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Documento 62011CJ0260

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 11 de abril de 2013.
The Queen, a pedido de David Edwards e Lilian Pallikaropoulos contra Environment Agency e o.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Supreme Court of the United Kingdom.
Ambiente — Convenção de Aarhus — Diretiva 85/337/CEE — Diretiva 2003/35/CE — Artigo 10.°‑A — Diretiva 96/61/CE — Artigo 15.°‑A — Acesso à justiça em matéria de ambiente — Conceito de processos judiciais ‘não exageradamente dispendiosos’.
Processo C‑260/11.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2013:221

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

11 de abril de 2013 ( *1 )

«Ambiente — Convenção de Aarhus — Diretiva 85/337/CEE — Diretiva 2003/35/CE — Artigo 10.o-A — Diretiva 96/61/CE — Artigo 15.o-A — Acesso à justiça em matéria de ambiente — Conceito de processos judiciais ‘não exageradamente dispendiosos’»

No processo C-260/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pela Supreme Court of the United Kingdom (Reino Unido), por decisão de 17 de maio de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 25 de maio de 2011, no processo

The Queen, a pedido de:

David Edwards,

Lilian Pallikaropoulos,

contra

Environment Agency,

First Secretary of State,

Secretary of State for Environment, Food and Rural Affairs,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: L. Bay Larsen, exercendo funções de presidente da Quarta Secção, J.-C. Bonichot (relator), C. Toader, A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado-geral: J. Kokott,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 13 de setembro de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação de L. Pallikaropoulos, por R. Buxton, solicitor, e D. Wolfe, QC,

em representação do Governo do Reino Unido, por C. Murrell e J. Maurici, na qualidade de agentes, assistidos por R. Palmer, barrister,

em representação do Governo dinamarquês, por S. Juul Jørgensen e V. Pasternak Jørgensen, na qualidade de agentes,

em representação da Irlanda, por E. Creedon e D. O’Hagan, na qualidade de agentes, assistidos por N. Hyland, barrister-at-law,

em representação do Governo grego, por G. Karipsiades, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por P. Oliver e L. Armati, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 18 de outubro de 2012,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 10.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9), e do artigo 15.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61/CE do Conselho, de 24 de setembro de 1996, relativa à prevenção e controlo integrados da poluição (JO L 257, p. 26), conforme alteradas pela Diretiva 2003/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de maio de 2003 (JO L 156, p. 17, a seguir, respetivamente, «Diretiva 85/337» e «Diretiva 96/61»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe D. Edwards e L. Pallikaropoulos à Environment Agency, ao First Secretary of State e ao Secretary of State for Environment, Food and Rural Affairs, a respeito de uma licença de exploração concedida a uma cimenteira pela Environment Agency. O pedido tem por objeto a conformidade com o direito da União da decisão da House of Lords que condenou L. Pallikaropoulos, a cujo recurso foi negado provimento, no pagamento das despesas da parte contrária.

Quadro jurídico

Direito internacional

3

Segundo o preâmbulo da Convenção sobre acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente, aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO L 124, p. 1, a seguir «Convenção de Aarhus»):

«[...]

«Reconhecendo igualmente que todos os indivíduos têm o direito de viver num ambiente propício à sua saúde e bem-estar, e o dever, quer individualmente quer em associação com outros indivíduos, de proteger e melhorar o ambiente em benefício das gerações presentes e futuras,

Considerando que, para poderem exercer esse direito e cumprir esse dever, os cidadãos devem ter acesso à informação, poder participar no processo de tomada de decisões e ter acesso à justiça no domínio do ambiente, e reconhecendo que, neste contexto, os cidadãos podem necessitar de assistência para poderem exercer os seus direitos,

[...]

Procurando garantir ao público, bem como às organizações, o acesso a mecanismos judiciais eficazes por forma a proteger os seus interesses legítimos e a garantir a aplicação da lei,

[...]»

4

O artigo 1.o da Convenção de Aarhus, sob a epígrafe «Objetivo», prevê o seguinte:

«Com o objetivo de contribuir para a proteção do direito de todos os indivíduos, das gerações presentes e futuras, a viver num ambiente propício à sua saúde e bem-estar, cada parte garantirá a concessão dos direitos de acesso à informação, à participação do público no processo de tomada de decisões e à justiça no domínio do ambiente, em conformidade com o disposto na presente convenção.»

5

O artigo 3.o desta Convenção, sob a epígrafe «Disposições gerais», dispõe, no seu n.o 8:

«Cada parte garantirá que as pessoas que exerçam os seus direitos nos termos do disposto na presente convenção não sejam penalizadas, perseguidas ou importunadas de alguma forma pelo seu envolvimento. Esta disposição não afetará os poderes dos tribunais nacionais para estabelecer custas razoáveis nos procedimentos judiciais.»

6

Sob a epígrafe «Acesso à justiça», o artigo 9.o da mesma Convenção precisa:

«[…]

2.   Cada parte garantirá, nos termos da respetiva legislação nacional, que os membros do público em causa:

a)

Que tenham um interesse suficiente;

ou, em alternativa,

b)

Cujo direito tenha sido ofendido, caso a lei de procedimento administrativo da parte o imponha como condição prévia, tenham acesso a um recurso junto dos tribunais e/ou de outra instância independente instituída por lei, para impugnar a legalidade material e processual de qualquer decisão, ato ou omissão sujeita às disposições previstas no artigo 6.o e, salvo disposição em contrário no direito interno, a outras disposições relevantes da presente convenção.

[...]

3.   Além disso, e sem prejuízo dos processos de recurso referidos nos n.os 1 e 2, cada parte assegurará que os membros do público que satisfaçam os critérios estabelecidos no direito interno tenham acesso aos processos administrativos ou judiciais destinados a impugnar os atos e as omissões de particulares e de autoridades públicas que infrinjam o disposto no respetivo direito interno do domínio do ambiente.

4.   Além disso, e sem prejuízo do disposto no n.o 1, os processos referidos nos n.os 1, 2 e 3 deverão proporcionar soluções eficazes e adequadas, incluindo, se necessário, a reparação injuntiva do direito, ser justos, equitativos, céleres e não exageradamente dispendiosos [...].

5.   Com o objetivo de aumentar a eficácia do disposto no presente artigo, cada parte assegurará a colocação à disposição do público das informações relativas ao acesso aos processos de recurso administrativos e judiciais e considerará a possibilidade de estabelecer mecanismos de assistência adequados para eliminar ou reduzir os entraves financeiros e outros ao acesso à justiça.»

Direito da União

7

Segundo o artigo 10.o-A da Diretiva 85/337 e o artigo 15.o-A da Diretiva 96/61:

«Os Estados-Membros devem assegurar que, de acordo com o sistema jurídico nacional relevante, os membros do público em causa que:

a)

Tenham um interesse suficiente ou, em alternativa;

b)

Invoquem a violação de um direito, sempre que a legislação de processo administrativo de um Estado-Membro assim o exija como requisito prévio,

tenham a possibilidade de interpor recurso perante um tribunal ou outro órgão independente e imparcial criado por lei para impugnar a legalidade substantiva ou processual de qualquer decisão, ato ou omissão abrangido pelas disposições de participação do público estabelecidas na presente diretiva.

Os Estados-Membros devem determinar a fase na qual as decisões, atos ou omissões podem ser impugnados.

Os Estados-Membros devem determinar o que constitui um interesse suficiente e a violação de um direito, de acordo com o objetivo que consiste em proporcionar ao público em causa um vasto acesso à justiça. […]

O presente artigo não exclui a possibilidade de um recurso preliminar para uma autoridade administrativa e não afeta o requisito de exaustão dos recursos administrativos prévios aos recursos judiciais, caso esse requisito exista na legislação nacional.

O referido processo deve ser justo, equitativo, atempado e não exageradamente dispendioso.

[...]»

8

A Diretiva 2011/92/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO 2012, L 26, p. 1), procedeu à codificação da Diretiva 85/337. O artigo 11.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Diretiva 2011/92 prevê disposições idênticas às do artigo 10.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337.

9

A Diretiva 2008/1/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008, relativa à prevenção e controlo integrados da poluição (JO L 24, p. 8), procedeu à codificação da Diretiva 96/61. O artigo 16.o, n.o 4, segundo parágrafo, da Diretiva 2008/1 prevê disposições idênticas às do artigo 15.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61.

Direito do Reino Unido

10

O artigo 49.o, n.o 1, do Regulamento de Processo da Supreme Court de 2009 (Supreme Court Rules 2009, SI 2009, n.o 1603) prevê:

«A apreciação detalhada das despesas é efetuada por dois costs officers designados pelo presidente e:

a)

um deles deve ser um costs judge (um Taxing Master das Senior Courts)

e

b)

o segundo pode ser o secretário.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11

D. Edwards impugnou a decisão da Environment Agency de autorização da exploração de uma cimenteira, incluindo a incineração de resíduos, em Rugby (Reino Unido), à luz do direito do ambiente, alegando, designadamente, a inexistência de avaliação do impacto do projeto no ambiente. Neste quadro, D. Edwards beneficiou de apoio judiciário.

12

Tendo sido negado provimento a este recurso, D. Edwards interpôs recurso na Court of Appeal antes de decidir, por fim, desistir da instância no último dia da audiência.

13

A seu pedido, L. Pallikaropoulos foi admitida a intervir como recorrente nas fases processuais subsequentes. Apesar de não preencher os requisitos para beneficiar do apoio judiciário, a Court of Appeal aceitou limitar as suas obrigações em matéria de despesas a um montante de 2000 GBP.

14

A Court of Appeal negou provimento ao recurso de L. Pallikaropoulos e condenou-a no pagamento das suas próprias despesas e das despesas, assim fixadas, da parte contrária.

15

L. Pallikaropoulos interpôs recurso na House of Lords, no qual pedia que não fosse obrigada a apresentar a garantia para as despesas previsíveis no montante de 25000 GBP que lhe tinha sido pedida por esse órgão jurisdicional. Este pedido foi indeferido.

16

L. Pallikaropoulos solicitou também que lhe fosse concedido o benefício de uma medida de proteção em matéria de despesas («protective costs order») destinada a limitar a sua responsabilidade em matéria de despesas na hipótese de o seu recurso não ter provimento. Este pedido foi indeferido.

17

Por decisão de 16 de abril de 2008, a House of Lords confirmou a decisão da Court of Appeal de negar provimento ao recurso e, em 18 de julho seguinte, condenou L. Pallikaropoulos a pagar aos recorridos as despesas do recurso, cujo montante devia, em caso de desacordo entre as partes, ser fixado pelo Clerk of the Parliaments. Os recorridos apresentaram duas faturas de 55810 GBP e 32290 GBP, a título de despesas recuperáveis.

18

A competência da House of Lords foi transferida para a Supreme Court of the United Kingdom, criada em 1 de outubro de 2009. Em conformidade com o Regulamento de Processo da Supreme Court de 2009, foi efetuada a apreciação detalhada das despesas por dois costs officers designados pelo presidente desse órgão jurisdicional. Neste âmbito, L. Pallikaropoulos invocou as Diretivas 85/337 e 96/61 para impugnar a condenação nas despesas.

19

Por decisão de 4 de dezembro de 2009, os costs officers consideraram que eram, em princípio, competentes para apreciar o mérito desse argumento.

20

No processo relativo às despesas, os recorridos no processo principal interpuseram recurso desta decisão perante um juiz único da Supreme Court of the United Kingdom, no quadro do qual o convidavam a remeter o processo para uma Secção de cinco juízes, o que veio a ser decidido.

21

Essa Secção pronunciou-se em 15 de dezembro de 2010. Considerou que os costs officers deveriam ter-se restringido às competências que o Regulamento de Processo da Supreme Court de 2009 lhes atribui e ter-se limitado, por conseguinte, a fixar as despesas. Em seu entender, a questão de saber se o processo seguido apresenta um custo proibitivo na aceção das Diretivas 85/337 e 96/61 é da competência exclusiva do órgão jurisdicional competente para conhecer do mérito do processo que pode decidir in limine litis, quando da apreciação do pedido de medidas de proteção em matéria de despesas, ou decidir concomitantemente à sua decisão de mérito.

22

Esta mesma Secção considerou igualmente que a questão de saber se a condenação de L. Pallikaropoulos no pagamento das despesas dos recorridos era contrária a essas diretivas não tinha sido examinada pela House of Lords, no quadro do exame do seu pedido de uma medida de decisão de proteção em matéria de despesas.

23

Nestas condições, a Supreme Court of the United Kingdom decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Como deve um tribunal nacional abordar a questão da condenação nas despesas de um membro do público que interpõe um recurso judicial em matéria ambiental ao qual é negado provimento, tendo em conta as obrigações decorrentes do artigo 9.o, n.o 4, da Convenção de Aarhus, conforme implementada pelo artigo 10.o-A da Diretiva [85/337] e pelo artigo 15.o-A da Diretiva [96/61]?

2)

A questão de saber se o processo judicial é ou não ‘exageradamente dispendioso’ na aceção do artigo 9.o, n.o 4, da Convenção de Aarhus, conforme implementada pelas [mesmas] diretivas, deve ser decidida com base num critério objetivo (com referência, por exemplo, à capacidade de um membro ‘normal’ do público assumir a potencial responsabilidade pelas despesas), ou num critério subjetivo (com referência aos meios do recorrente individual), ou numa combinação de ambos?

3)

Ou esta matéria é da esfera do direito nacional dos Estados-Membros, devendo apenas atingir o objetivo prescrito nas [referidas] diretivas, designadamente o objetivo de que os processos em questão não sejam ‘exageradamente dispendiosos’?

4)

Ao avaliar se os processos são ou não ‘exageradamente dispendiosos’, é relevante que o recorrente não tenha sido dissuadido de agir judicialmente ou de dar continuidade ao procedimento?

5)

É admissível uma abordagem diferente destas questões na fase de i) recurso jurisdicional ou ii) recurso subsequente em que se exija uma abordagem diferente da da primeira instância?»

Quanto às questões prejudiciais

24

Com as suas diferentes questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pede que o Tribunal de Justiça precise, por um lado, o sentido da exigência prevista no artigo 10.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337, bem como no artigo 15.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61, segundo a qual os processos judiciais visados por estas disposições não devem ser exageradamente dispendiosos e, por outro, os critérios de apreciação desta exigência suscetíveis de serem aplicados por um órgão jurisdicional nacional quando decide a respeito das despesas e a margem de manobra dos Estados-Membros para definir esses critérios no direito interno. No quadro da apreciação efetuada pelo juiz nacional do eventual caráter exageradamente dispendioso do processo, o órgão jurisdicional de reenvio pede igualmente que o Tribunal de Justiça precise se o juiz deve ter em conta o facto de a parte suscetível de ser condenada nas despesas não ter sido efetivamente dissuadida de interpor recurso ou dar-lhe continuidade e se, além disso, a sua análise pode ser diferente consoante decida em primeira instância, em recurso ou em sede de recurso de segunda instância.

Quanto ao conceito de «não exageradamente dispendioso» na aceção das diretivas 85/337 e 96/61

25

Como o Tribunal de Justiça já decidiu, importa recordar, em primeiro lugar, que a exigência de os processos judiciais não serem exageradamente dispendiosos, prevista no artigo 10.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337 e no artigo 15.o-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61, não proíbe que os órgãos jurisdicionais nacionais possam proferir uma condenação nas despesas (v., neste sentido, acórdão de 16 de julho de 2009, Comissão/Irlanda, C-427/07, Colet., p. I-6277, n.o 92).

26

Tal resulta expressamente da Convenção de Aarhus com a qual a legislação da União deve ser «harmonizada», como resulta do considerando 5 da Diretiva 2003/35 que alterou as Diretivas 85/337 e 96/61, tendo o artigo 3.o, n.o 8, desta Convenção precisado que [estas disposições] não afetam os poderes dos tribunais nacionais para estabelecer custas razoáveis nos procedimentos judiciais.

27

Em seguida, importa sublinhar que a exigência de que as custas de um processo não sejam exageradamente dispendiosas se refere a todos os custos financeiros ocasionados pela participação no processo judicial (v., neste sentido, acórdão Comissão/Irlanda, já referido, n.o 92).

28

Assim, o caráter exageradamente dispendioso deve ser apreciado globalmente, tendo em conta todas as despesas suportadas pela parte em causa.

29

Por outro lado, decorre das exigências de uma aplicação uniforme do direito da União e do princípio da igualdade que os termos de uma disposição do direito da União que não contenha nenhuma remissão expressa para o direito dos Estados-Membros para determinar o seu sentido e o seu alcance devem normalmente ser objeto, em toda a União Europeia, de uma interpretação autónoma e uniforme, que deve ser procurada tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo prosseguido (v., designadamente, acórdão de 14 de fevereiro de 2012, Flachglas Torgau, C-204/09, n.o 37).

30

Daqui resulta que, apesar de nem a Convenção de Aarhus, cujo artigo 9.o, n.o 4, prevê que os processos referidos nos seus n.os 1 a 3 não devem ser exageradamente dispendiosos, nem as Diretivas 85/337 e 96/61 precisarem a forma como deve ser apreciado o custo de um processo judicial a fim de saber se este deve ser considerado exageradamente dispendioso, essa apreciação não pode ser feita exclusivamente com base no direito nacional.

31

Como se precisa expressamente nos artigos 10.°-A, terceiro parágrafo, da Diretiva 85/337 e 15.°-A, terceiro parágrafo, da Diretiva 96/61, o objetivo prosseguido pelo legislador da União consiste em proporcionar ao público um «vasto acesso à justiça».

32

Este objetivo comunga, de forma lata, da vontade do legislador da União de preservar, proteger e melhorar a qualidade do ambiente e de atribuir ao público um papel ativo para esse efeito.

33

Por outro lado, a exigência de um processo não «exageradamente dispendioso» faz parte integrante, no domínio do ambiente, do respeito do direito a um recurso efetivo, consagrado no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, bem como do princípio da efetividade, segundo o qual as modalidades processuais das ações destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos conferidos aos litigantes pelo direito da União não devem tornar impossível na prática, ou excessivamente difícil, o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (v., designadamente, acórdão de 8 de março de 2011, Lesoochranárske zoskupenie VLK, C-240/09, Colet., p. I-1255, n.o 48).

34

Por último, ainda que o documento publicado em 2000 pela Comissão Económica para a Europa da Organização das Nações Unidas, intitulado «A Convenção de Aarhus, guia de aplicação», não possa dar uma interpretação vinculativa desta Convenção, há que notar que este documento precisa que o custo de um processo de recurso ao abrigo da Convenção ou da aplicação do direito nacional do ambiente não deve ser elevado ao ponto de impedir os membros do público de interpor recurso se considerarem necessário.

35

Resulta do exposto que a exigência de que o processo judicial não seja exageradamente dispendioso, prevista nos artigos 10.°-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337 e 15.°-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61, implica que as pessoas aí visadas não sejam impedidas de interpor ou dar continuidade a um processo judicial que seja abrangido pelo âmbito de aplicação desses artigos devido ao encargo financeiro que daí poderia resultar. Quando um órgão jurisdicional nacional é chamado a pronunciar-se sobre a condenação nas despesas de um particular que, enquanto recorrente, foi vencido num litígio em matéria de ambiente ou, mais genericamente, quando é levado, como podem sê-lo os órgãos jurisdicionais do Reino Unido, a tomar posição, numa fase anterior do processo, sobre uma eventual limitação dos custos que podem ser impostos à parte vencida, deve assegurar-se do respeito desta exigência, tendo em conta o interesse da pessoa que deseja defender os seus direitos e o interesse geral ligado à proteção do ambiente.

Quanto aos critérios relevantes para efeitos da apreciação da exigência do caráter «não exageradamente dispendioso»

36

Como se precisou no n.o 24 do presente acórdão, a Supreme Court of the United Kingdom pretende conhecer os critérios de apreciação que o juiz nacional deve aplicar para garantir o respeito da exigência, quando decide quanto às despesas, que os processos não sejam exageradamente dispendiosos. Pergunta, designadamente, se essa apreciação reveste um caráter objetivo ou, pelo contrário, subjetivo, bem como qual a medida em que há que ter em conta o direito nacional.

37

Deve recordar-se que, por força de jurisprudência constante, na falta de precisão do direito da União, os Estados-Membros, aquando da transposição de uma diretiva, devem assegurar a sua plena eficácia, ao mesmo tempo que dispõem de uma ampla margem de apreciação quanto à escolha dos meios (v., designadamente, acórdão de 9 de novembro de 2006, Comissão/Irlanda, C-216/05, Colet., p. I-10787, n.o 26).

38

Daqui resulta que, no que respeita aos fundamentos suscetíveis de alcançar o objetivo de garantir uma proteção jurisdicional efetiva sem custo excessivo no domínio do direito do ambiente, devem ser tidas em conta todas as disposições do direito nacional pertinentes e, designadamente, de um sistema nacional de apoio judiciário e de um regime de proteção das despesas, como o referido no n.o 16 do presente acórdão. Com efeito, há que ter em conta as diferenças sensíveis entre as legislações nacionais nesse domínio.

39

Por outro lado, como foi anteriormente indicado, o órgão jurisdicional nacional chamado a decidir sobre as despesas deve assegurar-se do respeito desta exigência, tendo em conta o interesse da pessoa que pretenda defender os seus direitos e o interesse geral ligado à proteção do ambiente.

40

Esta apreciação não pode, desde logo, limitar-se à situação económica do interessado, devendo também assentar numa análise objetiva do montante das despesas, e tanto assim é que, como foi precisado no n.o 32 do presente acórdão, os particulares e as associações são naturalmente chamados a desempenhar um papel ativo na defesa do ambiente. Nesta medida, o custo de um processo não deve, em certos casos, afigurar-se objetivamente desrazoável. Assim, o custo de um processo não deve exceder as capacidades financeiras do interessado nem afigurar-se, de qualquer modo, objetivamente desrazoável.

41

Quanto à análise da situação económica do interessado, a apreciação que o órgão jurisdicional nacional deve efetuar não pode assentar unicamente numa estimativa das capacidades financeiras de um recorrente «médio», uma vez que esses dados podem ter apenas uma ligação remota com a situação do interessado.

42

Por outro lado, o órgão jurisdicional pode tomar em consideração a situação das partes em causa, as hipóteses razoáveis de sucesso do requerente, a gravidade do que está em causa para este e para a proteção do ambiente, a complexidade do direito e do processo aplicáveis, bem como o eventual caráter temerário do recurso nas suas diferentes fases (v., por analogia, acórdão de 22 de dezembro de 2010, DEB, C-279/09, Colet., p. I-13849, n.o 61).

43

Há que precisar também que a circunstância, apresentada pela Supreme Court of the United Kingdom, de o interessado não ter sido dissuadido de exercer, na prática, o seu direito de agir judicialmente não basta, por si só, para considerar que o processo não é para si exageradamente dispendioso, na aceção, acima especificada, das Diretivas 85/337 e 96/61.

44

Por último, no que diz respeito à questão de saber se a apreciação da inexistência de um custo exageradamente dispendioso deveria diferir consoante o órgão jurisdicional nacional decida quanto às despesas no termo de um processo em primeira instância, em sede de recurso ou de um recurso em segunda instância, igualmente evocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, além do facto de essa distinção não estar prevista nas Diretivas 85/337 e 96/61, essa interpretação não respeitaria plenamente o objetivo prosseguido pelo legislador da União, que é assegurar um acesso amplo à justiça e contribuir para melhorar a proteção do ambiente.

45

A exigência relativa à inexistência de um custo exageradamente dispendioso do processo judicial não pode, assim, ser apreciada de modo diferente por um órgão jurisdicional nacional consoante este decida no termo de um processo em primeira instância, em sede de recurso ou de um recurso em segunda instância.

46

Por conseguinte, há que considerar que, quando o juiz nacional é chamado a pronunciar-se, no contexto recordado no n.o 41 do presente acórdão, sobre o caráter exageradamente dispendioso, para o interessado, do custo de um processo judicial em matéria de ambiente, não pode basear-se unicamente na situação económica do interessado, devendo também proceder a uma análise objetiva do montante das despesas. Além disso, pode levar em conta a situação das partes em causa, as hipóteses razoáveis de sucesso do requerente, a gravidade do que está em causa para este e para a proteção do ambiente, a complexidade do direito e do processo aplicáveis, o eventual caráter temerário do recurso nas suas diferentes fases, bem como a existência de um sistema nacional de apoio judiciário ou de um regime de proteção em matéria de despesas.

47

Em contrapartida, a circunstância de o interessado não ter sido dissuadido, na prática, de exercer o seu direito de agir judicialmente não basta, por si só, para considerar que o processo é, para este, exageradamente dispendioso.

48

Por último, essa apreciação não pode ser realizada com base em critérios diferentes consoante intervenha no termo de um processo em primeira instância, em sede de recurso ou de recurso em segunda instância.

Quanto às despesas

49

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

A exigência de que o processo judicial não seja exageradamente dispendioso, prevista nos artigos 10.°-A, quinto parágrafo, da Diretiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente, e 15.°-A, quinto parágrafo, da Diretiva 96/61/CE do Conselho, de 24 de setembro de 1996, relativa à prevenção e controlo integrados da poluição, conforme alteradas pela Diretiva 2003/35/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de maio de 2003, implica que as pessoas aí visadas não sejam impedidas de interpor ou dar continuidade a um processo judicial que seja abrangido pelo âmbito de aplicação desses artigos devido ao encargo financeiro que daí poderia resultar. Quando um órgão jurisdicional nacional é chamado a pronunciar-se sobre a condenação nas despesas de um particular que, enquanto recorrente, foi vencido num litígio em matéria de ambiente ou, mais genericamente, quando é levado, como podem sê-lo os órgãos jurisdicionais do Reino Unido, a tomar posição, numa fase anterior do processo, sobre uma eventual limitação dos custos que podem ser impostos à parte vencida, deve assegurar-se do respeito desta exigência, tendo em conta o interesse da pessoa que deseja defender os seus direitos e o interesse geral ligado à proteção do ambiente.

 

No âmbito desta apreciação, o juiz nacional não pode basear-se unicamente na situação económica do interessado, devendo também proceder a uma análise objetiva do montante das despesas. Além disso, pode levar em conta a situação das partes em causa, as hipóteses razoáveis de sucesso do requerente, a gravidade do que está em causa para este e para a proteção do ambiente, a complexidade do direito e do processo aplicáveis, o eventual caráter temerário do recurso nas suas diferentes fases, bem como a existência de um sistema nacional de apoio judiciário ou de um regime de proteção em matéria de despesas.

 

Em contrapartida, a circunstância de o interessado não ter sido dissuadido, na prática, de exercer o seu direito de agir judicialmente não basta, por si só, para considerar que o processo é, para este, exageradamente dispendioso.

 

Por último, essa apreciação não pode ser realizada com base em critérios diferentes consoante intervenha no termo de um processo em primeira instância, em sede de recurso ou de recurso em segunda instância.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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