletir o âmbito de aplicação alargado da diretiva. No entanto, como corretamente assinalado pelo Governo do Reino Unido, a alteração ao artigo 16.°, n.° 2, da diretiva não fez qualquer diferença relativamente às obrigações que impendem sobre os operadores de instalações.

    (12)  — Relatório do Parlamento Europeu, de 13 de setembro de 2002, sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à criação de um quadro de comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade Europeia e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (FINAL A5‑0303/2002), p. 28.

    (13)  — V. acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, EU:C:2013:664, n.° 25 (o sublinhado é meu).

    (14)  — Ibidem , n. os  19 e 33 a 42.

    (15)  — O sublinhado é meu.

    Início

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    NILS WAHL

    apresentadas em 5 de fevereiro de 2015 ( 1 )

    Processo C‑148/14

    República Federal da Alemanha

    contra

    Nordzucker AG

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha)]

    «Ambiente — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Artigo 16.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2003/87/CE — Monitorização e comunicação de emissões — Verificação dos relatórios apresentados pelos operadores — Sanções — Proporcionalidade»

    1. 

    A Diretiva 2003/87/CE ( 2 ) é um dos principais instrumentos jurídicos através do qual a União Europeia e os seus Estados‑Membros se propõem cumprir os seus compromissos, no âmbito do Protocolo de Quioto, de redução das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa. A diretiva destina‑se a contribuir para esse objetivo através da implementação de um mercado europeu de licenças de emissão de gases com efeito de estufa que seja eficiente que prejudique o menos possível o desenvolvimento económico e do emprego ( 3 ).

    2. 

    O presente pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht alemão (Supremo Tribunal Administrativo Federal), convida o Tribunal de Justiça a clarificar que sanções devem, quando necessário, ser aplicadas aos operadores que, até 30 de abril de determinado ano, tiverem devolvido um número de licenças que se verificou, de acordo com o artigo 15.o da Diretiva, ser equivalente às suas emissões durante o ano anterior, mas que, na sequência de controlos posteriores efetuados pela autoridade nacional competente, se revelou insuficiente para cobrir todas as suas emissões.

    3. 

    No essencial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se tal conduta deve ser, se for caso disso, sujeita a sanções nacionais, de acordo com o artigo 16.o, n.o 1, da diretiva, ou à sanção automática prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva

    4. 

    De seguida, explicarei as razões por que sou da opinião que a primeira abordagem é a correta.

    I – Quadro jurídico

    A – Direito da União Europeia

    5.

    À data dos factos ( 4 ), o artigo 6.o da diretiva, sob a epígrafe «Condições e conteúdo do título de emissão de gases com efeito de estufa», dispunha:

    «1.   O título de emissão de gases com efeito de estufa, pelo qual é permitida a emissão de gases com efeito de estufa de uma parte ou da totalidade de uma instalação, é emitido pela autoridade competente mediante prova de que o operador é capaz de monitorizar e comunicar as emissões.

    […]

    2.   Os títulos de emissão de gases com efeito de estufa devem incluir os seguintes elementos:

    […]

    e)

    A obrigação de devolver licenças de emissão equivalentes ao total das emissões da instalação em cada ano civil, verificadas em conformidade com o artigo 15.o, no prazo de quatro meses a contar do termo do ano em causa.

    6.

    Nos termos do artigo 12.o, n.o 3, da diretiva:

    «Os Estados‑Membros devem assegurar a devolução pelo operador de cada instalação, até 30 de abril de cada ano, de um número de licenças de emissão equivalente ao total das emissões provenientes dessa instalação durante o ano civil anterior, tal como verificadas nos termos do artigo 15.o, e a sua consequente anulação.»

    7.

    O artigo 15.o da diretiva, sob a epígrafe «Verificação», dispunha, no que tem de relevante para o presente caso:

    «Os Estados‑Membros devem assegurar que os relatórios apresentados pelos operadores, nos termos do n.o 3 do artigo 14.o, sejam verificados em conformidade com os critérios estabelecidos no anexo V e que as autoridades competentes sejam informadas dos resultados da verificação.

    […]»

    8.

    De acordo com o artigo 16.o da diretiva, sob a epígrafe «Sanções»:

    «1.   Os Estados‑Membros devem estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis em caso de infração às disposições nacionais aprovadas por força da presente diretiva e tomar todas as medidas necessárias para garantir a sua aplicação. As sanções impostas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas. […]

    2.   Os Estados‑Membros devem assegurar a publicação dos nomes dos operadores que não devolvam licenças de emissão suficientes nos termos do n.o 3 do artigo 12.o

    3.   Os Estados‑Membros devem assegurar que os operadores de instalações que não devolvam, até 30 de abril de cada ano, licenças de emissão suficientes para cobrir as suas emissões no ano anterior sejam obrigados a pagar uma multa pelas emissões excedentárias. A multa por emissões excedentárias será igual a 100 euros por cada tonelada de equivalente dióxido de carbono emitida pela instalação relativamente à qual o operador não tenha devolvido licenças. O pagamento da multa por emissões excedentárias não dispensa o operador da obrigação de devolver uma quantidade de licenças de emissão equivalente às emissões excedentárias aquando da devolução das licenças de emissão relativas ao ano civil subsequente.

    […]»

    B – Direito nacional

    9.

    As disposições pertinentes do direito alemão constam da Gesetz überden Handel mit Berechtigungen zur Emission von Treibhausgasen (Lei sobre o comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, a seguir «TEHG»), de 8 de julho de 2004 ( 5 ).

    10.

    O § 4 da TEHG, sob a epígrafe «Autorização de emissões», dispõe:

    «(1)   A emissão de gases com efeito de estufa decorrente de uma atividade na aceção desta lei carece de autorização.

    […]

    (5)   A autorização contém as seguintes informações e disposições:

    […]

    5.

    Uma obrigação de devolução de licenças de emissão nos termos do § 6.

    […]

    (8)   Caso o responsável não cumpra as obrigações referidas no § 5, as medidas previstas nos §§ 17 e 18 da presente lei prevalecem sobre as medidas previstas no § 17 da Bundes‑Immissionsschutzgesetz (Lei federal sobre o controlo de emissões). Em caso de violação das obrigações previstas no § 5, não se aplicam os §§ 20 e 21 da Bundes‑Immissionsschutzgesetz. Caso o operador responsável não cumpra as obrigações referidas no § 6, n.o 1, aplicam‑se exclusivamente as disposições da presente lei.»

    11.

    Nos termos do § 6 da TEHG, sob a epígrafe «Licenças»:

    «(1) A partir de 2006, o responsável deve devolver à autoridade competente, até 30 de abril de cada ano, o número de licenças de emissão equivalente às emissões geradas pela sua atividade no ano civil anterior.

    […]»

    12.

    O capítulo 5 da TEHG é relativo às sanções. O § 18 da referida lei dispõe:

    «(1)   Caso o operador responsável não cumpra a obrigação decorrente do § 6, n.o 1, a autoridade competente impõe uma obrigação de pagamento de 100 euros, ou de 40 euros durante o primeiro período de atribuição de licenças, por cada tonelada de equivalente de dióxido de carbono emitida em relação à qual o mesmo operador responsável não tenha devolvido licenças de emissão. A obrigação de pagamento pode não ser imposta se o operador responsável não tiver cumprido a sua obrigação decorrente do § 6, n.o 1, por motivos de força maior.

    (2)   Caso o operador responsável não comunique corretamente as emissões geradas pela sua atividade, a autoridade competente procede a uma estimativa das emissões geradas pela atividade no ano civil anterior. A estimativa constitui uma base irrefutável para a obrigação prevista no § 6, n.o 1. Não se procede à estimativa caso o operador responsável cumpra corretamente a sua obrigação de apresentação do relatório no âmbito da audição relativa à decisão de imposição de pagamento nos termos do n.o 1.

    (3)   O operador responsável fica obrigado à devolução das licenças em falta, no caso previsto no n.o 2, de acordo com a estimativa, até 30 de abril do ano seguinte. [...]»

    II – Factos na origem do litígio, processo principal e questão prejudicial

    13.

    Até ao seu encerramento em março de 2008, a Nordzucker AG (a seguir «Nordzucker») explorava uma refinaria de açúcar. O estabelecimento incluía um gerador de vapor e uma unidade de secagem para a desidratação térmica de polpa de beterraba sacarina.

    14.

    Após a introdução do regime de comércio de licenças de emissão e em resposta a um pedido do Verein der Zuckerindustrie (Associação alemã da Indústria Açucareira), o Bundesministerium für Umwelt, Naturschutz und Reaktorsicherheit (Ministério Federal do Ambiente, da Conservação da Natureza e da Segurança Nuclear, a seguir «Ministério») informou aquela associação, por carta de 17 de junho de 2004, que as unidades de secagem, enquanto equipamentos necessários ao funcionamento da indústria açucareira, não estavam sujeitas ao comércio de emissões obrigatório. Pelo contrário, uma caldeira utilizada para a produção de vapor e eletricidade, enquanto dispositivo complementar ligado a uma determinada unidade de produção ou refinaria de açúcar, estava sujeita ao comércio de emissões obrigatório quando a potência térmica do equipamento excedesse o limite mínimo.

    15.

    A Nordzucker elaborou um relatório de emissões relativo a 2005. O relatório indicava que o gerador de vapor produziu um total de 40288 toneladas de emissões dióxido de carbono. Esta quantidade não incluía as emissões resultantes da geração de vapor necessária para o funcionamento da unidade de secagem. Um perito verificou o relatório, considerou‑o satisfatório e aprovou a inscrição das emissões no registo tal como declaradas. Em 16 de março de 2006, o relatório foi enviado para a Deutsche Emissionshandelsstelle (Autoridade Alemã do Comércio de Emissões da Agência Federal do Ambiente, a seguir «Emissionshandelsstelle») através da autoridade competente do Land. A 30 de abril de 2006, a Nordzucker devolveu à Emissionshandelsstelle um número de licenças correspondente à quantidade de emissões declarada no relatório.

    16.

    Subsequentemente, a Emissionshandlsstelle examinou o relatório de emissões e convidou a Nordzucker a revê‑lo tendo em conta, inter alia, as emissões imputadas às unidades de secagem. A Nordzucker explicou que, com base na carta do Ministério, considerou que as unidades de secagem não estavam sujeitas ao comércio de emissões obrigatório e que, por isso, não estava obrigada a declarar as emissões imputáveis a um gerador de vapor utilizado no funcionamento de tal equipamento. No entanto, a Nordzucker corrigiu o seu relatório de emissões conforme solicitado pela Emissionshandelsstelle. Em resultado disso, a Nordzucker declarou um total de 42961 toneladas de emissões de dióxido de carbono e, em 24 de abril de 2007, devolveu licenças correspondentes a mais 2673 toneladas.

    17.

    Por decisão de 7 de dezembro de 2007, as autoridades alemãs aplicaram à Nordzucker, nos termos do § 18, n.o 1, primeira frase, da TEHG, uma coima no valor de 106920 euros. Por decisão de 14 de abril de 2009, a reclamação apresentada contra essa decisão foi indeferida.

    18.

    A Nordzucker impugnou essa decisão no Verwaltungsgericht (Tribunal Administrativo), o qual, por sentença de 11 de junho de 2010, anulou a decisão impugnada. Por acórdão de 20 de outubro de 2011, o Oberverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Superior) negou provimento ao recurso interposto pelas autoridades alemãs contra a sentença proferida em primeira instância. Subsequentemente, as autoridades alemãs recorreram do acórdão do Oberverwantungsgericht perante o Bundesverwaltungsgericht.

    19.

    Tendo dúvidas sobre a interpretação do artigo 16.o da diretiva, o Bundesverwaltungsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Deve o artigo 16.o, n.os 3 e 4, da Diretiva 2003/87 ser interpretado no sentido de que as sanções por emissões excedentárias também devem ser aplicadas quando o operador tiver devolvido, até 30 de abril de determinado ano, um número suficiente de licenças correspondent[e] às emissões totais indicadas no seu relatório de emissões da instalação referente ao ano anterior, que foi considerado satisfatório pelo verificador, mas a autoridade competente tiver concluído, após 30 de abril, que a quantidade total de emissões foi declarada por defeito no relatório de emissões objeto de verificação, tendo o relatório sido corrigido e tendo o operador devolvido as restantes licenças dentro do novo prazo fixado?»

    20.

    Foram apresentadas observações escritas pela Nordzucker, pela Emissionshandelsstelle, pelos Governos alemão, checo, neerlandês e do Reino Unido, e pela Comissão. O Tribunal de Justiça decidiu não realizar a audiência.

    III – Análise

    21.

    Com a sua questão, o tribunal de reenvio procura saber, em substância, se a sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva é aplicável a um operador que, a 30 de abril de um determinado ano, tenha devolvido um número de licenças igual às suas emissões durante o ano anterior, verificadas de acordo com o disposto no artigo 15.o da diretiva, mas que, após uma verificação subsequente pela autoridade competente, se revelou ser insuficiente para cobrir todas as emissões do operador no ano anterior.

    22.

    Na sua detalhada decisão de reenvio, o Bundesverwaltungsgericht explica que são possíveis duas abordagens diferentes e que vê argumentos convincentes para ambas. No entanto, esse tribunal considera, sobretudo com base no texto das disposições pertinentes da diretiva e tendo em conta o princípio da proporcionalidade, que a resposta à questão prejudicial deverá ser negativa.

    23.

    Essas duas abordagens foram também discutidas pelas partes que apresentaram observações neste processo. Por um lado, a Nordzucker, os Governos checo, neerlandês e do Reino Unido e a Comissão defendem, no essencial, que o artigo 16.o, n.o 3, da diretiva deve ser interpretado restritivamente. Consequentemente, esta disposição não deve ser considerada aplicável à situação descrita pelo tribunal de reenvio.

    24.

    Por outro lado, o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle propõem que o Tribunal de Justiça responda afirmativamente à questão prejudicial. No seu entender, podem ser traçados paralelismos entre a situação pendente no tribunal de reenvio e aquela que foi julgada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Billerud Karlsnorg e Billerud Skärblacka ( 6 ). Nesse processo, o Tribunal de Justiça confirmou que a sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva se aplicava diretamente aos operadores que, até 30 de abril de determinado ano, não tivessem devolvido um número suficiente de licenças e clarificou que o montante da sanção não poderia ser alterado por um tribunal nacional.

    25.

    Como irei agora explicar, sou da opinião que, não obstante a redação um tanto ambígua do artigo 16.o, n.o 3, da diretiva, uma interpretação sistemática e teleológica dessa disposição apoia os argumentos apresentados pela Nordzucker, pelos Governos checo, neerlandês e do Reino Unido e pela Comissão. Embora compreenda as preocupações subjacentes à interpretação daquela disposição defendida pelo Governo alemão e pela Emissionshandlsstelle, não acredito que, em última análise, essas preocupações sejam procedentes. De igual modo, não considero que o acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka corrobore a posição adotada por estas partes.

    26.

    Para começar, importa reconhecer que o texto do artigo 16.o, n.o 3, da diretiva não está isento de ambiguidade quanto à natureza da obrigação que deve ser cumprida sob pena da sanção aí prevista. De facto, aquela disposição obriga os Estados‑Membros a imporem uma sanção por excesso de emissões aos «operadores […] que não devolvam, até 30 de abril de cada ano, licenças de emissão suficientes para cobrir as suas emissões no ano anterior».

    27.

    Como o órgão jurisdicional de reenvio assinala com razão, nenhuma das interpretações propostas é, prima facie, incompatível com a redação do artigo 16.o, n.o 3, da diretiva. Consequentemente, esta disposição pode ser entendida no sentido de que se refere às emissões geradas durante o ano precedente, conforme verificadas nos termos do artigo 15.o, ou, alternativamente, às emissões geradas durante o ano anterior, conforme estabelecido em relatório final, eventualmente após controlos adicionais pelas autoridades nacionais competentes.

    28.

    Contudo, quando o artigo 16.o, n.o 3, da diretiva é interpretado no seu contexto adequado, torna‑se claro, no meu entender, que a primeira interpretação é a correta.

    29.

    Há que realçar, em primeiro lugar, que um dos pilares em que o sistema estabelecido pela diretiva se baseia é a obrigação de os operadores devolverem um número de licenças equivalente ao total das suas emissões durante o ano civil anterior. Cabe a cada operador reportar as suas emissões às autoridades competentes, respeitando as regras e princípios definidos nas orientações ad hoc adotadas pela Comissão ( 7 ) (artigo 14.o, n.o 3, da diretiva).

    30.

    Não obstante, dada a importância deste exercício e as potenciais vantagens financeiras para os operadores se declararem uma quantidade de emissões inferior às suas emissões reais, o legislador da União decidiu que os relatórios transmitidos pelos operadores não podem ser aceites automaticamente pelas autoridades, mas devem primeiro passar por um processo específico de verificação. Nos termos do artigo 15.o, primeiro parágrafo, da diretiva e do seu anexo V, o verificador deve ser «independente do operador, realizar as suas atividades com profissionalismo, probidade e objetividade» e ser qualificado para a tarefa. Deve ter em conta os relatórios submetidos pelos operadores e os sistemas de monitorização durante o ano anterior, com vista — em particular — a verificar a sua «fiabilidade, credibilidade e precisão».

    31.

    Esta verificação constitui uma fase‑chave do procedimento. Se, em resultado da verificação, um relatório não for considerado satisfatório, o procedimento é interrompido. O operador não pode fazer mais transferências de licenças até que o relatório seja considerado satisfatório (artigo 15.o, segundo parágrafo). Se, pelo contrário, a verificação der um resultado positivo, o operador, como referido acima, tem até 30 de abril do mesmo ano para devolver as licenças equivalentes ao total de emissões geradas. Com efeito, os artigos 6.°, n.o 2, alínea e), e 12.°, n.o 3, da diretiva estipulam expressamente que a obrigação de devolver licenças se refere às licenças correspondentes às emissões «verificadas em conformidade com o artigo 15.o».

    32.

    A diretiva não prevê, pelo menos explicitamente, nenhum controlo ou verificação subsequentes do número de licenças já verificadas nos termos do artigo 15.o, nem contém uma disposição que imponha a devolução de quotas adicionais depois de 30 de abril, no caso de as autoridades nacionais determinarem — por qualquer motivo — que aquelas licenças não cobrem o total de emissões.

    33.

    Claramente, a diretiva não pode ser interpretada no sentido de que preclude os controlos subsequentes pelas autoridades competentes ou a possibilidade de um operador devolver licenças adicionais depois de 30 de abril de modo a cumprir a sua obrigação de devolver um número suficiente de licenças de emissões. Pelo contrário, parece‑me que as disposições nacionais que permitem ambas as possibilidades apenas reforçam o sistema estabelecido pela diretiva.

    34.

    Contudo, a sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva está necessariamente relacionada com o incumprimento da obrigação que essa disposição expressamente impõe ao operador: devolver, até 30 de abril, o número de licenças devido, conforme verificado por um perito. Seria contrário ao sentido comum interpretar a diretiva como exigindo a aplicação automática de uma sanção por violação de uma obrigação que não está claramente especificada na mesma diretiva.

    35.

    O facto de o número de licenças, conforme verificado nos termos do artigo 15.o, ser determinante para o funcionamento do sistema estabelecido pela diretiva é também confirmado pelas orientações publicadas nos termos do artigo 14.o, n.o 1, da diretiva ( 8 ). O ponto 7.4 das orientações dispõe que «[a] autoridade competente utilizará o valor correspondente às emissões totais de uma instalação constante do relatório considerado satisfatório para verificar se o operador entregou um número de licenças suficiente para cobrir as emissões da instalação em causa» ( 9 ).

    36.

    Esta interpretação parece ser corroborada pelos trabalhos preparatórios da diretiva. O ponto 17 da exposição de motivos que acompanha a proposta de diretiva apresentada pela Comissão, em 23 de outubro de 2001, dispõe que «[o]s casos que envolvam violações da obrigação de restituir direitos de emissão suficientes para cobrir as emissões verificadas devem ser objeto de medidas rigorosas e coerentes em toda a [União] Europeia. Para tal, serão impostas penalidades financeiras […]» ( 10 ).

    37.

    Curiosamente, o artigo 16.o, n.o 2, da diretiva, relativo à publicação dos nomes dos operadores que não cumpriram a obrigação de devolver licenças suficientes, referia explicitamente na sua versão original, aplicável aos factos do caso, a obrigação «nos termos do n.o 3 do artigo 12.o» da diretiva ( 11 ). Claramente, pode defender‑se que os n.os 2 e 3 do artigo 16.o da diretiva, na medida em que tinham, e ainda têm, uma redação diferente, respeitam a infrações diferentes. De facto, o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle alegam, em substância, que o artigo 16.o, n.o 3, da diretiva tem um âmbito mais alargado que o artigo 16.o, n.o 2.

    38.

    Contudo, essa interpretação não é corroborada pelos trabalhos preparatórios. A diferença entre os textos dos dois números é antes explicada pelo facto de que, na proposta inicialmente apresentada pela Comissão, o artigo 16.o, n.o 2, da diretiva se destinava a ser aplicado a todas as violações da legislação nacional adotada para transpor a diretiva, enquanto o n.o 3 se destinava a punir a falta de devolução de um número de licenças suficiente. No entanto, o Parlamento considerou — e a Comissão aceitou — que um regime em que o infrator é exposto publicamente era desproporcionado no caso de vários tipos de infração da diretiva, incluindo as infrações que dizem respeito às medidas nacionais de transposição, e que, consequentemente, esse regime deveria ser limitado às situações em que os operadores não tivessem devolvido um número suficiente de licenças ( 12 ).

    39.

    A génese legislativa da diretiva parece, assim, indicar que a diferença de redação entre os dois números não reflete uma decisão por parte do legislador da União de estabelecer uma distinção entre os tipos de infração respetivamente cobertos.

    40.

    Esta interpretação encontra ainda confirmação no acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, no qual o Tribunal de Justiça declarou que a obrigação, prevista nos artigos 6.°, n.o 2, alínea e), e 12.°, n.o 3, da diretiva, de devolver um número de licenças equivalente ao total de emissões durante o ano civil anterior conforme verificado nos termos do artigo 15.o é «a única cujo incumprimento a própria Diretiva 2003/87 sujeita a uma sanção precisa, ao passo que a sanção de outros comportamentos contrários às suas disposições é deixada, nos termos do artigo 16.o desta diretiva, à descrição dos Estados‑Membros» ( 13 ).

    41.

    Além disso, uma interpretação diferente do artigo 16.o, n.o 3, da diretiva colocaria um problema em relação à proporcionalidade da sanção estabelecida nessa disposição.

    42.

    Com efeito, no acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, o Tribunal de Justiça também declarou que a sanção fixa e automática prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva era proporcionada, designadamente pelo facto de os operadores estarem em posição de saber o número exato de licenças a devolver (em virtude da verificação nos termos do artigo 15.o) e de lhes ser concedido um prazo razoável para dar cumprimento à obrigação. É evidente que um operador prudente não adiaria o cumprimento da sua obrigação até ao último momento. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não considerou que, por força do princípio da proporcionalidade, os tribunais nacionais devessem poder alterar o montante da sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva, mesmo no caso em que o incumprimento pelos operadores pudesse ser devido a um «problema administrativo interno» ( 14 ).

    43.

    Contudo, o presente processo parece — com base na informação que pode ser retirada da decisão de reenvio — bastante diferente do processo acima referido. De facto, a Nordzucker alega que o seu erro se deveu ao facto de a empresa se ter baseado na carta do Ministério que explicava que o tipo de instalação que a Nordzucker utilizava (os equipamentos de secagem) não estava abrangido pelo regime de comércio de licenças de emissão. Além disso, o relatório foi também devidamente verificado por um perito independente nos termos do artigo 15.o da diretiva. Apenas mais tarde — isto é, depois de 30 de abril —, as autoridades alemãs informaram a Nordzucker de que o número de licenças devolvidas era insuficiente, na medida em que as emissões produzidas pelos equipamentos de secagem também tinham de ser tomadas em consideração para efeitos da diretiva.

    44.

    Ainda que a conduta da Nordzucker deva ser sujeita a alguma sanção — questão que incumbe ao tribunal nacional apreciar — pelo menos, antes de 30 de abril, a Nordzucker não podia saber com suficiente certeza o número total de licenças a devolver. A imposição automática de uma pesada coima nessas circunstâncias poderia assim levantar sérios problemas de proporcionalidade.

    45.

    Segundo o Governo alemão e a Emissionshandelsstelle, seria, pelo contrário, desproporcionado aplicar essa sanção a qualquer incumprimento da obrigação prevista nos artigos 6.°, n.o 2, alínea e), e 12.°, n.o 3, da diretiva, quando os operadores que pudessem ter induzido em erro o perito que verificou o relatório (por exemplo, comunicando‑lhe dados falseados ou adotando outro comportamento fraudulento) escapariam à aplicação da sanção.

    46.

    Não estou de acordo. O facto de a sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da diretiva não se aplicar não significa que não possa ser aplicada a esses operadores nenhuma sanção. Com efeito, o artigo 16.o, n.o 1, da diretiva estipula que os Estados‑Membros devem estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis em caso de infração às disposições nacionais aprovadas por força da diretiva, e que essas sanções devem ser «efetivas, proporcionadas e dissuasivas» ( 15 ).

    47.

    Cabe, assim, às autoridades nacionais estabelecer as sanções que podem ser aplicadas aos operadores que, apesar de cumprirem a obrigação estabelecida nos artigos 6.°, n.o 2, alínea e), e 12.°, n.o 3, da diretiva, cometam outros tipos de infrações que dificultem o correto funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão estabelecido pela diretiva. Essas sanções devem, por um lado, ser efetivas e dissuasivas: isto significa, na minha opinião, que o comportamento fraudulento como o referido pelo Governo alemão e pela Emissionshandelsstelle pode (e deve) ser sujeito a sanções severas. Por outro lado, essas sanções devem ser proporcionadas: isto implica que situações como aquela em que se encontra a Nordzucker devem ser objeto de uma apreciação na qual todas as circunstâncias de facto pertinentes sejam tidas em conta para decidir sobre o an debeatur e o quantum debeatur da sanção (como, designadamente, a boa‑fé da empresa ou se a empresa foi induzida em erro pelas próprias autoridades).

    48.

    Por conseguinte, concluo que o tipo de incumprimento cometido pela Nordzucker não é abrangido pelo artigo 16.o, n.o 3, da diretiva mas entra, se for caso disso, no âmbito de aplicação do artigo 16.o, n.o 1, dessa diretiva.

    IV – Conclusão

    49.

    Pelo exposto, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial submetida pelo Bundesverwaltungsgericht nos seguintes termos:

    «A sanção prevista no artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho, não é aplicável a um operador que, até 30 de abril de determinado ano, tenha devolvido um número licenças equivalente às suas emissões durante o ano anterior conforme verificadas nos termos do artigo 15.o da diretiva, mas que, na sequência de um controlo posterior efetuado pela autoridade nacional competente, se revelou insuficiente para cobrir todas as emissões desse operador durante o ano anterior. Cabe aos Estados‑Membros estabelecer as regras relativas às sanções aplicáveis, quando adequado, a esses tipos de infrações. As sanções previstas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.»


    ( 1 ) Língua original: inglês.

    ( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (a seguir «diretiva») (JO L 275, p. 32).

    ( 3 ) V. considerandos 3 a 5 da Diretiva 2003/87.

    ( 4 ) A Diretiva 2003/87 foi, entretanto, alterada diversas vezes. No entanto, verifica‑se que nenhuma das alterações subsequentes tem pertinência no âmbito do presente processo.

    ( 5 ) BGB1 I, p. 1578.

    ( 6 ) Acórdão C‑203/12, EU:C:2013:664.

    ( 7 ) Decisão 2004/156/CE da Comissão, de 29 de janeiro de 2004, que estabelece orientações para a monitorização e a comunicação de informações relativas às emissões de gases com efeito de estufa, nos termos da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 59, p. 1) (a seguir «orientações»).

    ( 8 ) Ibid.

    ( 9 ) O sublinhado é meu. Neste contexto, importa realçar que as orientações foram adotadas não como um ato de «soft law» mas, como mencionado na nota 6, através de uma decisão da Comissão, ou seja, na forma de um ato com efeitos jurídicos.

    ( 10 ) COM(2001) 581 final. O sublinhado é meu.

    ( 11 ) Na sua versão atual, o artigo 16.o, n.o 2, da diretiva refere a «obrigação de devolver licenças de emissão suficientes nos termos da presente diretiva» (o sublinhado é meu). Esta alteração foi introduzida pela Diretiva 2008/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, que altera a Diretiva 2003/87/CE de modo a incluir as atividades da aviação no regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade (JO 2009, L 8, p. 2), que estendeu o regime de comércio de licenças de emissão às atividades de aviação. Esta alteração destinava‑se a refletir o âmbito de aplicação alargado da diretiva. No entanto, como corretamente assinalado pelo Governo do Reino Unido, a alteração ao artigo 16.o, n.o 2, da diretiva não fez qualquer diferença relativamente às obrigações que impendem sobre os operadores de instalações.

    ( 12 ) Relatório do Parlamento Europeu, de 13 de setembro de 2002, sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à criação de um quadro de comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade Europeia e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (FINAL A5‑0303/2002), p. 28.

    ( 13 ) V. acórdão Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, EU:C:2013:664, n.o 25 (o sublinhado é meu).

    ( 14 ) Ibidem, n.os 19 e 33 a 42.

    ( 15 ) O sublinhado é meu.

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