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Judgment of the Court (Second Chamber) of 15 July 2004.#Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région v Électricité de France (EDF).#Reference for a preliminary ruling: Cour de cassation - France.#Convention for the Protection of the Mediterranean Sea against Pollution (Barcelona Convention) - Protocol for the Protection of the Mediterranean Sea against Pollution from Land-based Sources - Article 6(3) - Authorisation to discharge - Direct effect.#Case C-213/03.
Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 15 de Julho de 2004. Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région contra Électricité de France (EDF). Pedido de decisão prejudicial: Cour de cassation - França. Convenção para a Protecção do Mar Mediterrâneo contra a Poluição (Convenção de Barcelona) - Protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica - Artigo 6.º, n.º 3 - Autorização de descarga - Efeito directo. Processo C-213/03.
Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 15 de Julho de 2004. Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région contra Électricité de France (EDF). Pedido de decisão prejudicial: Cour de cassation - França. Convenção para a Protecção do Mar Mediterrâneo contra a Poluição (Convenção de Barcelona) - Protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica - Artigo 6.º, n.º 3 - Autorização de descarga - Efeito directo. Processo C-213/03.
Colectânea de Jurisprudência 2004 I-07357
Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2004:464
Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l’étang de Berreet de la région
contra
Électricité de France (EDF)
[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (França)]
«Convenção para a Protecção do Mar Mediterrâneo contra a Poluição (Convenção de Barcelona) – Protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica – Artigo 6.°, n.° 3 – Autorização de descarga – Efeito directo»
Sumário do acórdão
1. Acordos internacionais – Acordos da Comunidade – Efeito directo – Condições – Artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção
do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica e artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto – Obrigação de os Estados‑Membros
sujeitarem a um regime de autorização a descarga de determinadas substâncias
(Protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica, artigo 6.°, n.° 3 e protocolo revisto,
artigo 6.°, n.° 1)
2. Acordos internacionais – Acordos da Comunidade – Artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo
contra a poluição de origem telúrica e artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto – Descarga de substâncias não tóxicas – Proibição
na falta de autorização prévia
(Protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica, artigo 6.°, n.° 3 e protocolo revisto,
artigo 6.°, n.° 1)
1. Uma disposição de um acordo celebrado pela Comunidade com países terceiros deve ser considerada directamente aplicável sempre
que, atendendo aos seus termos bem como ao objecto e à natureza do acordo, contém uma obrigação clara e precisa que não esteja
dependente, na sua execução ou nos seus efeitos, da intervenção de qualquer acto posterior.
É esse o caso do artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica
bem como do artigo 6.°, n.° 1, do mesmo protocolo revisto que consagram, em termos claros, precisos e incondicionais, a obrigação
de os Estados‑Membros fazerem depender as descargas de substâncias enumeradas no anexo II do mesmo protocolo da concessão,
pelas autoridades nacionais competentes, de uma autorização que tenha devidamente em conta as disposições do seu anexo III.
Consequentemente, dado que estas disposições têm efeito directo, qualquer pessoa interessada tem o direito de as invocar nos
órgãos jurisdicionais nacionais.
(cf. n.os 39, 41, 47, disp. 1)
2. O artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica bem como o
artigo 6.°, n.° 1, do mesmo protocolo revisto devem ser interpretados no sentido de que proíbem, na falta de autorização concedida
pelas autoridades competentes, a descarga de substâncias que, não sendo tóxicas, têm um efeito prejudicial sobre o teor em
oxigénio do meio marinho, uma vez que essas disposições não fazem depender expressamente a exigência da autorização prévia
de descarga da toxicidade destas.
(cf. n.os 49, 52, disp. 2)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção) 15 de Julho de 2004(1)
No processo C‑213/03,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pela Cour de cassation (França),
destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre
Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région
e
Électricité de France (EDF),
uma decisão a título prejudicial relativa à interpretação do artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo
contra a poluição de origem telúrica, assinado em Atenas em 17 de Maio de 1980, aprovado pela Decisão 83/101/CEE do Conselho,
de 28 de Fevereiro de 1983 (JO L 67, p. 1; EE 15 F4 p. 100), bem como do artigo 6.°, n.° 1, do mesmo protocolo, conforme alterado
na conferência de plenipotenciários, que decorreu em Siracusa em 7 e 8 de Março de 1996, tendo as alterações sido aprovadas
pela Decisão 1999/801/CE do Conselho, de 22 de Outubro de 1999 (JO L 322, p. 18),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),,
composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, C. Gulmann, J.‑P. Puissochet, J. N. Cunha Rodrigues e R. Schintgen
(relator), juízes,
advogado‑geral: D. Ruiz‑Jarabo Colomer, secretário: M. Múgica Arzamendi, administradora principal,
vistas as observações escritas apresentadas:
–
em representação do Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région, por W. Viscardini,
avocat,
–
em representação da Électricité de France (EDF), por O. Coutard e M. Mayer, avocats,
–
em representação do Governo francês, por G. de Bergues e E. Puisais, na qualidade de agentes,
–
em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por G. Valero Jordana e B. Stromsky, na qualidade de agentes,
ouvidas as alegações do Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang de Berre et de la région, da Électricité
de France, do Governo francês e da Comissão, na audiência de 10 de Março de 2004,
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1
Por acórdão de 6 de Maio de 2003, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de Maio seguinte, a Cour de cassation (França)
submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação do artigo 6.°, n.° 3, do protocolo
relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica, assinado em Atenas em 17 de Maio de 1980, aprovado
pela Decisão 83/101/CEE do Conselho, de 28 de Fevereiro de 1983 (JO L 67, p. 1; EE 15 F4 p. 100, a seguir «protocolo»), bem
como do artigo 6.°, n.° 1, do mesmo protocolo, conforme alterado na conferência de plenipotenciários, que decorreu em Siracusa
em 7 e 8 de Março de 1996, tendo as alterações sido aprovadas pela Decisão 1999/801/CE do Conselho, de 22 de Outubro de 1999
(JO L 322, p. 18, a seguir «protocolo revisto»).
2
Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre o Syndicat professionnel coordination des pêcheurs de l'étang
de Berre et de la région (a seguir «coordenação dos pescadores») e a Électricité de France (a seguir «EDF»), a respeito de
descargas efectuadas pela central hidroeléctrica de Saint‑Chamas (França) na lagoa de Berre.
Quadro jurídico
3
A Convenção para a Protecção do Mar Mediterrâneo contra a Poluição, assinada em Barcelona em 16 de Fevereiro de 1976 (JO 1977,
L 240, p. 3; EE 15 F2 p. 5, a seguir «convenção»), foi celebrada pela Comunidade Económica Europeia através da Decisão 77/585/CEE
do Conselho, de 25 de Julho de 1977 (JO L 240, p. 1; EE 15 F2 p. 3).
4
O artigo 2.°, alínea a), da convenção define o termo «poluição» do seguinte modo:
«[...] a introdução directa ou indirecta, pelo homem, de substâncias ou de energia no meio marinho, sempre que tal introdução
tenha efeitos nocivos tais como danos dos recursos biológicos, riscos para a saúde do homem, entraves às actividades marítimas,
incluindo a pesca, alteração da qualidade da água do mar do ponto de vista da sua utilização e degradação dos valores de qualidade».
5
Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da convenção:
«As partes contratantes tomarão, individual ou conjuntamente, quaisquer medidas adequadas que estejam em conformidade com
a presente convenção e com os protocolos em vigor de que sejam partes, para evitar, reduzir e combater a poluição na zona
do mar Mediterrâneo e para proteger e melhorar o meio marinho nesta zona.»
6
O artigo 8.° da convenção precisa:
«As partes contratantes tomarão todas as medidas adequadas para evitar, reduzir e combater a poluição da zona do mar Mediterrâneo
devida aos derrames dos cursos de água, estabelecimentos costeiros ou emissores, ou provenientes de qualquer outra fonte situada
no seu território.»
7
No mesmo sentido, o artigo 1.° do protocolo dispõe:
«As partes contratantes […] adoptarão todas as medidas adequadas para prevenir, reduzir, combater e controlar a poluição na
zona do mar Mediterrâneo devida às descargas provenientes de rios, estabelecimentos litorais ou emissários, ou emanadas de
qualquer outra fonte terrestre localizada no seu território.»
8
Nos termos do artigo 3.°, alínea c), do protocolo:
«A zona de aplicação do presente protocolo (a seguir designada ‘zona do protocolo') engloba:
[...]
c) Os lagos de águas salgadas que comunicam com o mar.»
9
O artigo 4.°, n.° 1, alínea a), dispõe que o protocolo se aplica «às descargas poluentes provenientes de fontes terrestres
localizadas no território das partes e que atinjam a zona do protocolo, em particular,
–
directamente, por emissários litorais ou por depósito ou derramamentos efectuados na costa ou a partir desta,
–
indirectamente, por intermédio de rios, canais ou outros cursos de água, incluindo os cursos de água subterrâneos ou as escorrências».
10
Nos termos do artigo 6.°, n.os 1 e 3, do protocolo:
«1. As partes comprometem‑se a reduzir rigorosamente a poluição de origem telúrica da zona do protocolo provocada pelas substâncias
ou fontes enumeradas no anexo II do presente protocolo.
[…]
3. As descargas ficarão estritamente dependentes da concessão, pelas autoridades nacionais competentes, de uma autorização que
tem em devida consideração as disposições do anexo III [...]»
11
Por força do artigo 7.°, n.° 1, alínea e), do protocolo:
«As partes elaborarão e adoptarão progressivamente, em colaboração com as organizações internacionais competentes, as directrizes
e, se for caso disso, as normas ou critérios comuns relativos nomeadamente:
[...]
e)
Às exigências específicas relativas às quantidades rejeitadas, concentração nos efluentes e métodos de descarga das substâncias
enumeradas nos anexos I e II.»
12
Resulta dos pontos 11 e 13 da secção A do anexo II do protocolo que estão abrangidas pelo regime previsto no artigo 6.° deste
último as «[s]ubstâncias que exercem uma influência desfavorável quer directamente, quer indirectamente no teor em oxigénio
do meio marinho, especialmente aquelas que podem dar origem a eutrofização», e as «[s]ubstâncias que, apesar de não tóxicas
por natureza, se podem tornar prejudiciais para o meio marinho ou afectar qualquer utilização legítima do mar devido às quantidades
rejeitadas».
13
A secção B do anexo II precisa:
«O controlo e a rigorosa limitação da descarga das substâncias mencionadas na secção A supracitada devem ser aplicados de
acordo com o anexo III.»
14
O anexo III do protocolo enuncia os factores a tomar em consideração «[t]endo em vista a concessão de uma autorização para
a descarga de detritos contendo substâncias mencionadas no anexo II […]». Assim, os Estados partes devem ter em consideração
as «[c]aracterísticas e composição do detrito», as «[c]aracterísticas dos constituintes do detrito quanto à sua nocividade»,
as «[c]aracterísticas do local de descarga e do meio marinho receptor», a «[d]isponibilidade de técnicas relativas a detritos»
e, por último, os «[p]ossíveis danos nos ecossistemas marinhos e nas utilizações de água do mar».
15
Nos termos do artigo 3.°, alínea d), do protocolo revisto, que corresponde ao artigo 3.°, alínea c), do protocolo, a zona
de aplicação deste último inclui:
«[...]
d) [a]s águas salobras, as águas costeiras salgadas, incluindo as lagoas e lagunas costeiras, e as águas subterrâneas que
comunicam com o mar Mediterrâneo».
16
O artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto dispõe:
«As descargas provenientes de fontes pontuais na zona do protocolo e as descargas na água ou a emissão para a atmosfera que
atinjam ou possam atingir a zona do Mediterrâneo, tal como está delimitada no artigo 3.°, alíneas a), c) e d), do presente
protocolo, estão estritamente subordinadas a uma autorização ou regulamentação por parte das autoridades competentes das partes,
tendo em conta as disposições do presente protocolo e do seu anexo II, bem como as decisões ou recomendações pertinentes resultantes
de reuniões das partes contratantes.»
17
O anexo I C do protocolo revisto enumera as «categorias de substâncias e fontes de poluição» que «servirão de guia na elaboração
de planos de acção, programas e medidas». Em especial, o ponto 17 menciona as «[s]ubstâncias não tóxicas que têm efeito desfavorável
no teor em oxigénio do meio marinho».
18
O protocolo revisto suprime o antigo anexo II e converte em «anexo II», alterando‑o, o antigo anexo III.
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
19
A lagoa de Berre, com uma superfície de 15 000 hectares e situada em França, é uma lagoa de água salgada que comunica directamente
com o mar Mediterrâneo.
20
A coordenação dos pescadores queixou‑se, por várias vezes, à EDF, da degradação do meio aquático da lagoa de Berre, devido,
principalmente, às descargas de água doce provenientes do Durance efectuadas artificialmente nesta lagoa sempre que são postas
em funcionamento as turbinas da central hidroeléctrica de Saint‑Chamas.
21
Em 1 de Setembro de 1999, a coordenação dos pescadores fez citar a EDF num processo de medidas provisórias, intentado contra
a EDF no tribunal de grande instance de Marseille (França) por facto lesivo, com o objectivo de obter a cessação da exploração
da central hidroeléctrica de Saint‑Chamas sob pena de uma sanção pecuniária compulsória. A coordenação dos pescadores alegava,
designadamente, que a EDF despejava as águas dessa central sem ter obtido a autorização prévia prevista no artigo 6.°, n.° 3,
do protocolo.
22
O juiz das medidas provisórias em primeira instância indeferiu o pedido de medidas provisórias através de despacho de 25 de
Outubro de 1999. Embora reconhecendo a existência de perturbação causada pelo funcionamento das turbinas da central hidroeléctrica,
considerou:
«Que, tratando‑se da aplicação do direito comunitário, especialmente das convenções de Barcelona e do protocolo de Atenas
[…], a questão do seu efeito directo sobre os particulares gera também controvérsias que não são da competência do juiz de
mérito.
Uma vez que a questão de saber se a exploração pela EDF da central hidroeléctrica de Saint‑Chamas constitui uma perturbação
manifestamente ilícita, ou seja, um acto lesivo na acepção geral da jurisprudência, gera demasiada controvérsia para que o
juiz das medidas provisórias possa intervir e pôr termo a três décadas de exploração, uma decisão, de resto, demasiado grave
que implica consequências gravíssimas no plano, designadamente, da produção e da segurança do sistema eléctrico da região
[…].»
23
A coordenação dos pescadores interpôs recurso dessa decisão na cour d'appel d'Aix‑en‑Provence (França), recurso que foi julgado
improcedente por acórdão de 21 de Setembro de 2000. A cour d'appel considerou, designadamente, «que os diferentes artigos
[do protocolo] são interdependentes» e que o artigo 6.°, n.° 3, «não pode ser considerado isoladamente, de modo que, dado
que o Estado francês não definiu os critérios técnicos aplicáveis, nenhuma autorização de descarga pode ser válida e utilmente
pedida pela EDF com base neste protocolo, uma vez que não pode ser dada qualquer resposta».
24
A coordenação dos pescadores interpôs recurso de cassação deste acórdão invocando, designadamente, a violação pela EDF do
artigo 6.°, n.° 3, do protocolo, cuja aplicação foi erradamente afastada pela cour d'appel.
25
Nestas condições, a Cour de cassation decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as duas questões prejudiciais
seguintes:
«1)
Deve considerar‑se que o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo […], que passou a artigo 6.°, n.° 1, na versão modificada, tem efeito
directo, podendo qualquer interessado invocá‑lo, nos tribunais nacionais, em apoio de uma acção destinada a fazer cessar descargas
de água não autorizadas de acordo com o processo e os critérios que o mesmo prevê?
2)
Deve interpretar‑se a referida disposição no sentido de que proíbe a qualquer pessoa proceder a descargas, numa lagoa [de
água] salgada que comunica com o mar Mediterrâneo, de substâncias que, não sendo tóxicas, têm um efeito prejudicial no teor
em oxigénio do meio marinho, sem ter obtido uma autorização emitida pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros, tendo
em conta as disposições do referido protocolo e do seu anexo III C (que passou a anexo II)?»
Quanto à pertinência do protocolo revisto para a solução do litígio no processo principal
26
A EDF e o Governo francês são de opinião de que é apenas necessário interpretar o protocolo, uma vez que o protocolo revisto
ainda não entrou em vigor.
27
A este respeito, resulta de jurisprudência assente que o processo instituído pelo artigo 234.° CE é um instrumento de cooperação
entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais (v., designadamente, acórdãos de 16 de Julho de 1992, Lourenço
Dias, C‑343/90, Colect., p. I‑4673, n.° 14, e de 18 de Março de 2004, Siemens e ARGE Telekom, C‑314/01, ainda não publicado
na Colectânea, n.° 33, e jurisprudência aí referida).
28
No âmbito desta cooperação, o órgão jurisdicional nacional a quem foi submetido o litígio, que é o único a ter um conhecimento
directo dos factos do processo principal e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, é o melhor
colocado para apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial
para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdãos
Lourenço Dias, já referido, n.° 15; de 22 de Janeiro de 2002, Canal Satélite Digital, C‑390/99, Colect., p. I‑607, n.° 18,
e Siemens e ARGE Telekom, já referido, n.° 34).
29
No caso vertente, não é de modo algum manifesto que a interpretação do artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto é útil para
a solução do litígio no processo principal. Como a Comissão observou, com razão, não se pode, com efeito, excluir que, no
caso de o acórdão da cour d'appel d'Aix‑en‑Provence ser anulado pela Cour de cassation, o protocolo revisto entre em vigor
no momento em que se deve decidir novamente quanto ao mérito do processo principal.
30
Por conseguinte, há também que tomar em consideração o protocolo revisto para efeitos das respostas a dar às questões prejudiciais.
Quanto ao efeito directo dos artigos 6.°, n.° 3, do protocolo e 6.°, n.° 1, do protocolo revistoObservações das partes
31
A EDF alega a existência de interdependência entre as várias disposições do protocolo que tornam impossível o reconhecimento
de efeito directo ao seu artigo 6.°, n.° 3, mesmo se este inclui uma estipulação clara e precisa.
32
Assim, o artigo 6.°, n.° 1, do protocolo estabelece o objectivo de «reduzir rigorosamente» a poluição pelas substâncias ou
fontes enumeradas no anexo II (incluindo as substâncias que têm uma influência desfavorável no teor em oxigénio). A este respeito,
o n.° 2 determina que as partes executem «conjuntamente ou individualmente», segundo os casos, «os programas e medidas adequados».
Por último, o n.° 3 impõe, com vista a efectuar descargas, a obtenção de uma «autorização que tem em devida consideração as
disposições do anexo III». Ora, a obrigação de «ter em devida consideração» tem um carácter muito vago que pode conduzir,
na falta de precisões, a submeter a autorização quaisquer descargas pelo simples facto de dizerem respeito a uma das substâncias
enumeradas no anexo II do protocolo. No entanto, esta exigência é totalmente desproporcionada à luz do objectivo por este
prosseguido.
33
A EDF invoca também o artigo 7.°, n.° 1, do protocolo relativo às «normas ou critérios comuns» cuja elaboração se impõe antes
da instituição de um sistema de autorização prévia. Ora, estas normas e critérios ainda não foram definidos no que respeita
às descargas em questão.
34
Além disso, na medida em que a Comunidade é parte na convenção e no protocolo, as normas a decretar para a sua aplicação podem
ser principalmente de ordem comunitária. Ora, ainda não existe nenhuma directiva relativa às descargas de água doce e de limos
numa lagoa de água salgada.
35
Por sua vez, a coordenação dos pescadores, o Governo francês e a Comissão defendem a tese do efeito directo do artigo 6.°,
n.° 3, do protocolo baseando‑se na jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão de 30 de Setembro de
1987, Demirel, 12/86, Colect., p. 3719, n.° 14).
36
Assim, o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo inclui, tendo em conta os seus termos bem como o seu objectivo e natureza, a obrigação
clara, precisa e incondicional de fazer depender as descargas de substâncias referidas no anexo II do protocolo da concessão
de uma autorização prévia pelas autoridades nacionais competentes. A proibição estrita de proceder a descargas na falta de
tal autorização não pode estar dependente, quanto à sua execução ou aos seus efeitos, de nenhuma reserva ou da intervenção
de qualquer acto posterior. Além disso, o anexo III do protocolo, para o qual remete o artigo 6.°, n.° 3, enumera todos os
factores que devem ser tomados em consideração com vista à concessão da autorização.
37
Segundo a Comissão, a inexistência de medidas, programas e linhas orientadoras adoptadas conjuntamente não tem o efeito de
paralisar a execução do protocolo nem impedir a concessão de autorizações de descarga, mas aumenta o poder de apreciação dos
Estados‑Membros na concessão dessas autorizações, cujo exercício está sujeito a fiscalização jurisdicional.
38
A coordenação dos pescadores e a Comissão acrescentam que a versão do artigo 6.°, resultante do protocolo revisto, e as outras
alterações efectuadas aos anexos não alteram a apreciação exposta.
Apreciação do Tribunal de Justiça
39
Segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, uma disposição de um acordo celebrado pela Comunidade com países terceiros
deve ser considerada directamente aplicável sempre que, atendendo aos seus termos bem como ao objecto e à natureza do acordo,
contém uma obrigação clara e precisa que não esteja dependente, na sua execução ou nos seus efeitos, da intervenção de qualquer
acto posterior (v., nomeadamente, acórdãos Demirel, já referido, n.° 14, e de 8 de Maio de 2003, Wählergruppe Gemeinsam, C‑171/01,
Colect., p. I‑4301, n.° 54).
40
Para decidir se o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo responde a esses critérios, importa, antes de mais, analisar os seus termos.
41
A este respeito, há que referir que essa disposição consagra, em termos claros, precisos e incondicionais, a obrigação de
os Estados‑Membros fazerem depender as descargas de substâncias enumeradas no anexo II do mesmo protocolo da concessão, pelas
autoridades nacionais competentes, de uma autorização que tenha devidamente em conta as disposições do seu anexo III.
42
Como sublinhou, com razão, a Comissão, a circunstância de as autoridades nacionais disporem de uma margem de apreciação na
concessão de autorizações, à luz dos critérios mencionados no anexo III, em nada diminui a clareza, a precisão e o carácter
incondicional da proibição decorrente do artigo 6.°, n.° 3, do protocolo de proceder às descargas sem dispor de autorização
prévia.
43
Esta conclusão é corroborada pelo objecto e pela natureza do protocolo.
44
Com efeito, resulta dos artigos 1.° e 4.° do protocolo que este tem por objecto prevenir, reduzir, combater e controlar a
poluição na zona do mar Mediterrâneo devida às descargas provenientes de rios, estabelecimentos litorais ou emissários, ou
provenientes de qualquer outra fonte terrestre localizada no seu território. Para este efeito, reiterando os compromissos
assumidos por força dos artigos 4.° e 8.° da convenção, o artigo 1.° do protocolo impõe às partes contratantes a obrigação
de adoptar «todas as medidas adequadas».
45
Ao instaurar um regime de autorização prévia pelas autoridades nacionais competentes para a descarga das substâncias mencionadas
no anexo II, o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo contribui para o controlo pelos Estados‑Membros da poluição de origem telúrica
na zona de aplicação do protocolo. O reconhecimento do efeito directo da disposição em causa só pode servir o objecto do protocolo,
tal como recordado supra, e responder à natureza do instrumento destinado, designadamente, a evitar a poluição devida à omissão dos poderes públicos.
46
As considerações expostas são igualmente válidas para a interpretação do artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto. A referência
aí efectuada às «decisões ou recomendações pertinentes resultantes de reuniões das partes contratantes», que as autoridades
nacionais devem ter em conta, não é susceptível de pôr em causa a clareza, a precisão e o carácter incondicional da proibição
de descarga sem dispor de autorização. Além disso, as alterações aprovadas pela Decisão 1999/801 não alteraram de forma alguma
o objecto nem a natureza do protocolo.
47
Tendo em conta o exposto, há que responder à primeira questão que tanto o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo como o artigo 6.°,
n.° 1, do protocolo revisto, após a sua entrada em vigor, têm efeito directo, pelo que qualquer pessoa interessada tem o direito
de invocar as referidas disposições nos órgãos jurisdicionais nacionais.
Quanto ao âmbito de aplicação dos artigos 6.°, n.° 3, do protocolo e 6.°, n.° 1, do protocolo revisto
48
Como observaram, com razão, a coordenação dos pescadores, o Governo francês e a Comissão, o próprio anexo III, objecto do
artigo 6.°, n.° 3, do protocolo e que enumera os factores a tomar em consideração com vista à concessão das autorizações de
descarga de detritos, refere‑se ao anexo II, que menciona as substâncias contidas nas descargas em questão. Entre elas figuram,
no ponto 11, as «[s]ubstâncias que exercem uma influência desfavorável quer directamente, quer indirectamente no teor em oxigénio
do meio marinho, especialmente aquelas que podem dar origem a fenómenos de eutrofização» e, no ponto 13, as «[s]ubstâncias
que, apesar de não tóxicas por natureza, se podem tornar prejudiciais para o meio marinho ou afectar qualquer utilização legítima
do mar devido às quantidades rejeitadas».
49
Há que referir que os pontos 11 e 13 não fazem depender a exigência de uma autorização prévia de descarga das substâncias
neles incluídas da toxicidade destas.
50
Impõe‑se a mesma conclusão a propósito do âmbito de aplicação do artigo 6.°, n.° 1, do protocolo revisto.
51
Com efeito, por força dessa disposição, são todas as «descargas provenientes de fontes pontuais na zona do protocolo [que
inclui, por força do artigo 3.°, alínea d), do protocolo revisto, as lagoas de água salgada que comunicam com o mar Mediterrâneo]
e as descargas na água ou a emissão para a atmosfera que atinjam ou possam atingir a zona do Mediterrâneo», e não apenas as
descargas de substâncias mencionadas no anexo II do protocolo, que serão doravante «estritamente subordinadas a uma autorização
ou regulamentação por parte das autoridades competentes», autoridades que terão em conta, designadamente, as disposições do
protocolo revisto e do seu anexoᅠII.
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Tendo em conta o exposto, há que responder à segunda questão que tanto o artigo 6.°, n.° 3, do protocolo como o artigo 6.°,
n.° 1, do protocolo revisto devem ser interpretados no sentido de que proíbem, na falta de autorização concedida pelas autoridades
competentes, a descarga numa lagoa de água salgada que comunica com o mar Mediterrâneo de substâncias que, não sendo tóxicas,
têm um efeito prejudicial sobre o teor em oxigénio do meio marinho.
Quanto às despesas
53
As despesas efectuadas pelo Governo francês e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis.
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional
nacional, compete a este decidir quanto às despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),
pronunciando‑se sobre as questões submetidas pela Cour de cassation, por acórdão de 6 de Maio de 2003, declara:
1)
O artigo 6.°, n.° 3, do protocolo relativo à protecção do mar mediterrâneo contra a poluição de origem telúrica, assinado
em Atenas em 17 de Maio de 1980, aprovado pela Decisão 83/101/CEE do Conselho, de 28 de Fevereiro de 1983, bem como, após
a sua entrada em vigor, o artigo 6.°, n.° 1, do mesmo protocolo, conforme alterado na conferência de plenipotenciários, que
decorreu em Siracusa em 7 e 8 de Março de 1996, tendo as alterações sido aprovadas pela Decisão 1999/801/CE do Conselho, de
22 de Outubro de 1999, têm efeito directo, pelo que qualquer pessoa interessada tem o direito de invocar as referidas disposições
nos órgãos jurisdicionais nacionais.
2)
Essas mesmas disposições devem ser interpretadas no sentido de que proíbem, na falta de autorização concedida pelas autoridades
competentes, a descarga numa lagoa de água salgada que comunica com o mar Mediterrâneo de substâncias que, não sendo tóxicas,
têm um efeito prejudicial sobre o teor em oxigénio do meio marinho.
Timmermans
Gulmann
Puissochet
Cunha Rodrigues
Schintgen
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 15 de Julho de 2004.