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Document 62020CC0389

Conclusões do advogado-geral M. Szpunar apresentadas em 30 de setembro de 2021.
CJ contra Tesorería General de la Seguridad Social (TGSS).
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Contencioso-Administrativo n.° 2 de Vigo.
Reenvio prejudicial – Igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social – Diretiva 79/7/CEE – Artigo 4.°, n.° 1 – Proibição de qualquer discriminação em razão do sexo – Trabalhadores do serviço doméstico – Proteção contra o desemprego – Exclusão – Desvantagem específica para os trabalhadores do sexo feminino – Objetivos legítimos de política social – Proporcionalidade.
Processo C-389/20.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:777

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 30 de setembro de 2021 ( 1 )

Processo C‑389/20

CJ

contra

Tesorería General de la Seguridad Social (TGSS)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Vigo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Vigo, Espanha)]

«Reenvio prejudicial — Igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social — Diretiva 79/7/CEE — Artigo 4.o, n.o 1 — Proibição de qualquer discriminação em razão do sexo — Trabalhadores do serviço doméstico — Proteção contra o risco de desemprego — Exclusão — Desvantagem específica para as trabalhadoras do sexo feminino — Objetivos legítimos de política social — Proporcionalidade»

I. Introdução

1.

Como o Tribunal de Justiça já declarou: «[o] direito de não ser discriminado em razão do sexo constitui um dos direitos fundamentais da pessoa humana, cujo respeito incumbe ao Tribunal garantir» ( 2 ).

2.

Com o presente reenvio prejudicial, o Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Vigo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Vigo, Espanha) submete ao Tribunal de Justiça questões que têm por objeto, nomeadamente, a interpretação do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7/CEE ( 3 ), no contexto de uma disposição nacional nos termos da qual as prestações por desemprego são excluídas das prestações concedidas por um regime legal de segurança social a uma categoria de trabalhadores no seu conjunto. No caso em apreço, é a atividade dos trabalhadores do serviço doméstico, um grupo composto, na sua grande maioria, por pessoas do sexo feminino, que está no cerne das questões do órgão jurisdicional de reenvio.

3.

Existe aqui uma discriminação indireta, proibida pela Diretiva 79/7? É a esta questão que vou tentar responder nas presentes Conclusões.

II. Quadro jurídico

A. Direito da União

1.   Diretiva 79/7

4.

O segundo considerando da Diretiva 79/7 enuncia:

«Considerando que convém realizar o princípio da igualdade de tratamento em matéria de segurança social em primeiro lugar no que se refere aos regimes legais que asseguram uma proteção contra os riscos de doença, de invalidez, de velhice, de acidente de trabalho, de doença profissional e de desemprego bem como nas disposições relativas à assistência social na medida em que se destinem a completar os regimes acima referidos ou a substitui‑los;»

5.

O artigo 1.o desta diretiva prevê:

«A presente diretiva tem por objetivo a realização progressiva, no domínio da segurança social e de outros elementos de proteção social previsto no artigo 3.o, do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, a seguir denominado “princípio da igualdade de tratamento”.»

6.

O artigo 3.o, n.o 1, da referida diretiva dispõe:

«A presente diretiva aplica‑se:

a)

Aos regimes legais que assegurem uma proteção contra os seguintes riscos:

[…]

desemprego;

[…]»

7.

O artigo 4.o, n.o 1, da mesma diretiva enuncia:

«O princípio da igualdade de tratamento implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer direta, quer indiretamente por referência, nomeadamente, ao estado civil ou familiar especialmente no que respeita:

ao âmbito dos regimes e às condições de acesso aos regimes,

à obrigação de pagar as cotizações e ao cálculo destas,

[…]»

2.   Diretiva 2006/54/CE

8.

O artigo 1.o da Diretiva 2006/54 ( 4 ), sob a epígrafe «Objetivo», prevê:

«A presente diretiva visa assegurar a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no emprego e na atividade profissional.

Para o efeito, contém disposições de aplicação do princípio da igualdade de tratamento em matéria de:

a)

Acesso ao emprego, incluindo a promoção, e à formação profissional;

b)

Condições de trabalho, incluindo remuneração;

c)

Regimes profissionais de segurança social.

[…]»

9.

O artigo 2.o desta diretiva, sob a epígrafe «Definições», dispõe, no seu n.o 1:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

f)

“Regimes profissionais de segurança social”: os regimes não regulados pela Diretiva [79/7], que tenham por objetivo proporcionar aos trabalhadores, assalariados ou independentes, de uma empresa ou de um grupo de empresas, de um ramo de atividade económica ou de um setor profissional ou interprofissional, prestações destinadas a completar as prestações dos regimes legais de segurança social ou a substituir estas últimas, quer a inscrição nesses regimes seja obrigatória ou facultativa.»

B. Direito espanhol

1.   LGSS

10.

O artigo 251.o da Ley General de la Seguridad Social (Lei Geral da Segurança Social), na sua versão consolidada aprovada pelo Real Decreto Legislativo 8/2015 por el que se aprueba el texto refundido de la Ley General de la Seguridad Social (Real Decreto Legislativo 8/2015, que aprova o texto revisto da Lei Geral da Segurança Social), de 30 de outubro de 2015 ( 5 ) (a seguir «LGSS»), sob a epígrafe «Proteção conferida», dispõe:

«Os trabalhadores abrangidos pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico têm direito às prestações da segurança social nos termos e condições previstos no presente regime geral da segurança social, com as seguintes especificidades:

[…]

d)

A proteção conferida pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico não abrange a prestação de desemprego.»

11.

O artigo 264.o da LGSS, sob a epígrafe «Pessoas protegidas», prevê, no seu n.o 1:

«Estão abrangidos pela proteção contra o desemprego, desde que prevejam contribuições a esse título:

a)

os trabalhadores assalariados abrangidos pelo regime geral da segurança social;

b)

os trabalhadores assalariados abrangidos pelos regimes especiais de segurança social que cobrem esse risco, com as particularidades fixadas por via regulamentar;

[…]»

2.   Real Decreto n.o 625/1985

12.

O artigo 19.o do Real Decreto 625/1985, por el que se desarrolla la Ley 31/1984, de 2 de agosto, de Protección por Desempleo (Real Decreto 625/1985, relativo à aplicação da Lei 31/1984, de 2 de agosto de 1984, sobre a proteção no desemprego), de 2 de abril de 1985 ( 6 ) (a seguir «Decreto 625/1985»), sob a epígrafe «Contribuição», prevê, no seu n.o 1:

«São obrigados a contribuir a título do risco de desemprego todas as empresas e trabalhadores abrangidos pelo regime geral e pelos regimes especiais de segurança social que ofereçam proteção contra esse risco. A base de cálculo da contribuição para o risco de desemprego é a mesma que a prevista para acidentes de trabalho e doenças profissionais.»

III. Factos na origem do litígio no processo principal, questões prejudiciais e processo no Tribunal de Justiça

13.

CJ é empregada doméstica e trabalha para uma entidade patronal, pessoa singular. Desde janeiro de 2011, está inscrita no regime especial de segurança social aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico (a seguir «regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico»).

14.

Em 8 de novembro de 2019, CJ requereu à Tesorería General de la Seguridad Social (Tesouraria Geral da Segurança Social, a seguir «TGSS») autorização para proceder ao pagamento de contribuições relativas à proteção contra o risco de desemprego para adquirir o direito às prestações. O requerimento ia acompanhado do consentimento escrito da sua entidade patronal para o pagamento da contribuição pedida.

15.

Por decisão de 13 de novembro de 2019, a TGSS indeferiu o referido requerimento com o fundamento de que, estando CJ inscrita no regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico, a possibilidade de contribuir para este regime com vista a obter uma proteção contra o risco de desemprego estava expressamente excluída pelo artigo 251.o, alínea d), da LGSS. Esta decisão foi confirmada pela TGSS pela sua decisão de 19 de dezembro de 2019, tomada na sequência de um recurso hierárquico interposto por CJ.

16.

Em 5 de junho de 2020, CJ interpôs recurso da segunda decisão da TGSS para o Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Vigo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Vigo, Espanha), alegando, em substância, que esta disposição nacional (a seguir «disposição em causa no processo principal») coloca os trabalhadores do serviço doméstico numa situação de desproteção social quando o seu emprego cessa por razões que não lhes são imputáveis. Esta situação traduz‑se na impossibilidade de aceder não apenas à prestação de desemprego, mas também aos outros auxílios sociais subordinados à extinção do direito a essa prestação.

17.

Foi nestas condições que o Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Vigo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Vigo, Espanha), por Decisão de 29 de julho de 2020 que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 14 de agosto de 2020, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Devem o artigo 4.o, n.o 1, da [Diretiva 79/7], sobre igualdade de tratamento[,] que impede qualquer discriminação em razão do sexo, quer direta quer indiretamente, na obrigação de contribuição para a segurança social, e o artigo 5.o, alínea b), da [Diretiva 2006/54], que prevê uma proibição idêntica de discriminação direta ou indireta em razão do sexo, no que respeita ao âmbito dos regimes sociais e às condições de acesso aos regimes, bem como à obrigação de pagar as quotizações e ao cálculo destas;

ser interpretados no sentido de que se opõem a uma norma nacional como o artigo 251.o, alínea d), da [Ley General de la Seguridad Social (Lei Geral da Segurança Social)] […] “d) A proteção conferida pelo [regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico] não abrange a prestação de desemprego”?

2)

Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, deve a referida disposição ser considerada um exemplo de discriminação proibida, na aceção do artigo 9.o, n.o 1, alíneas e) e/ou k), da [Diretiva 2006/54], na medida em que as destinatárias da norma em causa, artigo 251.o, alínea d), [da] LGSS, são quase exclusivamente mulheres?»

18.

Foram apresentadas observações escritas pela TGSS, pelo Governo espanhol e pela Comissão Europeia. Foram apresentadas observações orais em nome de CJ, da TGSS, do Governo espanhol e da Comissão na audiência realizada em 30 de junho de 2021.

IV. Análise

A. Quanto à admissibilidade

19.

Nas suas observações escritas, a TGSS e o Governo espanhol põem em causa a admissibilidade do pedido de decisão prejudicial e das questões que este comporta.

20.

Antes de mais, a TGSS alega que o litígio no processo principal é artificial, na medida em que CJ recorreu ao órgão jurisdicional de reenvio com base em fundamentos falaciosos. Com efeito, o litígio não diz respeito a um alegado direito a contribuir, mas ao reconhecimento do direito de segurança social às prestações de desemprego.

21.

Em seguida, a TGSS e o Governo espanhol sustentam que esse reconhecimento é da competência das jurisdições sociais e que, consequentemente, o órgão jurisdicional de reenvio, enquanto jurisdição administrativa, não é competente para conhecer deste litígio. Por conseguinte, segundo este Governo, não existe nenhum nexo entre a solução do presente pedido de decisão prejudicial e a do litígio no processo principal.

22.

A TGSS sustenta igualmente que, no caso de o litígio no processo principal incidir efetivamente sobre o reconhecimento de um direito a contribuir, a interpretação da Diretiva 79/7 não é necessária para permitir ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se sobre esse pedido. Com efeito, a questão do alcance da ação protetora do regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico é distinta da questão do financiamento deste regime.

23.

Por último, sem suscitar expressamente uma exceção de inadmissibilidade, o Governo espanhol afirma que a Diretiva 79/7 não é aplicável ao litígio em causa no processo principal. Além disso, alega que as questões prejudiciais devem ser declaradas inadmissíveis na medida em que têm por objeto a Diretiva 2006/54. Sem suscitar formalmente uma exceção de inadmissibilidade, a Comissão salienta, também, que esta última diretiva não é aplicável ao caso em apreço.

24.

Considero que, com exceção do relativo à Diretiva 2006/54, estes argumentos devem ser rejeitados.

25.

Em primeiro lugar, quanto à alegação de que o litígio no processo principal é artificial e as questões prejudiciais hipotéticas, há que recordar que as questões prejudiciais relativas ao direito da União gozam de uma presunção de pertinência ( 7 ).

26.

O órgão jurisdicional de reenvio indica que este litígio tem por objeto o reconhecimento, aos trabalhadores do serviço doméstico, do direito de segurança social às prestações de desemprego. Com efeito, através do seu recurso, CJ contesta o indeferimento de um pedido de contribuição para cobrir o risco de desemprego, não enquanto exercício de um pretenso direito a contribuir, mas tendo em vista adquirir o direito às prestações de desemprego. Resulta da decisão de reenvio que este indeferimento se baseia numa decisão de política legislativa que consiste em recusar aos trabalhadores do serviço doméstico a possibilidade de acesso às prestações sociais de desemprego ( 8 ). Assim, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que o artigo 251.o, alínea d), da LGSS, que dá execução a esta decisão, se aplica a um grupo de trabalhadores abrangidos pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico composto quase exclusivamente por mulheres, esta disposição é, no que respeita ao âmbito de aplicação de um regime legal de segurança social, suscetível de constituir uma discriminação indireta em razão do sexo, proibida pela Diretiva 79/7.

27.

Na medida em que a decisão de reenvio contém amplos esclarecimentos sobre a pertinência das questões submetidas, o Tribunal de Justiça não pode, na minha opinião, rejeitar o pedido de decisão prejudicial com o fundamento de que é manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal ( 9 ).

28.

Em segundo lugar, a alegação de que o órgão jurisdicional de reenvio não é competente, ao abrigo das regras do direito nacional, para apreciar este litígio, na medida em que o mesmo diz respeito ao reconhecimento do direito de segurança social às prestações de desemprego e, portanto, é da competência das jurisdições sociais, não pode bastar para conduzir à inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial, na medida em que não compete ao Tribunal de Justiça pôr em causa a apreciação, pelo órgão jurisdicional de reenvio, das regras nacionais de organização e de processo judiciais ( 10 ). Com efeito, este deve ater‑se à decisão de reenvio que emana de um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro, enquanto tal decisão não tiver sido revogada no quadro das vias processuais previstas eventualmente pelo direito nacional ( 11 ). A este respeito, recordo que, no que respeita à interpretação das disposições do direito nacional, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a basear‑se nas qualificações resultantes da decisão de reenvio, uma vez que, segundo jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça não tem competência para interpretar o direito interno de um Estado‑Membro ( 12 ).

29.

Em terceiro e último lugar, quanto ao argumento segundo o qual as questões prejudiciais não são admissíveis, baseado na pretensa inaplicabilidade das Diretivas 79/7 e 2006/54 ao litígio no processo principal, há que declarar que, na medida em que este litígio diz respeito, como indica o órgão jurisdicional de reenvio, à existência de uma alegada discriminação indireta em razão do sexo, a Diretiva 79/7 é aplicável ao litígio no processo principal. Com efeito, esta discriminação diz respeito ao âmbito de aplicação do regime legal espanhol de segurança social que assegura uma proteção contra, nomeadamente, o risco de desemprego.

30.

Em contrapartida, a Diretiva 2006/54 não é aplicável no caso em apreço. Com efeito, resulta do artigo 1.o desta diretiva que esta visa assegurar a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no emprego e na atividade profissional, e contém disposições de aplicação deste princípio em matéria, nomeadamente, de condições de trabalho, incluindo as remunerações. Não podem ser incluídos nos conceitos de «condições de trabalho» e «remunerações» os regimes ou as prestações de segurança social, como a prestação de desemprego, diretamente regulados pela lei, em que não tenha havido nenhum elemento de concertação no âmbito da empresa ou do ramo profissional interessado e obrigatoriamente aplicáveis a categorias gerais de trabalhadores ( 13 ). Além disso, decorre da leitura conjugada do artigo 1.o, segundo parágrafo, alínea c), e do artigo 2.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2006/54 que esta não se aplica aos regimes legais, mas aos regimes profissionais de segurança social.

31.

À luz destas observações, considero que a segunda questão prejudicial deve ser julgada inadmissível. No entanto, proponho ao Tribunal de Justiça que considere que o presente pedido de decisão prejudicial é admissível.

B. Quanto ao mérito

1.   Reformulação da primeira questão prejudicial

32.

Pelas razões expostas no n.o 30 das presentes Conclusões, proponho ao Tribunal de Justiça que responda apenas à primeira questão prejudicial, mas reformulando a sua redação.

33.

Com efeito, o Tribunal de Justiça é essencialmente interrogado sobre se o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional que exclui das prestações concedidas por um regime legal de segurança social os trabalhadores do serviço doméstico, quando se verifique que esses trabalhadores são quase exclusivamente mulheres.

34.

Para propor uma resposta útil a esta questão, analisarei, em primeiro lugar, se a disposição em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 79/7 (secção 2). Na medida em que se afigure que as prestações por desemprego são abrangidas por esta diretiva, examinarei, em segundo lugar, se a exclusão dessas prestações das prestações concedidas pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico prevista no artigo 251.o, alínea d), da LGSS constitui, como sugere o órgão jurisdicional de reenvio, uma discriminação indireta em razão do sexo, proibida por esta diretiva (secção 3).

2.   A disposição em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 79/7?

35.

Tendo em conta as considerações formuladas no âmbito da análise da admissibilidade do pedido prejudicial, serei breve no que respeita a esta questão.

36.

Em primeiro lugar, saliento que, com o seu recurso, CJ contesta o indeferimento pela TGSS do seu pedido de contribuição para cobrir o risco de desemprego com vista a adquirir o direito às prestações. Em segundo lugar, devo sublinhar que estas prestações estão abrangidas pelo âmbito de aplicação material da Diretiva 79/7, na medida em que se inscrevem no quadro de um regime legal de proteção contra um dos riscos enumerados no artigo 3.o, n.o 1, alínea a), desta diretiva ( 14 ).

37.

Por conseguinte, considero que a disposição em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação material da Diretiva 79/7.

3.   A exclusão das prestações de desemprego das prestações concedidas pelo regime especial de segurança social aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico, prevista pela disposição em causa no processo principal, constitui uma discriminação indireta em razão do sexo na aceção da Diretiva 79/7?

38.

O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à compatibilidade do artigo 251.o, alínea d), da LGSS com o direito da União. Com efeito, o grupo de trabalhadores abrangidos pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico é constituído quase exclusivamente por pessoas do sexo feminino. Por conseguinte, esta disposição constitui uma discriminação indireta em razão do sexo, na medida em que recusa às mulheres pertencentes a este grupo a possibilidade de acederem à prestação social de desemprego, impedindo‑as de contribuir para cobrir esse risco.

39.

As partes no processo principal e os interessados estão divididos quanto à questão de saber se existe tal discriminação indireta em relação aos trabalhadores do serviço doméstico. O Governo espanhol alega que a diferença de tratamento que consiste na exclusão da proteção contra o risco de desemprego do regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico não constitui uma discriminação indireta em razão do sexo. A TGSS não nega a existência dessa discriminação mas considera‑a justificada e sustenta que a disposição nacional em causa no processo principal é proporcionada ( 15 ). Quanto à Comissão, alega que esta disposição é manifestamente constitutiva de uma discriminação indireta e tem dúvidas tanto sobre certas razões da justificação como sobre a proporcionalidade.

40.

Para determinar se a disposição em causa no processo principal constitui uma discriminação indireta em razão do sexo na aceção da Diretiva 79/7, abordarei, antes de mais, a questão de saber se esta disposição institui uma desigualdade de tratamento de facto em razão do sexo. Examinarei em seguida se tal desigualdade pode ser objetivamente justificada ao abrigo das disposições da Diretiva 79/7 e, por último, se for caso disso, se é proporcionada.

a)   A disposição em causa no processo principal instaura uma desigualdade de tratamento em razão do sexo?

41.

Antes de mais, recordo que o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que, no exercício da sua competência para organizar os seus regimes de segurança social e para determinar, na falta de harmonização a nível da União, as condições de concessão das prestações em matéria de segurança social, os Estados‑Membros devem respeitar o direito da União ( 16 ).

42.

Em conformidade com o artigo 1.o da Diretiva 79/7, esta tem por objetivo a realização progressiva, no domínio da segurança social e de outros elementos de proteção social previsto no artigo 3.o, do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social ( 17 ). O artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva precisa que «[o] princípio da igualdade de tratamento implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer direta, quer indiretamente […], especialmente no que respeita ao âmbito dos regimes e às condições de acesso aos regimes».

43.

Daqui resulta que o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, que aplica o princípio da não discriminação em razão do sexo em matéria de segurança social, deve ser respeitado pelos Estados‑Membros quando exercem a sua competência em matéria de segurança social e, em especial, de prestações de desemprego.

1) Quanto ao argumento do Governo espanhol relativo à não comparabilidade das situações

44.

Antes de mais, recordo que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma discriminação consiste na aplicação de regras diferentes a situações comparáveis ou da aplicação da mesma regra a situações diferentes ( 18 ). A este respeito, importa precisar que, para efeitos dos objetivos do direito social da União, o conceito de discriminação indireta está, antes de mais, relacionado com o tratamento diferente de situações comparáveis ( 19 ).

45.

O Governo espanhol considera, com base no Acórdão MB (Mudança de sexo e pensão de reforma) ( 20 ), que a situação dos trabalhadores do serviço doméstico não é comparável à dos outros trabalhadores do regime geral e, consequentemente, que não há discriminação indireta em razão do sexo.

46.

Este argumento não me convence. Não só há que constatar que as duas situações em causa são comparáveis do ponto de vista dos direitos às prestações de desemprego como o Governo espanhol, ao fazer referência a este acórdão, parece confundir os conceitos de «discriminação direta» e de «discriminação indireta» ( 21 ).

47.

Recordo que resulta da decisão de reenvio que a disposição em causa no processo principal não constitui uma discriminação direta mas uma discriminação indireta em razão do sexo, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7. Contrariamente ao processo que deu origem ao Acórdão MB (Mudança de sexo e pensão de reforma) ( 22 ), resulta da presente decisão de reenvio que a disposição em causa no processo principal está formulada de forma neutra. Com efeito, esta disposição aplica‑se indistintamente aos trabalhadores do serviço doméstico de um ou de outro sexo e, portanto, não constitui uma discriminação direta em razão do sexo que possa ser posta em causa pela não comparabilidade da situação dos trabalhadores do serviço doméstico com a de outros trabalhadores ( 23 ).

48.

Por conseguinte, há que rejeitar o argumento do Governo espanhol.

2) Quanto à existência de uma desvantagem específica para as pessoas de um sexo em relação a pessoas do outro sexo

49.

O Governo espanhol sustenta que a diferença de tratamento instituída pela cláusula de exclusão não acarreta um prejuízo para os trabalhadores em causa ( 24 ).

50.

Todavia, há que recordar, como uma parte da doutrina considerou, que a existência de um prejuízo não é uma condição da existência da discriminação indireta. Assim, mesmo que um prejuízo possa frequentemente ser indício de uma discriminação, o conceito de «discriminação» não implica, enquanto tal, a sua existência ( 25 ). Trata‑se, portanto, de saber se uma determinada medida nacional é suscetível de ter um «efeito prejudicial ou díspar» sobre pessoas pertencentes a um grupo relativamente ao efeito que tem sobre as pessoas pertencentes a outro grupo ( 26 ).

51.

Feita esta precisão, penso que o Governo espanhol quis dizer que a disposição em causa no processo principal não institui uma desvantagem específica para os trabalhadores do serviço doméstico.

52.

Não estou de acordo com este argumento. Pelo contrário, considero que a disposição em causa no processo principal institui uma desvantagem específica para os trabalhadores do serviço doméstico, como irei expor nas considerações que se seguem.

53.

Em primeiro lugar, saliento que a Diretiva 79/7 não define o conceito de «discriminação indireta» ( 27 ). Todavia, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que este conceito deve, no contexto desta diretiva, ser entendido da mesma maneira que no contexto da Diretiva 2006/54. Esta última define, no seu artigo 2.o, n.o 1, alínea b), o conceito de «discriminação indireta [em razão do sexo]» como a situação em «que uma disposição, critério ou prática, aparentemente neutro, seja suscetível de colocar pessoas de um determinado sexo numa situação de desvantagem comparativamente com pessoas do outro sexo» ( 28 ). Segundo o Tribunal de Justiça, a existência de tal desvantagem específica pode ser demonstrada, designadamente, se se provar que uma regulamentação como a que está em causa no processo principal afeta negativamente uma proporção significativamente maior de pessoas de um sexo do que de pessoas do outro sexo ( 29 ).

54.

A este respeito, recordo que a questão de saber se a utilização de um critério formalmente neutro constitui uma discriminação indireta depende das circunstâncias factuais do caso concreto ( 30 ). Por conseguinte, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, tendo em conta estas circunstâncias, se a disposição em causa no processo principal pode ser qualificada de «medida indiretamente discriminatória» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7.

55.

Neste contexto, os dados estatísticos desempenham um papel fundamental na verificação da existência de uma desvantagem de facto das pessoas de um sexo relativamente às pessoas do outro sexo. Todavia, incumbe ao órgão jurisdicional nacional apreciar a fiabilidade desses dados e se podem ser tomados em conta ( 31 ). Se este considerar que a cláusula de exclusão prevista pela disposição em causa no processo principal diz respeito a uma percentagem mais elevada de mulheres do que de homens, esta última constitui uma desigualdade de tratamento contrária ao artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7.

56.

Em segundo lugar, no caso em apreço, não parece resultar da decisão de reenvio nem das informações apresentadas na audiência que não existam dados estatísticos. Embora a disposição nacional em causa no processo principal não estabeleça uma distinção entre as pessoas dos dois sexos, as estatísticas fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio indicam, no entanto, que, dentro do grupo dos trabalhadores do serviço doméstico, as mulheres estão em desvantagem numa proporção esmagadora. Esse órgão jurisdicional indica que esses dados não foram de forma alguma contestados pela TGSS e que a disposição em causa no processo principal prejudica os trabalhadores do serviço doméstico ( 32 ).

57.

Para apreciar esses dados, recordo que resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, por um lado, que compete ao juiz nacional tomar em consideração o conjunto dos trabalhadores sujeitos à regulamentação nacional na qual a diferença de tratamento tem origem, neste caso, o artigo 251.o, alínea d), da LGSS, e, por outro, que o melhor método de comparação consiste em comparar as proporções respetivas de trabalhadores que são e que não são afetados pela pretensa diferença de tratamento, entre a mão‑de‑obra feminina abrangida pelo âmbito de aplicação desta regulamentação e as mesmas proporções entre a mão‑de‑obra masculina abrangida ( 33 ).

58.

Se se aplicar este método no presente processo, por um lado, há que ter em conta não apenas os inscritos no regime especial da segurança social aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico, mas também o conjunto dos trabalhadores sujeitos ao regime geral da segurança social espanhol, incluindo os que se enquadram nos regimes especiais, no qual esses inscritos estão integrados, na medida em que a regulamentação em causa no processo principal contribui para definir o âmbito de aplicação pessoal das prestações aplicáveis a todos os inscritos no regime geral, a saber, as prestações de desemprego ( 34 ).

59.

A este respeito, resulta do artigo 264.o, n.o 1, da LGSS que todos os trabalhadores por conta de outrem sujeitos ao regime geral da segurança social têm, em princípio, direito às prestações de desemprego. Com efeito, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça na audiência, a TGSS explicou que, em 31 de maio de 2021, em Espanha, 15872720 trabalhadores por conta de outrem estavam abrangidos por esse regime geral. Neste grupo, a proporção de homens e mulheres era mais ou menos similar, a saber, respetivamente, 51,04 % e 48,96 % ( 35 ), e 14259814 trabalhadores contribuíam para o risco de desemprego, ao passo que 1612906 não o faziam.

60.

Por outro lado, a TGSS precisou na audiência que, no que respeita ao regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico, do qual faziam parte, na mesma data, 384175 trabalhadores por conta de outrem, a proporção de homens e mulheres difere muito. Mais precisamente, o órgão jurisdicional de reenvio indica que as mulheres representam quase 100 % dos trabalhadores abrangidos por este regime. A este respeito, a TGSS indicou igualmente na audiência, no que respeita aos dados relativos a essa mesma data, que o grupo dos trabalhadores do serviço doméstico era representado por 17171 homens e 366991 mulheres. Resulta destes dados que, na data em causa, esse grupo era composto por 95,53 % de mulheres.

61.

As estatísticas apresentadas no órgão jurisdicional de reenvio e confirmadas pela TGSS na audiência evidenciam que a cláusula de exclusão em causa no processo principal afeta negativamente uma proporção significativamente maior dos trabalhadores do serviço doméstico do sexo feminino do que do sexo masculino.

62.

Considero, portanto, que, se o órgão jurisdicional de reenvio, com base nos dados estatísticos que acabo de examinar e, sendo caso disso, em outros elementos pertinentes, chegar à conclusão de que a disposição em causa no processo principal coloca especialmente em desvantagem os trabalhadores do serviço doméstico do sexo feminino, há que considerar que esta disposição é contrária ao artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, a menos que seja justificada por fatores objetivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo ( 36 ).

63.

Por conseguinte, importa agora analisar a questão de saber se a desigualdade de tratamento instituída pela disposição em causa no processo principal em detrimento dos trabalhadores do serviço doméstico do sexo feminino pode ser objetivamente justificada à luz do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7 ( 37 ).

b)   A desigualdade de tratamento instituída pela disposição em causa no processo principal pode ser objetivamente justificada à luz das disposições da Diretiva 79/7?

64.

Nas suas observações escritas, a TGSS e o Governo espanhol alegam, nomeadamente, que a diferença de tratamento em relação aos trabalhadores do serviço doméstico é justificada por objetivos baseados nas características específicas desta categoria de trabalhadores e no estatuto dos seus empregadores, bem como em objetivos de proteção dos trabalhadores, de salvaguarda do nível de emprego neste setor e de luta contra o trabalho ilegal e a fraude.

65.

Coloca‑se, portanto, a questão de saber se estes motivos são objetivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo. Segundo o Tribunal de Justiça, é esse o caso quando os meios escolhidos responderem a um objetivo legítimo de política social, forem aptos para atingir o objetivo prosseguido pela legislação em causa e necessários para esse efeito ( 38 ). Além disso, esses meios só são adequados para garantir o objetivo invocado se responderem verdadeiramente à preocupação de o atingir e se forem aplicados de modo coerente e sistemático ( 39 ).

1) Quanto à fiscalização da legitimidade do objetivo de política social a que responde a cláusula de exclusão prevista pela disposição em causa no processo principal

66.

Em primeiro lugar, recordo que os objetivos de política social são geralmente considerados pelo Tribunal de Justiça como objetivos de interesse geral legítimos. A proteção contra o risco de desemprego faz parte integrante da política social da competência dos Estados‑Membros.

67.

Nomeadamente, no contexto da igualdade de tratamento em matéria de emprego e de trabalho, o Tribunal de Justiça já declarou que a promoção da contratação constitui incontestavelmente um objetivo legítimo de política social ( 40 ). Em especial, no que respeita ao artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, o Tribunal de Justiça aceitou como fundamento objetivo justificativo, tendo em conta o acesso a um regime legal de seguro de desemprego, a luta contra o aumento dos empregos ilegais e das manobras para contornar a lei ( 41 ).

68.

Neste contexto, o Tribunal de Justiça admitiu por vezes que os Estados‑Membros dispõem «de uma margem de apreciação razoável» no que respeita à natureza das medidas de proteção social e às modalidades concretas da sua realização ( 42 ), ao passo que, nessas decisões mais recentes, indicou que estes dispõem «de uma larga margem de apreciação» ( 43 ). Em especial, no âmbito das discriminações indiretas em razão do sexo, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, o Tribunal de Justiça declarou que, ao escolherem as medidas suscetíveis de realizar os objetivos da sua política social e de emprego, os Estados‑Membros dispõem de uma ampla margem de apreciação ( 44 ).

69.

Há que salientar que esta jurisprudência do Tribunal de Justiça foi objeto de críticas por parte da doutrina, que lhe censura esta mudança de abordagem ( 45 ). Feita esta precisão, sublinho que, independentemente do facto de a tónica ser colocada no caráter «razoável» ou «amplo» da margem de apreciação dos Estados‑Membros na escolha das medidas suscetíveis de realizar os objetivos da sua política social, o Tribunal de Justiça declarou, no entanto, que esta margem de apreciação não pode ter por efeito esvaziar de conteúdo a aplicação de um princípio fundamental do direito da União como o da igualdade de tratamento ( 46 ).

70.

Neste contexto, recordo que, para que uma diferença de tratamento não seja constitutiva de uma discriminação indireta, deve ser justificada por fatores objetivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo ( 47 ). É certo que, como já referi ( 48 ), o Tribunal de Justiça considera que é esse o caso, nomeadamente, quando os meios escolhidos responderem a um objetivo legítimo da política social do Estado‑Membro cuja legislação está em causa, forem aptos para atingir o objetivo prosseguido por esta e necessários para esse efeito ( 49 ). Assim, por um lado, é ao Estado‑Membro que incumbe demonstrar que a regulamentação em causa responde a um objetivo legítimo e que este último é alheio a qualquer discriminação em razão do sexo, e, por outro, é ao órgão jurisdicional de reenvio que cabe determinar se, e em que medida, a disposição legislativa em causa se justifica por esse fator objetivo, sendo o Tribunal de Justiça competente para fornecer indicações, retiradas dos autos do processo principal e das observações escritas e orais que lhe foram apresentadas, suscetíveis de permitir ao órgão jurisdicional nacional decidir ( 50 ).

71.

Quanto à identificação dos objetivos prosseguidos pelo regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico, não se pode contestar que os fundamentos apresentados pelo Governo espanhol e pela TGSS relativos à promoção do recrutamento e à salvaguarda dos níveis de emprego, bem como à proteção de trabalhadores, à luta contra o trabalho ilegal e à fraude social, constituem objetivos legítimos de política social. Todavia, importa recordar que, no âmbito de uma discriminação indireta, a justificação objetiva não pode consistir unicamente em enumerar uma série de objetivos de política social que parecem, à primeira vista, legítimos: estes objetivos deverão ser alheios a qualquer discriminação em razão do sexo ( 51 ). A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que simples afirmações generalistas não são suficientes para evidenciar que o objetivo de uma regra nacional é alheio a qualquer discriminação em razão do sexo ( 52 ). Por conseguinte, importa ainda verificar o caráter objetivamente alheio a qualquer discriminação em razão do sexo dos motivos de política social alegados pelo Governo espanhol e pela TGSS.

2) Quanto à verificação do caráter objetivamente alheio a qualquer discriminação em razão do sexo dos motivos invocados

72.

No que respeita ao objetivo de justificação relativo às características do ramo de atividade dos trabalhadores do serviço doméstico e da salvaguarda do nível de emprego, nas suas observações escritas, o Governo espanhol sustenta, por um lado, que o ramo de atividade dos trabalhadores do serviço doméstico é tradicionalmente sensível aos encargos que podem resultar das obrigações administrativas e dos custos laborais da segurança social para os empregadores (chefes de família) e para os trabalhadores e, por outro, que se trata de um setor que tem historicamente uma elevada taxa de emprego. Isto justifica a exclusão da cobertura de um risco como o do desemprego, que tem uma menor incidência para esse grupo de trabalhadores.

73.

A TGSS invocou como justificação possível da limitação da ação protetora da segurança social relativamente aos trabalhadores do serviço doméstico o estatuto diferente dos seus empregadores, que não são empresários que exploram uma unidade de produção clássica mas chefes de família do agregado familiar ( 53 ). Além disso, a TGSS sublinha, nas suas observações escritas, que, na medida em que a atividade desses trabalhadores exige poucas qualificações e é, portanto, geralmente remunerada com o salário mínimo, poderia ser «mais cómodo» para esses trabalhadores aceder à proteção contra o risco de desemprego do que continuar a prestar os seus serviços, ou alternar períodos de trabalho efetivo e descanso recebendo o seguro de desemprego, com um efeito de incentivo à fraude.

74.

Quanto ao objetivo de justificação assente na luta contra o trabalho ilegal e a fraude, o Governo espanhol sustenta, nas suas observações escritas, que a exclusão do regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico da proteção contra o risco de desemprego se justifica pelo objetivo legítimo de evitar encargos e custos sociais que agravam o problema do trabalho ilegal e, portanto, a vulnerabilidade desses trabalhadores. Além disso, as especificidades da relação de trabalho dos trabalhadores do serviço doméstico originam dificuldades suplementares na verificação de certas condições essenciais para o acesso à prestação de desemprego, como o caráter involuntário da cessação do trabalho ou a dificuldade de proceder a fiscalizações e a inspeções para verificar a existência de situações de incompatibilidade ou de fraude, devido à inviolabilidade do domicílio dos empregadores, local de trabalho desses trabalhadores.

75.

Nesse contexto, o Governo espanhol e a TGSS indicam que a eventual inclusão da proteção contra o risco de desemprego neste regime especial implicaria necessariamente um aumento das contribuições, o que poderia implicar um aumento do trabalho ilegal, sem inscrição nem pagamento de contribuições para a segurança social, tendo por efeito uma menor proteção dos trabalhadores abrangidos pelo referido regime.

76.

Como indiquei no n.o 67 das presentes Conclusões, estes objetivos de política social, que examinarei conjuntamente, são, em princípio, objetivos legítimos ( 54 ). Confesso, no entanto, ter dúvidas quanto ao caráter não discriminatório desses objetivos, pelas seguintes razões.

77.

Em primeiro lugar, basta salientar que os regimes de segurança social se baseiam frequentemente num modelo de família no qual se considera que a pessoa de sexo masculino, à qual é atribuída oficiosamente a qualidade de chefe de família, exerce uma atividade profissional e suporta todos os encargos ligados ao seu agregado familiar ( 55 ). Por esta razão, há que examinar, quando da análise da «justificação objetiva», se certos objetivos de política social invocados para justificar a diferença de tratamento das pessoas do sexo feminino estão assentes em papéis estereotipados ou em estereótipos de género que podem estar na origem de discriminações indiretas ou sistémicas ( 56 ). Este modelo, no qual perduram estereótipos sobre o papel dos homens e das mulheres na sociedade ( 57 ), já não corresponde à realidade da sociedade na Europa. Com efeito, as mulheres integram hoje o mercado de trabalho a todos os níveis, a situação das mães e dos pais tende a ser comparável no que respeita à parentalidade e à educação dos filhos ( 58 ), ou há novas formas de estruturas familiares, nomeadamente as famílias monoparentais, que já não correspondem ao modelo clássico de família.

78.

Em segundo lugar, como sustentou a doutrina, uma conceção da igualdade entre as pessoas dos dois sexos que consolida o modelo tradicional da especialização dos papéis masculinos e femininos tem por efeito, por um lado, ignorar a segregação profissional e a situação desfavorável das pessoas do sexo feminino no mercado de trabalho, «autorizando a manutenção das desigualdades entre os trabalhadores típicos e atípicos nos sistemas de segurança social» ( 59 ). Por outro lado, «as pessoas que não adotem o modelo tradicional de atividade profissional, nomeadamente os trabalhadores “atípicos”, são então concebidas como economicamente dependentes de um trabalhador “típico” ( 60 ). Esta conceção da igualdade legitima a manutenção e o desenvolvimento de formas múltiplas de “familialização dos direitos”» ( 61 ).

79.

Neste contexto, podemos admitir que os objetivos examinados são alheios a qualquer discriminação em razão do sexo?

80.

Penso que não.

81.

Em primeiro lugar, os motivos baseados nas características dos trabalhadores do serviço doméstico (trabalhadores pouco qualificados e remunerados com o salário mínimo) ou nas dos seus empregadores (chefe de família) parecem, pelo contrário, basear‑se em estereótipos de género e, portanto, dificilmente alheios a uma discriminação assente no sexo ( 62 ). A TGSS afirma que, se os trabalhadores do serviço doméstico estivessem protegidos contra o risco de desemprego, seria «mais cómodo» para esses trabalhadores «alternar períodos de trabalho efetivo e descanso recebendo o seguro de desemprego, com um efeito de incentivo à fraude». Se esse efeito se verificasse tendo em conta essas características, então, logicamente, todos os trabalhadores pouco qualificados e remunerados com o salário mínimo do mercado de trabalho dos outros setores deveriam igualmente ser excluídos da prestação de desemprego. Ora, não é esse o caso ( 63 ). Por conseguinte, na minha opinião, não existe uma relação entre os motivos justificativos invocados pela TGSS e a exclusão dos trabalhadores do serviço doméstico das prestações de desemprego pela disposição em causa no processo principal.

82.

Em segundo lugar, o Governo espanhol justifica esta exclusão pelo objetivo de salvaguarda do nível de emprego da categoria de atividade dos trabalhadores do serviço doméstico, fazendo referência, por um lado, à incidência mínima que teria o desemprego sobre este grupo de trabalhadores, constituído maioritariamente por pessoas do sexo feminino, e, por outro, ao facto de, em seu entender, a eventual inclusão da proteção contra o desemprego no regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico implicar necessariamente um aumento das contribuições e, portanto, o aumento do trabalho ilegal. Ora, esta exclusão conduz, em minha opinião, ao reforço da conceção social tradicional dos papéis permitindo, além disso, não só explorar a posição estruturalmente mais fraca das pessoas que integram o setor dos trabalhadores do serviço doméstico, mas também subestimar o valor do trabalho dos trabalhadores deste setor ( 64 ), que deveria, pelo contrário, ser reconhecido e valorizado pela sociedade.

83.

Tendo em conta estas considerações, considero que os objetivos invocados pelo Governo espanhol e pela TGSS, relativos à salvaguarda do nível de emprego no setor dos trabalhadores do serviço doméstico e às características deste setor ou à luta contra o trabalho ilegal, não são alheios a qualquer discriminação em razão do sexo e, portanto, não podem justificar uma discriminação em detrimento de pessoas do sexo feminino.

84.

No entanto, no caso de o Tribunal de Justiça considerar que a cláusula de exclusão prevista pela disposição em causa no processo principal responde a objetivos legítimos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo, vou examinar a questão de saber se esta cláusula é adequada para atingir o objetivo prosseguido pela disposição em causa no processo principal e necessária para esse efeito ( 65 ).

c)   A disposição em causa no processo principal é proporcionada?

1) Quanto à aptidão e à necessidade

85.

Como indicou o Tribunal de Justiça, não é desrazoável as autoridades nacionais de um Estado‑Membro considerarem que uma medida concreta possa ser apropriada e necessária para atingir os objetivos alegados para efeitos de proteção social dos trabalhadores ( 66 ). Contudo, uma medida como a que está em causa no processo principal, que exclui uma determinada categoria de trabalhadores, neste caso os trabalhadores do serviço doméstico, das prestações de desemprego, pode ser considerada apropriada e necessária?

86.

Recordo que resulta da jurisprudência constante do Tribunal que simples generalizações a respeito da aptidão de uma determinada medida para a salvaguarda do emprego e a luta contra o trabalho ilegal não bastam para demonstrar que o objetivo da disposição em causa no processo principal é alheio a qualquer discriminação em razão do sexo nem para dar elementos que permitam razoavelmente concluir que a referida medida é adequada à realização desse objetivo ( 67 ).

87.

Coloca‑se, portanto, a questão de saber se a cláusula de exclusão em causa no processo principal pode ser considerada uma medida adequada para garantir esses objetivos de política social ( 68 ). Para tal, a referida cláusula deve responder verdadeiramente à preocupação de atingir esse objetivo e deve ser aplicada de modo coerente e sistemático ( 69 ).

88.

Por um lado, tenho dúvidas quanto à capacidade da cláusula em causa para prosseguir os objetivos legítimos invocados, pelas razões expostas nos n.os 77 a 82 das presentes Conclusões.

89.

Por outro lado, no que respeita à exigência relativa à aplicação coerente e sistemática dessa cláusula, considero que o órgão jurisdicional de reenvio pode verificar os aspetos seguintes.

90.

Em primeiro lugar, importa observar que resulta das observações orais de CJ que a única categoria de trabalhadores excluída da proteção contra o risco de desemprego é a dos trabalhadores do serviço doméstico.

91.

A este respeito, a TGSS indicou na audiência que estão igualmente excluídas da proteção contra o risco de desemprego pessoas abrangidas por outras categorias de atividades, nas quais a proporção das pessoas de um e outro sexo é semelhante, como os participantes nos programas de formação e os parlamentares. Sublinhou igualmente que as pessoas que pertencem a determinados grupos que não contribuem a título de desemprego, como os gerentes e/ou os administradores de sociedades comerciais, profissionais ou equiparadas, bem como os ministros do culto, são, na maioria, homens. Por razões óbvias, os exemplos dados não são pertinentes ( 70 ).

92.

Em segundo lugar, resulta das observações do Governo espanhol que o regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico cobre os riscos profissionais relativos aos acidentes de trabalho e às doenças profissionais. Por conseguinte, há que verificar se o risco de fraude ou a dificuldade de proceder a fiscalizações são efetivamente mais importantes no que respeita às prestações de desemprego, excluídas para os trabalhadores do serviço doméstico, do que no que respeita às outras prestações reconhecidas a esses trabalhadores ( 71 ).

93.

Em terceiro lugar, partilho da opinião da Comissão segundo a qual há que examinar a severidade da medida escolhida para lutar contra o trabalho ilegal e a fraude. Com efeito, observo que a exclusão absoluta de uma categoria de trabalhadores, como os trabalhadores do serviço doméstico, da proteção contra o risco de desemprego, enquanto medida de «proteção social», não parece beneficiar esses trabalhadores. Por conseguinte, tenho dificuldade em observar de que modo uma cláusula de exclusão, como a que está em causa no processo principal, que pretende lutar contra o trabalho ilegal, mas que parece agravar a situação de desproteção social desta categoria de trabalhadores, pode ser considerada coerente. Seria diferente uma medida de luta contra o trabalho ilegal destinada a controlar a obtenção fraudulenta das prestações de desemprego, que seria coerente com o objetivo de proteção social dos trabalhadores do serviço doméstico e não penalizaria os trabalhadores do serviço doméstico ( 72 ).

94.

Em quarto lugar, no que respeita, em especial, ao nexo que a TGSS estabeleceu entre o aumento das contribuições e o trabalho ilegal ( 73 ), resulta das suas observações escritas que a criação do regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico e integrado no regime geral em 2012 ( 74 ) tinha, pelo contrário, conduzido a um aumento significativo das inscrições desses trabalhadores ( 75 ), mostrando assim o anterior trabalho ilegal ( 76 ). Por conseguinte, não se pode concluir pela existência de um nexo de causalidade entre o aumento das contribuições e o trabalho ilegal.

95.

Em quinto lugar, coloca‑se a questão de saber se o facto de o local de trabalho ser o domicílio do empregador justifica a escolha da medida de exclusão em causa. Por conseguinte, é pertinente verificar qual é a importância da influência do local de trabalho nessa escolha. Com efeito, como pode o facto de a prestação do serviço ter lugar no domicílio do empregador conduzir à exclusão das prestações de desemprego das prestações concedidas aos trabalhadores do serviço doméstico, mas não conduzir à exclusão de outras prestações sociais de que beneficiam esses trabalhadores, como a relativa aos acidentes de trabalho ou à doença?

96.

Nesta linha, quanto ao aspeto sistemático, o órgão jurisdicional de reenvio poderia igualmente verificar se, tendo em conta as prestações de desemprego, o local de trabalho tem a mesma influência na situação de outros trabalhadores cujo local de trabalho é igualmente o domicílio do empregador (jardineiros, motoristas particulares, etc.) ou o seu próprio domicílio (trabalhadores independentes) como na situação dos trabalhadores do serviço doméstico ( 77 ). A este respeito, coloca‑se igualmente a questão de saber quais são as exigências relativas à inspeção de um domicílio e de uma empresa ( 78 ).

97.

Por último, em sexto e último lugar, pode ser pertinente saber se existem outras prestações sociais reconhecidas aos trabalhadores do serviço doméstico que possam compensar a falta de proteção contra o risco de desemprego ( 79 ). Quanto a este ponto, CJ alegou na audiência, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, que não só não existe outra prestação que possa compensar a falta de proteção contra esse risco mas, além disso, a exclusão dessa proteção leva a que os trabalhadores do serviço doméstico sejam privados do benefício de outras prestações, como a prestação por incapacidade permanente ( 80 ).

98.

A este respeito, o Governo espanhol e a TGSS alegam que foi recentemente instituída uma prestação excecional por falta de atividade ( 81 ) em benefício dos inscritos no regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico que, devido à crise sanitária provocada pela pandemia de COVID‑19, viram a sua atividade reduzida ou terminada. Todavia, há que observar que esta prestação excecional é temporária. Nas suas observações escritas, a própria TGSS indica que a referida prestação «continuaria em vigor durante um mês (a contar da data de aquisição do direito), duração que poderia ser prorrogada por períodos de um mês por Real Decreto‑Lei».

99.

Tendo em conta as considerações precedentes, considero que a disposição em causa no processo principal não se mostra adequada para garantir os objetivos de luta contra o trabalho ilegal e a fraude, bem como de proteção do emprego, na medida em que esta disposição não parece responder verdadeiramente à preocupação de atingir estes objetivos nem ser aplicada de modo coerente e sistemático ( 82 ).

100.

Por conseguinte, considero que a cláusula de exclusão prevista pela disposição em causa no processo principal, ao proibir de forma absoluta o acesso à prestação de desemprego a todos os trabalhadores do serviço doméstico, vai além do que é necessário para atingir os objetivos prosseguidos.

2) Conclusão intercalar

101.

Considero que a disposição em causa no processo principal comporta uma discriminação indireta na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, uma vez que não é justificada por fatores objetivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo.

4.   Observações adicionais

102.

Para terminar a minha análise, gostaria de salientar os dois elementos seguintes.

103.

Por um lado, resulta das observações escritas da Comissão e das observações orais de CJ que o Real Decreto 1620/2011, de 14 de novembro de 2011, prevê, na sua segunda disposição adicional, que o Ministério do Trabalho constituirá um grupo de peritos para elaborar, antes de 31 de dezembro de 2012, um relatório relativo, nomeadamente, «[à] viabilidade do estabelecimento de um regime de proteção contra o desemprego adaptado às particularidades da atividade do serviço doméstico que garanta os princípios da contribuição, da solidariedade e da sustentabilidade financeira». Tanto a Comissão como CJ sublinharam que, até à data, esta disposição não parece ter sido aplicada.

104.

Por outro lado, o artigo 14.o da Convenção n.o 189 da Organização Internacional do Trabalho sobre os Trabalhadores e Trabalhadoras do Serviço Doméstico, aprovada em 16 de junho de 2011, estipula que «[t]odo o Membro deve adotar medidas adequadas, de acordo com a legislação nacional e tendo em devida consideração as características específicas do trabalho doméstico, para assegurar que os trabalhadores do serviço doméstico beneficiem de condições não menos favoráveis do que as aplicáveis aos trabalhadores em geral em matéria de segurança social […]». A Comissão salienta que embora o Reino de Espanha ainda não tenha ratificado esta convenção, é, no entanto, membro da Organização Internacional do Trabalho ( 83 ).

V. Conclusão

105.

À luz das considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que dê a seguinte resposta às questões submetidas pelo Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Vigo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Vigo, Espanha):

«O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional que exclui as prestações de desemprego das prestações concedidas por um regime legal de segurança social aos trabalhadores do serviço doméstico, quando se verifica que esses trabalhadores são quase exclusivamente mulheres.»


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) Acórdão de 30 de abril de 1996, P./S. (C‑13/94, EU:C:1996:170, n.o 19 e jurisprudência referida).

( 3 ) Diretiva do Conselho, de 19 de dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social (JO 1979, L 6, p. 24; EE 05 F2 p. 174).

( 4 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional (JO 2006, L 204, p. 23).

( 5 ) BOE n.o 261, de 31 de outubro de 2015, p. 103291, e retificação no BOE n.o 36, de 11 de fevereiro de 2016, p. 10898.

( 6 ) BOE n.o 109, de 7 de maio de 1985, p. 12699, e retificação no BOE n.o 134, de 5 de junho de 1985, p. 16992.

( 7 ) V., nomeadamente, Acórdãos de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 25), e de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o. (C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 27).

( 8 ) Resulta da decisão de reenvio que a TGSS concluiu, na sua Decisão de 13 de novembro de 2019, que «este grupo de trabalhadores e trabalhadoras não tem atualmente a possibilidade de contribuir para o sistema de segurança social tendo em vista obter uma proteção contra o desemprego». O sublinhado é meu.

( 9 ) V., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 25), e de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o. (C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 27).

( 10 ) V. Acórdão de 30 de setembro de 2020, CPAS de Liège (C‑233/19, EU:C:2020:757, n.o 36 e jurisprudência referida).

( 11 ) V., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, Governo della Repubblica italiana (Estatuto dos juízes de paz italianos) (C‑658/18, EU:C:2020:572, n.o 61 e jurisprudência referida).

( 12 ) V., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Târşia (C‑69/14, EU:C:2015:662, n.o 13), e de 16 de outubro de 2019, Glencore Agriculture Hungary (C‑189/18, EU:C:2019:861, n.o 29 e jurisprudência referida).

( 13 ) V., neste sentido, Acórdão de 22 de novembro de 2012, Elbal Moreno (C‑385/11, EU:C:2012:746, n.o 20 e jurisprudência referida).

( 14 ) Nos termos do artigo 2.o da Diretiva 79/7, esta aplica‑se à população ativa, pelo que uma trabalhadora do serviço doméstico como CJ está abrangida pelo âmbito de aplicação pessoal desta diretiva.

( 15 ) Na medida em que o Governo espanhol sustentou que não existe discriminação indireta, defendeu esta posição exclusivamente a título subsidiário relativamente à justificação da desigualdade de tratamento e à proporcionalidade da disposição em causa no processo principal.

( 16 ) No âmbito da Diretiva 79/7, v., nomeadamente, Acórdão de 9 de novembro de 2017, Espadas Recio (C‑98/15, EU:C:2017:833, n.o 37 e jurisprudência referida).

( 17 ) Resulta da jurisprudência que a Diretiva 79/7 é a expressão, no domínio em causa, do princípio da igualdade, que é um dos princípios fundamentais do direito. V., por analogia, Acórdão de 30 de abril de 1996, P./S. (C‑13/94, EU:C:1996:170, n.o 18). V., igualmente, Lenaerts, K., «L’égalité de traitement en droit communautaire. Un principe unique aux apparences multiples», Cahiers de droit européen, 1991, pp. 3 a 41.

( 18 ) V., nomeadamente, Acórdãos de 14 de fevereiro de 1995, Schumacker (C‑279/93, EU:C:1995:31, n.o 30); de 30 de março de 2004, Alabaster (C‑147/02, EU:C:2004:192, n.o 45); de 16 de julho de 2009, Gómez‑Limón Sánchez‑Camacho (C‑537/07, EU:C:2009:462, n.o 56), e de 8 de maio de 2019, Praxair MRC (C‑486/18, EU:C:2019:379, n.o 73).

( 19 ) Tobler, C., Limites et potentiel du concept de discrimination indirecte, Direção‑Geral do Emprego, dos Assuntos Sociais e da Inclusão (Comissão Europeia), 2009, pp. 1 a 85, em especial p. 24.

( 20 ) Acórdão de 26 de junho de 2018 (C‑451/16, EU:C:2018:492, n.o 42).

( 21 ) O conceito de «discriminação direta» é definido no artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/54 como a situação em «que, em razão do sexo, uma pessoa seja sujeita a tratamento menos favorável que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável». Na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça indicou que importa compreender este conceito da mesma forma no contexto da Diretiva 79/7. A este respeito, precisou que, no caso de esse tratamento menos favorável em razão do sexo ser suscetível de constituir uma discriminação direta na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 79/7, é ainda necessário verificar se as duas situações examinadas são comparáveis. V., nomeadamente, Acórdão de 26 de junho de 2018, MB (Mudança de sexo e pensão de reforma) (C‑451/16, EU:C:2018:492, n.os 34, 38 e 39). Daqui resulta que, no caso de as situações examinadas não serem comparáveis, a diferença de tratamento não constitui uma discriminação direta. Além disso, há que distinguir os conceitos de «discriminação direta» e «discriminação indireta» ao nível da justificação. Com efeito, enquanto o primeiro conceito só pode ser justificado com base em motivos específicos expressamente previstos na lei, o segundo pode ser justificado por motivos objetivos. Por conseguinte, a questão de saber se uma discriminação pode ser objetivamente justificada coloca‑se unicamente no âmbito do exame das discriminações indiretas. O sublinhado é meu.

( 22 ) V. Acórdão de 26 de junho de 2018 (C‑451/16, EU:C:2018:492, n.o 48): «Importa pois declarar que a legislação nacional em causa no processo principal reserva um tratamento menos favorável, diretamente em razão do sexo, a uma pessoa que mudou de identidade sexual após o casamento do que a uma pessoa que conservou o seu sexo de nascimento estando casada, ainda que essas pessoas estejam em situação comparável.» O sublinhado é meu.

( 23 ) V., nomeadamente, no âmbito da igualdade de remuneração entre trabalhadores masculinos e femininos, Acórdão de 11 de maio de 1999, Angestelltenbetriebsrat der Wiener Gebietskrankenkasse (C‑309/97, EU:C:1999:241, n.o 21).

( 24 ) Segundo o Governo espanhol, esta abordagem decorre dos Acórdãos de 14 de abril de 2015, Cachaldora Fernández (C‑527/13, EU:C:2015:215, n.os 31 e 33), e de 9 de novembro de 2017, Espadas Recio (C‑98/15, EU:C:2017:833, n.o 41).

( 25 ) Geulette, A., « De la discrimination indirecte telle qu’appréhendée par la Cour de Justice des Communautés Européennes au regard du règlement 1408/71/CEE et de la directive 79/7/CEE», Revue belge de sécurité sociale, 2.o trimestre de 2003, pp. 541 a 582, em especial p. 554 e doutrina referida. A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que «o conceito de “discriminação” não implica, por definição, o facto de ter sido causado um dano direto [e] que este conceito pressupõe, antes de mais, que estejam previstas condições desiguais para casos comparáveis». Todavia, «a aplicação de condições desiguais é suscetível de causar danos, que podem então ser considerados a consequência reveladora de uma discriminação». V. Acórdão de 10 de maio de 1960, Barbara e o./Alta Autoridade (3/58 a 18/58, 25/58 e 26/58, EU:C:1960:18, p. 404).

( 26 ) Quanto à influência da doutrina americana relativa ao «disparate impact» no âmbito das discriminações indiretas no direito social da União v., nomeadamente, Tobler, C., Indirect Discrimination. A Case Study into the Development of the Legal Concept of Indirect Discrimination under EC Law, Intersentia, Antwerpen‑Oxford, 2005, pp. 91 a 96. V., a este respeito, Acórdão de 31 de março de 1981, Jenkins (96/80, EU:C:1981:80, p. 925, considerando 13) e Conclusões do advogado‑geral J.‑P. Warner no processo Jenkins (96/80, não publicadas, EU:C:1981:21, pp. 936 e 937).

( 27 ) O Tribunal de Justiça referiu‑se pela primeira vez à discriminação indireta (em razão da nacionalidade) no Acórdão de 12 de fevereiro de 1974, Sotgiu (152/73, EU:C:1974:13, n.o 11), relativo ao Regulamento (CEE) n.o 1612/68 do Conselho, de 15 de outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade (JO 1968, L 257, p. 2): «As normas referentes à igualdade de tratamento […] proíbem não só as discriminações ostensivas, em razão da nacionalidade, mas também qualquer forma de discriminação dissimulada que, mediante a aplicação de outros critérios de distinção, conduza efetivamente ao mesmo resultado.» O sublinhado é meu. Para uma jurisprudência recente no domínio da livre circulação dos trabalhadores na qual o Tribunal de Justiça utiliza este conceito, v., nomeadamente, Acórdão de 2 de abril de 2020, PF e o. (C‑830/18, EU:C:2020:275, n.o 30 e jurisprudência referida).

( 28 ) Acórdãos de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 37 e jurisprudência referida), e de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 24). O sublinhado é meu. Observo que este acórdão marca uma evolução da definição deste conceito em relação à jurisprudência anterior, segundo a qual «existe discriminação indireta na aceção desta disposição quando a aplicação de uma medida nacional, apesar da sua formulação neutra, prejudica, de facto, um número muito mais elevado de mulheres do que de homens». O sublinhado é meu. V., nomeadamente, Acórdãos de 20 de outubro de 2011, Brachner (C‑123/10, EU:C:2011:675, n.o 56); de 22 de novembro de 2012, Elbal Moreno (C‑385/11, EU:C:2012:746, n.o 29); de 14 de abril de 2015, Cachaldora Fernández (C‑527/13, EU:C:2015:215, n.o 28), e de 9 de novembro de 2017, Espadas Recio (C‑98/15, EU:C:2017:833, n.o 38). Como sublinhou a doutrina, trata‑se de examinar mais qualitativamente quais são os efeitos potenciais desfavoráveis de uma medida sobre as pessoas abrangidas por um determinado critério relativamente a outras pessoas. Esta nova definição permite igualmente tratar as discriminações indiretas ligadas a critérios para os quais faltam os dados quantitativos. V., a este respeito, Miné, M., «Les concepts de discrimination directe et indirecte», ERA Forum, volume 4, 2003, pp. 30 a 44, em especial pp. 38 e 39; Tridimas, T., The General Principles of EU Law, Oxford University Press, 2005, pp. 67 a 72, e Vielle, P., e Wuiame, N., Évaluation de la mise en œuvre de la directive 79/7/CEE relative à l’égalité de traitement entre les hommes et les femmes en matière de sécurité sociale, 1999, pp. 1 a 49, em especial p. 21.

( 29 ) V. Acórdãos de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 38 e jurisprudência referida), e de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 25).

( 30 ) V., nomeadamente, Tobler, C., Indirect Discrimination. A Case Study into the Development of the Legal Concept of Indirect Discrimination under EC Law, op.cit., p. 58.

( 31 ) V. Acórdão de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 27 e jurisprudência referida). Há que salientar que a discriminação indireta pode ser estabelecida por todos os meios e não apenas com base em dados estatísticos. V., a este respeito, Acórdão de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 46). V., igualmente, Acórdão de 3 de outubro de 2019, Schuch‑Ghannadan (C‑274/18, EU:C:2019:828, n.o 56).

( 32 ) A TGSS indica, nas suas observações escritas, que «[n]ão há dúvida de que os trabalhadores inscritos no regime especial dos trabalhadores do serviço doméstico são, na sua maioria, mulheres e de que a sua exclusão da proteção contra o desemprego poderia constituir uma discriminação indireta em relação aos trabalhadores masculinos».

( 33 ) V., nomeadamente, Acórdãos de 24 de setembro de 2020, YS (Pensões de empresa de pessoal dirigente) (C‑223/19, EU:C:2020:753, n.o 52 e jurisprudência referida), e de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 26). V., igualmente, neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.os 39 e 45).

( 34 ) V., neste sentido, Acórdão de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 28).

( 35 ) Para dados estatísticos relativos ao primeiro trimestre de 2017, v. Acórdão de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 42).

( 36 ) V., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 47).

( 37 ) V., neste sentido, Acórdãos de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 37 e jurisprudência referida), e de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 24).

( 38 ) V. Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 53 e jurisprudência referida). V., igualmente, Acórdãos de 13 de maio de 1986, Bilka‑Kaufhaus (170/84, EU:C:1986:204, n.o 36); de 13 de julho de 1989, Rinner‑Kühn (171/88, EU:C:1989:328, n.o 14); de 24 de fevereiro de 1994, Roks e o. (C‑343/92, EU:C:1994:71, n.o 34), e de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 48).

( 39 ) V. Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 54 e jurisprudência referida).

( 40 ) Acórdãos de 16 de outubro de 2007, Palacios de la Villa (C‑411/05, EU:C:2007:604, n.o 65), e de 2 de abril de 2020, Comune di Gesturi (C‑670/18, EU:C:2020:272, n.o 37). V., igualmente, Acórdão de 11 de setembro de 2003, Steinicke (C‑77/02, EU:C:2003:458, n.o 62 e jurisprudência referida).

( 41 ) V. Acórdão de 14 de dezembro de 1995, Megner e Scheffel (C‑444/93, EU:C:1995:442, n.os 27, 28 e 32). No âmbito do acesso obrigatório ao seguro de invalidez e velhice, v. Acórdão de 14 de dezembro de 1995, Nolte (C‑317/93, EU:C:1995:438, n.os 31, 32 e 36). Por outro lado, no contexto das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado, o Tribunal de Justiça declarou que objetivos como a proteção social dos trabalhadores e a facilitação dos controlos administrativos inerentes à mesma [Acórdão de 16 de abril de 2013, Las (C‑202/11, EU:C:2013:239, n.o 28)], bem como a luta contra a fraude, nomeadamente social, e a prevenção dos abusos são objetivos que figuram entre as «razões imperiosas de interesse geral» suscetíveis de justificar uma restrição ao exercício das liberdades fundamentais reconhecidas pelo Tratado [Acórdão de 13 de novembro de 2018, Čepelnik (C‑33/17, EU:C:2018:896, n.o 44)]. Todavia, devo recordar que os conceitos de «razões imperiosas de interesse geral» no contexto das liberdades fundamentais e de «motivos objetivos de justificação» no âmbito das discriminações indiretas não são equivalentes.

( 42 ) V., nomeadamente, Acórdãos de 12 de julho de 1984, Hofmann (184/83, EU:C:1984:273, n.o 27) (sobre medidas sociais destinadas a assegurar a proteção da mulher no que respeita à gravidez e à maternidade); de 7 de maio de 1991, Comissão/Bélgica (C‑229/89, EU:C:1991:187, n.o 22) (sobre o objetivo social de garantir um rendimento mínimo de substituição), e de 20 de outubro de 2011, Brachner (C‑123/10, EU:C:2011:675, n.o 91) (sobre a atribuição de um rendimento igual ao mínimo social como parte integrante da política social).

( 43 ) V., nomeadamente, Acórdãos de 14 de dezembro de 1995, Nolte (C‑317/93, EU:C:1995:438, n.o 33); de 14 de dezembro de 1995, Megner e Scheffel (C‑444/93, EU:C:1995:442, n.o 29); de 1 de fevereiro de 1996, Posthuma‑van Damme e Oztürk, C‑280/94, EU:C:1996:27, n.o 26); de 9 de fevereiro de 1999, Seymour‑Smith e Perez (C‑167/97, EU:C:1999:60, n.o 74); e de 20 de outubro de 2011, Brachner (C‑123/10, EU:C:2011:675, n.o 73).

( 44 ) Acórdão de 21 de janeiro de 2021, INSS (C‑843/19, EU:C:2021:55, n.o 33 e jurisprudência referida).

( 45 ) A doutrina criticou igualmente o enfraquecimento do teste, estruturado em três fases, da justificação cujo caráter objetivo exige que os meios escolhidos, em primeiro lugar, respondam a uma verdadeira necessidade (realidade), em segundo lugar, sejam aptos a atingir o objetivo (adequação) e, em terceiro lugar, sejam necessários para esse efeito (proporcionalidade). Segundo a doutrina, o Tribunal de Justiça aplica este critério de maneira mais estrita e sistemática nos domínios da discriminação indireta em razão da nacionalidade do que no das matérias sujeitas, nomeadamente, à Diretiva 79/7. V., nomeadamente, Barnard, C. e Hepple, B., «Indirect Discrimination: Interpreting Seymour‑Smith», Cambridge Law Journal, 58 (2), 1999, pp. 399 a 412, em especial pp. 409 a 412: «The real problem is that while the Court of Justice is contenant of pronouncing on questions of formal equality, it lacks access to the statical and social science advice which is needed to assess arguments about disparate impact and objective justification.» [«O verdadeiro problema é que, embora o Tribunal de Justiça seja capaz de se pronunciar sobre questões de igualdade formal, não tem acesso aos conselhos estatísticos e de ciências sociais necessários para avaliar os argumentos relativos ao impacto desigual e à justificação objetiva»]; Bell, M. e Waddington, L., «More Equal than Others: Distinguishing European Union Equality Directives», Common Market Law Review, vol. 38, 2001, pp. 587 a 611, em especial p. 593, e Vielle, P., e Wuiame, N., op. cit., p. 22. Quanto à importância da aplicação estrita deste teste no quadro das discriminações em razão do sexo, v. Mulder, J., Indirect sex discrimination in employment. Theoretical analysis and reflections on the CJEU case law and national application of the concept of indirect sex discrimination, European Network of Legal experts in gender equality and non‑discrimination, Comissão Europeia, Bruxelas, 2020, p. 130.

( 46 ) Acórdãos de 9 de fevereiro de 1999, Seymour‑Smith e Perez (C‑167/97, EU:C:1999:60, n.o 71); de 20 de março de 2003, Kutz‑Bauer (C‑187/00, EU:C:2003:168, n.o 57); e de 11 de setembro de 2003, Steinicke (C‑77/02, EU:C:2003:458, n.o 63). V., igualmente, Acórdão de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale (C‑176/12, EU:C:2014:2, n.o 27).

( 47 ) V., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 47).

( 48 ) V. n.o 65 das presentes Conclusões.

( 49 ) V. Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 54 e jurisprudência referida). V. igualmente, Acórdãos de 13 de maio de 1986, Bilka‑Kaufhaus (170/84, EU:C:1986:204, n.o 36); de 13 de julho de 1989, Rinner‑Kühn (171/88, EU:C:1989:328, n.os 14); de 24 de fevereiro de 1994, Roks e o. (C‑343/92, EU:C:1994:71, n.o 34), e de 8 de maio de 2019, Villar Láiz (C‑161/18, EU:C:2019:382, n.o 48).

( 50 ) Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.os 55 e 56 e jurisprudência referida).

( 51 ) Foi tendo em conta esta fase do exame da determinação da existência de uma discriminação indireta, a saber, a das verificações relativas às justificações objetivas, que a doutrina emitiu reservas quanto à fiscalização efetuada pelo Tribunal de Justiça. Em seu entender, esta fiscalização parece laxista em todos os casos em que se alega que a prestação em causa é justificada por objetivos legítimos de política social. V., nomeadamente, Pennings, F., European Social Security Law, Intersentia. Antwerp, Oxford e Portland, 2010, pp. 322 a 327.

( 52 ) Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 59 e jurisprudência referida). A este respeito, a doutrina sublinha que o facto de ter sido invocado um objetivo legítimo não implica necessariamente que a proteção contra a discriminação indireta prevista pela Diretiva 79/7 seja limitada. V. Tobler, C., Limites et potentiel du concept de discrimination indirecte, op. cit., p. 39: «[é] por essa razão que não é surpreendente que o Tribunal de Justiça seja criticado por ter aceitado certos objetivos como legítimos.»

( 53 ) Além disso, a TGSS sublinhou que esses trabalhadores podem beneficiar da prestação de desemprego uma vez que, além do facto de a sua cessação de emprego não ser voluntária, contribuíram para o regime geral da segurança social durante os seis anos anteriores à sua inscrição no regime especial aplicável aos trabalhadores do serviço doméstico. No entanto, isto parece excluir da prestação de desemprego os trabalhadores que sempre trabalharam como trabalhadores do serviço doméstico.

( 54 ) O exame conjunto destes objetivos parece‑me pertinente uma vez que se sobrepõem e estão fortemente ligados uns aos outros.

( 55 ) V., nomeadamente, Geulete, A., op. cit., p. 555.

( 56 ) V., nomeadamente, Tobler, C., Indirect Discrimination. A Case Study into the Development of the Legal Concept of Indirect Discrimination under EC Law, op. cit., pp. 61 e segs., e doutrina citada: «The term “structural discrimination” refers to a type of discrimination with a much more complex nature. Structural discrimination arises from deeply rooted views, opinions and value judgments relied on in a given society or from societal, cultural, economic patterns and structures. [«A expressão “discriminação estrutural” refere‑se a um tipo de discriminação de natureza muito mais complexa. A discriminação estrutural decorre de pontos de vista, opiniões e juízos de valor profundamente enraizados numa dada sociedade ou em padrões e estruturas sociais, culturais e económicas.»] V., igualmente, no âmbito da discriminação racial, a definição do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos do Homem (ACDH): «Discrimination can exist explicitly, through institutions, norms and values. […] Structural discrimination primarily relates to the ways in which common behaviour and equal legislation and norms for everybody can affect, and obscure, discriminatory intent.» [FR] disponível no seguinte endereço: https://www.ohchr.org/Documents/Issues/Racism/IWG/Session8/MirjanaNajcevska.doc.

( 57 ) Quanto a este aspeto, v., nomeadamente, Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu, Plano de ação da UE para 2017‑2019. Colmatar as disparidades salariais entre homens e mulheres, COM (2017) 678 final.

( 58 ) Como recordou o advogado‑geral M. Bobek nas suas Conclusões no processo Syndicat CFTC (C‑463/19, EU:C:2020:550, n.o 52 e jurisprudência referida), bem como no processo Instituto Nacional de la Seguridad Social (Complemento de pensão para as mulheres que tiveram filhos) (C‑450/18, EU:C:2019:696, n.os 37 e 38), nomeadamente por referência aos Acórdãos de 25 de outubro de 1988, Comissão/França (312/86, EU:C:1988:485, n.o 14); de 29 de novembro de 2001, Griesmar (C‑366/99, EU:C:2001:648, n.o 56); de 26 de março de 2009, Comissão c. Grécia (C‑559/07, EU:C:2009:198, n.o 69), e de 16 de julho de 2015, Maïstrellis (C‑222/14, EU:C:2015:473, n.o 47).

( 59 ) Vielle, P., e Wuiame, N., op. cit., p. 24. V., a este respeito, Vogel‑Polsky, E., «Genre et droit: les enjeux de la parité», Cahiers du GEDISST (Groupe d’étude sur la division sociale et sexuelle du travail)n.o 17, 1996, «Principes et enjeux de la parité», pp. 11 a 31: «La ségrégation professionnelle […] des femmes dans l’économie et le monde du travail trouve ses origines dans la totalité des rapports sociaux de sexe [ou] dans l’imprégnation des stéréotypes véhiculés par la culture, l’éducation, le système scolaire, la famille, les médias […]» [«A segregação profissional […] das mulheres na economia e no mundo do trabalho tem a sua origem na totalidade das relações sociais de sexo [ou] na propagação de estereótipos veiculados pela cultura, educação, sistema escolar, família, meios de comunicação social […]».

( 60 ) Vielle, P., e Wuiame, N., op. cit., p. 24.

( 61 ) Ibidem, p. 24. Para uma análise exaustiva do reforço progressivo da igualdade entre os trabalhadores masculinos e femininos no seu papel de pais pelo legislador da União Europeia, v. Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Syndicat CFTC (C‑463/19, EU:C:2020:550, n.os 53 e segs.).

( 62 ) A este respeito, resulta das observações da Comissão que, para explicar as diferenças atuais relativas à proteção dos diferentes tipos de trabalhadores e, em especial, dos trabalhadores do serviço doméstico, a doutrina espanhola fez referência, nomeadamente, ao facto de este grupo ser constituído maioritariamente por mulheres e de estas últimas estarem tradicionalmente cobertas pela segurança social graças aos seus laços familiares. V., nomeadamente, Otxoa Crespo, I., La SeguridadSsocial del empleo doméstico: evolución y perspectivas, Universidad del País Vasco — Euskal Herriko Unibertsitatea, 2012, pp. 304 e 305. Disponível no seguinte endereço: https://addi.ehu.es/bitstream/handle/10810/11601/9082‑090‑2‑OtxoaTH.pdf?sequence=6&isAllowed=y.

( 63 ) O Governo espanhol indicou, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça na audiência, que os motoristas particulares estão integrados no regime geral da segurança social e contribuem a título das prestações de desemprego.

( 64 ) Travail décent pour les travailleurs domestiques, Rapport IV(1), 99a Conferência Internacional do Trabalho, Genebra, 2010, pp. 1 a 134. Quanto à segregação profissional, v. Rodríguez Escanciano, S., «Condiciones de trabajo y discriminación salarial por razón de sexo», Derecho Social de la Unión Europea. Aplicación por el Tribunal de Justicia, Casas Baamonde, M. E., e Gil Alburquerque, R. (dir.), Francis Lefebvre, 2019, p. 269 a 307, em especial pp. 280 e segs.

( 65 ) Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 53).

( 66 ) V., nomeadamente, neste sentido, Acórdão de 16 de outubro de 2007, Palacios de la Villa (C‑411/05, EU:C:2007:604, n.o 72).

( 67 ) V., neste sentido, Acórdãos de 9 de fevereiro de 1999, Seymour‑Smith e Perez (C‑167/97, EU:C:1999:60, n.o 76); de 20 de março de 2003, Kutz‑Bauer (C‑187/00, EU:C:2003:168, n.o 58); de 11 de setembro de 2003, Steinicke (C‑77/02, EU:C:2003:458, n.o 64), e de 5 de março de 2009, Age Concern England (C‑388/07, EU:C:2009:128, n.o 51).

( 68 ) V. jurisprudência recordada no n.o 65 das presentes Conclusões.

( 69 ) V., nomeadamente, Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 54 e jurisprudência referida).

( 70 ) V., a este respeito, n.o 81 das presentes Conclusões.

( 71 ) Resulta das observações orais do Governo espanhol que este regime abrange igualmente os riscos relativos à gravidez e à amamentação, à maternidade e à paternidade, bem como o risco de morte e de sobrevivência.

( 72 ) A Comissão menciona, a título de exemplo, o cheque‑serviço existente em França e na Bélgica, as reduções ou isenções totais ou parciais das contribuições para certos empregadores, bem como as bonificações ou deduções fiscais.

( 73 ) V. n.o 75 das presentes Conclusões.

( 74 ) Real Decreto 1620/2011 por el que se regula la relación laboral de caráter especial del servicio del hogar familiar (Real Decreto 1620/2011, que regula a relação de trabalho com caráter especial de serviço doméstico), de 14 de novembro de 2011 (BOE n.o 277, de 17 de novembro de 2011, p. 119046).

( 75 ) A este respeito, CJ indicou na audiência que o número de inscrições na segurança social desses trabalhadores tinha aumentado de 296949 para 414453 trabalhadores em 2012.

( 76 ) Nas suas observações escritas, a TGSS indicou, contudo, que o número de inscritos diminuiu em seguida entre os anos de 2012 e 2019.

( 77 ) Como indiquei na nota de pé de página n.o 63 das presentes Conclusões, o Governo espanhol indicou, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça na audiência, que os motoristas particulares pagam contribuições a título de proteção de desemprego.

( 78 ) Nas suas observações escritas, a Comissão remete para uma questão parlamentar dirigida à Comissão (P‑128/2020) por deputados espanhóis ao Parlamento Europeu, na qual se indicava, no que respeita à possibilidade de inspecionar os domicílios para detetar a fraude, que «o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) exige as mesmas condições (indícios de fraude, princípios da necessidade e da proporcionalidade) para inspecionar uma empresa ou um domicílio». Disponível no endereço seguinte: https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P‑9‑2020‑000128_EN.html.

( 79 ) A este respeito, a TGSS explicou na audiência que a atribuição de incapacidade temporária é mais vantajosa uma vez que é paga a partir não do décimo quinto dia mas do nono dia.

( 80 ) O órgão jurisdicional de reenvio indica que, quando o emprego dos trabalhadores do serviço doméstico cessa por razões que não lhes são imputáveis, a impossibilidade de aceder à prestação de desemprego implica igualmente a impossibilidade de aceder a outros subsídios sociais dependentes da extinção do direito a essa prestação. V., a este respeito, n.o 16 das presentes Conclusões.

( 81 ) Artigo 30.o do Real Decreto‑ley 11/2020 por el que se adoptan medidas urgentes complementarias en el ámbito social y económico para hacer frente al COVID‑19 (Real Decreto‑Lei 11/2020, que adota medidas urgentes complementares no domínio social e económico para fazer face ao COVID‑19), de 31 de março de 2020 (BOE n.o 91, de 1 de abril de 2020).

( 82 ) V., nomeadamente, Acórdão de 17 de julho de 2014, Leone (C‑173/13, EU:C:2014:2090, n.o 54 e jurisprudência referida).

( 83 ) Quanto a este aspeto, o Governo espanhol indicou na audiência que as diligências necessárias para efeitos da ratificação desta convenção tinham sido iniciadas e poderiam conduzir ao reconhecimento dos trabalhadores do serviço doméstico no que respeita à proteção contra o desemprego.

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