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Document 62023CJ0481
Judgment of the Court (Fifth Chamber) of 10 April 2025.#Ministerio Fiscal and Abogado del Estado v JMTB.#Request for a preliminary ruling from the Audiencia Nacional.#Reference for a preliminary ruling – Judicial cooperation in criminal matters – Framework Decision 2002/584/JHA – European arrest warrant – Article 4(4) and (6) – Grounds for optional non-execution – Condition that the acts fall within the jurisdiction of the executing Member State under its own criminal law – Conviction which is not final – European arrest warrant issued for the purposes of criminal prosecution.#Case C-481/23.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 10 de abril de 2025.
Ministerio Fiscal e Abogado del Estado contra JMTB.
Pedido de decisão prejudicial apresentada por Audiencia Nacional.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria penal — Decisão‑Quadro 2002/584/JAI — Mandado de Detenção Europeu — Artigo 4.o, pontos 4 e 6 — Motivos de não execução facultativa — Condição de os factos serem da competência do Estado‑Membro de execução nos termos da sua legislação penal — Condenação não definitiva — Mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal.
Processo C-481/23.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 10 de abril de 2025.
Ministerio Fiscal e Abogado del Estado contra JMTB.
Pedido de decisão prejudicial apresentada por Audiencia Nacional.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria penal — Decisão‑Quadro 2002/584/JAI — Mandado de Detenção Europeu — Artigo 4.o, pontos 4 e 6 — Motivos de não execução facultativa — Condição de os factos serem da competência do Estado‑Membro de execução nos termos da sua legislação penal — Condenação não definitiva — Mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal.
Processo C-481/23.
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2025:259
*A9* Audiencia Nacional, auto de 24/07/2023 (0000005/2019)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
10 de abril de 2025 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria penal — Decisão‑Quadro 2002/584/JAI — Mandado de Detenção Europeu — Artigo 4.o, pontos 4 e 6 — Motivos de não execução facultativa — Condição de os factos serem da competência do Estado‑Membro de execução nos termos da sua legislação penal — Condenação não definitiva — Mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal»
No processo C‑481/23 [Sangas] ( i ),
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Audiencia Nacional (Audiência Nacional, Espanha), por Decisão de 24 de julho de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 26 de julho de 2023, no processo relativo à execução do mandado de detenção europeu emitido contra
JMTB,
sendo intervenientes:
Ministerio Fiscal,
Abogado del Estado,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
composto por: M. L. Arastey Sahún, presidente de secção, D. Gratsias, E. Regan (relator), J. Passer e B. Smulders, juízes,
advogado‑geral: J. Richard de la Tour,
secretário: L. Carrasco Marco, administradora,
vistos os autos e após a audiência de 13 de novembro de 2024,
vistas as observações apresentadas:
– |
em representação do Ministerio Fiscal, por R. de Miguel Morante, na qualidade de agente, |
– |
em representação do Governo Espanhol, por L. Aguilera Ruiz, A. Gavela Llopis e P. Pérez Zapico, na qualidade de agentes, |
– |
em representação do Governo Lituano, por K. Dieninis e V. Kazlauskaitė‑Švenčionienė, na qualidade de agentes, |
– |
em representação do Governo Austríaco, por A. Posch, J. Schmoll e C. Leeb, na qualidade de agentes, |
– |
em representação da Comissão Europeia, por J. Baquero Cruz, H. Leupold e J. Vondung, na qualidade de agentes, |
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 |
O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, pontos 4 e 6, da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros (JO 2002, L 190, p. 1), conforme alterada pela Decisão‑Quadro 2009/299/JAI do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009 (JO 2009, L 81, p. 24) (a seguir «Decisão‑Quadro 2002/584»). |
2 |
Este pedido foi apresentado no âmbito do processo relativo à execução do mandado de detenção europeu emitido contra JMTB. |
Quadro jurídico
Direito da União
3 |
O artigo 1.o da Decisão‑Quadro 2002/584, sob a epígrafe «Definição de mandado de detenção europeu e obrigação de o executar», prevê: «1. O mandado de detenção europeu é uma decisão judiciária emitida por um Estado‑Membro com vista à detenção e entrega por outro Estado‑Membro duma pessoa procurada para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade. 2. Os Estados‑Membros executam todo e qualquer mandado de detenção europeu com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com o disposto na presente decisão‑quadro. […]» |
4 |
O artigo 3.o desta decisão‑quadro prevê motivos de não execução obrigatória do mandado de detenção europeu. |
5 |
O artigo 4.o desta decisão‑quadro, sob a epígrafe «Motivos de não execução facultativa do mandado de detenção europeu», dispõe: «A autoridade judiciária de execução pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu: […]
[…]
[…]» |
6 |
O artigo 4.o‑A da mesma decisão‑quadro prevê outras circunstâncias em que a autoridade judiciária de execução pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu, enquanto o artigo 5.o dessa diretiva tem por objeto as garantias a fornecer pelo Estado‑Membro de emissão em casos especiais. |
Direito romeno
7 |
O artigo 99, n.o 2, alíneas c) e g), e n.o 3, da Legea nr. 302/2004 privind cooperarea judiciară internațională în materie penală (Lei n.o 302/2004, relativa à Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal), de 28 de junho de 2004 (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 594 de 1 de julho de 2004), conforme republicada (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 411 de 27 de maio de 2019), estabelece: «2. A autoridade judiciária romena pode recusar a execução de um mandado de detenção europeu nos seguintes casos: […]
[…]
[…] 3. Se apenas for aplicável o caso previsto no n.o 2, alínea c), a autoridade judiciária de execução romena pede à autoridade judiciária de emissão, antes de proferir a decisão referida no artigo 109.o, uma cópia autenticada da condenação, bem como quaisquer outras informações necessárias, comunicando à autoridade judiciária de emissão o motivo pelo qual esses documentos são pedidos. O reconhecimento da condenação penal estrangeira é efetuado, a título incidental, pelo órgão jurisdicional perante o qual está pendente o processo de execução do mandado de detenção europeu. Se a autoridade judiciária de execução romena reconhecer a condenação penal estrangeira, o mandado de execução da pena é emitido na data de adoção da decisão referida no artigo 109.o» |
Processo principal e questões prejudiciais
8 |
Por Acórdão de 21 de fevereiro de 2022, aclarado por Despacho de 3 de março de 2022 (a seguir «Acórdão de 21 de fevereiro de 2022»), a Audiencia Nacional (Audiência Nacional, Espanha) condenou JMTB (a seguir «arguido»), um nacional espanhol residente na Roménia, enquanto coautor de três crimes fiscais e de um crime de branqueamento de capitais. Por um lado, no que respeita a cada uma dessas três infrações fiscais, o arguido foi condenado em dois anos de prisão e em multa de 23 milhões de euros pelo exercício de 2011, em multa de 135 milhões euros pelo exercício de 2012 e em multa de 140 milhões de euros pelo exercício de 2013, além das sanções acessórias. Por outro lado, no que respeita a esse crime de branqueamento de capitais, foi condenado em seis anos de prisão e em multa de 54 milhões de euros. |
9 |
Os factos subjacentes à condenação do arguido consistiam, em substância, na criação de várias sociedades em Espanha, dirigidas por testas de ferro que agiam na qualidade de administradores fictícios, com o objetivo de se subtrair ao pagamento em Espanha, a título dos exercícios de 2011 a 2013, do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) sobre a venda de hidrocarbonetos, num montante total superior a 100 milhões de euros. |
10 |
Na sequência do anúncio da interposição pelo arguido de um recurso de cassação do Acórdão de 21 de fevereiro de 2022, foi‑lhe recusada a autorização para se deslocar à Roménia. Todavia, após ter sido detetado na fronteira croata em direção à Roménia, o órgão jurisdicional de reenvio adotou, em 6 de abril de 2022, uma decisão relativa ao arguido, acompanhada de um mandado de detenção europeu e de um mandado de detenção internacional, ordenando a sua busca, detenção e prisão preventiva (a seguir «Decisão de 6 de abril de 2022»). |
11 |
Por ofício de 4 de abril de 2023, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia, Roménia) remeteu uma cópia do acórdão pelo qual recusava a execução do referido mandado de detenção europeu. |
12 |
Resulta desse acórdão que é certo que nenhum dos motivos de não execução obrigatória previstos no artigo 3.o da Decisão‑Quadro 2002/584 era aplicável ao mandado de detenção europeu emitido contra o arguido. No entanto, no que respeita aos motivos de não execução facultativa previstos no artigo 4.o da referida decisão‑quadro, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia) constatou, por um lado, que o arguido tinha apresentado documentos comprovativos de residência contínua e legal no território romeno durante um período de, pelo menos, cinco anos e, por outro, que ele tinha declarado que não desejava ser entregue às autoridades judiciárias espanholas, o que equivalia a uma recusa de execução da pena no Estado‑Membro de emissão, pelo que existia um motivo que justificava a recusa da entrega do interessado. |
13 |
Além disso, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia) considerou que as infrações pelas quais o arguido tinha sido condenado em primeira instância, pela autoridade judiciária de emissão do mandado de detenção europeu, eram definidas na lei espanhola como crimes de fraude fiscal e de branqueamento de capitais, puníveis com pena de prisão de três a dez anos, de tal forma que, se os factos tivessem sido da competência das autoridades judiciárias romenas, o prazo de prescrição da responsabilidade penal por infrações análogas teria sido de dez anos a contar da data do último ato ou da última omissão. |
14 |
Com efeito, tendo salientado que os três crimes de fraude fiscal pelos quais o arguido tinha sido condenado haviam sido cometidos durante os exercícios de 2011 a 2013, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia) deduziu que o prazo de prescrição tinha começado a correr, o mais tardar, em 31 de dezembro de 2013. Considerando, além disso, que, desde a prática dessas três infrações, não tinha havido nenhuma causa de interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia) concluiu que esse prazo tinha expirado. |
15 |
Tendo em conta o referido acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio observa que, para recusar a entrega do arguido, a Curtea de Apel Alba Iulia (Tribunal de Recurso de Alba Iulia) considerou existirem dois motivos de não execução facultativa do mandado de detenção europeu em causa no processo principal, relativos, por um lado, à prescrição da ação penal ao abrigo do direito romeno e, por outro, à residência do arguido na Roménia. |
16 |
Ora, no que respeita à prescrição da ação penal ao abrigo do direito romeno, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que a decisão de recusa de entrega do arguido foi adotada em aplicação das regras de prescrição das infrações do direito romeno, apesar de todos os factos em causa no processo principal terem sido cometidos em Espanha e constituírem crimes de fraude fiscal lesivos dos interesses económicos do Reino de Espanha, o que implica que as autoridades judiciárias romenas não são, em caso algum, competentes para conhecer dessas infrações e não podem, por conseguinte, invocar o artigo 4.o, ponto 4, da Decisão‑Quadro 2002/584. |
17 |
No que respeita à residência do arguido na Roménia, o órgão jurisdicional de reenvio observa que o artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 só permite recusar a entrega da pessoa procurada se estiverem preenchidos três pressupostos cumulativos, a saber, primeiro, o mandado de detenção europeu ter sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade, segundo, a pessoa em causa permanecer ou residir no Estado‑Membro de execução ou dele ser nacional e, terceiro, o Estado de execução comprometer‑se a executar essa pena ou essa medida de segurança nos termos do seu direito interno. Ora, no caso em apreço, o primeiro destes pressupostos não está preenchido, uma vez que o arguido só foi condenado em primeira instância e está pendente um recurso de cassação contra essa condenação. Acresce que, mesmo admitindo que o arguido seja considerado residente na Roménia, a recusa de entrega deste não foi acompanhada de nenhum compromisso, por parte das autoridades romenas, de executar na Roménia a pena que poderá ser definitivamente aplicada ao interessado. |
18 |
Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, tal recusa não se justifica à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça resultante do Acórdão de 31 de janeiro de 2023, Puig Gordi e o. (C‑158/21, EU:C:2023:57). Com efeito, como resulta, em substância, dos n.os 75 e 76 desse acórdão, admitir que um Estado‑Membro possa acrescentar aos motivos de não execução de um mandado de detenção europeu enunciados nos artigos 3.o, 4.o e 4.o‑A da Decisão‑Quadro 2002/584 outros motivos com base no direito nacional, permitindo não dar seguimento a esse mandado de detenção, obstaria ao bom funcionamento do sistema simplificado de entrega de pessoas instituído por esta decisão‑quadro. |
19 |
Nestas circunstâncias, a Audiencia Nacional (Audiência Nacional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
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Quanto às questões prejudiciais
Quanto à primeira questão
20 |
Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária de execução de um mandado de detenção europeu pode recusar executar esse mandado de detenção com fundamento nesta disposição quando o referido mandado de detenção não tenha sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade, uma vez que o arguido não foi ainda condenado definitivamente, e o Estado‑Membro de execução não se tenha comprometido a executar, em conformidade com o seu direito interno, a pena ou a medida de segurança privativas de liberdade que possa vir a ser definitivamente proferida contra essa pessoa. |
21 |
A este respeito, importa notar que o mandado de detenção europeu pode visar, como prevê o artigo 1.o, n.o 1, da Decisão‑Quadro 2002/584, duas situações. Assim, este mandado de detenção pode ser emitido, por um lado, para efeitos de procedimento penal ou, por outro lado, para cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade (Acórdão de 21 de outubro de 2010, B., C‑306/09, EU:C:2010:626, n.o 49). |
22 |
Embora o princípio do reconhecimento mútuo esteja subjacente à sistemática da Decisão‑Quadro 2002/584, esse reconhecimento não implica uma obrigação absoluta de execução do mandado de detenção emitido, uma vez que essa decisão‑quadro enuncia expressamente os motivos de não execução obrigatória (artigo 3.o) e facultativa (artigos 4.o e 4.o‑A) de um mandado de detenção europeu, bem como as garantias a fornecer pelo Estado‑Membro de emissão em casos especiais (artigo 5.o) [v., neste sentido, Acórdãos de 21 de outubro de 2010, B., C‑306/09, EU:C:2010:626, n.o 50, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 42 e jurisprudência referida]. |
23 |
Em particular, o sistema da Decisão‑Quadro 2002/584, como resulta nomeadamente destes artigos, deixa aos Estados‑Membros a possibilidade de, em situações específicas, permitirem às autoridades judiciárias competentes decidir que uma pena aplicada deve ser cumprida no território do Estado‑Membro de execução (Acórdãos de 21 de outubro de 2010, B., C‑306/09, EU:C:2010:626, n.o 51, e de 13 de dezembro de 2018, Sut, C‑514/17, EU:C:2018:1016, n.o 30). |
24 |
A este respeito, o artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 dispõe que a autoridade judiciária de execução pode recusar executar um mandado de detenção europeu se este tiver sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade, quando a pessoa procurada se encontrar no Estado‑Membro de execução, for dele nacional ou nele residente, e esse Estado se comprometer a executar essa pena ou medida de segurança nos termos do seu direito nacional. |
25 |
Assim, resulta da própria redação do artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 que, para ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta disposição, a pessoa procurada deve ser objeto de um mandado de detenção europeu emitido «para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade», ou seja, a segunda das situações evocadas no n.o 21 do presente acórdão. Com efeito, só nesta situação é que pode ser cumprida a última condição enunciada nesta disposição. |
26 |
No caso em apreço, resulta porém do pedido de decisão prejudicial que, embora, por Acórdão de 21 de fevereiro de 2022, o arguido tenha sido condenado em primeira instância em várias penas como autor de três crimes fiscais e de um crime de branqueamento de capitais, interpôs recurso de cassação desse acórdão, de forma que o processo penal relativo a essa condenação ainda está em curso nos tribunais espanhóis. Ora, resulta dos elementos de que o Tribunal de Justiça dispõe que, por força do direito espanhol, o referido acórdão não é executório devido à interposição deste recurso. |
27 |
Por outro lado, decorre destes elementos que a decisão do órgão jurisdicional de reenvio na qual se baseia o mandado de detenção europeu em causa no processo principal não é o Acórdão de 21 de fevereiro de 2022, mas sim a Decisão de 6 de abril de 2022 pela qual foram ordenadas a busca, a detenção e a prisão preventiva do arguido. Com efeito, esta última decisão foi adotada por esse órgão jurisdicional, uma vez que o arguido não cumpriu as medidas de coação a que estava sujeito no âmbito do processo penal contra ele instaurado. Em especial, embora o arguido estivesse condicionalmente em liberdade com interdição expressa de sair do território espanhol e obrigação de comparecer nas audiências, foi localizado na fronteira croata, em direção à Roménia. A Decisão de 6 de abril de 2022 e o mandado de detenção europeu emitido com base nesta última foram, por conseguinte, adotados com vista a assegurar a presença do arguido no prosseguimento desse processo. |
28 |
Por conseguinte, como sustentam o Ministerio Fiscal (Ministério Público, Espanha), o Governo Espanhol e a Comissão Europeia e como observa, em substância, o órgão jurisdicional de reenvio no pedido de decisão prejudicial, o mandado de detenção europeu em causa no processo principal não foi adotado «para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade», na aceção do artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, mas sim para efeitos da outra situação prevista no artigo 1.o, n.o 1, da Decisão‑Quadro 2002/584 e recordada no n.o 21 do presente acórdão, a saber, o procedimento penal. |
29 |
Daqui decorre que a situação do arguido não está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584, pelo que uma recusa de execução do mandado de detenção europeu emitido contra ele não se pode basear nesta disposição. |
30 |
Nestas circunstâncias, há que responder à primeira questão que o artigo 4.o, ponto 6, da Decisão‑Quadro 2002/584 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária de execução de um mandado de detenção europeu não pode recusar executar esse mandado de detenção com fundamento nesta disposição quando o referido mandado de detenção não tiver sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou de uma medida de segurança privativas de liberdade. |
Quanto à segunda questão
31 |
Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, ponto 4, da Decisão‑Quadro 2002/584 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária de execução de um mandado de detenção europeu pode recusar a execução desse mandado de detenção com fundamento nesta disposição, mesmo que os factos não estejam abrangidos pela competência do Estado‑Membro de execução segundo a sua própria lei penal, com o fundamento de que a ação penal ou a pena tivesse prescrito no caso de a legislação desse Estado‑Membro ser aplicável. |
32 |
A este respeito, importa recordar que o artigo 4.o, ponto 4, da Decisão‑Quadro 2002/584 permite à autoridade judiciária de execução recusar a execução um mandado de detenção europeu quando houver prescrição da ação penal segundo a legislação do Estado‑Membro de execução e os factos forem da competência desse Estado‑Membro nos termos da sua própria lei penal. |
33 |
Resulta assim da própria redação do artigo 4.o, ponto 4, da Decisão‑Quadro 2002/584 que os dois pressupostos que enuncia se aplicam cumulativamente. Daqui decorre que a autoridade judiciária de execução não pode invocar o motivo de não execução facultativa de um mandado de detenção europeu previsto nesta disposição quando os factos que são objeto da ação penal ou da pena não são da competência desse Estado‑Membro segundo a sua própria lei penal, mesmo que essa ação ou essa pena estivesse prescrita se essa lei fosse aplicável. |
34 |
Tendo em conta o exposto, há que responder à segunda questão que o artigo 4.o, ponto 4, da Decisão‑Quadro 2002/584 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária de execução de um mandado de detenção europeu não pode recusar a execução desse mandado de detenção com fundamento nesta disposição quando os factos não estejam abrangidos pela competência do Estado‑Membro de execução segundo a sua própria lei penal, mesmo que a ação penal ou a pena tivesse prescrito no caso de a legislação desse Estado‑Membro ser aplicável. |
Quanto às despesas
35 |
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: espanhol.
( i ) O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome verdadeiro de nenhuma das partes no processo.