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Documento 62001CC0334

    Conclusões do advogado-geral Mischo apresentadas em 23 de Janeiro de 2003.
    Glencore Grain Rotterdam BV contra Bundesanstalt für Landwirtschaft und Ernährung.
    Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Frankfurt am Main - Alemanha.
    Agricultura - Organização comum de mercado no sector dos cereais - Processo de concurso permanente - Produto cerealífero destinado a ser exportado para os Estados ACP - Facto que origina o início do prazo para apresentação da prova da introdução no consumo no Estado de destino - Artigos 8.º, n.º 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento (CE) n.º 2372/95 e 47.º, n.º 2, do Regulamento (CEE) n.º 3665/87.
    Processo C-334/01.

    Colectânea de Jurisprudência 2003 I-06769

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2003:53

    62001C0334

    Conclusões do advogado-geral Mischo apresentadas em 23 de Janeiro de 2003. - Glencore Grain Rotterdam BV contra Bundesanstalt für Landwirtschaft und Ernährung. - Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Frankfurt am Main - Alemanha. - Agricultura - Organização comum de mercado no sector dos cereais - Processo de concurso permanente - Produto cerealífero destinado a ser exportado para os Estados ACP - Facto que origina o início do prazo para apresentação da prova da introdução no consumo no Estado de destino - Artigos 8.º, n.º 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento (CE) n.º 2372/95 e 47.º, n.º 2, do Regulamento (CEE) n.º 3665/87. - Processo C-334/01.

    Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-06769


    Conclusões do Advogado-Geral


    1. O pedido de decisão prejudicial dirigido a este Tribunal pelo Verwaltungsgericht Frankfurt am Main (Alemanha) respeita a cereais vendidos por um organismo de intervenção agrícola, através de um processo de concurso, a fim de serem exportados para Estados signatários da convenção entre a Comunidade e os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (a seguir «Estados ACP»). A questão que se coloca é a de saber qual o facto que desencadeia o prazo de doze meses dentro do qual deve ser feita a prova da introdução dos produtos no consumo nos Estados de destino.

    I - Enquadramento jurídico: regulamentação comunitária

    A - Regulamento (CEE) n.° 1766/92

    2. O artigo 4.° do Regulamento (CEE) n.° 1766/92 do Conselho, de 30 de Junho de 1992, que estabelece a organização comum de mercado no sector dos cereais , prevê que os organismos de intervenção designados pelos Estados-Membros comprarão determinados tipos de cereais, entre os quais trigo mole, colhidos na Comunidade, que lhes sejam oferecidos, desde que a oferta satisfaça as condições estabelecidas, nomeadamente no que diz respeito à qualidade e quantidade.

    3. O artigo 5.° autoriza a Comissão, no âmbito do procedimento do comité de gestão, a fixar os processos e condições para escoamento dos cereais pelos organismos de intervenção dos Estados-Membros.

    B - Regulamento (CEE) n.° 2131/93

    4. O Regulamento (CEE) n.° 2131/93 da Comissão, de 28 de Julho de 1993, que estabelece os processos e condições da colocação à venda dos cereais na posse dos organismos de intervenção , prevê dois processos de concurso distintos para a colocação à venda dos cereais no mercado da Comunidade, por um lado, e a venda destinada a exportação, por outro.

    5. Nos termos do artigo 13.° , n.° 4, em ambos os casos deve ser constituída uma garantia. Acresce que, quando da colocação à venda para exportação, deve ser constituída em determinadas circunstâncias uma garantia específica a fim de garantir que os cereais são efectivamente exportados e não escoados no mercado comunitário.

    6. No que respeita à liberação ou à perda das duas garantias, o artigo 17.° do Regulamento n.° 2131/93, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 120/94 da Comissão, de 25 de Janeiro de 1994 , dispõe o seguinte:

    «1. As garantias referidas no presente regulamento serão constituídas em conformidade com o disposto no título III do Regulamento (CEE) n.° 2220/85 da Comissão.

    2. A garantia referida no n.° 4 do artigo 13.° será liberada para as quantidades relativamente às quais:

    - [...]

    - o pagamento do preço de venda tenha sido efectuado no prazo previsto e, no caso de venda para exportação e de o preço pago ser inferior ao preço mínimo a respeitar aquando de uma recolocação à venda no mercado comunitário, em conformidade com o disposto nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 5.° , tenha sido constituída uma garantia que cubra a diferença entre esses dois preços.

    3. A garantia referida no segundo travessão do n.° 2 será liberada para as quantidades relativamente às quais:

    - [...]

    - tenham sido apresentadas as provas referidas no artigo 18.° do Regulamento (CEE) n.° 3665/87. No entanto, a garantia será liberada se o operador apresentar prova de que, pelo menos, 1 500 toneladas de cereais deixaram o território aduaneiro da Comunidade num navio apto para a navegação marítima.

    [...]

    5. Salvo caso de força maior, a garantia referida no segundo travessão do n.° 2 será executada no que diz respeito às quantidades relativamente às quais as provas referidas no segundo travessão do n.° 3 não tenham sido apresentadas no prazo previsto no artigo 47.° do Regulamento (CEE) n.° 3665/87.»

    C - Regulamento (CE) n.° 2372/95

    7. É o Regulamento (CE) n.° 2372/95 da Comissão, de 10 de Outubro de 1995, relativo à abertura de concursos permanentes para a venda de trigo mole panificável na posse dos organismos de intervenção francês e alemão, destinado à exportação para determinados países ACP durante a campanha de 1995/1996 , que constitui essencialmente o objecto do litígio.

    8. O artigo 2.° prevê que, «[s]ob reserva do disposto no presente regulamento, as vendas de trigo mole panificável referidas no artigo 1.° realizar-se-ão em conformidade com os processos e condições fixadas no Regulamento (CEE) n.° 2131/93».

    9. O artigo 8.° dispõe:

    «1. A garantia constituída nos termos do n.° 4 do artigo 13.° do Regulamento (CEE) n.° 2131/93 será liberada imediatamente após a entrega dos certificados de exportação aos adjudicatários.

    2. A obrigação de exportação, bem como de importação nos países destinatários definidos no anexo I, será coberta por uma garantia de 60 ecus por tonelada, dos quais 20 ecus por tonelada a depositar aquando da emissão do certificado de exportação e os restantes 40 ecus por tonelada a depositar antes da retirada dos cereais.

    Em derrogação ao n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento (CEE) n.° 3002/92 da Comissão:

    - o montante de 20 ecus por tonelada deve ser liberado num prazo de vinte dias úteis após a data de apresentação, pelo adjudicatário, da prova de que o trigo mole retirado deixou o território aduaneiro da Comunidade,

    - o montante de 40 ecus por tonelada deve ser liberado num prazo de quinze dias úteis após a data de apresentação da prova, pelo adjudicatário, da introdução no consumo no ou nos Estados ACP referidos no n.° 3 do artigo 5.° Esta prova deve ser apresentada em conformidade com o disposto nos artigos 18.° e 47.° do Regulamento (CEE) n.° 3665/87 da Comissão.

    [...]»

    D - Regulamento (CEE) n.° 3665/87

    10. O regulamento especialmente em causa no presente processo refere-se, do ponto de vista da administração da prova, ao Regulamento (CEE) n.° 3665/87 da Comissão, de 27 de Novembro de 1987, que estabelece regras comuns de execução do regime das restituições à exportação para os produtos agrícolas .

    11. O artigo 18.° , n.° 1, que define os documentos que o exportador deve apresentar para fazer prova do cumprimento das formalidades aduaneiras de introdução no consumo, prevê:

    «1. A prova de cumprimento das formalidades aduaneiras de introdução no consumo é produzida:

    a) Pela apresentação do documento aduaneiro ou da sua cópia ou fotocópia; esta cópia ou fotocópia deve ser certificada conforme, quer pelo organismo que visou o documento original, quer pelos serviços oficiais do país terceiro em causa, quer pelos serviços oficiais de um dos Estados-Membros;

    ou

    b) Pela apresentação do certificado de desalfandegamento estabelecido num formulário conforme ao modelo que consta do anexo II; este formulário deve ser preenchido numa ou várias línguas oficiais da Comunidade e numa língua em uso no país terceiro em causa;

    ou

    c) Pela apresentação de qualquer outro documento visado pelos serviços aduaneiros do país terceiro em causa, que contenha a identificação dos produtos e demonstre que estes foram introduzidos no consumo nesse país terceiro.»

    12. Por outro lado, resulta do n.° 2 do mesmo artigo que, se nenhum dos documentos referidos no n.° 1 puder ser apresentado devido a circunstâncias independentes da vontade do exportador ou se os mesmos forem considerados insuficientes, a prova do cumprimento das formalidades aduaneiras de introdução no consumo pode ainda ser considerada produzida pela apresentação de um ou vários de sete outros tipos de documentos.

    13. Quanto ao procedimento a seguir e aos prazos a respeitar para o pagamento da restituição à exportação, o artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1829/94 da Comissão, de 26 de Julho de 1994 , dispõe o seguinte:

    «1. A restituição só é paga, a pedido específico do exportador, pelo Estado-Membro no território do qual tiver sido aceite a declaração de exportação.

    [...]

    2. O processo de pagamento da restituição ou da liberação da garantia deve ser entregue, salvo caso de força maior, nos doze meses seguintes ao dia da aceitação da declaração de exportação .

    [...]

    4. Sempre que os documentos exigidos a título do artigo 18.° não possam ser apresentados no prazo referido no n.° 2, ainda que o exportador tenha feito diligências para obtê-los e comunicá-los nesse prazo, podem ser-lhe concedidos prazos suplementares para a sua apresentação.

    [...]»

    E - Regulamento (CEE) n.° 2220/85

    14. O Regulamento (CEE) n.° 2220/85 da Comissão, de 22 de Julho de 1985, que fixa as regras comuns de aplicação do regime de garantias para os produtos agrícolas , contém as disposições que regulam as garantias a fornecer no quadro dos regulamentos relativos à organização comum dos mercados, designadamente no sector dos cereais, salvo disposição em contrário prevista nos referidos regulamentos (artigo 1.° ).

    15. O artigo 3.° dispõe:

    «Na acepção do presente regulamento entende-se por:

    a) Garantia, a segurança de que um montante será pago ou permanecerá adquirido pela autoridade competente se uma determinada obrigação não for cumprida.

    [...]»

    16. Os artigos 21.° , 22.° e 28.° do Regulamento n.° 2220/85, alterados pelo Regulamento (CEE) n.° 1181/87 da Comissão, de 29 de Abril de 1987 , tem a seguinte redacção:

    «Artigo 21.°

    A garantia é liberada desde que tenha sido fornecida a prova prevista para esse efeito de que todas as exigências principais, secundárias e subordinadas foram respeitadas.

    Artigo 22.°

    1. A garantia é perdida na totalidade em relação à quantidade para a qual não for respeitada uma exigência principal, excepto quando a não observância for devida a caso de força maior.

    2. Uma exigência principal é considerada como não tendo sido respeitada se a prova correspondente não for apresentada no prazo fixado para a sua apresentação, excepto quando a impossibilidade da apresentação da prova no prazo fixado for devida a caso de força maior. Será imediatamente iniciado o processo previsto no artigo 29.° para recuperar o montante perdido.

    3. Se a prova do cumprimento da(s) exigência(s) principal(s) for apresentada nos dezoito meses seguintes ao prazo referido no n.° 2, são reembolsados 85% do montante adquirido.

    Se a prova do respeito da(s) exigência(s) principal(s) for apresentada nos dezoito meses seguintes ao prazo referido no n.° 2 e se a exigência secundária inerente não tiver sido respeitada, o montante reembolsado é igual ao montante que seria liberado em caso de aplicação do n.° 2 do artigo 27.° , diminuído de 15% da referida parte do montante garantido.

    4. Não é efectuado qualquer reembolso do montante adquirido quando a prova do cumprimento da(s) exigência(s) principal(s) seja apresentada após o decurso do prazo de dezoito meses referido no n.° 3, excepto quando a impossibilidade da apresentação da prova no prazo fixado for devida a caso de força maior.

    Artigo 28.°

    1. Se não for previsto qualquer prazo para a produção das provas necessárias para obtenção de liberação de uma garantia, esse prazo é de:

    a) Doze meses a partir do prazo limite especificado para o respeito da ou das exigência(s) principal(s);

    ou

    b) Se um tal prazo não for especificado, doze meses a contar da data a partir da qual a ou as exigências(s) principal(s) foram respeitadas.

    2. O prazo previsto no n.° 1 não pode exceder três anos a contar da data em que a garantia foi afectada à obrigação em causa, salvo caso de força maior.»

    II - O litígio no processo principal e a questão prejudicial

    A - Antecedentes do litígio no processo principal

    17. A sociedade Glencore Grain Rotterdam BV (a seguir «Glencore»), recorrente no processo principal, participou no concurso aberto pelo Regulamento n.° 2372/95. Foi-lhe adjudicada uma quantidade total de 102 359 toneladas de trigo mole, tendo então prestado a garantia de 60 ecus por tonelada, nos termos do artigo 8.° , n.° 2, do Regulamento n.° 2372/95.

    18. Nos termos dos certificados de exportação emitidos, o trigo mole destinava-se a um ou vários Estados ACP enumerados no anexo do Regulamento n.° 2372/95. O trigo mole adjudicado foi sujeito às formalidades aduaneiras e abandonou por navio o território da Comunidade entre Janeiro e Março de 1996.

    19. A recorrente no processo principal salienta que, na realidade, apenas as exportações para o Botswana, o Lesoto e a Suazilândia são relevantes para o processo principal. Além disso, afirma que, dado estes três países se situarem no interior do sul da África e não disporem de portos, o trigo mole foi desembarcado em Durban, porto pertencente à República da África do Sul, onde foi armazenado numa primeira fase a fim de, posteriormente, logo que os meios de transporte estivessem disponíveis, ser transportado para os três países ACP em questão.

    20. Nos termos do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, do Regulamento n.° 2372/95, foi liberada pelo recorrido no processo principal a garantia de 20 ecus por tonelada após apresentação da prova de que a mercadoria retirada deixou o território aduaneiro da Comunidade.

    21. Contudo, os documentos que comprovam a introdução no consumo das mercadorias nos países de destino só foram apresentados ao recorrido no processo principal em 24 de Junho de 1997, ou seja, mais de dezoito meses após a aceitação da declaração de exportação.

    22. A recorrente no processo principal declarou então perdidos 15% da garantia constituída no valor de 40 ecus por tonelada, invocando como base legal os artigos 22.° , n.os 2 e 3, e 29.° do Regulamento n.° 2220/85 conjugados com os artigos 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, e 2.° do Regulamento n.° 2372/95, o artigo 17.° , n.° 5, do Regulamento n.° 2131/93, bem como os artigos 18.° e 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87.

    23. Após ter impugnado sem êxito esta decisão, a recorrente no processo principal interpôs, em 3 de Abril de 1998, recurso para o Verwaltungsgericht da perda parcial da sua garantia.

    24. No órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente no processo principal afirmou, no essencial, que o prazo de doze meses fixado no artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87 não se aplicava no quadro do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 2372/95. Em seu entender, deve antes ser aplicado o prazo de doze meses previsto no artigo 28.° , n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2220/85. Esta disposição - ao contrário do artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87 - não determina que o prazo comece a contar a partir do dia seguinte à aceitação da declaração de exportação, mas apenas que a prova necessária à liberação da garantia deve ser apresentada doze meses a contar da data em que foi respeitada a exigência principal.

    25. Em contrapartida, a recorrente no processo principal considera que o artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 constitui a base jurídica da decisão controvertida que considerou a garantia perdida. Nos termos destas disposições, a garantia de 40 ecus por tonelada deve ser liberada no prazo de quinze dias seguintes à data em que o adjudicatário apresente a prova da introdução no consumo no Estado ou Estados ACP referidos no artigo 5.° , n.° 3, do mesmo regulamento. Esta prova é apresentada nos termos do disposto nos artigos 18.° e 47.° do Regulamento n.° 3665/87.

    26. Resulta do despacho de reenvio que o Verwaltungsgericht se inclina para o entendimento da recorrente no processo principal segundo o qual a remissão, no artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 para o artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87 e, assim, para o prazo que consta do seu n.° 2, constitui um erro de redacção do legislador. Em seu entender, o Regulamento n.° 2372/95 não fixa qualquer prazo para o cumprimento da obrigação principal, isto é, a importação do trigo mole panificável num Estado ACP.

    B - Questão prejudicial

    27. Considerando que a solução do litígio que lhe foi submetido exige a interpretação do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 e do artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87, o Verwaltungsgericht Frankfurt am Main decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «O artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento (CE) n.° 2372/95 da Comissão, de 10 de Outubro de 1995, deve ser interpretado no sentido de que o artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento (CEE) n.° 3665/87 da Comissão, de 27 de Novembro de 1987, apenas se aplica por analogia, dado que o prazo de doze meses para a prova da importação no Estado ACP em causa só começa a contar quando a obrigação principal imposta por este regulamento, nomeadamente a importação no Estado ACP, estiver cumprida?»

    III - Questão de direito

    28. No essencial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se as disposições conjugadas do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 e do artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87 podem ser interpretadas no sentido de que o prazo de doze meses para a prova da importação no Estado ACP em causa só começa a contar quando estiver cumprida a exigência principal imposta pela regulamentação, isto é, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a importação no Estado ACP.

    A - Redacção da disposição em causa e sua interpretação

    1. Argumentos da Glencore

    29. No entender da recorrente no processo principal, cujo ponto de vista é compartilhado pelo órgão jurisdicional de reenvio, a prova da importação do trigo foi apresentada dentro do prazo fixado, uma vez que, segundo a interpretação correcta do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95, o prazo de doze meses previsto para apresentar a prova da importação no Estado ACP em causa só começa a contar quando tiver sido completada a importação neste Estado.

    30. A este respeito, a recorrente no processo principal afirma em primeiro lugar que, ao contrário do Regulamento n.° 3665/87 relativo às restituições à exportação, o Regulamento n.° 2372/95 prevê unicamente um prazo dentro do qual a mercadoria deve ser exportada, mas não prevê expressamente o prazo no qual a mercadoria deve ser importada no Estado ACP de destino. Nesta regulamentação, que respeita apenas às exportações para os Estados ACP, o legislador renunciou intencionalmente à fixação de um prazo para cumprimento das importações no Estado ACP em causa uma vez que, muito frequentemente, o prazo de doze meses não pode ser respeitado. Com efeito, a mercadoria, que vem da Europa por navio, deve, por razões logísticas, ser armazenada numa primeira fase de modo provisório antes de poder ser carregada em camiões ou por via férrea. É então transportada através da África em condições frequentemente muito difíceis. Dado que nenhum prazo foi fixado para a importação no Estado ACP, isto implica necessariamente que também não poderá ser imposto qualquer prazo para apresentação da respectiva prova.

    31. No entender da recorrente no processo principal, a comparação com o artigo 17.° do Regulamento n.° 2131/93 demonstra também que o legislador não pretendeu sujeitar a prova da importação à observância do prazo de doze meses subsequente ao cumprimento das formalidades aduaneiras de exportação. Esta disposição prevê que a garantia será liberada ou após a apresentação dos documentos que comprovam o pagamento dos direitos aduaneiros de importação nos termos do artigo 18.° do Regulamento n.° 3665/87, ou quando for feita prova de que os cereais deixaram o território aduaneiro da Comunidade após terem sido carregados num navio de alto mar. É expressamente referido que as provas em causa devem ser apresentadas dentro do prazo previsto no artigo 47.° deste regulamento. Independentemente do facto de o prazo previsto no artigo 47.° , n.° 2, ser expressamente mencionado no artigo 17.° acima referido, esta regulamentação é racional, dado que a prova de que a mercadoria deixou a Comunidade num navio de alto mar pode ser apresentada de modo simples e sem dificuldades. No Regulamento n.° 2372/95, só foi previsto um prazo para a exportação. Se o legislador tivesse pretendido fixar igualmente um prazo para apresentação da prova da importação nos Estados ACP, não teria deixado de o fazer.

    32. Por último, a interpretação acima referida do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 é, no entender da Glencore, igualmente justificada pelo facto de o Regulamento n.° 2220/85 ser aplicável. A garantia a constituir no quadro das exportações nos termos do Regulamento n.° 2372/95 é uma garantia na acepção do artigo 3.° , alínea a), do Regulamento n.° 2220/85. A importação dos cereais nos Estados destinatários ACP constitui uma exigência essencial em conformidade com o artigo 20.° , n.° 2, deste regulamento. É pacífico que a mesma foi respeitada.

    33. É certo que o artigo 22.° , n.° 2, do mesmo regulamento dá a impressão de que se deve considerar que a exigência principal não foi respeitada se a prova correspondente não for apresentada dentro do prazo fixado para a produção dessa prova. Contudo, o artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95, contrariamente ao artigo 17.° , n.° 5, do Regulamento n.° 2131/93, não fixa um prazo para apresentar a prova.

    34. Na medida em que também não foi previsto um prazo para a observância da exigência principal, o prazo para apresentar a prova da importação no Estado-Membro de destino é, nos termos do artigo 28.° , n.° 1, alínea b), de doze meses a partir da observância da exigência principal, isto é, as importações nos Estados ACP de destino. Para evitar que este prazo não se alargue demasiado, o n.° 2 do mesmo artigo prevê o prazo máximo absoluto de três anos a contar da data em que tenha sido constituída a garantia.

    35. A recorrente no processo principal conclui daqui que o artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão não prevê um prazo para apresentar a prova da importação e que a remissão para o artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87 apenas pode ser interpretada no sentido de que a esta disposição se pode aplicar uma interpretação por analogia adaptada ao Regulamento n.° 2372/95.

    36. O prazo de doze meses só deve, assim, começar a correr quando estiver cumprida a exigência principal imposta por este regulamento, ou seja, a importação no Estado ACP.

    2. Ponto de vista da Comissão

    37. A Comissão considera que as disposições em matéria de prazos previstas no artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87 são aplicáveis de pleno direito por força do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95, pelo que a prova da importação da mercadoria no ou nos países ACP em causa, necessária para a liberação da garantia, deve ser apresentada - sem prejuízo da prorrogação do prazo nos termos do artigo 47.° , n.os 4 e 5 do Regulamento n.° 3665/87 ou em caso de força maior - no prazo de doze meses a contar da data de aceitação da declaração de exportação.

    38. Para a Comissão, a redacção do artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.° 2372/95 é clara e unívoca: esta disposição não contém qualquer elemento que sugira que a referência ao artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87 não deve também alargar-se à disposição em matéria de prazo constante do seu n.° 2. Se, conforme realça, esta disposição em matéria de prazo não fosse tida em conta, a referência em causa seria privada de qualquer efeito.

    39. A Comissão considera que o recurso, sugerido pela recorrente no processo principal, às disposições em matéria de prazo constantes do artigo 28.° do Regulamento n.° 2220/85 não é admissível uma vez que este regulamento, nos termos do seu artigo 1.° , apenas se aplica na medida em que os regulamentos sectoriais adoptados no quadro da organização comum de mercado em causa não contenham qualquer disposição em contrário. A Comissão remete também, quanto a esta questão, para o penúltimo considerando do Regulamento n.° 2220/85. Para a Comissão, este procedimento seria, por outro lado, contrário ao princípio da segurança jurídica, segundo o qual «a legislação comunitária deve ser clara e a sua aplicação previsível para todos os que por ela são abrangidos» .

    40. Para a Comissão, se se tratasse de um erro de redacção, teria sido fácil rectificar ou alterar consequentemente a disposição. Ora, não houve rectificação nem alteração nesse sentido, embora a Comissão, em Novembro de 1995, tenha alterado outra disposição do Regulamento n.° 2372/95.

    41. Aliás, observa a Comissão, o artigo 17.° do Regulamento n.° 2131/93 remete também, no que respeita ao prazo a observar para a liberação da garantia, para o artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87. A Comissão refere também que o artigo 8.° do Regulamento n.° 2372/95 se insere, por isso, na linha das regras aplicáveis aos processos de colocação à venda de cereais provenientes das existências de intervenção. O facto de o teor da referência variar ligeiramente de uma disposição para outra nada altera neste aspecto. Se o legislador, quanto à questão dos prazos, tivesse tido a intenção de se afastar das regras gerais de execução, tê-lo-ia claramente manifestado.

    3. Apreciação

    42. Evidentemente que só pode lamentar-se o facto de a Comissão recorrer à técnica da remissão para outros regulamentos mesmo em casos em que seria muito fácil expressar directamente a regra que se pretende instituir.

    43. Assim, o Regulamento n.° 2372/95 não teria sido indevidamente alongado se a Comissão, no artigo 8.° , n.° 2, tivesse indicado:

    «Salvo caso de força maior, esta prova é apresentada nos doze meses seguintes ao dia da aceitação da declaração de exportação, segundo um dos meios de prova previstos no artigo 18.° do Regulamento (CEE) n.° 3665/87 da Comissão. Contudo, sempre que os documentos exigidos a título do artigo 18.° não possam ser apresentados no referido prazo, ainda que o exportador tenha feito diligências para obtê-los e comunicá-los no mesmo prazo, podem ser-lhe concedidos prazos suplementares para a sua apresentação ».

    44. Dito isto, não há, porém, em nosso entender, dúvidas de que as disposições em causa não são ambíguas. Efectivamente, não é possível interpretar a remissão para o artigo 47.° no sentido de que a mesma se refere a todas as disposições do artigo 47.° , com excepção das do n.° 2, que fixa um prazo de doze meses que começa a contar a partir da data em que foi aceite a declaração de exportação, e das do n.° 4, que prevê a possibilidade de concessão de prazos suplementares.

    45. O artigo 47.° , como as restantes disposições do regulamento a que pertence, diz efectivamente respeito ao regime das restituições à exportação. Ora, estas restituições não foram concedidas no âmbito dos concursos em causa no presente processo. Nestas condições, a Comissão tem razão quando observa que a remissão para este artigo não teria sentido se não tivesse em vista os dois números que se referem aos prazos.

    46. Acrescente-se que o advogado-geral P. Léger, em conclusões, a que a Comissão se refere, relativas à interpretação de regulamentos sobre a gestão e o controlo de auxílios comunitários, salienta:

    «As disposições de direito comunitário que não apresentam qualquer ambiguidade bastam-se a si próprias. São objecto de uma interpretação pelo Tribunal de Justiça que se baseia pelo menos tanto na sua redacção como nos objectivos prosseguidos pelo diploma no qual se inserem. Para quê interpretar um diploma simultaneamente claro e preciso atribuindo-lhe um sentido que ele não pode manifestamente ter »?

    47. Nas mesmas conclusões, o advogado-geral P. Léger considera que se deve «privilegiar a interpretação que melhor respeite o princípio da segurança jurídica, isto é, aquela que é imposta pela própria letra» da disposição em causa.

    48. O próprio Tribunal de Justiça não admite uma argumentação que vá contra a redacção de uma disposição de um regulamento isenta de ambiguidades e cujo teor seja suficientemente claro .

    49. Quanto aos argumentos extraídos pela Glencore do Regulamento n.° 2220/85 bem como de um alegado erro de redacção, consideramos que as respostas aos mesmos dadas pela Comissão (referidas supra nos n.os 38 e 39) são inteiramente convincentes.

    50. Concluímos, assim, que as disposições em causa não são ambíguas e que o seu teor não autoriza a interpretação proposta pelo órgão jurisdicional de reenvio. Pelo contrário, o prazo de doze meses de que o operador dispõe para apresentar a prova da importação começa efectivamente a contar na data da aceitação da declaração de exportação.

    51. Dado que esta conclusão nos permite já dar uma resposta definitiva à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, referiremos apenas a título subsidiário os restantes argumentos avançados no mesmo processo.

    B - A ratio legis do mecanismo e das regras previstas em matéria de prazo pelo Regulamento n.° 2372/95 tendo em conta a especificidade deste regulamento e as circunstância do caso concreto

    52. Sobre este ponto, consideramos adequado retomar as observações do órgão jurisdicional de reenvio, que são mais detalhadas do que as da Glencore, embora tendo um alcance idêntico.

    1. Ponto de vista do órgão jurisdicional de reenvio

    53. Este órgão jurisdicional, assim como a Glencore, entende que o Regulamento n.° 2372/95 não fixa qualquer prazo para o cumprimento da exigência principal, ou seja, a exportação do trigo mole nos Estados ACP.

    54. Ora, o Verwaltungsgericht refere que, se fosse de seguir a opinião do Bundesanstalt segundo a qual os documentos que certificam a importação no Estado ACP devem ser apresentados nos doze meses seguintes à aceitação da declaração de exportação, isso equivaleria a criar indirectamente, através de uma exigência secundária subordinada, um prazo para o cumprimento da exigência principal.

    55. Assim, se a remissão para o artigo 47.° do Regulamento n.° 3665/87, efectuada pelo artigo 8.° , n.° 2, do Regulamento n.° 2372/95, não constitui um erro de redacção, este regulamento conduzirá à deterioração da situação do exportador em relação às obrigações que lhe são impostas pelo Regulamento n.° 2131/93, sendo este estado de coisas contrário ao espírito e à finalidade do regulamento.

    56. Resulta com efeito dos considerandos, conforme recorda o órgão jurisdicional nacional, que a especificidade da operação bem como a situação contabilística do trigo mole em causa requeriam uma fexibilização dos mecanismos e obrigações de revenda das existências de intervenção. Deveriam ser fixadas medidas especiais para assegurar a regularidade das operações e os respectivos controlos; para esse efeito, era adequado prever um sistema de garantia susceptível de assegurar o respeito dos objectivos pretendidos evitando, embora, encargos excessivos, e convinha, por isso, derrogar determinadas regras, designadamente do Regulamento n.° 2131/93.

    57. Ora, ao contrário do que lhe impõe o Regulamento n.° 2131/93, o importador é obrigado, pelas disposições do Regulamento n.° 2372/95, não apenas a retirar as mercadorias após a venda e a comercializá-las fora da Comunidade, mas também a importá-las nos Estados ACP.

    58. Exige-se, assim, mais ao exportador que beneficiou de uma adjudicação nos termos do Regulamento n.° 2372/95 do que ao exportador referido no Regulamento n.° 2131/93.

    59. Por outro lado, enquanto o exportador nos termos deste último regulamento dispõe de doze meses para fazer prova de que a mercadoria foi carregada num navio (prova relativamente simples, uma vez que pode ser emitida pelas autoridades dos Estados-Membros da Comunidade), o exportador nos termos do Regulamento n.° 2372/95 deve fazer prova de que a mercadoria foi introduzida no consumo num Estado ACP (prova mais difícil de apresentar), e dispõe, para esse efeito, do mesmo prazo de doze meses. Tudo isto não tem de modo algum em conta o facto de que o Regulamento n.° 2372/95 deve evitar encargos excessivos para os operadores, o que necessitava da derrogação de determinadas disposições do Regulamento n.° 2131/93.

    60. Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que o exportador deve, nos termos do Regulamento n.° 2372/95, apresentar uma garantia de valor nitidamente mais elevado (ou seja, 60 ecus por tonelada) do que a que é obrigado a constituir nos termos do Regulamento n.° 2131/93.

    61. Esta garantia, tendo em conta o respectivo montante, não assegura apenas a diferença entre o preço do mercado mundial e o preço em vigor na Comunidade, mas prossegue um outro objectivo em função do seu montante. O argumento da recorrente segundo o qual as disposições do Regulamento n.° 2131/93 continuam a aplicar-se não pode proceder, a menos que o Regulamento n.° 2372/95 disponha em sentido diferente.

    62. O artigo 17.° , n.° 5, do Regulamento n.° 2131/93 não pode constituir a base legal para a garantia prevista no Regulamento n.° 2372/95, uma vez que a garantia a que se refere esta disposição não representa uma garantia da proposta nem uma garantia destinada a cobrir a diferença de preço entre a Comunidade e o mercado mundial.

    2. Ponto de vista da Comissão

    63. Nas suas observações, a Comissão realça, em primeiro lugar, a título meramente preventivo, que uma interpretação baseada no objectivo da disposição, longe de contradizer os argumentos invocados em apoio da sua tese, vem antes apoiar os seus argumentos.

    64. Remetendo para os segundo e terceiro considerandos do Regulamento n.° 2372/95, a Comissão salienta que o concurso permanente aberto desta forma deve antes de mais cobrir as necessidades em trigo mole panificável dos países ACP. Para a Comissão, a importação de trigo nestes países constituía efectivamente, por isso, a exigência principal imposta aos beneficiários cujo cumprimento era assegurado pela constituição da garantia prevista no artigo 8.° , n.° 2. Fixar um prazo mais amplo de que o prazo equiparável, aplicável no âmbito do regime geral do artigo 17.° , n.° 5, do Regulamento n.° 2131/93, para apresentar a prova da importação da mercadoria nos países ACP em causa, prova essa necessária para liberar a segunda parte da garantia, teria afectado a importância que esta obrigação assume para o êxito da medida no seu conjunto. Seria essa, contudo, a consequência do recurso proposto pela Glencore às disposições em matéria de prazo do artigo 28.° , n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2220/85.

    65. Por último, a Comissão salienta que o facto de que a determinação relativa à garantia constante do artigo 8.° , n.° 2, do Regulamento n.° 2372/95 tinha por objectivo, em conformidade com o quarto considerando do regulamento, evitar encargos excessivos para os operadores também se não opõe a esta apreciação: esta conclusão refere-se, com efeito, simplesmente ao montante da garantia a constituir, e não às condições da sua liberação, as quais são sobretudo objecto do quinto considerando.

    3. Apreciação

    66. Quanto ao interesse e importância de uma interpretação teleológica, recordaremos desde logo as conclusões do advogado-geral P. Léger, acima referidas , onde pode ler-se:

    «Um exame atento da vossa jurisprudência mostra que a interpretação designada de teleológica não é um instrumento utilizado em todas as circunstâncias pelo Tribunal de Justiça.

    [...]

    A referência à finalidade prosseguida pelo texto comunitário é muitas vezes utilizada para confirmar a redacção da disposição em causa. Destina-se a corroborar o sentido de uma disposição que, sem ser sempre absolutamente clara e unívoca, deixa geralmente uma ligeira margem de dúvida. O recurso à letra e o recurso à finalidade das regras comunitárias preenchem assim uma função complementar no processo de interpretação.

    A interpretação teleológica desempenha, ao invés, um papel primordial quando o texto em causa é difícil de interpretar unicamente a partir da sua redacção. Tal acontece quando a disposição controvertida é ambígua [...]

    No caso em apreço, [...] a disposição é clara e precisa. Por este motivo, não necessita, de um ponto de vista puramente interpretativo, de nenhuma confirmação nem de nenhum esclarecimento que exigiria que se apurasse o objectivo prosseguido pelo diploma no qual se insere ».

    67. Tendo em conta a ausência de ambiguidade das disposições em causa, não se nos afigura, assim, necessário averiguar a respectiva ratio legis. Aliás, é apenas a título subsidiário que analisaremos esta questão.

    68. Não vemos problemas em reconhecer que a Comissão não esclareceu em que sentido o Regulamento n.° 2372/95 procedeu a «uma maior flexibilidade dos mecanismos e obrigações de revenda das existências de intervenção» (quarto considerando). Também não demonstrou quais eram os «encargos excessivos» que o sistema de garantia instituído evitou que fossem impostos aos operadores. O exemplo do montante da garantia não é, evidentemente, convincente, uma vez que esta é mais elevada do que a relativa às exportações ordinárias.

    69. Dito isto, há que notar que o objectivo principal do Regulamento n.° 2372/95 não é flexibilizar determinados mecanismos ou evitar determinados encargos, mas sim garantir que o trigo chegue ao destino dentro de um prazo razoável, e isto por duas razões.

    70. Por outro lado, os fornecimentos em causa tinham por objecto proporcionar aos Estados ACP destinatários as quantidades significativas de trigo de que tinham necessidade, podendo supor-se que tinham necessidade dessas quantidades muito rapidamente mesmo que não estejamos perante uma operação de auxílio alimentar de urgência.

    71. Por outro lado, o segundo considerando do Regulamento n.° 2372/95 conclui que, «atendendo à situação desses mercados, é necessário abrir um concurso específico destinado a garantir o acesso dos utilizadores desses países ao trigo mole panificável em condições adequadas à situação de forte concorrência existente no mercado mundial». Os preços a que foram atribuídos os lotes situam-se, assim, num contexto económico preciso e os fornecimentos deviam, por isso, ocorrer durante o período em que esse contexto se mantinha.

    72. Consideramos que se trata aqui de razões válidas que puderam legitimamente levar a Comissão a sujeitar «[a] obrigação de exportação, bem como de importação nos países destinatários» (artigo 8.° , n.° 2, do Regulamento n.° 2372/95), a um prazo rigoroso e a garantir a observância desse prazo através do depósito de uma caução relativamente elevada.

    73. A Glencore ainda não apresentou ao Tribunal os contratos que celebrou com os países de destino e que, nos termos do artigo 4.° do Regulamento n.° 2372/95, deveriam ter sido comunicados ao organismo nacional de intervenção antes da data da primeira adjudicação. Estes contratos devem indicar o prazo de entrega. Ora, também nos termos do artigo 4.° , os referidos contratos apenas devem «dizer respeito às entregas a efectuar de Outubro de 1995 a Fevereiro de 1996».

    74. Estas regras não são impostas para as exportações «normais» efectuadas no âmbito do Regulamento n.° 2131/93, que tem por objectivo unicamente garantir que os cereais provenientes das existências dos organismos de intervenção sejam efectivamente exportados para países terceiros não identificados de outra forma e não escoados no mercado comunitário.

    75. Por outro lado, é de salientar que o Regulamento n.° 2131/93 não constitui a base jurídica do Regulamento n.° 2372/95. Não é referido entre os «vistos» deste regulamento. Ambos os regulamentos se situam ao mesmo nível. Têm os dois como base jurídica o artigo 5.° do Regulamento n.° 1766/92, que estabelece a organização comum de mercado no sector dos cereais.

    76. O artigo 2.° do Regulamento n.° 2372/95 esclarece desde logo, de forma bastante lógica, que o Regulamento n.° 2131/93 só é aplicável na medida em que o Regulamento n.° 2372/95 não disponha em contrário.

    77. Por último, para sermos exaustivos, observe-se que, do ponto de vista técnico, o regime em questão no presente processo apresenta muitas semelhanças com o das restituições diferenciadas, na medida em que a identidade do país destinatário desempenha um papel essencial num e noutro caso.

    78. Ora, no acórdão DAT-SCHAUB , o Tribunal de Justiça, após identificar as características específicas do regime em causa («resultando a diferenciação da restituição da vontade de se atender às características específicas de cada mercado de importação em que a Comunidade pretende desempenhar um papel»), extraiu daí as seguintes considerações:

    «Face a esta finalidade do regime das restituições diferenciadas, é essencial que os produtos subvencionados pela concessão de uma restituição cheguem efectivamente ao mercado de destino para aí serem comercializados [...].

    Assim, de acordo com o disposto no Regulamento n.° 3665/87, o pagamento das restituições está subordinado, no caso das restituições diferenciadas, à condição de o produto ter sido importado num país terceiro e de as formalidades de colocação no consumo terem sido cumpridas ».

    79. Chegamos, por isso, à conclusão de que a tomada em consideração da finalidade das disposições em causa de modo nenhum conduz a uma interpretação diferente da que resulta do respectivo teor.

    C - O princípio da proporcionalidade

    80. No órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente no processo principal afirmou que o montante considerável da garantia que foi considerada perdida contraria igualmente o princípio da proporcionalidade.

    81. A este respeito, deve, contudo, salientar-se que o artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento n.° 3665/87 permite expressamente ao operador apresentar a prova de um caso de força maior e que o n.° 4 da mesma disposição permite ao operador requerer a concessão de prazos suplementares. Como salientou a Comissão na audiência, a utilização do plural indica que podem ser concedidos sucessivamente vários prazos suplementares.

    82. Além disso, a Comissão salientou correctamente, nas suas observações escritas, que o artigo 22.° do Regulamento n.° 2220/85 prevê um sistema de sanções gradual para o caso de o cumprimento das obrigações principais não ocorrer nos prazos fixados. Assim, nos termos do n.° 3, primeiro parágrafo, a garantia é definitivamente perdida apenas em 15% quando a prova é apresentada dentro dos dezoito meses seguintes ao termo do prazo inicial. Apenas após o termo deste «prazo suplementar» é que a garantia é perdida na totalidade, em conformidade com o n.° 4. Com esta graduação, o artigo 22.° tem em conta os princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência sobre a proporcionalidade das sanções em caso de incumprimento dos prazos.

    83. Se o órgão jurisdicional de reenvio tivesse submetido ao Tribunal de Justiça a questão de saber se o regulamento deve ser considerado inválido por violar o princípio da proporcionalidade, o Tribunal deveria, em nosso entender, responder negativamente a essa questão.

    IV - Conclusão

    84. Tendo em conta as observações que antecedem, propomos que o Tribunal responda da forma seguinte à questão submetida pelo Verwaltungsgericht Frankfurt am Main:

    «O artigo 8.° , n.° 2, segundo parágrafo, segundo travessão, do Regulamento (CE) n.° 2372/95 da Comissão, de 10 de Outubro de 1995, relativo à abertura de concursos permanentes para a venda de trigo mole panificável na posse dos organismos de intervenção francês e alemão, destinado à exportação para determinados países ACP durante a campanha de 1995/1996, deve ser interpretado no sentido de que a prova da importação da mercadoria nos Estados ACP em causa, que é necessária para a liberação da garantia até 40 ecus por tonelada, deve ser apresentada, nos termos do artigo 47.° , n.° 2, do Regulamento (CEE) n.° 3665/87 da Comissão, de 27 de Novembro de 1987, que estabelece regras comuns de execução do regime das restituições à exportação para os produtos agrícolas, no prazo de doze meses seguinte ao dia da aceitação da declaração de exportação, a menos que o exportador tenha obtido um prazo suplementar para apresentar a prova exigida ou que se trate de um caso de força maior, em conformidade com o artigo 47.° , n.os 4 e 5, do último regulamento referido.»

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