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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62005CJ0417

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 14 de Septembro de 2006.
    Comissão das Comunidades Europeias contra Maria Dolores Fernández Gómez.
    Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Agente temporário - Artigo 2.º, alínea a), do ROA - Período cumprido na Comissão na qualidade de perito nacional destacado - Pedido de anulação - Admissibilidade - Requerimento nos termos do artigo 90.º, n.º 1, do Estatuto - Conceito - Acto que causa prejuízo.
    Processo C-417/05 P.

    Colectânea de Jurisprudência – Função Pública 2006 II-B-2-00091
    Colectânea de Jurisprudência 2006 I-08481;FP-I-B-2-00013

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2006:582

    Processo C‑417/05 P

    Comissão das Comunidades Europeias

    contra

    Maria Dolores Fernández Gómez

    «Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Agente temporário – Artigo 2.°, alínea a), do ROA – Período cumprido na Comissão na qualidade de perito nacional destacado – Pedido de anulação – Admissibilidade – Requerimento nos termos do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto – Conceito – Acto que causa prejuízo»

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 14 de Setembro de 2006 

    Sumário do acórdão

    1.     Funcionários – Recurso – Requerimento nos termos do artigo 90°, n.° 1, do Estatuto – Conceito

    (Estatuto dos Funcionários, artigo 90.°, n.° 1)

    2.     Funcionários – Recurso – Acto que causa prejuízo – Conceito

    (Estatuto dos Funcionários, artigo 90.°, n.° 2)

    1.     O pedido de renovação do contrato de um agente temporário, apresentado pelo chefe da unidade na qual aquele trabalha não constitui um pedido por parte desse agente temporário na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto. Resulta, com efeito, dos termos claros desta disposição que só as pessoas a que se refere esse Estatuto podem submeter esse requerimento. Uma nota dirigida por um serviço da Comissão a outro não entra, portanto, no quadro definido por essa disposição e não pode ser considerada um requerimento desse tipo, sob pena de se permitir que o processo estabelecido por essa disposição seja contornado.

    Um correio electrónico desse agente temporário enviado ao serviço competente solicitando determinadas informações relativamente ao seu contrato, mas sem requerer a esse serviço que tomasse uma decisão a seu respeito, também não constitui um requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto.

    (cf. n.os 37‑39)

    2.     Só causam prejuízo na acepção do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto os actos ou as medidas que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar directa e imediatamente os interesses do recorrente alterando, de modo caracterizado, a sua situação jurídica.

    Não é manifestamente esse o caso de um correio electrónico do serviço competente informando o chefe de unidade de um agente temporário da impossibilidade de renovação do seu contrato e que não contém qualquer elemento novo relativamente às estipulações do contrato, que constitui a única fonte de efeitos jurídicos para as pessoas a quem o Estatuto se refere. Uma comunicação deste tipo constitui um acto puramente confirmativo do contrato e não pode, por isso, ter por efeito dar início a um novo prazo de recurso.

    (cf. n.os 42‑46)




    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    14 de Setembro de 2006 (*)

    «Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Agente temporário – Artigo 2.°, alínea a), do ROA – Período cumprido na Comissão na qualidade de perito nacional destacado – Pedido de anulação – Admissibilidade – Requerimento nos termos do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto – Conceito – Acto que causa prejuízo»

    No processo C‑417/05 P,

    que tem por objecto um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 24 de Novembro de 2005,

    Comissão das Comunidades Europeias, representada por D. Martin e L. Lozano Palacios, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    recorrente,

    sendo a outra parte no processo:

    Maria Dolores Fernández Gómez, representada por J. R. Iturriagagoitia, abogado,

    recorrida em primeira instância,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, R. Schintgen, P. Kūris, G. Arestis (relator) e J. Klučka, juízes,

    advogado‑geral: L. A. Geelhoed,

    secretário: M. Ferreira, administradora principal,

    vistos os autos e após a audiência de 17 de Maio de 2006,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1       Com o seu recurso, a Comissão das Comunidades Europeias pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 13 de Setembro de 2005, Fernández Gómez/Comissão (T‑272/03, ainda não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão recorrido»), que, por um lado, anulou a decisão da autoridade habilitada a celebrar contratos de admissão de 12 de Maio de 2003 que indeferia o pedido de renovação do contrato de M. D. Fernández Gómez (a seguir «decisão controvertida») e, por outro, condenou a Comissão a pagar‑lhe o montante de 50 000 euros a título de reparação pelo prejuízo sofrido devido a essa decisão e a suportar as despesas.

     Quadro jurídico, factos na origem do litígio e processo no Tribunal de Primeira Instância

    2       Os artigos 2.° e 3.° do Regulamento (CEE, Euratom, CECA) n.° 259/68 do Conselho, de 29 de Fevereiro de 1968, que fixa o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias, assim como o Regime aplicável aos outros agentes destas Comunidades, e institui medidas especiais temporariamente aplicáveis aos funcionários da Comissão (JO L 56, p. 1; EE 01 F1 p. 129), tal como vigoraram até 30 de Abril de 2004, definem, respectivamente, o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto») e o Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (a seguir «ROA»).

    3       Nos termos do artigo 2.°, alínea a), do ROA, considera‑se agente temporário «[o] agente admitido a ocupar um lugar pertencente ao quadro de efectivos anexo à secção do orçamento correspondente a cada instituição e ao qual as autoridades orçamentais conferiram carácter temporário».

    4       O artigo 8.° do ROA precisa, nomeadamente, que os agentes temporários a que se aplica o já referido artigo 2.°, alínea a) podem ser contratados por tempo determinado ou indeterminado e que os contratos destes agentes contratados por tempo determinado só podem ser prorrogados uma vez, por um período também determinado.

    5       Em 18 de Outubro de 1994, a Comissão adoptou um código de boa conduta relativo às disposições gerais que regulam as relações entre os serviços da Comissão e certas categorias do pessoal (a seguir «código de boa conduta»).

    6       As várias categorias do pessoal referidas neste código são o «pessoal não estatutário» e «certas categorias específicas [de pessoal]». Nos termos do ponto I B do referido código, importa entender por «certas categorias específicas [de pessoal]» «certos recursos previstos no Estatuto, no ROA ou no direito público». Estas últimas expressões referem‑se aos auxiliares, aos peritos nacionais destacados (a seguir «PND»), aos funcionários ou agentes em licença sem vencimento ou que trabalham a tempo parcial, aos antigos funcionários e agentes temporários e aos «outros agentes das Comunidades».

    7       Em 13 de Novembro de 1996, a Comissão adoptou a decisão intitulada «Política dos agentes temporários do artigo 2.°, alínea a) do Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (RAA)» (a seguir «decisão da Comissão de 13 de Novembro de 1996»). Esta decisão adopta, a título de novas orientações, «disposições operacionais» relativas ao recrutamento e selecção dos agentes temporários do artigo 2.°, alínea a), do ROA, à duração dos seus contratos, à limitação da sua acumulação temporal com outras posições administrativas ou contratos com a Comissão e aos concursos internos e externos susceptíveis de lhes interessar.

    8       O ponto 6, alíneas b) e c), desta decisão define a duração dos contratos e as modalidades da regra de não acumulação aplicável aos agentes temporários do artigo 2, alínea a), do ROA a quem tenha sido proposto um contrato a partir de 1 de Dezembro de 1996 (a seguir «regra da não acumulação»). O ponto 6, alínea c), precisa nomeadamente o seguinte:

    «A duração total da presença de pessoal não funcionário na Comissão não deverá exceder um total de 6 anos. Para o cálculo destes 6 anos, serão tidos em conta os períodos passados como agente temporário do artigo 2.°, alíneas a) ou b), agente auxiliar e pessoal não estatutário. […] Serão dirigidas recomendações às direcções‑gerais para lhes permitir aplicar esta limitação de acumulação nas suas propostas de recrutamento.»

    9       Em 14 de Novembro de 1996, o director‑geral da Direcção‑Geral (DG) IX «Pessoal e Administração» (a seguir «DG IX») enviou um folheto informativo ao pessoal relativo à «nova política dos agentes temporários do artigo 2.°, alínea a) do ROA». Quanto, em especial, à regra de não acumulação que limita a duração total do exercício do pessoal não permanente a um máximo de seis anos, este folheto explica que, para o cálculo desta duração máxima, importa, nomeadamente, ter em conta «os períodos passados […] como PND ou qualquer outro pessoal não estatutário» na Comissão.

    10     M. D. Fernández Gómez trabalhou na Comissão na qualidade de PND durante três anos, de 1 de Dezembro de 1997 a 30 de Novembro de 2000. Foi depois contratada, como agente auxiliar, por dois meses e meio, de 1 de Dezembro de 2000 a 15 de Fevereiro de 2001.

    11     Em seguida, candidatou‑se a um lugar publicado no aviso de vaga 13T/TRADE/2000 destinado a prover quatro lugares temporários na Direcção Geral «Comércio». Quanto à duração do contrato, o aviso indicava:

    «[A]quando da nomeação de um candidato [...], a Comissão deverá aplicar as regras contidas na sua decisão de 13 de Novembro de 1996 destinadas a limitar a duração dos contratos celebrados nos termos do artigo 2.°, alínea a), do [ROA] a um período máximo de três anos, com uma única possibilidade de renovação por um período máximo de um ano.»

    12     Tendo sido aceite a sua candidatura, M. D. Fernández Gómez celebrou com a Comissão um contrato de agente temporário na acepção do artigo 2.°, alínea a), do ROA. Esse contrato, datado de 17 de Janeiro de 2001, começou a produzir efeitos em 16 de Fevereiro do mesmo ano. Segundo o artigo 4.° do referido contrato, a sua duração era fixada em dois anos e nove meses e meio, pelo que deveria terminar em 30 de Novembro de 2003.

    13     Este contrato foi comunicado à recorrida por ofício de 19 de Janeiro de 2001 em que o serviço competente da Comissão chamava a sua atenção para o facto de «o contrato [ter sido] celebrado por um período determinado de dois anos e nove meses e meio e não [poder] ser renovado nos termos da decisão da Comissão de 13 de Novembro de 1996 que fixa a duração máxima dos diferentes tipos de contratos».

    14     Em 13 de Fevereiro de 2003, M. D. Fernández Gómez enviou um correio electrónico a um agente da DG IX, o Sr. Daum. Este correio electrónico, intitulado «Questões relativas ao destacamento dos PND», estava formulado da seguinte forma:

    «[…] agradecia que me fornecesse as seguintes informações:

    –       a ‘regra da não acumulação’ (decisão da Comissão de 13 de Novembro de 1996) é aplicável aos destacamentos de PND que tiveram início e terminaram antes de 5 de Janeiro de 2002? Em caso afirmativo,

    –       desde que data é aplicável, e

    –       por que razão tal limitação não consta na decisão da Comissão de 9 de Fevereiro de 2001 (que regula as condições de emprego dos PND) e os períodos de destacamento dos PND não são mencionados na decisão de 13 de Novembro de 1996?

    […]»

    15     Por nota de 3 de Abril de 2003 dirigida à DG IX, o chefe da unidade em que trabalhava M. D. Fernández Gómez pediu, nomeadamente, a prorrogação do seu contrato de agente temporário por forma a atingir uma duração total de quatro anos, que considerava a sua duração máxima. Este pedido de prorrogação expunha, além disso, as razões pelas quais a manutenção da pessoa em causa na unidade era «muito desejada». Por outro lado, a referida nota indicava que a decisão da Comissão de 13 de Novembro de 1996 não previa que o período de destacamento na qualidade de PND fosse tido em consideração para o cálculo do período de seis anos previsto pela regra de não acumulação. Essa mesma nota indicava também que os PND não eram considerados «pessoal não estatutário» no código de boa conduta.

    16     Em 12 de Maio de 2003, um agente da DG IX enviou um correio electrónico a um agente da unidade de que M. D. Fernández Gómez fazia parte. Este correio electrónico estava formulado como segue:

    «[F]oi‑me pedido que respondesse [à] mensagem relativa às prorrogações solicitadas pela V. nota de 3 de Abril de 2003 para dois [agentes temporários] do artigo 2.°, alínea a), M. D. Fernández Gómez e [...].

    M. D. Fernández Gómez contactou directamente o Sr. Daum quanto à questão do período PND contabilizado na regra de não acumulação; este último respondeu‑lhe que era prática constante contabilizar este período PND como período ‘pessoal não estatutário’ [...]

    Confirmo, consequentemente, que para estes dois agentes temporários, tal como para todos os outros na mesma situação, não está previsto neutralizar o período passado como PND nem rever o termo do seu contrato.

    […]»

    17     Este correio electrónico foi enviado em 18 de Junho de 2003 a M. D. Fernández Gómez.

    18     Em 11 de Julho de 2003, esta apresentou uma reclamação com base no artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto, que foi indeferida por decisão da Comissão de 29 de Outubro de 2003.

    19     Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Agosto de 2003, M. D. Fernández Gómez tinha entretanto interposto um recurso destinado, por um lado, à anulação da decisão controvertida e, por outro, à condenação da Comissão no pagamento do montante de 101 328,60 euros, acrescido de juros de mora, como reparação do prejuízo sofrido.

    20     Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância no mesmo dia, M. D. Fernández Gómez apresentou também um pedido destinado, nomeadamente, a obter a suspensão da execução da decisão controvertida.

    21     Por despacho de 16 de Setembro de 2003, Fernández Gómez/Comissão (T‑272/03 R, ColectFP, pp. I‑A‑197 e II‑979), o presidente do Tribunal de Primeira Instância indeferiu este pedido e reservou para final a decisão quanto às despesas.

    22     Por requerimento separado apresentado em 29 de Janeiro de 2004, a Comissão suscitou uma questão prévia de admissibilidade nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

    23     Por despacho de 30 de Março de 2004, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que a questão prévia de admissibilidade seria apreciada com o mérito da causa.

    24     Através do acórdão recorrido, após ter declarado o recurso admissível, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão controvertida e condenou a Comissão a pagar a M. D. Fernández Gómez o montante de 50 000 euros como reparação do prejuízo sofrido.

     Pedidos das partes

    25     No seu recurso, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

    –       anular o acórdão recorrido;

    –       decidindo o litígio, julgar procedentes os seus pedidos apresentados no Tribunal de Primeira Instância e negar provimento ao recurso;

    –       a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância;

    –       condenar M. D. Fernández Gómez nas despesas do processo, incluídas as do processo no Tribunal de Primeira Instância.

    26     A recorrida conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

    –       negar provimento ao recurso, na totalidade;

    –       condenar a Comissão nas despesas relativas ao recurso no Tribunal de Primeira Instância e ao recurso no Tribunal de Justiça.

    27     Por carta entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 23 de Fevereiro de 2006, a Comissão pediu, ao abrigo do artigo 117.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, autorização para apresentar réplica. Por decisão de 8 de Março de 2006, o presidente do Tribunal indeferiu este pedido.

     Quanto ao recurso

    28     A Comissão apresenta três fundamentos de recurso. O primeiro diz respeito a um erro de direito que o Tribunal de Primeira Instância cometeu ao considerar admissível o recurso da decisão controvertida. O segundo fundamento diz respeito a um erro de direito relativo ao artigo 8.° do ROA e à regra de não acumulação. O terceiro fundamento diz respeito a um erro de direito relativo à determinação e avaliação do prejuízo alegadamente sofrido pela então recorrente, ora recorrida.

     Quanto ao primeiro fundamento

    29     O Tribunal de Primeira Instância declarou, antes de mais, no n.° 37 do acórdão recorrido que a decisão controvertida, a saber, o correio electrónico de 12 de Maio de 2003, contém a resposta dada pela administração ao pedido de prorrogação do contrato de M. D. Fernández Gómez apresentado pelo seu chefe de unidade de 3 de Abril de 2003.

    30     Segundo o n.° 38 do mesmo acórdão, a decisão controvertida indefere este pedido uma vez que o período de três anos que a recorrida passou ao serviço da Comissão na qualidade de PND deve ser contabilizado para a aplicação da regra de não acumulação, juntando‑se esse período aos outros, por um lado, de dois meses e meio que aí passou como agente auxiliar e, por outro, de dois anos e nove meses e meio que aí passou como agente temporária, o que corresponde, no total, ao período máximo de seis anos de presença na Instituição previsto pela regra de não acumulação.

    31     Depois, em resposta ao fundamento de inadmissibilidade suscitado pela Comissão, segundo o qual a decisão controvertida apenas confirma o conteúdo do contrato de agente temporário da ora recorrida, o Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 43 do acórdão recorrido, que a comparação da decisão controvertida com o contrato e o ofício de 19 de Janeiro de 2001 que o comunicava permite concluir que a referida decisão contém um elemento novo, já que indefere o pedido de renovação do referido contrato por o período passado ao serviço da Comissão na qualidade de PND dever ser tido em conta para a aplicação da regra de não acumulação, enquanto os actos anteriores só tomavam posição sobre a questão da duração do contrato, sem se pronunciarem sobre a sua eventual prorrogação quando chegasse ao seu termo, reenviando, quanto a este ponto, para as regras aplicáveis.

    32     Após ter considerando, consequentemente, no n.° 44 do acórdão recorrido, que a decisão controvertida não é um acto confirmativo de uma decisão anterior, mas um acto que causa prejuízo à recorrida, o Tribunal de Primeira Instância entendeu, por último, nos n.os  45 e 46 do mesmo acórdão, que os prazos estatutários tinham sido respeitados, para concluir, no n.° 47 do referido acórdão, que o recurso era admissível na íntegra.

    33     A Comissão defende que o Tribunal de Primeira Instância, ao agir assim, cometeu vários erros de direito. A este propósito afirma, nomeadamente, que a ora recorrida não formulou um requerimento, na acepção do Estatuto, relativo à renovação do seu contrato de agente temporário, pelo que o recurso, apenas por esta razão, já seria inadmissível. A Comissão acrescenta que, de qualquer modo, a decisão controvertida, sendo um simples folheto informativo sem carácter decisório, não constitui um acto que causa prejuízo.

    34     Importa recordar os termos do artigo 90.°, n.os 1 e 2, do Estatuto, segundo os quais:

    «1.      Qualquer pessoa referida neste Estatuto pode submeter um requerimento à [autoridade investida do poder de nomeação, a seguir ‘AIPN’], convidando‑a a tomar uma decisão a seu respeito. A entidade comunica ao interessado a sua decisão fundamentada num prazo de quatro meses a partir do dia da introdução do requerimento. Ao terminar este prazo, a falta de resposta ao requerimento vale como decisão implícita de indeferimento, susceptível de ser objecto de uma reclamação nos termos n.° 2.

    2.      Qualquer pessoa referida neste Estatuto pode apresentar à [autoridade investida do poder de nomeação] uma reclamação contra um acto que lhe cause prejuízo, quer porque a dita autoridade haja tomado uma decisão, quer porque se haja abstido de tomar uma medida imposta pelo Estatuto. […]

    […]»

    35     Há que observar que resulta do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto que só as pessoas nele referidas podem submeter requerimentos à AIPN.

    36     Enquanto agente temporária, a ora recorrida faz parte das pessoas referidas no artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto e pode, portanto, a esse título, apresentar o requerimento previsto nesta disposição. Importa, pois, examinar se ela apresentou efectivamente esse requerimento.

    37     Como resulta do processo submetido ao Tribunal de Justiça, a ora recorrida contactou a DG IX por correio electrónico de 13 de Fevereiro de 2003, referido no n.° 14 do presente acórdão, relativamente ao seu contrato. Sem insistir especialmente no facto de esse correio constituir um requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, a recorrida alega que o pedido de renovação do seu contrato foi apresentado, na sequência das suas diligências pessoais, pelo chefe da unidade em que ela trabalhava.

    38     É certo que, por nota de 3 de Abril de 2003, o referido chefe de unidade pediu a renovação do contrato da recorrida. No entanto, resulta dos termos claros do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, reproduzidos no n.° 34 do presente acórdão, que só as pessoas a que se refere esse Estatuto podem submeter esse requerimento. Uma nota dirigida por um serviço da Comissão a outro não entra, portanto, no quadro definido por essa disposição. Afigura‑se, além disso, que tal nota não pode ser considerada um requerimento desse tipo, sob pena de se permitir que o processo estabelecido por essa disposição seja contornado.

    39     Por outro lado, resulta também do correio electrónico de 13 de Fevereiro de 2003, já referido, que a recorrida não convidou a AIPN a tomar uma decisão a seu respeito. Com efeito, com este correio, intitulado «Questões relativas ao destacamento do PND», a recorrida limitou‑se a pedir informações sobre a aplicação, no seu caso, da regra de não acumulação.

    40     De onde resulta que a recorrida não formulou qualquer requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto.

    41     Nestas condições, importa ainda examinar se, na falta de tal requerimento, a decisão controvertida constitui um acto que causa prejuízo, sendo certo que a recorrida, de qualquer modo, apresentou, contra este acto, uma reclamação na acepção do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto.

    42     A este respeito, há que assinalar que só causam prejuízo os actos ou as medidas que produzem efeitos jurídicos obrigatórios susceptíveis de afectar directa e imediatamente os interesses do recorrente, alterando de modo caracterizado, a sua situação jurídica.

    43     Importa referir, à partida, que o correio electrónico da DG IX de 12 de Maio de 2003 não constitui, manifestamente, um tal acto.

    44     Efectivamente, admitindo que o correio electrónico em questão contém uma decisão, segundo a jurisprudência, só o contrato de trabalho é fonte de efeitos jurídicos para as pessoas referidas no Estatuto (v., neste sentido, acórdão de 9 de Julho de 1987, Castagnoli/Comissão, 329/85, Colect., p. 3281, n.os 10 e 11, e despacho de 4 de Maio de 1988, Contini/Comissão, 95/87, Colect., p. 2537, n.° 8). Ora, é pacífico que a recorrida nunca contestou as cláusulas do seu contrato, tal como explicitadas no ofício que o acompanhava, de 19 de Janeiro de 2001, nos prazos estatutários.

    45     Além disso, quanto ao correio de 12 de Maio de 2003, há que observar que não contém, relativamente às referidas cláusulas, qualquer elemento novo no que respeita à questão da data em que o contrato da recorrida chega ao seu termo e à questão da renovação do referido contrato.

    46     Ora, um acto que não contém qualquer elemento novo relativamente a um acto anterior constitui um acto puramente confirmativo deste e não pode, por isso, ter por efeito dar início a um novo prazo de recurso (v. acórdão de 10 de Dezembro de 1980, Grasselli/Comissão, 23/80, Recueil, p. 3709, n.° 18).

    47     Importa, portanto, declarar que, ao considerar, no n.° 37 do acórdão recorrido, que a decisão controvertida contém a resposta dada pela administração ao pedido de prorrogação do contrato de M. D. Fernández Gómez apresentado pelo seu chefe de unidade em 3 de Abril de 2003 e, depois, no n.°  44 do referido acórdão, que a decisão controvertida constitui um acto que causa prejuízo, para concluir, no n.° 47 do mesmo, que o recurso da recorrida é admissível, o Tribunal de Primeira Instância violou os artigos 90.° e 91.° do Estatuto.

    48     Assim, há que acolher o primeiro fundamento do presente recurso e anular o acórdão recorrido, sem que seja necessário decidir quanto aos outros fundamentos invocados pela Comissão. Consequentemente, há também que anular o acórdão recorrido na medida em que condenou a Comissão a reparar o prejuízo alegadamente sofrido por M. D. Fernández Gómez devido à adopção da decisão controvertida.

     Quanto ao recurso no Tribunal de Primeira Instância

    49     Em conformidade com o artigo 61.°, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça, este pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal de Primeira Instância, julgar definitivamente o litígio se o mesmo estiver em condições de ser julgado. É o que acontece no caso em apreço.

    50     Resulta dos n.os 43 a 47, supra, que a questão de admissibilidade suscitada no Tribunal de Primeira Instância pela Comissão deve ser acolhida. Consequentemente, há que julgar o recurso de M. D. Fernández Gómez inadmissível, na medida em que se destina à anulação da decisão controvertida.

    51     A este respeito, importa precisar que a inadmissibilidade do pedido de anulação de um acto implica a do pedido de indemnização quando, como é aqui manifestamente o caso, existir uma ligação estreita entre os dois pedidos.

    52     De onde resulta que há que julgar inadmissível na íntegra o recurso de M. D. Fernández Gómez.

     Quanto às despesas

    53     Segundo o artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

    54     Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, aplicável ao recurso de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do seu artigo 118.°, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

    55     No entanto, de acordo com o artigo 70.° do referido regulamento, aplicável aos recursos de decisão do Tribunal de Primeira Instância interpostos pelas Instituições por força dos seus artigos 118.° e 122.°, nos litígios entre as Comunidades e os seus agentes, as despesas efectuadas pelas Instituições ficam, em princípio, a cargo destas. Nessas condições, cada parte suportará as suas próprias despesas.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

    1)      É anulado o acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 13 de Setembro de 2005, Fernández Gómez/Comissão (T‑272/03).

    2)      O recurso interposto por M. D. Fernández Gómez no Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias, destinado à anulação da decisão da autoridade habilitada a celebrar contratos de admissão de 12 de Maio de 2003 que indefere o pedido de renovação do contrato de M. D. Fernández Gómez e à indemnização do prejuízo alegado como sendo consequência dessa decisão, é julgado inadmissível.

    3)      Cada parte suportará as suas próprias despesas, quer no que respeita ao processo em primeira instância quer ao presente recurso.

    Assinaturas


    * Língua do processo: francês.

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