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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62009CJ0505

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 29 de março de 2012.
Comissão Europeia contra República da Estónia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Ambiente — Diretiva 2003/87/CE — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Plano nacional de atribuição de licenças de emissão, para a República da Estónia, para o período de 2008 a 2012 — Competências respetivas da Comissão e dos Estados‑Membros — Artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.° 2, da Diretiva 2003/87 — Igualdade de tratamento — Princípio da boa administração.
Processo C‑505/09 P.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2012:179

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

29 de março de 2012 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Ambiente — Diretiva 2003/87/CE — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Plano nacional de atribuição de licenças de emissão, para a República da Estónia, para o período de 2008 a 2012 — Competências respetivas da Comissão e dos Estados-Membros — Artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87 — Igualdade de tratamento — Princípio da boa administração»

No processo C-505/09 P,

que tem por objeto o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (atualmente Tribunal Geral), interposto ao abrigo do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, entrado em 3 de dezembro de 2009,

Comissão Europeia, representada por E. Kružíková, E. Randvere e E. White, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

apoiada por:

Reino da Dinamarca, representado por C. Vang, na qualidade de agente,

interveniente no presente recurso,

sendo as outras partes no processo:

República da Estónia, representada por L. Uibo e M. Linntam, na qualidade de agentes,

recorrente em primeira instância,

apoiada por:

República Checa, representada por M. Smolek, na qualidade de agente,

República da Letónia, representada por K. Drēviņa e I. Kalniņš, na qualidade de agentes,

intervenientes no presente recurso,

República da Lituânia,

República Eslovaca,

Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas (relator), A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: V. Trstenjak,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 29 de setembro de 2011,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 17 de novembro de 2011,

profere o presente

Acórdão

1

No seu recurso, a Comissão Europeia pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 23 de setembro de 2009, Estónia/Comissão (T-263/07, Colet., p. II-3463, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este anulou a decisão da Comissão de 4 de maio de 2007, sobre o plano nacional de atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa notificado pela República da Estónia para o período de 2008 a 2012, em conformidade com a Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (a seguir «decisão controvertida»).

Quadro jurídico

2

O artigo 1.o da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (JO L 275, p. 32), conforme alterada pela Diretiva 2004/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de outubro de 2004 (JO L 338, p. 18, a seguir «Diretiva 2003/87»), prevê:

«A presente diretiva cria um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade […], a fim de promover a redução das emissões de gases com efeito de estufa em condições que ofereçam uma boa relação custo-eficácia e sejam economicamente eficientes.»

3

O artigo 9.o da referida diretiva tem a seguinte redação:

«1.   Para cada período referido nos n.os 1 e 2 do artigo 11.o, cada Estado-Membro deve elaborar um plano nacional estabelecendo a quantidade total de licenças de emissão que tenciona atribuir nesse período e de que modo tenciona atribuí-la[s]. O plano deve basear-se em critérios objetivos e transparentes, incluindo os enumerados no anexo III, e ter em devida conta as observações do público. Sem prejuízo do disposto no Tratado [CE], a Comissão deve desenvolver, até 31 de dezembro de 2003, orientações sobre a execução dos critérios enumerados no anexo III.

Para o período referido no n.o 1 do artigo 11.o, o plano deve ser publicado e notificado à Comissão e aos outros Estados-Membros até 31 de março de 2004. Para os períodos posteriores, o plano deve ser publicado e notificado à Comissão e aos outros Estados-Membros pelo menos 18 meses antes do início do período em causa.

2.   Os planos nacionais de atribuição de licenças de emissão devem ser analisados no Comité referido no n.o 1 do artigo 23.o

3.   No prazo de três meses a contar da data de notificação de um plano nacional de atribuição por um Estado-Membro nos termos do n.o 1, a Comissão pode rejeitar esse plano ou qualquer dos seus elementos, com base na sua incompatibilidade com os critérios enumerados no anexo III ou no artigo 10.o O Estado-Membro só pode tomar uma decisão, nos termos dos n.os 1 ou 2 do artigo 11.o, se as alterações propostas tiverem sido aceites pela Comissão. As decisões de rejeição da Comissão devem ser justificadas.»

4

O artigo 10.o desta mesma diretiva prevê que «[o]s Estados-Membros devem atribuir gratuitamente, pelo menos, 95% das licenças de emissão para o período de três anos com início em 1 [de] janeiro de 2005. Os Estados-Membros devem atribuir gratuitamente pelo menos 90% das licenças de emissão para o período de cinco anos com início em 1 de janeiro de 2008».

5

Nos termos do artigo 11.o, n.o 2, da Diretiva 2003/87:

«Para o período de cinco anos com início em 1 de janeiro de 2008, e para cada período de cinco anos subsequente, cada Estado-Membro deve determinar a quantidade total de licenças de emissão que atribuirá nesse período e dar início ao processo de atribuição dessas licenças aos operadores das instalações. Essa decisão deve ser tomada pelo menos 12 meses antes do início do período em causa, devendo basear-se no respetivo plano nacional de atribuição elaborado nos termos do artigo 9.o e em conformidade com o artigo 10.o, tendo em devida conta as observações do público.»

6

O anexo III dessa mesma diretiva enumera doze critérios aplicáveis aos planos nacionais de atribuição. Os critérios n.os 1 a 3, 5 e 6 do referido anexo preveem, respetivamente, o seguinte:

«1)

A quantidade total de licenças de emissão a atribuir no período em causa deve ser compatível com a obrigação do Estado-Membro de limitar as suas emissões em conformidade com a Decisão 2002/358/CE [do Conselho, de 25 de abril de 2002, relativa à aprovação, em nome da Comunidade Europeia, do Protocolo de Quioto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas e ao cumprimento conjunto dos respetivos compromissos (JO L 130, p. 1)] e com o Protocolo de Quioto, tendo em conta, por um lado, a proporção das emissões globais que estas licenças de emissão representam em comparação com as emissões de fontes não abrangidas pela presente diretiva e, por outro, as políticas energéticas nacionais, e compatível com o programa nacional para as alterações climáticas. A quantidade total de direitos de emissão a atribuir não deverá ser superior à quantidade que será provavelmente necessária para efeitos de aplicação estrita dos critérios enunciados no presente anexo. Até 2008, a quantidade deve ser consentânea com as orientações visando a consecução ou a superação do objetivo correspondente a cada Estado-Membro, por força do disposto na Decisão 2002/358/CE e no Protocolo de Quioto.

2)

A quantidade total de licenças de emissão a atribuir deve ser compatível com as avaliações dos progressos reais e previstos na realização das contribuições dos Estados-Membros para o cumprimento dos compromissos assumidos pela Comunidade, efetuadas em conformidade com a Decisão 93/389/CEE [do Conselho, de 24 de junho de 1993, relativa a um mecanismo de vigilância das emissões comunitárias de CO2 e de outros gases responsáveis pelo efeito de estufa (JO L 167, p. 31)].

3)

A quantidade de licenças de emissão a atribuir deve ser compatível com o potencial, incluindo o potencial tecnológico, de redução de emissões das atividades abrangidas por este regime. Os Estados-Membros podem basear a sua repartição das licenças de emissão nas emissões médias de gases com efeito de estufa por produto em cada atividade e nos progressos possíveis em cada atividade.

[…]

5)

Em conformidade com os requisitos do Tratado, em especial com os artigos 87.° [CE] e 88.° [CE], o plano não deve estabelecer discriminações entre empresas ou setores que sejam suscetíveis de favorecer indevidamente determinadas empresas ou atividades.

6)

O plano deve incluir informações sobre os meios que permitirão aos novos operadores começarem a participar no regime comunitário no Estado-Membro em questão.»

7

O artigo 3.o da Decisão 2006/780/CE da Comissão, de 13 de novembro de 2006, relativa à prevenção da dupla contagem das reduções de emissões de gases com efeito de estufa no âmbito do regime comunitário de comércio de emissões no que diz respeito a atividades de projeto ao abrigo do Protocolo de Quioto em aplicação da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 316, p. 12), prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   No seu plano nacional de atribuição para o período de 2008 a 2012, o Estado-Membro deve incluir na quantidade total de licenças uma reserva de licenças elaborada para cada atividade de projeto no formato estabelecido no quadro constante do anexo I à presente decisão se, antes do termo do prazo para a notificação do seu plano nacional de atribuição previsto no n.o 1 do artigo 9.o da Diretiva 2003/87/CE, o Estado-Membro tiver emitido declarações de aprovação como país de acolhimento, comprometendo-se a emitir [unidades de redução de emissões] e [reduções certificadas de emissões] para atividades de projeto de que resultam reduções ou limitações de emissões em instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87/CE.

2.   No seu plano nacional de atribuição para o período de 2008 a 2012, o Estado-Membro pode também incluir na quantidade total de licenças uma reserva adicional de licenças elaborada no formato estabelecido no anexo II à presente decisão se, após decisão tomada ao abrigo do n.o 2 do artigo 11.o da Diretiva 2003/87/CE, tencionar emitir declarações de aprovação como país de acolhimento em que se compromete a emitir [unidades de redução de emissões] e [reduções certificadas de emissões] até 31 de dezembro de 2012 para atividades de projeto de que resultem reduções ou limitações de emissões em instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87/CE. As atividades de projeto programadas que utilizem a mesma metodologia para a redução de emissões e relativamente às quais não tenha ainda sido emitida uma declaração de apoio poderão ser agrupadas numa única coluna no quadro de reservas elaborado de acordo com o anexo II.»

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

8

Os factos na origem do litígio e a decisão controvertida constam dos n.os 6 a 12 do acórdão recorrido, nos seguintes termos:

«6

A República da Estónia notificou à Comissão […] o seu plano nacional de atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, em conformidade com a [D]iretiva [2003/87]. Segundo a República da Estónia, esta notificação foi efetuada em 30 de junho de 2006 ao passo que, segundo a Comissão, a mesma foi feita em 7 de julho de 2006.

7

Na sequência de uma troca de correspondência com a Comissão, a República da Estónia apresentou-lhe, em fevereiro de 2007, uma nova versão do seu plano nacional de atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa.

8

Em 4 de maio de 2007, a Comissão adotou a […] decisão [controvertida]. Esta decisão prevê uma redução de 47,8% em relação às licenças de emissão que a República da Estónia propunha emitir.

9

A parte decisória da decisão [controvertida] enuncia o seguinte:

‘Artigo 1.o

Os seguintes aspetos do plano nacional de atribuição de licenças da [República da] Estónia para o primeiro período de cinco anos referido no artigo 11.o, n.o 2, da [D]iretiva [2003/87] são incompatíveis, respetivamente, com:

1.

Os critérios [n.os] 1 [a] 3 do anexo III da [D]iretiva [2003/87]: a fração da quantidade total de licenças a atribuir, ou seja 11,657987 milhões de toneladas de equivalente CO2 por ano, que é incompatível com as avaliações efetuadas em conformidade com a Decisão […] 280/2004/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, relativa à criação de um mecanismo de vigilância das emissões comunitárias de gases com efeito de estufa e de implementação do Protocolo de Quioto (JO L 49, p. 1)] e com o potencial, incluindo o potencial tecnológico, de redução de emissões das atividades, tendo sido esta fração reduzida para ter em conta as emissões das atividades de projetos que já estavam operacionais em 2005 e que deram lugar em 2005 a reduções ou a limitações das emissões nas instalações abrangidas pelo âmbito de aplicação da [D]iretiva [2003/87], na medida em que estas reduções ou limitações tenham sido fundamentadas e verificadas; além disso, a parte da quantidade total de licenças que correspondem às emissões suplementares de uma instalação de combustão não incluída no plano nacional de atribuição elaborado para a primeira fase, avaliada em 0,313883 milhões de toneladas por ano, que não foi fundamentada em conformidade com a metodologia geral estabelecida no plano nacional de atribuição e baseada em dados sobre emissões fundamentados e verificados[;]

2.

O critério [n.o] 3 do anexo III da [D]iretiva [2003/87]: a não inclusão, na quantidade total de licenças a atribuir prevista nos termos do plano nacional de atribuição, de uma reserva de licenças constituída pela [República da] Estónia em conformidade com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2006/780/CE e o facto de a quantidade de licenças atribuídas às instalações onde são realizadas as atividades em causa não ser reduzida em proporção;

3.

O critério [n.o] 5 do anexo III da [D]iretiva [2003/87]: as licenças atribuídas a determinadas instalações, superiores às suas necessidades previstas, resultantes da acumulação de um bónus para as medidas adotadas numa fase precoce e as atribuições calculadas de forma diferente;

4.

O critério [n.o] 6 do anexo III da [D]iretiva [2003/87]: as informações sobre o modo como os novos operadores poderão começar a participar no regime comunitário.

Artigo 2.o

Não serão levantadas objeções ao plano nacional de atribuição sob reserva de as seguintes alterações lhe serem efetuadas de modo não discriminatório e de serem notificadas à Comissão o mais rapidamente possível, tendo em conta os prazos necessários à execução dos procedimentos nacionais:

1.

A quantidade total de licenças de emissão a atribuir para fins do sistema comunitário é reduzida em 11,657987 milhões de toneladas de equivalente CO2 por ano e as quantidades atribuídas a uma instalação de combustão suplementar não incluída no plano elaborado para a primeira fase são fixadas em conformidade com a metodologia geral estabelecida no plano nacional de atribuição, com base em dados sobre emissões fundamentados e verificados, sendo a quantidade total ainda reduzida no equivalente à diferença eventual entre as licenças atribuídas a esta instalação e os 0,313883 milhões de toneladas reservados por ano para esta instalação; além disso, a quantidade total é aumentada para ter em conta as emissões das atividades de projetos que já estavam operacionais em 2005 e que deram lugar em 2005 a reduções ou a limitações das emissões nas instalações abrangidas pelo âmbito de aplicação da [D]iretiva [2003/87], na medida em que estas reduções ou limitações tenham sido fundamentadas e verificadas;

2.

A reserva de licenças que [a República d]a Estónia pretende constituir em conformidade com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2006/780/CE está incluída na quantidade total de licenças de 12,717058 milhões de toneladas calculada de acordo com os critérios [n.os] 1 [a] 3 do anexo III da [D]iretiva [2003/87] antes da adoção da decisão nacional final em matéria de atribuição por força do artigo 11.o, n.o 2, da [D]iretiva [2003/87], e a quantidade de licenças atribuída às instalações que desenvolvem as atividades em causa é reduzida em proporção;

3.

As licenças atribuídas a determinadas instalações que não ultrapassem as necessidades previstas como resultado da aplicação de um bónus para as medidas adotadas numa fase precoce;

4.

São fornecidas informações sobre o modo como os novos operadores poderão começar a participar no regime comunitário, em conformidade com os critérios do anexo III da [D]iretiva [2003/87] e com o disposto no artigo 10.o desta.

Artigo 3.o

1.   O total anual médio de licenças de emissão de 12,717058 milhões de toneladas —diminuído da reserva que [a República d]a Estónia pretende constituir em conformidade com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2006/780/CE e ainda diminuído do equivalente à diferença eventual entre as licenças atribuídas a uma instalação de combustão suplementar não incluída no plano nacional de atribuição estabelecido para a primeira fase e os 0,313883 milhões de toneladas reservados anualmente para esta instalação, que não estão fundamentados em conformidade com a metodologia geral prescrita no plano nacional de atribuição, com base em dados de emissões verificados e fundamentados, e aumentado para ter em conta as emissões das atividades de projetos que já estavam operacionais em 2005 e que deram lugar em 2005 a reduções ou a limitações das emissões nas instalações abrangidas pelo âmbito de aplicação da [D]iretiva [2003/87], na medida em que estas reduções ou limitações tenham sido fundamentadas e verificadas —a atribuir pela [República d]a Estónia, em conformidade com o seu plano nacional de atribuição, às instalações mencionadas neste plano e aos novos operadores, não foi ultrapassado.

2.   O plano nacional de atribuição de licenças de emissão pode ser alterado sem o acordo prévio da Comissão se a alteração respeitar às licenças atribuídas a determinadas instalações, dentro dos limites do total das licenças a atribuir às instalações mencionadas no plano, na sequência de melhoramentos na qualidade dos dados, ou se consistir na redução da percentagem das licenças a atribuir gratuitamente dentro dos limites definidos no artigo 10.o da [D]iretiva [2003/87].

3.   Qualquer alteração do plano nacional de atribuição destinada a corrigir as incompatibilidades indicadas no artigo 1.o da presente decisão que se afaste das alterações referidas no artigo 2.o deve ser notificada o mais rapidamente possível, tendo em conta os prazos necessários à execução dos procedimentos nacionais, e requer o acordo prévio da Comissão em conformidade com o artigo 9.o, n.o 3, da [D]iretiva [2003/87]. Qualquer outra alteração do plano nacional de atribuição, à exceção das requeridas em conformidade com o artigo 2.o da presente decisão, é inadmissível.

Artigo 4.o

A [R]epública da Estónia é a destinatária da presente decisão’.»

Tramitação do processo no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

9

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 16 de julho de 2007, a República da Estónia interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

10

Por despacho de 29 de janeiro de 2008, o presidente da Sétima Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu a intervenção do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, em apoio dos pedidos da Comissão, bem como a intervenção da República da Lituânia e da República Eslovaca, em apoio dos pedidos da República da Estónia.

11

Este Estado-Membro invocou cinco fundamentos de recurso, relativos, em primeiro lugar, a um desvio de poder resultante da violação dos artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87, em segundo lugar, a erros manifestos de apreciação, em terceiro lugar, à violação do artigo 175.o CE, em quarto lugar, à violação do princípio da boa administração e, em quinto lugar, à falta de fundamentação.

12

A Comissão pediu ao Tribunal de Primeira Instância que declarasse o recurso inadmissível no que respeita aos artigos 1.°, n.os 3 e 4, 2.°, n.os 3 e 4, e 3.°, n.os 2 e 3, da decisão controvertida, uma vez que a República da Estónia não apresentou nenhum fundamento de facto ou de direito relativo a essas disposições, e que negasse provimento ao mesmo no que respeita às demais disposições daquela.

13

Pelo acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão controvertida, na totalidade.

14

Desde logo, nos n.os 28 a 34 do referido acórdão, o Tribunal de Primeira Instância rejeitou a exceção de inadmissibilidade parcial deduzida pela Comissão. Considerou que os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida não eram autonomizáveis das demais disposições desta decisão e que, na hipótese de os fundamentos apresentados pela República da Estónia serem procedentes, haveria que anular a decisão controvertida na totalidade.

15

Em seguida, nos n.os 49 a 93 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância examinou o primeiro fundamento do recurso, relativo a um desvio de poder resultante de violações dos artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87. Em primeiro lugar, considerou que a Comissão tinha excedido os limites do seu poder de fiscalização nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da referida diretiva, por um lado, ao precisar, na decisão controvertida, uma quantidade específica de licenças a atribuir, sendo qualquer ultrapassagem considerada incompatível com os critérios estabelecidos pela mesma diretiva, e, por outro, ao rejeitar o plano nacional de atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa notificado pela República da Estónia para o período de 2008 a 2012, em conformidade com a Diretiva 2003/87 (a seguir «PNA estónio»), na medida em que a quantidade total de licenças nele proposta ultrapassava esse limiar. Em segundo lugar, entendeu que a Comissão violou o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, ao substituir pela sua própria análise a análise efetuada pela República da Estónia nesse plano. Neste contexto, o Tribunal de Primeira Instância considerou igualmente que os dados e os métodos de avaliação utilizados pela Comissão não eram «necessariamente» os mais representativos.

16

O Tribunal de Primeira Instância concluiu daqui, no n.o 94 do acórdão recorrido, que deviam ser anulados os artigos 1.°, n.o 1, 2.°, n.o 1, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida, relativos à fixação da quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir. Quanto ao segundo, terceiro e quinto fundamentos suscitados pela República da Estónia, o Tribunal de Primeira Instância considerou que não tinham de ser examinados, na medida em que eram dirigidos contra essas mesmas disposições.

17

Por último, nos n.os 99 a 112 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância examinou o quarto fundamento do recurso, relativo à violação do princípio da boa administração. Este fundamento prendia-se com a apreciação, por parte da Comissão, da questão de saber se o PNA estónio era conforme com o critério n.o 3 do anexo III da Diretiva 2003/87, relativo à tomada em consideração das reservas na quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir. Segundo o Tribunal de Primeira Instância, a Comissão não tinha provado que os cálculos contidos nesse plano enfermavam de um erro.

18

Nessas circunstâncias, o Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.o 113 do referido acórdão, que havia que anular os artigos 1.°, n.o 2, e 2.°, n.o 2, da decisão controvertida, relativos à alegada não inclusão de reservas de licenças na referida quantidade total.

19

Tendo assim concluído pela anulação dos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida e declarado que essas disposições não eram autonomizáveis do resto dessa decisão, o Tribunal de Primeira Instância declarou, por último, no n.o 114 do acórdão recorrido, que a decisão controvertida devia ser anulada na totalidade.

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

20

Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 1 de junho de 2010, foi admitida a intervenção do Reino da Dinamarca, em apoio dos pedidos da Comissão, e a intervenção da República Checa e da República da Letónia, em apoio dos pedidos da República da Estónia.

21

No seu recurso, a Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido e

condenar a República da Estónia nas despesas.

22

O Reino da Dinamarca pede ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão recorrido.

23

A República da Estónia pede que o Tribunal de Justiça se digne:

a título principal, negar provimento ao recurso;

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral, para que este se pronuncie sobre os fundamentos apresentados por este Estado-Membro em primeira instância, que não foram apreciados no acórdão recorrido; e

condenar a Comissão nas despesas.

24

A República Checa pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento ao presente recurso e

condenar a Comissão nas despesas.

25

A República da Letónia pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao presente recurso.

Quanto ao presente recurso

26

A Comissão suscita quatro fundamentos de recurso, relativos, em primeiro lugar, a um erro de direito no exame da admissibilidade do recurso de anulação e, em segundo lugar, a um erro de direito na interpretação dos artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87. Em terceiro lugar, o Tribunal de Primeira Instância fez uma interpretação errónea do princípio da boa administração e, em quarto lugar, cometeu um erro na qualificação jurídica dos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida, ao considerar que estas disposições não eram autonomizáveis das demais disposições dessa decisão.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de direito no exame da admissibilidade do recurso de anulação

Argumentos das partes

27

A Comissão alega que, ao aceitar a admissibilidade do recurso de anulação no que diz respeito aos artigos 1.°, n.os 3 e 4, 2.°, n.os 3 e 4, e 3.°, n.os 2 e 3, da decisão controvertida, o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

28

A Comissão recorda que os fundamentos invocados pela República da Estónia perante o Tribunal de Primeira Instância diziam essencialmente respeito à legalidade do teto máximo fixado para a quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa referida nos artigos 1.°, n.o 1, 2.°, n.o 1, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida e, parcialmente, à não inclusão das reservas de licenças referida no artigo 1.o, n.o 2, e no artigo 2.o, n.o 2, desta última. Este Estado-Membro não formulou nenhuma crítica relativamente às outras incompatibilidades apuradas no que respeita ao PNA estónio, a saber, o favoritismo na atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa e a falta de transparência no tratamento de novos operadores. Ora, para interpor recurso de toda a decisão controvertida, a República da Estónia devia ter suscitado fundamentos relacionados com cada uma das suas disposições.

29

Além disso, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao declarar que os artigos 1.°, n.os 3 e 4, 2.°, n.os 3 e 4, e 3.°, n.os 2 e 3, da decisão controvertida não eram autonomizáveis das suas outras disposições.

30

A República da Estónia pede que este fundamento seja julgado improcedente. Recorda que pediu a anulação de toda a decisão controvertida. A petição incluiu uma exposição sumária dos fundamentos invocados, em conformidade com os requisitos de forma estabelecidos no artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça e no artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Quanto ao acórdão recorrido, este baseou-se numa compreensão correta da condição da natureza autonomizável das disposições da referida decisão.

Apreciação do Tribunal de Justiça

31

O primeiro fundamento do recurso diz respeito aos n.os 28 a 34 do acórdão recorrido, relativos à exceção de inadmissibilidade parcial do recurso de anulação.

32

O Tribunal de Primeira Instância examinou, nos n.os 28 a 33 do referido acórdão, a questão de saber se os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida eram autonomizáveis das outras disposições desta decisão e concluiu que não. Nestas circunstâncias, no n.o 34 do referido acórdão, rejeitou os argumentos da Comissão relativos à alegada inadmissibilidade parcial do referido recurso, precisando que, na hipótese de os fundamentos suscitados pela República da Estónia serem procedentes, haveria que anular toda a decisão controvertida.

33

No caso em apreço, é pacífico que a República da Estónia tinha pedido, na petição inicial, a anulação de toda a decisão controvertida. A exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão prendia-se com uma alegada insuficiência de fundamentação da referida petição face ao alcance da anulação pedida, na medida em que os fundamentos apresentados por este Estado-Membro apenas tinham por objeto os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da referida decisão. Segundo a Comissão, tal petição não estava em conformidade com os requisitos estabelecidos no artigo 21.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça e no artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Por considerar que as disposições que são objeto dos fundamentos apresentados pela República da Estónia eram autonomizáveis das demais disposições da referida decisão, a Comissão pediu ao Tribunal de Primeira Instância que declarasse o recurso inadmissível no que respeita a estas últimas disposições.

34

A este respeito, cumpre recordar que, nos termos do artigo 21.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável ao processo no Tribunal de Primeira Instância em conformidade com o artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a petição deve conter o objeto do litígio, o pedido e uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir à parte demandada preparar a sua defesa e ao Tribunal decidir a causa, se for o caso, sem outras informações. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que um recurso seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição (v. acórdão de 14 de janeiro de 2010, Comissão/República Checa, C-343/08, Colet., p. I-275, n.o 26 e jurisprudência referida).

35

De resto, há que observar que a petição inicial apresentada pela República da Estónia cumpria estes requisitos de forma, de modo que é pacífico que continha o objeto do litígio e uma exposição sumária dos fundamentos invocados por esse Estado-Membro, que tinham por objeto os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida. Também não é contestado que os elementos essenciais de facto e de direito em que esses fundamentos se baseavam resultavam de forma coerente e compreensível do texto da referida petição.

36

É claro que a República da Estónia não tinha apresentado, na petição, fundamentos ou alegações no que diz respeito aos artigos 1.°, n.os 3 e 4, 2.°, n.os 3 e 4, e 3.°, n.os 2 e 3, da decisão controvertida. Todavia, para interpor um recurso de anulação de um ato jurídico da União no seu todo, não é necessário que um recorrente suscite fundamentos ou alegações contra cada disposição do mesmo.

37

Quanto à questão de saber se a anulação das disposições expressamente referidas nos fundamentos da petição, a saber, os artigos 1.°, n.o 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida, era suscetível de implicar a anulação do resto da decisão, como a República da Estónia solicitava no dispositivo da petição inicial, e, mais particularmente, se o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao considerar que essas disposições não eram autonomizáveis das demais disposições da referida decisão, há que apreciar essa questão no quadro do exame do quarto fundamento do presente recurso.

38

Daqui decorre que foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância rejeitou a exceção de inadmissibilidade deduzida pela Comissão no que respeita aos artigos 1.°, n.os 3 e 4, 2.°, n.os 3 e 4, e 3.°, n.os 2 e 3, da decisão controvertida. Assim, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro de direito na interpretação dos artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87

39

Com o seu segundo fundamento, a Comissão acusa o Tribunal de Primeira Instância de ter cometido um erro de direito na interpretação do artigo 9.o, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, da Diretiva 2003/87. Após ter formulado críticas às observações gerais apresentadas pelo Tribunal de Primeira Instância sobre a repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão, conforme prevista pela referida diretiva, e sobre a natureza da fiscalização exercida por esta instituição nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da referida diretiva, a Comissão apresenta argumentos que podem ser classificados em duas partes. A primeira parte é relativa a uma alegada inobservância do princípio da igualdade de tratamento, e a segunda, a uma alegada inobservância do objetivo dessa mesma diretiva.

40

A República da Estónia pede que seja negado provimento a esse fundamento. A Comissão não invocou nenhum argumento que prove que o Tribunal de Primeira Instância cometeu tal erro quando decidiu que, segundo os artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87, aquela devia agir no quadro de uma fiscalização da legalidade das escolhas efetuadas por este Estado-Membro e respeitar a margem de manobra reservada a este.

Quanto à natureza da fiscalização pela Comissão nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87

– Argumentos das partes

41

A Comissão acusa o Tribunal de Primeira Instância de ter violado a repartição de competências entre ela e os Estados-Membros, prevista nos artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87, e de ter cometido um erro de direito, ao qualificar de fiscalização da legalidade a sua fiscalização nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da referida diretiva.

42

O Tribunal de Primeira Instância, no n.o 51 do acórdão recorrido, alargou erradamente as competências dos Estados-Membros, ao basear-se na definição da natureza jurídica de uma diretiva, decorrente do artigo 249.o CE. Os artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87 são passíveis de se aplicar unicamente entre as instituições e os Estados-Membros e não necessitam de transposição prévia para o direito nacional. Têm natureza regulamentar e aplicam-se diretamente, à semelhança das disposições de um regulamento. No que diz respeito à forma e ao conteúdo dos planos nacionais de atribuição, estes são largamente determinados e fiscalizados a nível da União Europeia, tendo em conta, designadamente, as orientações elaboradas pela Comissão, nos termos do artigo 9.o, n.o 1, dessa diretiva, para a execução dos critérios enunciados no anexo III desta última.

43

Ao contrário da abordagem preconizada pelo Tribunal Geral, a aplicação do princípio da subsidiariedade, consagrado no artigo 5.o, segundo parágrafo, CE, não podia limitar o poder de fiscalização conferido à Comissão pelo legislador da União. Com efeito, uma vez que este último concluiu pela necessidade de regulamentar a nível da União, esse princípio já não é aplicável.

44

Além disso, o Tribunal de Primeira Instância apoiou-se, erradamente, nos artigos 211.° CE e 226.° CE. Os planos nacionais de atribuição não constituem medidas clássicas de transposição de uma diretiva. Enquanto um ato de transposição só pode ser objeto de uma fiscalização ex post pela Comissão, nos termos do artigo 226.o CE, os planos nacionais de atribuição são avaliados por esta quando de uma fiscalização ex ante, em conformidade com o artigo 9.o da Diretiva 2003/87. Nesse contexto, o comité das alterações climáticas, referido no n.o 2 deste artigo, desempenha um papel importante. Assim, nesta matéria, a fiscalização da Comissão vai mais longe do que uma mera fiscalização da legalidade.

45

Na sua resposta às alegações de intervenção da República Checa, do Reino da Dinamarca e da República da Letónia, a Comissão precisa que o objetivo desse fundamento não é obter a declaração de que ela é competente para fixar de forma vinculativa a quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir, mas sim provar que o raciocínio desenvolvido pelo Tribunal de Primeira Instância para limitar o seu poder de fiscalização é errado. Em todo o caso, ainda que se devesse entender, ao contrário da posição da Comissão, que esta não podia indicar, na decisão controvertida, a quantidade total de licenças de emissão que considerava aceitável, semelhante conclusão não bastaria para anular a referida decisão, na medida em que a Comissão explicou, de forma circunstanciada, que a quantidade total de licenças prevista pela República da Estónia era manifestamente demasiado elevada.

46

Este último Estado-Membro defende que as alegações da Comissão não procedem. O Tribunal de Primeira Instância não limitou a competência desta última, apoiando-se no artigo 249.o CE. Limitou-se a concluir que, sempre que uma diretiva não prescreve a forma e os meios que devem ser empregues, quando da sua transposição, para atingir o resultado pretendido, a liberdade dos Estados-Membros para os escolher é, em princípio, total. A questão de saber se os artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87 têm ou não natureza regulamentar não tem nenhuma influência na repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão. Tão-pouco se pode defender que o Tribunal de Primeira Instância, ao invocar o princípio da subsidiariedade, limitou as competências atribuídas à Comissão.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

47

As alegações da Comissão visam os n.os 49 a 56 do acórdão recorrido, relativos à repartição de competências entre a Comissão e os Estados-Membros, conforme prevista nos artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87.

48

Nos referidos números, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que os Estados-Membros são exclusivamente competentes, por um lado, para elaborar o seu plano nacional de atribuição e, por outro, para tomar as decisões finais que fixam, nomeadamente, a quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir. No exercício das suas competências, estes dispõem de uma certa margem de manobra. A Comissão está habilitada, nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, por um lado, a verificar se os planos nacionais de atribuição estão em conformidade com os critérios enunciados por esta e, por outro, a rejeitar planos por motivo de incompatibilidade com esses critérios. O poder de fiscalização da Comissão limita-se a uma fiscalização da legalidade.

49

No caso em apreço, como o Tribunal de Primeira Instância corretamente observou nos n.os 53 e 54 do acórdão recorrido, resulta claramente do artigo 11.o, n.o 2, da Diretiva 2003/87 «que apenas o Estado-Membro é competente, por um lado, para elaborar o plano nacional de atribuição através do qual se propõe atingir os objetivos definidos [por essa] diretiva relativamente às emissões de gases com efeito de estufa, [e que] notifica à Comissão, e, por outro, para tomar as decisões finais que fixam a quantidade total de licenças que atribuirá para cada período de cinco anos e a repartição dessa quantidade entre os operadores económicos». Em contrapartida, decorre de modo unívoco do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87 que o papel da Comissão se limita a uma fiscalização da conformidade do plano nacional de atribuição do Estado-Membro com os critérios enunciados no anexo III da diretiva e com as disposições do artigo 10.o desta última. Esta está habilitada a verificar essa conformidade e a rejeitar o plano nacional de atribuição, por motivo de incompatibilidade com estes critérios ou com estas disposições, por decisão fundamentada. Em caso de rejeição do seu plano pela Comissão, o Estado-Membro só pode tomar uma decisão nos termos do n.o 2 do artigo 11.o da referida diretiva se as alterações propostas tiverem sido aceites pela Comissão.

50

Ao contrário do que a Comissão defende, o Tribunal de Primeira Instância não pode ser censurado por, no n.o 51 do acórdão recorrido, se ter apoiado no artigo 249.o, terceiro parágrafo, CE, para apreciar a questão da repartição de competências entre a Comissão e os Estados-Membros, conforme prevista nos artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87. O princípio de que uma diretiva vincula qualquer Estado-Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios para a obtenção do referido resultado, aplica-se, em princípio, a qualquer diretiva.

51

É verdade que pode haver grandes diferenças quanto ao tipo de obrigações que as diretivas impõem aos Estados-Membros e quanto aos resultados que estes devem alcançar. É igualmente pacífico que as disposições das diretivas que apenas dizem respeito às relações entre um Estado-Membro e a Comissão podem não precisar de medidas de transposição (v., neste sentido, acórdão de 30 de novembro de 2006, Comissão/Luxemburgo, C-32/05, Colet., p. I-11323, n.os 35 e 36). No entanto, esta circunstância não tem influência na solução do presente litígio. Não se pode negar que os artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87 regulam os papéis respetivos da Comissão e dos Estados-Membros, no âmbito do procedimento de adoção dos planos nacionais de atribuição, a saber, a questão da repartição de competências entre estes. Estas disposições permitem determinar se os Estados-Membros gozam ou não de margem de manobra para elaborar o seu plano e, se for caso disso, qual o alcance desta.

52

No caso concreto, não se pode negar que a Diretiva 2003/87 não prescreve um método específico para a elaboração de um plano nacional de atribuição e para a determinação da quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir. Bem pelo contrário, o anexo III, n.o 1, da referida diretiva prevê expressamente, como o Tribunal de Primeira Instância observou, em substância, no n.o 81 do acórdão recorrido, que os Estados-Membros devem fixar a quantidade total de licenças a atribuir, tendo em conta, designadamente, a política energética nacional e o programa nacional em matéria de alterações climáticas.

53

Assim, como o Tribunal de Primeira Instância concluiu no n.o 53 do acórdão recorrido, os Estados-Membros dispõem de uma certa margem de manobra para escolher as medidas que consideram mais adaptadas para atingir, no contexto específico do mercado energético nacional, o resultado prescrito pela referida diretiva.

54

Quanto ao facto de, em conformidade com o artigo 9.o da Diretiva 2003/87, os planos nacionais de atribuição serem avaliados pela Comissão quando de uma fiscalização ex ante, é certo que esse poder difere, em múltiplos aspetos, da fiscalização ex post prevista no artigo 226.o CE. Esta circunstância não pode, contudo, implicar que a fiscalização ex ante deva ir mais longe do que uma fiscalização da legalidade.

55

Resulta do exposto que há que afastar as críticas formuladas pela Comissão contra as considerações gerais do Tribunal de Primeira Instância relativas à repartição de competências entre a Comissão e os Estados-Membros, conforme prevista pela Diretiva 2003/87.

Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa à inobservância do princípio da igualdade de tratamento

– Argumentos das partes

56

A Comissão sustenta que, ao determinar o sentido e o alcance do seu poder de fiscalização por força do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito que resulta, no essencial, de uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

57

A conclusão de que a Comissão violou o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, ao substituir a análise efetuada pela República da Estónia pela sua própria análise, é errada. O Tribunal de Primeira Instância interpretou esta disposição sem ter em conta o referido princípio e, além disso, cometeu um erro de direito ao apreciar a questão da escolha dos dados relativos às emissões que devem servir de ponto de partida para efeitos das previsões para o período de 2008 a 2012.

58

O Tribunal de Primeira Instância considerou, erradamente, que a Comissão não podia afastar os dados de emissões de CO2 anteriores a 2005, introduzidos pela República da Estónia no seu plano nacional de atribuição, e as previsões do produto interno bruto (PIB) utilizadas por este Estado-Membro, em vez das publicadas por todos os Estados-Membros durante 2005. Ora, aceitar que cada Estado-Membro utilize os seus próprios dados, desenvolvidos segundo os seus próprios critérios, é suscetível de gerar uma desigualdade de tratamento entre os referidos Estados.

59

O objeto e a finalidade da Diretiva 2003/87 assim como o desenvolvimento do procedimento de fiscalização dos planos nacionais de atribuição são «garantir que os planos nacionais de atribuição de todos os Estados-Membros se encontrem em situações comparáveis». Assim, a compatibilidade dos planos nacionais de atribuição com os critérios enunciados no anexo III desta diretiva devia ser examinada com base num método de avaliação elaborado pela Comissão e em dados obtidos graças a esse método. Esse exame implica a utilização, pela Comissão, dos dados relativos às emissões de CO2 do mesmo ano para todos os Estados-Membros e das previsões de crescimento do PIB durante o período de 2005-2010 disponíveis no mesmo momento para todos os Estados.

60

O desenvolvimento do procedimento de fiscalização previsto no artigo 9.o da Diretiva 2003/87 demonstra que se trata de um exercício de fiscalização simultânea, num intervalo de tempo limitado, visando permitir a execução do regime comum de comércio de licenças, em todos os Estados-Membros, antes de 1 de janeiro de 2008. Os planos nacionais de atribuição são examinados no comité das alterações climáticas, em paralelo com o seu exame pela Comissão, o que confirma a necessidade de esta utilizar uma abordagem homogénea para todos os planos.

61

O raciocínio seguido pelo Tribunal de Primeira Instância nos n.os 84 a 86 do acórdão recorrido está em contradição com o aplicado no seu despacho de 20 de outubro de 2008, BOT Elektrownia Bełchatów e o./Comissão (T-208/07). Neste, o Tribunal de Primeira Instância aceitou o enquadramento temporal das alterações que os Estados-Membros introduzem no seu plano nacional de atribuição, ao decidir que resulta da redação da Diretiva 2003/87 assim como da sistemática geral e dos objetivos do regime que a mesma estabelece que um Estado-Membro tem sempre o direito de propor alterações ao seu plano, após a respetiva notificação à Comissão, e isto até à adoção da decisão que esse Estado deve tomar em aplicação do artigo 11.o, n.o 2, da referida diretiva.

62

A República da Estónia pede que esta primeira parte do segundo fundamento seja julgada improcedente. A Comissão baseou-se no princípio da igualdade de tratamento como se se tratasse de um princípio absoluto. A possível superveniência de uma desigualdade de tratamento não pode justificar uma alteração da repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão conforme prevista pela Diretiva 2003/87. A igualdade de tratamento entre os Estados-Membros pode ser assegurada de forma adequada se a Comissão examinar cada plano com o mesmo grau de diligência.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

63

A primeira parte do segundo fundamento diz respeito aos n.os 56 a 93 do acórdão recorrido. Nos referidos números, o Tribunal de Primeira Instância constatou que o poder de fiscalização de que a Comissão dispõe por força do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87 não lhe permite substituir os dados inseridos pelo Estado-Membro no seu plano pelos seus próprios dados. Precisou que o princípio da igualdade de tratamento «não pode modificar a repartição de competências prevista por [essa] diretiva entre a Comissão e os Estados-Membros, nos termos da qual estes são competentes para elaborar um plano nacional de atribuição e para adotar uma decisão final sobre a quantidade total de licenças a atribuir».

64

Cumpre recordar desde já que, segundo jurisprudência assente, o princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (v., nomeadamente, acórdão de 16 de dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o., C-127/07, Colet., p. I-9895, n.o 23).

65

A necessidade de respeitar esse princípio não pode, contudo, alterar a repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão, conforme prevista por uma disposição da União. Ora, como foi confirmado no n.o 49 do presente acórdão, o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87 confere à Comissão unicamente um poder de fiscalização da legalidade dos planos nacionais de atribuição, que lhe permite rejeitar um plano que não esteja em conformidade com os critérios enunciados no anexo III da Diretiva 2003/87 ou com as disposições do seu artigo 10.o

66

Quanto ao grau desta fiscalização, o Tribunal de Primeira Instância considerou, com razão, nos n.os 68, 69, 75, 79 e 80 do acórdão recorrido, que os Estados-Membros continuam livres de utilizar os dados e os métodos de avaliação da sua escolha, desde que estes não conduzam a resultados que não sejam conformes a esses critérios ou a essas disposições. Ao exercer o seu poder de fiscalização nos termos do artigo 9.o, n.o 3, desta diretiva, a Comissão deve respeitar a margem de manobra de que os Estados-Membros dispõem. Assim, não pode rejeitar um plano nacional de atribuição unicamente pelo motivo de os dados inseridos neste não estarem em conformidade com os dados que privilegiou.

67

Nestas condições, não se pode censurar o Tribunal de Primeira Instância por ter considerado que a Comissão tinha a obrigação de examinar os dados inseridos pela República da Estónia no seu plano nacional de atribuição. Caso a Comissão tivesse dúvidas quanto aos referidos dados, competia-lhe pedir esclarecimentos às autoridades nacionais competentes, ou mesmo demonstrar a desconformidade desses dados com os critérios enumerados no anexo III da Diretiva 2003/87.

68

Os argumentos invocados pela Comissão relativamente à natureza simultânea da fiscalização dos planos nacionais de atribuição não são de molde a pôr em causa esta conclusão. Com efeito, esses argumentos assentam numa conceção errónea do seu poder de fiscalização, nos termos do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87. Como a advogada-geral observou no n.o 65 das conclusões, as eventuais diferenças quanto aos dados e aos métodos de avaliação seguidos pelos Estados-Membros são uma manifestação da sua margem de manobra, que a Comissão deve respeitar no âmbito da sua fiscalização de conformidade.

69

Neste contexto, importa observar, como o Tribunal de Primeira Instância declarou no n.o 89 do acórdão recorrido, que a Comissão pode assegurar a igualdade de tratamento dos Estados-Membros de forma adequada, ao examinar, com o mesmo grau de diligência, o plano apresentado por cada um deles. Há que recordar igualmente que a Comissão pode escolher um ponto comum de comparação entre os planos elaborados por cada um desses Estados. Como o Tribunal de Primeira Instância observou no n.o 63 do acórdão recorrido, para o efeito, aquela pode designadamente elaborar o «seu próprio modelo económico e ecológico», assente em dados por si escolhidos, e utilizá-lo como meio de comparação para verificar se os planos nacionais de atribuição são compatíveis com os critérios enunciados no anexo III da Diretiva 2003/87 ou com as disposições do seu artigo 10.o

70

Nestas circunstâncias, há que julgar improcedente a primeira parte do segundo fundamento.

Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa ao desrespeito do objetivo da Diretiva 2003/87

– Argumentos das partes

71

A Comissão considera que, ao interpretar o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, o Tribunal de Primeira Instância desrespeitou o objetivo prosseguido por esta última. Contesta que tenha excedido os limites do seu poder de fiscalização, nos termos do referido artigo, ao ter examinado o PNA estónio com base na sua própria metodologia, ao ter indicado uma quantidade específica de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir, cuja ultrapassagem era considerada incompatível com os critérios estabelecidos por esta diretiva e, por conseguinte, ao ter rejeitado o PNA estónio, na medida em que a quantidade total de licenças aí proposta ultrapassava esse limite.

72

Os poderes de fiscalização de que a Comissão dispõe por força desta disposição devem ser entendidos e interpretados à luz dos objetivos da Diretiva 2003/87. Ora, a referida diretiva estabelece, nos termos do seu artigo 1.o, um regime comunitário de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, a fim de promover a redução das emissões destes gases em condições que ofereçam uma boa relação de custo-eficácia e que sejam economicamente eficientes. O Tribunal de Justiça reconheceu, no seu acórdão Arcelor Atlantique et Lorraine e o., já referido, que o objetivo final desse regime é a proteção do ambiente e que o referido regime encoraja e favorece a procura dos custos mais baixos, a fim de obter uma redução dessas emissões. Resulta desse acórdão que tal objetivo só pode ser alcançado quando a procura de licenças ultrapassa a oferta no mercado de licenças comunitário. Além disso, nos termos do sétimo considerando da Diretiva 2003/87, a execução desse mesmo regime deverá contribuir para preservar a integridade do mercado interno e evitar distorções da concorrência.

73

Ao contrário do que o Tribunal de Primeira Instância decidiu no acórdão recorrido, a fiscalização efetuada pela Comissão ao abrigo do artigo 9.o da Diretiva 2003/87 não pode ser uma fiscalização «muito limitada», reduzida a uma mera verificação dos dados utilizados pelos Estados-Membros nos seus planos nacionais de atribuição. Essa fiscalização deve assentar numa abordagem homogénea, implicando a utilização pela Comissão dos dados relativos às emissões de CO2 do mesmo ano para todos os Estados-Membros e das previsões de crescimento do PIB durante o período de 2005-2010, disponíveis no mesmo momento para todos esses Estados.

74

Segundo a Comissão, os objetivos da Diretiva 2003/87 não podem ser alcançados se não dispuser do poder de fixar um nível máximo de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir. A sua posição é igualmente justificada por razões de economia processual.

75

O Tribunal de Primeira Instância considerou erradamente que os Estados-Membros dispõem de competência exclusiva para fixar a quantidade total de licenças a atribuir. É possível provar ex post que o reconhecimento incondicional dos dados de emissões de CO2 indicados no PNA estónio, relativos aos anos anteriores a 2005, bem como a quantidade total de licenças a atribuir proposta conduziriam a um resultado contrário não só aos critérios n.os 1 a 3 do anexo III da Diretiva 2003/87 mas igualmente ao objetivo desta diretiva de reduzir as emissões de CO2.

76

Além disso, o Tribunal de Primeira Instância não distinguiu corretamente a fixação, pela Comissão, de um limite para a quantidade total de licenças e a fixação da quantidade total de licenças a atribuir pelo Estado-Membro.

77

A República da Estónia considera que esta segunda parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente. A Comissão não demonstrou minimamente que seria impossível cumprir o objetivo da Diretiva 2003/87 relativamente à repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão, confirmada pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

78

A segunda parte do segundo fundamento diz respeito aos n.os 59 a 66 do acórdão recorrido. Nos referidos números, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a Comissão, ao fixar na decisão controvertida uma quantidade específica de licenças cuja ultrapassagem era considerada incompatível com os critérios estabelecidos pela Diretiva 2003/87 e ao rejeitar o PNA estónio na medida em que a quantidade total de licenças aí proposta ultrapassava esse patamar, excedeu os limites do seu poder de fiscalização nos termos dos artigos 9.°, n.os 1 e 3, e 11.°, n.o 2, desta diretiva. Na referida parte do fundamento, visa-se igualmente a conclusão a que o Tribunal de Primeira Instância chegou, segundo a qual a Comissão excedera os referidos limites, ao utilizar, aquando da apreciação do PNA estónio, os seus próprios dados e o seu próprio método. Ao fazê-lo, o Tribunal de Primeira Instância interpretou o artigo 9.o, n.o 3, da referida diretiva em violação dos objetivos prosseguidos por esta.

79

A este respeito, recorde-se que o objetivo principal declarado da Diretiva 2003/87 é reduzir substancialmente as emissões de gases com efeito de estufa, para cumprir os compromissos da União e dos Estados-Membros para com o Protocolo de Quioto. Este objetivo deve ser alcançado com observância de uma série de subobjetivos e com recurso a certos instrumentos. O instrumento principal para este efeito é constituído pelo regime comunitário de comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa, como decorre do artigo 1.o e do segundo considerando da Diretiva 2003/87. O referido artigo 1.o expõe, assim, que este regime promove a redução das referidas emissões em condições que ofereçam uma boa relação de custo-eficácia e que sejam economicamente eficientes. Os outros subobjetivos a que o referido regime deve dar resposta são, designadamente, conforme mencionado no quinto e sétimo considerandos desta diretiva, a preservação do desenvolvimento económico e do emprego, bem como da integridade do mercado interno e das condições de concorrência.

80

No caso em apreço, ainda que se admita que a abordagem preconizada pela Comissão seja suscetível de melhorar o funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa da União e permita assim atingir, de maneira mais eficaz, o objetivo de reduzir substancialmente as emissões de gases com efeito de estufa, esta circunstância não pode alterar a repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão, conforme prevista nos artigos 9.° e 11.° da Diretiva 2003/87.

81

Com efeito, num domínio de competência partilhada, como o da proteção do ambiente, cabe ao legislador da União determinar as medidas que considera necessárias para alcançar os objetivos pretendidos, no respeito dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade consagrados no artigo 5.o CE.

82

A vontade do legislador da União de conferir à Comissão unicamente um poder de fiscalização da conformidade dos planos nacionais de atribuição com os critérios enunciados no anexo III da Diretiva 2003/87 e com as disposições do artigo 10.o desta, e não um poder de substituição ou de uniformização que inclua o poder de fixar uma quantidade máxima de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir, decorre tanto do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87 como dos trabalhos preparatórios desta diretiva. Assim, considerar que a Comissão pode fixar essa quantidade máxima ultrapassaria os limites de uma interpretação teleológica desta diretiva e equivaleria a conferir a esta instituição poderes desprovidos de base jurídica.

83

Como resulta já do n.o 51 do presente acórdão, o Tribunal de Primeira Instância decidiu, pois, com razão, no n.o 54 do acórdão recorrido, que decorre de modo unívoco do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87 que o papel da Comissão está limitado à fiscalização da conformidade do plano nacional de atribuição de um Estado-Membro com os critérios enunciados no anexo III da referida diretiva e com as disposições do artigo 10.o desta. O Tribunal de Primeira Instância considerou, acertadamente, que a Comissão está habilitada a verificar essa conformidade e a rejeitar o plano nacional de atribuição por motivo de incompatibilidade com esses critérios e com essas disposições, não podendo esse Estado-Membro tomar uma decisão nos termos do artigo 11.o, n.o 2, da diretiva, a não ser que as alterações do plano que propõe tenham sido aceites por aquela instituição.

84

A este respeito, importa observar que o legislador da União, que tem competência exclusiva para introduzir alterações na Diretiva 2003/87, considerou necessário alterar o artigo 9.o através da Diretiva 2009/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, que altera a Diretiva 2003/87/CE a fim de melhorar e alargar o regime comunitário de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa (JO L 140, p. 63). Esta diretiva de alteração prevê o estabelecimento de um regime mais harmonizado, a fim de explorar melhor os benefícios do comércio de licenças de emissão, evitar distorções no mercado interno e facilitar a ligação entre os diferentes regimes de comércio de licenças de emissão.

85

A alegação da Comissão de que é possível provar ex post que o reconhecimento incondicional dos dados de emissões de CO2 e da quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, indicados no PNA estónio, conduziria a um resultado contrário aos critérios n.os 1 a 3 do anexo III da Diretiva 2003/87 baseia-se numa interpretação errónea do acórdão recorrido. Com efeito, como observou a advogada-geral no n.o 80 das suas conclusões, o Tribunal de Primeira Instância reconheceu que a Comissão pode rejeitar um plano nacional de atribuição que não seja conforme com os critérios enumerados nesse anexo ou nas disposições do artigo 10.o desta diretiva e, por conseguinte, não considerou que esta devia reconhecer incondicionalmente os dados inscritos no PNA estónio.

86

Quanto ao argumento da Comissão de que, no interesse da economia processual, importaria reconhecer-lhe o poder de fixar o nível máximo da quantidade de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir, é uma verdade incontestável que essa abordagem reduziria o risco de adoção de decisões sucessivas de rejeição de planos nacionais de atribuição por incompatibilidade com os critérios enumerados no anexo III da Diretiva 2003/87 ou com as disposições do artigo 10.o desta. Neste contexto, importa contudo sublinhar que a Comissão não excede as suas competências se, no dispositivo de uma decisão de rejeição de um plano, anunciar, sem determinar de forma vinculativa a quantidade máxima dessas licenças, que não irá rejeitar as alterações introduzidas nesse plano, desde que estejam em conformidade com as propostas e as recomendações feitas nessa decisão de rejeição. Este procedimento está em conformidade com o princípio da cooperação leal entre os Estados-Membros e a Comissão e responde igualmente a objetivos de economia processual.

87

Daqui resulta que a Comissão não tem razão quando defende que o Tribunal de Primeira Instância, com a sua interpretação do artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, violou os objetivos prosseguidos por esta. Por conseguinte, há que julgar improcedente a segunda parte do segundo fundamento.

88

Uma vez que as críticas formuladas pela Comissão contra as considerações gerais do Tribunal de Primeira Instância relativamente à repartição de competências entre os Estados-Membros e a Comissão, conforme prevista na Diretiva 2003/87, foram afastadas e que as duas partes do segundo fundamento não foram acolhidas, há que julgar improcedente este fundamento.

Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro de direito na interpretação do princípio da boa administração

Argumentos das partes

89

A Comissão acusa o Tribunal de Primeira Instância de ter cometido um erro de direito na interpretação do princípio da boa administração, quando apreciou o quarto fundamento do recurso, relativo a uma violação desse princípio.

90

Para apreciar a questão de saber se o PNA estónio era compatível com o critério n.o 3 do anexo III da Diretiva 2003/87, a saber, se uma reserva de licenças estabelecida em conformidade com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2006/780 estava incluída ou não na quantidade total de licenças a atribuir, a Comissão podia ter-se baseado, validamente, nos dados utilizados para todos os planos nacionais de atribuição dos Estados-Membros. A fundamentação do artigo 1.o, n.o 2, da decisão controvertida era, a este respeito, suficiente, pertinente e adequada. O Tribunal de Primeira Instância acusou, erradamente, a Comissão de ter baseado a fundamentação dessa decisão nos seus próprios dados, em detrimento dos da República da Estónia.

91

Devido à ambiguidade do PNA estónio quanto à inclusão de certas partes das reservas na quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir, a Comissão tinha o direito de considerar que a quantidade total proposta nesse plano era incompatível com os três critérios do anexo III da Diretiva 2003/87. No n.o 107 do acórdão recorrido, o próprio Tribunal de Primeira Instância reconheceu essa ambiguidade.

92

A República da Estónia conclui pedindo que este fundamento seja rejeitado. Os argumentos da Comissão resultam de uma leitura errónea do acórdão recorrido. Quando examinou o quarto fundamento do recurso, o Tribunal de Primeira Instância não se pronunciou sobre a questão de saber se a Comissão tinha o direito de utilizar os seus próprios dados para avaliar a tomada em consideração das reservas de licenças, mas limitou-se a verificar se esta tinha examinado, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos do caso em apreço.

Apreciação do Tribunal de Justiça

93

Este fundamento do recurso, que se refere aos n.os 99 a 112 do acórdão recorrido, tem por objeto a procedência da conclusão do Tribunal de Primeira Instância segundo a qual a Comissão violou o princípio da boa administração, ao não ter examinado de forma adequada o PNA estónio, nomeadamente os seus anexos 1 e 3, a fim de apreciar se uma reserva de licenças estabelecida em conformidade com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2006/780 tinha sido tomada em conta no cálculo da quantidade total de licenças a atribuir.

94

Ao contrário do que defende a Comissão, o Tribunal de Primeira Instância não apreciou, nesses números do acórdão recorrido, a questão de saber se ela se podia basear nos seus próprios dados para avaliar se essa reserva tinha sido tida em conta ou não. Como a República da Estónia observa com razão, o referido órgão jurisdicional limitou-se a verificar se a Comissão tinha examinado os dados apresentados por esse Estado-Membro no seu plano nacional de atribuição, com observância do princípio da boa administração.

95

Desde logo, no n.o 99 do referido acórdão, o Tribunal de Primeira Instância recordou que entre as garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos processos administrativos figura, designadamente, o princípio da boa administração, a que está associada a obrigação de a instituição competente analisar com cuidado e imparcialidade todos os elementos relevantes do caso concreto (v., designadamente, acórdão de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C-269/90, Colet., p. I-5469, n.o 14).

96

Quanto aos valores apresentados pela República da Estónia no seu plano nacional de atribuição, o Tribunal de Primeira Instância considerou em seguida, nos n.os 103 a 108 do acórdão recorrido, que estes se afiguravam coerentes e compreensíveis. Por fim, nos n.os 109 a 111 do referido acórdão, apreciou se, tendo em conta esses valores, a Comissão tinha examinado com cuidado e imparcialidade todos os elementos pertinentes do caso em apreço. Em primeiro lugar, o referido órgão jurisdicional verificou que a conclusão da Comissão de que as licenças constantes das reservas em questão não tinham sido incluídas na quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir não parecia poder ser conciliada com os elementos dos autos. Em segundo lugar, o Tribunal de Primeira Instância considerou que a Comissão devia ter explicado em que é que se tinha baseado para chegar à conclusão de que o PNA estónio não estava em conformidade com o critério n.o 3 do anexo III da Diretiva 2003/87. Daí deduziu que a Comissão não tinha provado em que medida os cálculos contidos nesse plano continham erros.

97

Quanto à alegação da Comissão de que o próprio Tribunal de Primeira Instância tinha reconhecido que o PNA estónio era ambíguo, é verdade que, no n.o 107 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância constatou que esse plano se afigurava ambíguo quanto à não inclusão de uma parte das reservas na quantidade total de licenças, na medida em que as razões pelas quais a República da Estónia considerou que havia lugar a deduzir essa parte das reservas da quantidade total de licenças não resultavam dos anexos desse plano.

98

Contudo, este único elemento não implica que o PNA estónio podia ser considerado incompatível com os critérios enumerados no anexo III da Diretiva 2003/87. Com efeito, a presença de um elemento ambíguo num plano nacional de atribuição não pode, por si só, conduzir à rejeição desse plano.

99

Por força tanto do artigo 9.o, n.o 3, desta diretiva como do princípio da cooperação leal entre a Comissão e os Estados-Membros e do princípio da boa administração, compete a esta instituição tomar as medidas necessárias para determinar se esse elemento ambíguo é contrário ou conforme aos critérios enumerados no referido anexo. Neste contexto, a Comissão deve apreciar todas as informações contidas no plano nacional de atribuição que examina e, se for caso disso, pedir esclarecimentos às autoridades nacionais competentes.

100

Consequentemente, este fundamento baseia-se numa leitura errada do acórdão recorrido e deve, portanto, ser rejeitado.

Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro de direito na análise do caráter não autonomizável dos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida

Argumentos das partes

101

A Comissão censura o Tribunal de Primeira Instância por ter considerado que os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida não eram autonomizáveis das outras disposições da decisão controvertida e por, consequentemente, ter anulado esta decisão na totalidade.

102

O acórdão recorrido assenta numa errada compreensão do caráter autonomizável das disposições dos atos da União, bem como numa interpretação errónea da jurisprudência, referida pelo Tribunal de Primeira Instância no n.o 28 do acórdão recorrido, e da decisão controvertida. Segundo a Comissão, é jurisprudência constante que a exigência da possibilidade de autonomização não é cumprida quando a anulação parcial de um ato tem por efeito alterar a substância deste. Todavia, não é o que acontece com qualquer alteração do conteúdo do ato. Com efeito, alterar a substância de um ato implica a transformação deste num ato que o seu autor não teve a intenção de adotar ou não teria adotado.

103

Os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida diziam respeito à quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir (critérios n.os 1 a 3 do anexo III da Diretiva 2003/87). Estes artigos estão, de facto, relacionados entre si, mas são autonomizáveis das outras disposições da referida decisão. Os artigos 1.°, n.o 3, e 2.°, n.o 3, dessa mesma decisão referem-se a uma atribuição excessiva dessas licenças a certas empresas (critério n.o 5 desse anexo), ao passo que os artigos 1.°, n.o 4, e 2.°, n.o 4, desta se referem à falta de informações suficientes sobre os novos operadores (critério n.o 6 desse anexo).

104

O raciocínio do Tribunal de Primeira Instância assenta, por um lado, na conclusão da existência de um paralelismo entre os números dos artigos 1.° e 2.° da decisão controvertida, conclusão partilhada pela Comissão, e, por outro, numa interpretação errónea do alcance do artigo 2.o desta última. O alcance desta última disposição devia ser apreciado à luz do artigo 1.o, e não o inverso.

105

O artigo 1.o da decisão controvertida contém a lista dos elementos do PNA estónio que a Comissão considera contrários aos critérios enumerados no anexo III da Diretiva 2003/87. O artigo 2.o desta decisão inclui uma série de sugestões para suprir cada uma das incompatibilidades declaradas no referido artigo 1.o As incompatibilidades descritas nos n.os 1 e 2 destes dois artigos são diferentes e independentes das declaradas nos n.os 3 e 4 destes. Estes números, ou pelo menos estes dois grupos de números, são, pois, dissociáveis.

106

Resulta claramente da estrutura e da fundamentação da decisão controvertida que cada número do artigo 2.o desta tem um laço indissociável com o número correspondente do seu artigo 1.o, e não com as outras disposições do próprio artigo 2.o Esta mesma conclusão também é válida para as disposições do artigo 1.o

107

Embora a Comissão se tenha comprometido a não suscitar objeções no seu exame de outro plano nacional de atribuição que incorpora todas as sugestões que figuram no artigo 2.o da decisão controvertida, estas sugestões não formam um conjunto indissociável. Se se decidir que uma ou várias das incompatibilidades descritas no artigo 1.o dessa decisão não devem ser consideradas como tal, as sugestões correspondentes no artigo 2.o já não terão razão de ser. Todavia, as outras disposições deste último artigo são sempre suscetíveis de ser aplicadas.

108

Nestas condições, a anulação dos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida não podia, segundo a Comissão, alterar a substância da referida decisão. De resto, estas diferentes disposições também poderão ser vistas como constituindo várias decisões reunidas num único ato normativo.

109

A República da Estónia pede ao Tribunal de Justiça que julgue este fundamento improcedente. Há um laço indissociável entre, por um lado, os critérios n.os 1 a 3 do anexo III da Diretiva 2003/87, relativos à quantidade que pode ser determinada a título de quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, e, por outro, os critérios n.os 5 e 6 do referido anexo. Essa quantidade total e a maneira como o PNA estónio é alterado em função destes últimos critérios estão interligadas. A redução substancial, por parte da Comissão, da referida quantidade, por força dos artigos 1.° e 2.°, n.o 1, da decisão controvertida, tem influência tanto no tratamento favorável concedido a certas empresas para as medidas adotadas numa fase precoce (critério n.o 5 do anexo III dessa diretiva) como nas referidas licenças para os novos operadores (critério n.o 6 deste anexo).

Apreciação do Tribunal de Justiça

110

O quarto fundamento do recurso visa os n.os 31 a 34 e 114 do acórdão recorrido, que têm por objeto a questão de saber se os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida são autonomizáveis ou não do resto dessa decisão e se, por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância tinha razão quando anulou essa decisão na totalidade.

111

Como o Tribunal de Primeira Instância recordou no n.o 28 do acórdão recorrido, a anulação parcial de um ato da União só é possível se os elementos cuja anulação é pedida forem destacáveis do resto do ato (v., designadamente, acórdãos de 10 de dezembro de 2002, Comissão/Conselho, C-29/99, Colet., p. I-11221, n.o 45, e de 24 de maio de 2005, França/Parlamento e Conselho, C-244/03, Colet., p. I-4021, n.o 12; v., neste sentido, acórdão de 21 de janeiro de 2003, Comissão/Parlamento e Conselho, C-378/00, Colet., p. I-937, n.o 30). De igual modo, o Tribunal de Justiça decidiu reiteradamente que esta exigência de possibilidade de autonomização não será cumprida se a anulação parcial de um ato tiver por efeito alterar a substância deste (acórdão de 31 de março de 1998, França e o./Comissão, C-68/94 e C-30/95, Colet., p. I-1375, n.o 257; e acórdãos, já referidos, Comissão/Conselho, n.o 46, e França/Parlamento e Conselho, n.o 13).

112

No caso em apreço, a verificação da possibilidade de autonomização dos artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida do resto desta decisão pressupõe o exame do alcance das referidas disposições, a fim de se poder avaliar se a sua anulação modificaria o espírito e a substância da referida decisão (v., neste sentido, acórdão de 27 de junho de 2006, Parlamento/Conselho, C-540/03, Colet., p. I-5769, n.o 29).

113

Importa recordar que as disposições da decisão controvertida são o resultado de uma apreciação negativa, feita pela Comissão, do PNA estónio, conforme notificado pela República da Estónia. O artigo 1.o da referida decisão enumera diferentes incompatibilidades desse plano com um ou vários dos critérios enunciados no anexo III da Diretiva 2003/87. O artigo 2.o desta decisão contém o compromisso da Comissão de não suscitar objeções ao plano a adotar na sequência dessa decisão de rejeição, desde que o Estado-Membro em causa introduza as alterações enumeradas nos n.os 1 a 4 do referido artigo. Quanto ao artigo 3.o da decisão controvertida, o seu n.o 1 regula a fixação de uma reserva de licenças e os seus n.os 2 e 3 contêm precisões relativas à execução das outras disposições da referida decisão.

114

No que diz respeito, mais especificamente, à relação entre, por um lado, os artigos 1.°, n.o 1, 2.°, n.o 1, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida e, por outro, as demais disposições desta, é forçoso concluir que essas disposições, embora façam referência a diferentes aspetos do PNA estónio e a diferentes critérios enumerados no anexo III da Diretiva 2003/87, formam uma unidade indissociável.

115

Por um lado, não se pode negar que a fixação da quantidade total de licenças de emissão de gases com efeito de estufa a atribuir (critérios n.os 1 a 3 do anexo III da Diretiva 2003/87), referida nos artigos 1.°, n.o 1, 2.°, n.o 1, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida, constitui o elemento principal dos planos nacionais de atribuição e está estreitamente ligada aos outros elementos desses planos.

116

Por outro lado, como o Tribunal de Primeira Instância concluiu com razão, respetivamente, nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, a eventual anulação de apenas uma parte dos números do artigo 1.o da decisão controvertida «teria por consequência reduzir o número de incompatibilidades com a [D]iretiva [2003/87] declaradas pela Comissão». A anulação de certos números do artigo 2.o desta decisão «teria por consequência que o compromisso de a Comissão não levantar objeções em relação ao plano nacional permaneceria válido, reduzindo, contudo, o número de alterações sob reserva das quais este compromisso foi inicialmente assumido».

117

Ora, nada na referida decisão permite supor que o PNA estónio podia ter sido considerado compatível com a Diretiva 2003/87 sem que todas as alterações enumeradas nesta última disposição tivessem sido introduzidas.

118

Com efeito, como o Tribunal de Primeira Instância observou com razão no n.o 32 do acórdão recorrido, a anulação de apenas uma parte dos números do artigo 2.o«substituiria a decisão [controvertida], segundo a qual o [PNA estónio] pode ser adotado sob reserva de quatro alterações específicas que permitem corrigir quatro incompatibilidades com os critérios do anexo III [da Diretiva 2003/87], por uma decisão diferente nos termos da qual este plano poderia ser adotado sob reserva de um número menos importante de modificações».

119

Face a estes elementos, verifica-se que foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância, no n.o 31 do acórdão recorrido, concluiu que a anulação de um dos números do artigo 1.o da decisão controvertida, bem como do número correspondente do artigo 2.o desta decisão, teria por efeito alterar a substância desta.

120

Quanto ao artigo 3.o, n.os 2 e 3, da decisão controvertida, basta observar que estas disposições contêm precisões relativas à aplicação de outras disposições da decisão controvertida. Assim, na medida em que os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida são anulados, o artigo 3.o, n.os 2 e 3, desta já não tem objeto.

121

Estas conclusões não podem ser infirmadas pela alegação da Comissão de que alterar a substância de um ato da União significa unicamente a transformação deste num ato que o seu autor não tencionava adotar ou não teria adotado. A este respeito, basta referir que a questão de saber se uma anulação parcial altera a substância do ato da União constitui um critério objetivo, e não um critério subjetivo, ligado à vontade política da autoridade que adotou o ato controvertido (v. acórdão de 30 de setembro de 2003, Alemanha/Comissão, C-239/01, Colet., p. I-10333, n.o 37, e acórdão França/Parlamento e Conselho, já referido, n.o 14).

122

Resulta do exposto que o Tribunal de Primeira Instância não cometeu um erro de direito no seu acórdão, ao decidir que os artigos 1.°, n.os 1 e 2, 2.°, n.os 1 e 2, e 3.°, n.o 1, da decisão controvertida não são autonomizáveis das demais disposições desta decisão e ao anular, por conseguinte, a referida decisão na íntegra. O quarto fundamento é, por isso, improcedente.

123

Uma vez que não foi acolhido nenhum dos fundamentos invocados pela Comissão, há que negar provimento ao recurso.

Quanto às despesas

124

Por força do disposto no artigo 69.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 118.o do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida e a República da Estónia pedido a sua condenação, há que a condenar nas despesas.

125

Em conformidade com o n.o 4, primeiro parágrafo, do referido artigo 69.o, a República Checa, o Reino da Dinamarca e a República da Letónia, que intervieram no processo, suportam as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

 

3)

A República Checa, o Reino da Dinamarca e a República da Letónia suportam as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: estónio.

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