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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62011CJ0385

Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 22 de novembro de 2012.
Isabel Elbal Moreno contra Instituto Nacional de la Seguridad Social (INSS) e Tesorería General de la Seguridad Social (TGSS).
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Social de Barcelona.
Artigo 157.° TFUE — Diretiva 79/7/CEE — Diretiva 97/81/CE — Acordo‑quadro relativo ao trabalho a tempo parcial — Diretiva 2006/54/CE — Pensão de reforma contributiva — Igualdade de tratamento entre trabalhadores do sexo masculino e trabalhadores do sexo feminino — Discriminação indireta em razão do sexo.
Processo C‑385/11.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2012:746

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

22 de novembro de 2012 ( *1 )

«Artigo 157.o TFUE — Diretiva 79/7/CEE — Diretiva 97/81/CE — Acordo-quadro relativo ao trabalho a tempo parcial — Diretiva 2006/54/CE — Pensão de reforma contributiva — Igualdade de tratamento entre trabalhadores do sexo masculino e trabalhadores do sexo feminino — Discriminação indireta em razão do sexo»

No processo C-385/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentados pelo Juzgado de lo Social de Barcelona (Espanha), por decisão de 4 de julho de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 19 de julho de 2011, no processo

Isabel Elbal Moreno

contra

Instituto Nacional de la Seguridad Social (INSS),

Tesorería General de la Seguridad Social (TGSS),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: C. Toader, exercendo funções de presidente da Oitava Secção, A. Prechal (relator) e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado-geral: E. Sharpston,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 27 de setembro de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Instituto Nacional de la Seguridad Social (INSS), por F. de Miguel Pajuelo, na qualidade de agente, assistido por A. Álvarez Moreno e J. Ignacio del Valle de Joz, abogados,

em representação do Governo espanhol, por S. Centeno Huerta e S. Martínez-Lage Sobredo, na qualidade de agentes,

em representação do Governo belga, por L. Van den Broeck e M. Jacobs, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por G. Valero Jordana e M. van Beek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da cláusula 4 do acordo-quadro relativo ao trabalho a tempo parcial, celebrado em 6 de junho de 1997, que figura no anexo da Diretiva 97/81/CE do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, respeitante ao acordo-quadro relativo ao trabalho a tempo parcial celebrado pela UNICE, pelo CEEP e pela CES (JO 1998, L 14, p. 9), conforme alterada pela Diretiva 98/23/CE do Conselho, de 7 de abril de 1998 (JO L 131, p. 10, a seguir «acordo-quadro»), bem como a interpretação dos artigos 157.° TFUE e 4.° da Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional (JO L 204, p. 23), e do artigo 4.o da Diretiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social (JO 1979, L 6, p. 24; EE 05 F2 p. 174).

2

Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe I. Elbal Moreno ao Instituto Nacional de la Seguridad Social (INSS) (Instituto Nacional da Segurança Social) e à Tesorería General de la Seguridad Social (TGSS) (Tesouraria Geral da Segurança Social), a propósito da obtenção de uma pensão de reforma.

Quadro jurídico

Regulamentação da União

3

O artigo 1.o da Diretiva 79/7 dispõe:

«A presente diretiva tem por objetivo a realização progressiva, no domínio da segurança social e de outros elementos de proteção social previsto no artigo 3.o, do principio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, a seguir denominado ‘princípio da igualdade de tratamento’»

4

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 79/7:

«A presente diretiva aplica-se:

a)

Aos regimes legais que assegurem uma proteção contra os seguintes riscos:

[...]

velhice,

[...]»

5

O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7 dispõe:

«O princípio da igualdade de tratamento implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer direta, quer indiretamente por referência, nomeadamente, ao estado civil ou familiar especialmente no que respeita:

ao âmbito dos regimes e às condições de acesso aos regimes,

à obrigação de pagar as cotizações e ao cálculo destas,

ao cálculo das prestações, incluindo os acréscimos devidos na qualidade de cônjuge e por pessoa a cargo e as condições de duração e de manutenção do direito às prestações.»

6

Nos termos da cláusula 4 do acordo-quadro, intitulada «Princípio da não discriminação»:

«1.

No que respeita às condições de emprego, os trabalhadores a tempo parcial não devem ser tratados em condições menos favoráveis do que os trabalhadores comparáveis a tempo inteiro unicamente pelo facto de trabalharem a tempo parcial, a menos que, por razões objetivas, a diferença de tratamento se justifique.

[...]»

7

A Diretiva 2006/54 prevê, no seu artigo 1.o, intitulado «Objetivo»:

«A presente diretiva visa assegurar a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no emprego e na atividade profissional.

Para o efeito, contém disposições de aplicação do princípio da igualdade de tratamento em matéria de:

[...]

b)

Condições de trabalho, incluindo remuneração;

c)

Regimes profissionais de segurança social.

[...]»

Regulamentação espanhola

8

Tal como resulta da decisão de reenvio, as disposições da Lei Geral relativa à Segurança Social (ley general de seguridad social), aprovada pelo Real Decreto Legislativo n.o 1/94, de 20 de junho de 1994 (BOE n.o 154, de 28 de junho de 1994, p. 20658, a seguir «LGSS»), aplicáveis ao litígio no processo principal, são as seguintes:

«Artigo 160.o

Definição

A prestação económica a título de pensão de reforma de tipo contributivo será única para cada beneficiário e consistirá numa pensão vitalícia a atribuir nas condições, quantia e forma dispostas na lei, quando, atingida a idade prevista, cesse ou tenha cessado o trabalho assalariado.

Artigo 161.o

Beneficiários

1.   Terão direito à pensão de reforma de tipo contributivo as pessoas abrangidas neste regime geral que, além da condição geral exigida no artigo 124.o, n.o 1, preencham os seguintes requisitos:

a)

Ter completado 65 anos de idade.

b)

Ter assegurado um período mínimo de quotização de quinze anos, [...]

Artigo 162.o

Base de cálculo da pensão de reforma

1.   A base de cálculo da pensão de reforma de tipo contributivo será o quociente obtido dividindo por 210 as bases de quotização do interessado durante os 180 meses que precederam o mês anterior à ocorrência do facto gerador [...].

Sétima Disposição Adicional. Regras aplicáveis aos trabalhadores contratados em regime de tempo parcial

1.

A proteção social resultante dos contratos de trabalho a tempo parcial rege-se pelo princípio da equiparação do trabalhador a tempo parcial ao trabalhador a tempo inteiro e especificamente pelas seguintes regras:

Primeira. Quotização

a)

A base de quotização para a Segurança Social e das quotizações cobradas conjuntamente com as respetivas quotas será sempre mensal e constituída pelas retribuições efetivamente recebidas em função das horas de trabalho efetivo, tanto ordinárias como extraordinárias.

b)

A base de quotização assim determinada não pode ser inferior às quantias previstas na lei.

c)

A quotização para a segurança social sobre as horas extraordinárias é feita sobre as mesmas bases e tipos que a das horas ordinárias.

Segunda. Períodos de quotização

a)

Para provar os períodos de quotização necessários à atribuição do direito às prestações de reforma, de incapacidade permanente, de morte e de sobrevivência, de incapacidade temporária, de maternidade e de paternidade, apenas serão tidas em conta as quotizações correspondentes às horas trabalhadas, tanto ordinárias como extraordinárias, calculando a sua equivalência em dias teóricos de quotização. Para esse efeito, o número de horas efetivamente trabalhadas será dividido por cinco, equivalente diário do cálculo de 1826 horas anuais.

b)

Para a atribuição do direito às pensões de reforma e de incapacidade permanente, ao número de dias teóricos de quotização obtidos nos termos do disposto na alínea a) desta norma será aplicado o coeficiente multiplicador de 1,5, daí resultando o número de dias que se consideram provados para a determinação dos períodos mínimos de quotização. Não poderá em caso algum ser contabilizado um número de dias de quotização superior ao que corresponderia à prestação de serviços a tempo inteiro.

Terceira. Base de cálculo

a)

A base de cálculo das prestações de reforma e de incapacidade permanente será calculada de acordo com a regra geral [...].»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

9

Em 8 de outubro de 2009, com 66 anos de idade, a recorrente no processo principal apresentou ao INSS um pedido de pensão de reforma. Anteriormente, tinha trabalhado exclusivamente como empregada de limpeza num condomínio de proprietários, durante 18 anos, a tempo parcial, à razão de 4 horas por semana, ou seja, 10% do tempo de trabalho legal em Espanha, que é de 40 horas semanais.

10

Por decisão de 13 de outubro de 2009, esta pensão foi-lhe recusada com o fundamento de que não preenchia o período mínimo de quotização de quinze anos que era exigido para a aquisição do direito à pensão de reforma em conformidade com as disposições do artigo 161.o, n.o 1, alínea b), da LGSS.

11

A reclamação apresentada pela recorrente no processo principal, em 30 de novembro de 2009, foi indeferida por decisão do INSS de 9 de novembro de 2009. Embora a recorrente no processo principal devesse provar um período mínimo de quotização de 4931 dias, a referida decisão reconhecia-lhe um período de quotização de 1362 dias, repartidos do seguinte modo:

41 dias: de 24 de outubro de 1960 a 3 de dezembro de 1960, a tempo inteiro.

336 dias: dias equiparados ao abrigo de três partos (3x112).

656 dias: de 1 de novembro de 1991 a 30 de outubro de 2009, ou seja, um período de 6564 dias, contabilizados a 10% em razão do tempo parcial.

329 dias: dias equiparados em resultado do fator de correção (1,5) previsto na Sétima Disposição Adicional da LGSS.

12

Na sequência do indeferimento da sua reclamação, a recorrente no processo principal interpôs no Juzgado de lo Social de Barcelona um recurso no âmbito do qual alegou que a Sétima Disposição Adicional da LGSS, em aplicação da qual a pensão lhe foi recusada, viola o princípio da igualdade. A referida disposição exigia, com efeito, um período maior de quotização aos trabalhadores a tempo parcial do que aos trabalhadores a tempo inteiro, mesmo tendo em conta o fator de correção constituído pelo multiplicador de 1,5 para aceder a uma prestação que é já proporcionalmente mais reduzida. Além disso, a recorrente no processo principal sustentava que essa regra implicava uma discriminação indireta, pois é estatisticamente incontestável que as mulheres são as principais utilizadoras, em cerca de 80%, deste tipo de contratos.

13

Relativamente à referida Sétima Disposição Adicional, o órgão jurisdicional de reenvio explica que esta regulamentação é baseada no princípio da tomada em conta exclusiva das horas efetivamente trabalhadas com vista a determinar os períodos de quotização exigidos, atenuando-o, no entanto, graças a duas medidas de correção com vista a facilitar o acesso à proteção da segurança social para os trabalhadores a tempo parcial.

14

Assim, primeiramente, um conceito de «dia teórico de quotização» é definido como correspondendo a cinco horas diárias de trabalho efetivo ou a 1 826 horas anuais. As quotizações pagas são tomadas em conta em função das horas trabalhadas, calculando a sua equivalência em dias teóricos de quotização.

15

Em segundo lugar, para adquirir o direito às prestações de reforma e de invalidez permanente, procede-se à aplicação de uma medida de correção específica, que consiste num coeficiente multiplicador de 1,5 aplicado aos dias teóricos de quotização. Estes são, assim, aumentados, o que facilita o acesso à proteção.

16

Todavia, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que a Sétima Disposição Adicional da LGSS tem exclusivamente em conta as horas trabalhadas, e não o período de quotização, isto é, os dias trabalhados, implica, no fim de contas, uma dupla aplicação — se bem que corrigida — do princípio do pro rata temporis. Com efeito, exige proporcionalmente um período maior de quotização para a aquisição do direito a uma pensão de reforma, a qual será também proporcionalmente reduzida ao nível da sua base de cálculo, em razão do caráter parcial do tempo de trabalho. Daqui resulta que, em matéria de quotizações, é exigido ao trabalhador a tempo parcial um período de carência maior, inversamente proporcional à redução do seu tempo de trabalho, para aceder a uma pensão cujo montante já é direta e proporcionalmente reduzido devido ao caráter parcial do tempo de trabalho.

17

O órgão jurisdicional de reenvio especifica ainda que, no caso da recorrente no processo principal, a aplicação da Sétima Disposição Adicional da LGSS implica que as quotizações pagas durante um período de 18 anos relativamente a 10% do tempo de trabalho diário equivalem, com vista ao cálculo do período de quotização exigido para aceder a uma pensão de reforma, a quotizações pagas durante um período inferior a três anos. Por conseguinte, no caso de um contrato de trabalho a tempo parcial de quatro horas por semana, a recorrente no processo principal deveria trabalhar 100 anos para completar o período de carência mínimo de 15 anos, que lhe permitiria aceder a uma pensão de reforma de 112,93 euros por mês.

18

Nestas condições, o Juzgado de lo Social de Barcelona decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O conceito de ‘condições de emprego’a que se refere a proibição de discriminação da cláusula [4] da Diretiva 97/81 abrange uma pensão de reforma de tipo contributivo, como a prevista pelo sistema de segurança social espanhol, resultante das quotizações efetuadas pelo e a favor do trabalhador durante toda a sua vida laboral?

2)

No caso de se ter respondido afirmativamente à primeira questão e de se entender que uma pensão de reforma de tipo contributivo como a que se encontra prevista no sistema de segurança social espanhol é abrangida pelo conceito de ‘condição de emprego’ a que se refere a cláusula 4 da Diretiva 97/81, a proibição de discriminação constante da referida cláusula deve ser interpretada no sentido de que proíbe ou se opõe a uma norma nacional que — em consequência de uma dupla aplicação do ‘princípio pro rata temporis’ — exija aos trabalhadores a tempo parcial, em comparação com os trabalhadores a tempo inteiro, um período de quotização proporcionalmente maior para a eventual atribuição de uma pensão de reforma de tipo contributivo de quantia proporcionalmente reduzida em função do seu horário de trabalho parcial?

3)

Como questão complementar às anteriores, uma legislação como a legislação espanhola (contida na Sétima Disposição Adicional [da] LGSS) do sistema de quotização, direito a pensão e cálculo da pensão de reforma para os trabalhadores a tempo parcial pode ser considerada como um dos ‘elementos e condições de remuneração’ a que se refere a proibição de discriminação do artigo 4.o da Diretiva 2006/54 — e o próprio artigo 157.o da versão consolidada do Tratado [FUE] […]?

4)

Como questão alternativa às anteriores, caso a pensão de reforma de tipo contributivo espanhola não seja considerada como ‘condição de emprego’ nem como ‘elemento ou condição de remuneração’, a proibição de discriminação em razão do sexo, direta ou indireta, prevista no artigo 4.o da Diretiva 79/7 deve ser interpretada no sentido de que proíbe ou se opõe a uma norma nacional que em consequência da dupla aplicação do ‘princípio pro rata temporis’ exija aos trabalhadores a tempo parcial (na sua grande maioria, mulheres), comparativamente com os trabalhadores a tempo inteiro, um período de quotização proporcionalmente maior para a atribuição de uma eventual pensão de reforma de tipo contributivo de montante proporcionalmente reduzido em função do horário de trabalho parcial?»

Quanto às questões prejudiciais

Observações preliminares

19

Através das suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio levanta a questão preliminar de saber se uma pensão como a que está em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da cláusula 4 do acordo-quadro, dos artigos 157.° TFUE e 4.° da Diretiva 2006/54 e/ou do artigo 4.o da Diretiva 79/7.

20

A este propósito, há que recordar que estão incluídas no conceito de «remuneração», na aceção do artigo 157.o, n.o 2, TFUE, as pensões que são função da relação laboral que une o trabalhador ao empregador, com exclusão das que decorrem de um sistema legal para o financiamento do qual os trabalhadores, os empregadores e, eventualmente, os poderes públicos contribuem numa medida que depende menos dessa relação laboral do que de considerações de política social (acórdão de 10 de junho de 2010, Bruno e o., C-395/08 e C-396/08, Colet., p. I-5119, n.o 41 e jurisprudência referida). Assim, não podem ser incluídos neste conceito os regimes ou as prestações de segurança social, como as pensões de reforma, diretamente regulados pela lei, em que não tenha havido nenhum elemento de concertação no âmbito da empresa ou do ramo profissional interessado e obrigatoriamente aplicáveis a categorias gerais de trabalhadores (v. acórdão de 29 de novembro de 2001, Griesmar, C-366/99, Colet., p. I-9383, n.o 27 e jurisprudência referida).

21

Da mesma forma, estão incluídas no conceito de «condições de emprego», na aceção da cláusula 4, n.o 1, do acordo-quadro, as pensões que dependam de uma relação laboral entre trabalhador e empregador, com exclusão das pensões legais de segurança social, que dependem menos dessa relação do que de considerações de ordem social (acórdão Bruno e o., já referido, n.o 42).

22

Ora, uma pensão como a que está em causa no processo principal, que, como observa o Governo espanhol, é a mais geral das pensões regulamentadas pelo direito espanhol, parece ser uma pensão que depende menos de uma relação laboral entre trabalhadores e empregador do que de considerações de ordem social, na aceção da jurisprudência referida nos n.os 20 e 21 do presente acórdão, e à qual o artigo 157.o TFUE e a cláusula 4 do acordo-quadro não se aplicam, portanto.

23

É certo que as considerações de política social, de organização do Estado, de ética, ou mesmo as preocupações de natureza orçamental que tenham desempenhado ou que possam ter desempenhado um papel na fixação de um regime pelo legislador nacional não podem prevalecer se a pensão interessar apenas a uma categoria específica de trabalhadores, se ela depender diretamente do tempo de serviço cumprido e se o seu montante for calculado com base no último vencimento (acórdão Bruno e o., já referido, n.o 47).

24

Todavia, de qualquer forma, a primeira destas três condições não se mostra preenchida, uma vez que os autos apresentados ao Tribunal de Justiça não revelam indício algum de que uma pensão como a que está em causa no processo principal afeta apenas uma categoria específica de trabalhadores.

25

Por conseguinte, tal como salientam com razão o INSS, os Governos espanhol e belga e a Comissão Europeia, nem o artigo 157.o TFUE, nem, por conseguinte, o artigo 4.o da Diretiva 2006/54, que visa aplicar essa primeira disposição, nem a cláusula 4 do acordo-quadro podem ser considerados aplicáveis a uma pensão como a que está em causa no processo principal.

26

Em contrapartida, tal pensão é suscetível de estar abrangida pela Diretiva 79/7, uma vez que faz parte de um regime legal de proteção contra um dos riscos enumerados no artigo 3.o, n.o 1, desta diretiva, a saber, a velhice, e que está direta e efetivamente ligada à proteção contra esse risco (v., neste sentido, acórdão de 20 de outubro de 2011, Brachner, C-123/10, Colet., p. I-10003, n.o 40).

27

Nestas condições, há que responder unicamente à quarta questão.

Quanto à quarta questão

28

Através da sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o da Diretiva 79/7 deve ser interpretado no sentido de que se opõe, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, a uma regulamentação de um Estado-Membro que exige dos trabalhadores a tempo parcial, a grande maioria dos quais é constituída por mulheres, em comparação com os trabalhadores a tempo inteiro, um período de quotização proporcionalmente maior, para aceder, se for caso disso, a uma pensão de reforma de tipo contributivo cujo montante é proporcionalmente reduzido em função do seu tempo de trabalho.

29

A este propósito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, existe discriminação indireta, na aceção do artigo 4.o da Diretiva 79/7, quando a aplicação de uma medida nacional, apesar da sua formulação neutra, prejudica, de facto, um número muito maior de mulheres do que de homens (v., nomeadamente, acórdão Brachner, já referido, n.o 56).

30

Ora, por um lado, como resulta da decisão de reenvio e, em particular, das explicações do órgão jurisdicional de reenvio evocadas no n.o 17 do presente acórdão, uma regulamentação como a que está em causa no processo principal prejudica os trabalhadores a tempo parcial, como a recorrente no processo principal, que durante muito tempo trabalharam a tempo parcial reduzido, uma vez que, em razão do método utilizado para calcular o período de quotização exigido para beneficiar de uma pensão de reforma, esta regulamentação exclui, na prática, esses trabalhadores da possibilidade de obterem essa pensão.

31

Por outro lado, o próprio órgão jurisdicional de reenvio reconhece que está estatisticamente provado que uma regulamentação como a que está em causa no processo principal afeta uma proporção bastante mais elevada de mulheres do que de homens, uma vez que, em Espanha, pelo menos 80% dos trabalhadores a tempo parcial são mulheres.

32

Daqui resulta que tal regulamentação é contrária ao artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, a menos que seja justificada por fatores objetivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo. Tal acontecerá se os meios escolhidos corresponderem a um objetivo legítimo da política social do Estado-Membro cuja legislação esteja em causa, forem aptos para alcançar o objetivo prosseguido por esta e forem necessários para esse efeito (v., neste sentido, acórdão Brachner, já referido, n.o 70).

33

O INSS e o Governo espanhol alegam que a obrigação de cumprir um certo número de períodos de quotização prévios para ser elegível para certas prestações constitui a expressão de um objetivo geral de política social prosseguido pelo legislador nacional, uma vez que essa obrigação é essencial no quadro de um sistema de segurança social de tipo contributivo, incluindo para garantir o equilíbrio financeiro desse sistema.

34

A esse propósito, há que salientar que, como resulta da decisão de reenvio, os trabalhadores a tempo parcial abrangidos pagaram quotizações que visam, nomeadamente, financiar o sistema de pensões. Além disso, é claro que, se recebessem uma pensão, o montante desta seria proporcionalmente reduzido em função do tempo de trabalho e das quotizações pagas.

35

Ora, como salientam o Governo belga e a Comissão, nenhum elemento dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça permite concluir que, nessas condições, a exclusão dos trabalhadores a tempo parcial como a recorrente no processo principal da possibilidade de obterem uma pensão de reforma constitui uma medida efetivamente necessária para alcançar o objetivo de salvaguarda do sistema de segurança social de tipo contributivo, ao qual se referem o INSS e o Governo espanhol, e que nenhuma outra medida menos gravosa para esses mesmos trabalhadores permite alcançar esse mesmo objetivo.

36

Esta interpretação não é afetada pelo argumento do INSS e do Governo espanhol, segundo o qual as duas medidas de correção evocadas nos n.os 14 e 15 do presente acórdão têm por finalidade facilitar o acesso do trabalhador a tempo parcial à pensão de reforma. Com efeito, não se afigura que estas duas medidas de correção tenham algum efeito positivo na situação dos trabalhadores a tempo parcial como a recorrente no processo principal.

37

No que diz respeito à referência feita pelo Governo espanhol ao acórdão de 16 de julho de 2009, Gómez-Limón Sánchez-Camacho (C-537/07, Colet., p. I-6525), basta reconhecer que, como salientou com razão a Comissão, este acórdão, tal como resulta do seu n.o 60, diz essencialmente respeito, no tocante à Diretiva 79/7, à interpretação do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), dessa diretiva, por força do qual os Estados-Membros dispõem da faculdade de excluir do âmbito de aplicação desta a aquisição de direitos às prestações de segurança social ao abrigo dos regimes legais na sequência de períodos de interrupção de trabalho devidos à educação dos filhos. Ora, não resulta da decisão de reenvio que esta disposição seja aplicável ao litígio no processo principal.

38

Por conseguinte, deve responder-se à quarta questão que o artigo 4.o da Diretiva 79/7 deve ser interpretado no sentido de que se opõe, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, à regulamentação de um Estado-Membro que exige aos trabalhadores a tempo parcial, a grande maioria dos quais é constituída por mulheres, em comparação com os trabalhadores a tempo inteiro, um período de quotização proporcionalmente maior, para aceder, se for caso disso, a uma pensão de reforma de tipo contributivo cujo montante é proporcionalmente reduzido em função do seu tempo de trabalho.

Quanto às despesas

39

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

 

O artigo 4.o da Diretiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, deve ser interpretado no sentido de que se opõe, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, à regulamentação de um Estado-Membro que exige aos trabalhadores a tempo parcial, a grande maioria dos quais é constituída por mulheres, em comparação com os trabalhadores a tempo inteiro, um período de quotização proporcionalmente maior, para aceder, se for caso disso, a uma pensão de reforma de tipo contributivo cujo montante é proporcionalmente reduzido em função do seu tempo de trabalho.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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