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Document 62002CC0465

Conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas em 10 de Maio de 2005.
República Federal da Alemanha (C-465/02) e Reino da Dinamarca (C-466/02) contra Comissão das Comunidades Europeias.
Agricultura - Indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios - Denominação "feta" - Regulamento (CE) n.º 1829/2002 - Validade.
Processos apensos C-465/02 e C-466/02.

European Court Reports 2005 I-09115

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2005:276

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

DÁMASO RUIZ‑JARABO COLOMER

apresentadas em 10 de Maio de 2005 (1)

Processos apensos C‑465/02 e C‑466/02

República Federal da Alemanha

e

Reino da Dinamarca

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Agricultura – Indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios – Denominação ‘feta’ – Designações genéricas – Denominações tradicionais – Validade do Regulamento (CE) n.° 1829/2002»






Índice


I –   Introdução

II – Quadro jurídico: a protecção comunitária das indicações geográficas e das denominações de origem

A –   Antecedentes

B –   Primeiros passos do direito comunitário

C –   A regulamentação comunitária actual

1.     Os produtos vitivinícolas

2.     Os produtos agrícolas e os géneros alimentícios

D –   O Regulamento n.° 2081/92

1.     Os conceitos de denominação de origem e de indicação geográfica

a)     Delimitação básica

i)     A relação geográfica

ii)   A relação qualitativa

b)     Conceitos equiparados

i)     As denominações tradicionais

ii)   Outras designações territoriais

2.     As denominações não susceptíveis de registo

a)     As denominações genéricas

b)     As denominações susceptíveis de induzir em erro

3.     O processo de registo

a)     O processo normal

b)     O processo simplificado

c)     O comité científico

E –   O Regulamento n.° 1107/96

III – Análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça

A –   Concepção como direitos de propriedade industrial e comercial

B –   Objectivo da protecção

C –   O regulamento de base

1.     Âmbito de aplicação

2.     Alcance da protecção

3.     A inscrição e respectivos efeitos

4.     Corolário

IV – Antecedentes dos litígios

A –   A primeira inclusão de «feta» no Regulamento n.° 1107/96 

B –   O acórdão «Feta»

C –   A segunda inclusão de «feta» no Regulamento n.° 1107/96 por força do Regulamento n.° 1829/2002

D –   O processo «Canadane Cheese e Kouri»

V –   Os recursos de anulação

A –   Quanto à admissibilidade dos recursos de anulação

B –   Questões de forma

1.     Incumprimento dos prazos e do regime linguístico

2.     Insuficiência de fundamentação

C –   Fundamentos substantivos

1.     «Feta» como denominação genérica

a)     Quanto «(a)o genérico»

b)     Critérios de delimitação

i)     A situação no Estado‑Membro de origem do nome e nas zonas de consumo

–       A situação no Estado de origem

–       A situação nas zonas de consumo

ii)   A situação noutros Estados comunitários

–       A situação geral nos outros Estados

–       A situação nos Estados produtores do queijo

iii) As legislações nacionais ou comunitárias pertinentes

–       As legislações nacionais

–       O direito comunitário

iv)   Outros factores

–       A situação em Estados terceiros

–       A situação no tempo

c)     Apreciação dos critérios e consequências

2.     «Feta» como denominação tradicional

a)     O carácter tradicional da denominação

b)     A designação de um produto originário de determinadas zonas territoriais

c)     A qualidade e características do «feta» e a delimitação territorial da sua produção, transformação e elaboração

i)     A qualidade derivada do meio geográfico

ii)   A produção, a transformação e a elaboração numa área delimitada

d)     Consequências

VI – Despesas

VII – Conclusão

I –    Introdução

1.     Neste recurso de anulação o Tribunal de Justiça é chamado uma vez mais a fiscalizar a legalidade da inclusão do nome «feta» no registo de indicações geográficas e de denominações de origem da Comunidade Europeia.

2.     A discussão já tinha tido lugar no âmbito de uma questão prejudicial submetida, mas posteriormente retirada, pelo Symvoulio tis Epikrateias (Conselho de Estado helénico), na qual apresentei as minhas conclusões em 24 de Junho de 1997 (2) e que foi objecto de acórdão (3) que anulou a inscrição por questões formais, sem decidir se o referido nome é «genérico» ou pode ser qualificado como «tradicional» para efeitos da legislação aplicável.

3.     Posteriormente, a Comissão actuou no sentido de suprir as lacunas reveladas por essa decisão judicial, incorporando de novo o termo «feta» nas denominações protegidas pelo Regulamento (CE) n.° 1829/2002 (4), disso tendo os Governos alemão e dinamarquês interposto os respectivos recursos de anulação.

4.     Nas presentes conclusões abordar‑se‑á o quadro jurídico e a jurisprudência do Tribunal de Justiça nesta matéria, antes de expor os antecedentes dos litígios e de analisar os fundamentos de anulação.

II – Quadro jurídico: a protecção comunitária das indicações geográficas e das denominações de origem

A –    Antecedentes

5.     A primeira referência a uma denominação de origem surge na Bíblia, quando descreve a construção do templo de Jerusalém, que o rei David prometera a Javé; Salomão encarregou Hirão, rei de Tiro e de Sidón, de mandar cortar cedros do Líbano para edificar o palácio, construído com tal abundância desta madeira que ficou conhecido como «Casa da Floresta do Líbano», pois tinha quatro filas de colunas desta madeira, da qual também se achava revestida a sala do trono, «onde administrava a justiça, a Sala do Juízo» (5). Além dos nomes ou dos símbolos, a indicação de origem territorial constituiu provavelmente um dos primeiros métodos de individualizar as pessoas e as coisas, distinguindo‑as claramente das semelhantes (6). Desde a antiguidade, numerosos testemunhos comprovam a notoriedade e a reputação de produtos originários de certas zonas. Autores clássicos como Heródoto, Aristóteles ou Platão manifestam o apreço dos gregos pelo bronze de Corinto, pelo mármore da Frígia e de Paros, pela cerâmica de Atenas, pelas estatuetas de terracota de Thisbé, pelos perfumes da Arábia ou pelos vinhos de Naxos, Rodes e Corinto (7). Na Eneida, Virgílio conta que Heleno ofereceu a Eneias «objectos em ouro maciço e marfim trabalhado, grande quantidade de prata e caldeiros de Dodona» (8) e incluiu entre os presentes oferecidos por Andrómaca a Ascânio «trajes com figuras bordadas com fio de ouro e clâmide frígia» (9). A obra de Horácio está cheia de referências geográficas romanas, advertindo contra as falsificações (10).

6.     A conexão entre os objectos e a sua procedência não discriminava entre os que surgem espontaneamente e os que são fruto da actividade humana, não correspondia a uma noção precisa nem obedecia a qualquer disposição legal (11).

7.     O mesmo se passava na Idade Média: um extracto de Alceu cita os gládios de Cálcide, de lâmina curta e punho longo, assim chamadas pelo seu lugar de fabrico (12). Neste período, nota‑se uma certa confusão entre as marcas dos artesãos e os selos dos locais de origem das mercadorias, resultantes da obrigação de os membros das corporações identificarem as suas criações, sob pena de exclusão. Em consequência, havia dois tipos de cunhos: o das corporações (signum collegii) e o do autor (signum privati) (13). Desta forma se certificava que no fabrico tinham sido respeitadas certas condições, o que indirectamente também garantia o lugar onde este tinha ocorrido.

8.     A Revolução Francesa extinguiu as corporações e restabeleceu a total liberdade de comércio, eliminando muitas destas práticas proteccionistas. Contudo, não o fez na totalidade, pois na primeira metade do século XIX ainda havia regras destinadas a promover as especialidades de determinadas localidades como o sabão de Marselha, os aços de Westfália e da Renânia ou as forjas da Áustria (14).

9.     A partir daí, algumas nações adoptaram medidas de repressão das fraudes sobre a origem dos produtos naturais ou manufacturados, especialmente no sector vinícola (15). O objectivo era proteger os consumidores, garantindo a autenticidade do produto e defendendo os empresários contra as imitações ilegítimas (16). Posteriormente, foi instituído um sistema de apoio que atribuiu independência própria à denominação de origem, à semelhança do instituído para os sinais que identificam as mercadorias.

10.   Entretanto, continuam a aparecer na literatura e na cultura europeias muitas referências à origem de alguns produtos para destacar a sua comprovada qualidade ou as suas especificações. Na obra «D. Quixote», Cervantes refere‑se aos fusos do Guadarrama (17), a alguns géneros alimentícios como o grão de Martos (18), os francolins negros de Milão, os faisões de Roma, a vitela de Sorrento, as perdizes de Morón ou os gansos de Lavajos (19), ao sabão napolitano (20) e a certos tecidos como o pano de Cuenca ou o «lemiste» de Segóvia (21); Lope de Vega elogia um xaile francês (22), gabando a «palmilla» de Cuenca (23) e (24) a cerâmica de Talavera; em Hamlet, príncipe da Dinamarca, Shakespeare faz alusão ao vinho do Reno com que dirige um brinde ao rei (25) e à aposta entre Cláudio e Laertes de seis cavalos berberes contra seis espadas e adagas francesas (26); Proust relata os elogios a uma sobremesa, dizendo que era digna de que se abrissem garrafas de vinho do Porto (27) e refere‑se ao encontro do narrador, no hotel de Balbec, com a duquesa de Guermantes, envolta na bruma de um vestido de seda cinzenta da China (28); e Carpentier, expressão autêntica da cultura europeia no continente americano, escreve sobre o vinho de Bordéus (29), dos chapéus de palha de Itália (30), das bonecas francesas e italianas ou do «whisky» escocês (31).

11.   Actualmente, a identificação dos objectos é feita com a marca própria de cada produtor mas, em muitos casos, também com a indicação do lugar de fabrico. Num mundo onde predominam os símbolos e onde a evolução das trocas comerciais proporciona aos consumidores múltiplas alternativas, o elemento distintivo é fundamental na escolha; daí a sua transcendência económica.

B –    Primeiros passos do direito comunitário

12.   No Tratado CE não há disposições relativas às indicações geográficas. Quando foi aprovado, e na sequência da evolução referida, os direitos nacionais protegiam‑nas de diversos modos. Enquanto alguns países davam garantias gerais por meio de normas de combate à concorrência desleal – designadamente mediante a aplicação do princípio da verdade – outros, como a França ou a Espanha, tinham um regime especial, paralelo ao concebido para alguns elementos específicos, caracterizado por distinguir entre «indicação de procedência» e «denominação de origem» (32).

13.   A existência desses diferentes modos de defesa na União Europeia gera tensões com as liberdades fundamentais uma vez que, ao reconhecer o direito de utilização exclusiva de um nome, se está a actuar sobre a circulação de mercadorias (33). Este efeito, porém, é expressamente referido no texto do Tratado: embora os artigos 28.° CE e 29.° CE proíbam as restrições quantitativas à importação e à exportação bem como as medidas de efeito equivalente, o artigo 30.° CE adverte que estas disposições são aplicáveis sem prejuízo, entre outras razões, da «protecção da propriedade industrial e comercial» (34), mas a competência dos Estados‑Membros nessa matéria cessa quando a Comunidade institui um sistema de harmonização para garantir a protecção. Em todo o caso, como adiante explicamos, coube ao Tribunal de Justiça fixar em que medida aquele direito prevalece sobre o de livre circulação.

14.   A oportunidade de flexibilizar o efeito do artigo 28.° CE neste âmbito foi anunciada na Directiva 70/50/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1969, relativa à supressão das medidas de efeito equivalente às restrições quantitativas à importação, não previstas por noutras disposições adoptadas por força do Tratado (35), mencionando as que reservem aos produtos nacionais qualificativos que não sejam de origem nem impliquem indicações de proveniência [alínea s) do artigo 2.°]. O que significa, a contrario sensu, que não são excluídas as abrangidas por estes conceitos.

15.   Posteriormente, a Directiva 79/112/CEE do Conselho, de 18 de Dezembro de 1978, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à rotulagem, apresentação e publicidade dos géneros alimentícios destinados ao consumidor final (36) previu a possibilidade de as autoridades de cada país proibirem o comércio desses produtos por razões de protecção da propriedade industrial e comercial, das indicações de proveniência, das denominações de origem e de repressão da concorrência desleal (n.° 2 do artigo 15.°).

C –    A regulamentação comunitária actual

16.   Num primeiro momento, o interesse comunitário abrangia apenas o sector vitivinícola, passando posteriormente a incluir os sectores agrícola e alimentar e podendo de futuro abranger outros (37), como parece prever o nono considerando do Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, de 14 de Julho de 1992 – a seguir «regulamento de base» – relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (38) ao circunscrever o seu âmbito de aplicação aos géneros «relativamente aos quais existe uma ligação entre as características do produto e a sua origem geográfica; [...] todavia, podem incluir‑se outros [...]» (39).

1.      Os produtos vitivinícolas

17.   Os vinhos, mostos e sumos de uva foram incluídos no anexo II do Tratado, ao enunciar os produtos em função dos quais seria concebida a política agrícola comum. Esta circunstância justifica que desde muito cedo tenham sido definidos princípios básicos e prevista a elaboração de regras para os vinhos «de qualidade produzidos em regiões determinadas», através do Regulamento (CEE) n.° 24 do Conselho, de 4 de Abril de 1962, relativo ao estabelecimento gradual de uma organização comum do mercado vitivinícola (40).

18.   Actualmente, o Regulamento (CE) n.° 1493/1999 do Conselho, de 17 de Maio de 1999, que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola (41), constitui o pilar da regulamentação no sector, sem prejuízo de outras regras especiais em diferentes domínios (42).

19.   Com base no facto de que «a designação, a denominação e a apresentação dos produtos abrangidos pelo [seu] âmbito de aplicação [...] podem ter uma influência significativa nas suas possibilidades de comercialização», o regulamento dedica parte do seu texto a «prever a utilização obrigatória de determinadas menções que permitam identificar o produto e fornecer aos consumidores algumas informações importantes, bem como a utilização facultativa de outras indicações com base em regras comunitárias ou sob reserva das disposições relativas à prevenção de práticas fraudulentas» (quinquagésimo considerando). De acordo com o n.° 1 do artigo 47.°, entre os seus objectivos constam, nomeadamente, a protecção dos legítimos interesses dos consumidores [alínea a)] e dos produtores [alínea b)], o correcto funcionamento do mercado interno [alínea c)] e a promoção da produção de produtos de qualidade [alínea d)].

20.   Quanto ao resto, o regime descrito é completado por leis específicas dos diversos Estados‑Membros.

2.      Os produtos agrícolas e os géneros alimentícios

21.   Foi preciso esperar pelo início da década de noventa do século passado até a Comunidade se dotar de um estatuto que regulamentasse a aplicação de termos territoriais a outros produtos, em especial aos produtos agrícolas e aos géneros alimentícios pois, embora inicialmente a já referida Directiva 79/112 relativa à rotulagem parecesse um instrumento adequado e suficiente para proteger o consumidor contra o risco de fraudes (43), logo se verificou que havia outros interesses em jogo. A directiva era um bom complemento, mas não protegia eficazmente as indicações geográficas nem o comprador (44).

22.   A necessidade de evitar novos obstáculos às trocas comerciais e de adoptar mecanismos que proporcionassem protecção adequada aos consumidores e aos fabricantes enquadrou‑se no estabelecimento de uma política comunitária de qualidade (45) destinada a completar as falhas detectadas e assinaladas pelo Tribunal de Justiça (46).

23.   Posteriormente foram apresentadas várias sugestões, incluindo a de assegurar uma ampla protecção aos vocábulos identificadores dos lugares de origem dos alimentos (47). A Comissão (48) actuou nesse sentido e o Parlamento Europeu também deu alguns contributos (49).

24.   Deste modo, ao subscrever a proposta apresentada em Fevereiro de 1991, o Conselho adoptou em 14 de Julho de 1992 o já referido Regulamento n.° 2081/92 (50), diploma essencial nesta matéria. Em contraste com o sector vitivinícola, o sistema assenta no tradicional conceito de denominação de origem, garantido pela inscrição obrigatória, pois a protecção só é concedida depois do registo (51).

D –    O Regulamento n.° 2081/92

25.   Os considerandos deste regulamento referem algumas iniciativas que o justificam: fomentar a diversificação da produção agrícola, promover produtos com determinadas especificidades e proporcionar aos consumidores informações claras e precisas sobre a procedência dos bens que adquirem. Reconhecendo os resultados satisfatórios conseguidos pelos Estados cujas ordens jurídicas defendiam as indicações de proveniência (quinto considerando), assinala que «um quadro de regras comunitárias que inclua um regime de protecção permitirá o desenvolvimento das indicações geográficas e das denominações de origem na medida em que garantirá, através de uma abordagem mais uniforme, a igualdade das condições de concorrência entre os produtores de produtos que beneficiem dessas menções e conduzirá a uma maior credibilidade desses produtos aos olhos dos consumidores» (sexto considerando).

26.   A protecção é muito ampla, pois segundo o artigo 13.°, as denominações registadas impedem: a) qualquer utilização comercial directa ou indirecta relativamente a produtos não abrangidos pelo registo; b) a usurpação, imitação ou evocação, ainda que especifique a origem verdadeira; c) qualquer indicação falsa quanto à proveniência, natureza ou qualidades essenciais dos produtos; e d) qualquer outra prática susceptível de induzir o público em erro quanto à verdadeira origem do produto.

27.   Em resumo, como afirmei nas conclusões apresentadas no processo Canadane Cheese e Kouri, «a protecção jurídica das denominações geográficas confere o monopólio colectivo da utilização comercial destas denominações geográficas a um grupo determinado de produtores que beneficiam deste direito em razão do local onde se encontram estabelecidos. Esta protecção diferencia‑se portanto da que é conferida às marcas, que só podem ser utilizadas pelos seus titulares» (52). É uma recompensa do esforço desenvolvido pelos titulares da credencial que, ao produzir os objectos de certa forma, conseguem que estes adquiram uma reputação digna de protecção através desta modalidade de propriedade industrial. A protecção evita prejuízos económicos aos detentores do sinal e, além disso, impede o enriquecimento ilícito de outras pessoas.

28.   Mas a evolução registada no plano internacional e o desejo de encontrar uma solução conforme com as orientações existentes nas legislações nacionais fazem com que a salvaguarda não se circunscreva às típicas denominações de origem, antes inclua, com maior ou menor intensidade, as indicações geográficas, conceitos nos quais, em vista dos recursos de anulação em causa, vale a pena determo‑nos. Também há que fazer uma referência aos nomes não susceptíveis de registo e ao procedimento de registo.

1.      Os conceitos de denominação de origem e de indicação geográfica

29.   O artigo 2.° do regulamento de base define o que, para efeitos desse regulamento, se entende por cada um desses conceitos. O n.° 2 estabelece uma delimitação inicial, alargada nos n.os 3 e 4.

a)      Delimitação básica

30.   De acordo com o artigo 2.°, entende‑se por:

«a)      Denominação de origem, o nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país, que serve para designar um produto agrícola ou um género alimentício:

–       originário dessa região, desse local determinado ou desse país e

–       cuja qualidade ou características se devem essencial ou exclusivamente ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, e cuja produção, transformação e elaboração ocorrem na área geográfica delimitada» (53);

b)      A indicação geográfica restringe‑se ao «nome de uma região, de um local determinado, ou, em casos excepcionais, de um país, que serve para designar um produto agrícola ou um género alimentício:

–       originário dessa região, desse local determinado ou desse país e

–       cuja reputação, determinada qualidade ou outra característica podem ser atribuídas a essa origem geográfica e cuja produção e/ou transformação e/ou elaboração ocorrem na área geográfica delimitada».

31.   Por conseguinte, não são garantidas todas as designações, mas unicamente as que tenham uma dupla relação, espacial e qualitativa, entre o produto, por um lado, e o seu nome, por outro. Além disso, a relação qualitativa distingue a denominação de origem da indicação geográfica e, no caso da segunda (54), a relação com o meio é menos acentuada.

i)      A relação geográfica

32.   Qualquer das duas modalidades tem que estar directamente ligada a um lugar. Este elemento da relação não tem balizas mínimas pois, ao mencionar um «lugar determinado», inclui a parcela mais pequena, como por exemplo uma parte de um vale, a encosta de um monte ou a margem de um rio.

33.   Pelo contrário, no que se refere ao máximo, já existe um impedimento imposto pelo termo «país», uma unidade territorial, com protecção apenas em «casos excepcionais». Em princípio, poder‑se‑ia pensar que foi concebida tendo em mente os Estados de reduzidas dimensões (55). Mas, se tivesse sido esse o caso, o próprio regulamento não deixaria de o referir (56), pelo que é possível, desde que se encontrem preenchidas as condições previstas, que se protejam designações de grande dimensão, incluindo as que abarcam a totalidade de uma nação (57).

34.   Convém insistir na eventualidade de a denominação de origem abranger a totalidade de um território, o que significa que algumas disposições, tanto nacionais como internacionais, não estabelecem qualquer limite (58). Pelo contrário, certas normas comunitárias, como as referidas no âmbito do sector vitivinícola, prevêem o carácter extraordinário de tão ampla referência (59).

35.   É certo que uma designação que compreenda todo um Estado pode ser considerada proteccionista, pois os seus produtos têm vantagem só pelo facto de aí serem fabricados. Mas o facto de o regulamento considerar estes casos «excepcionais» só reflecte a diminuta frequência com que as características de uma mercadoria surgem associadas aos elementos naturais e humanos do conjunto de um país (60), situação que se atenua nos de menor dimensão, o que não impede a sua aplicação a outros casos. É nesta linha que devem ser incluídas, por exemplo, as inscrições «Svecia» (61) ou «Salamini italiani alla cacciatora» (62).

ii)    A relação qualitativa

36.   Com esta exigência pretende‑se que o produto tenha uma qualidade ou propriedades que o distingam de outros da mesma espécie, devido às condições particulares do seu meio original, como o clima ou a flora.

37.   No entanto, as suas qualidades específicas são devidas geralmente a mais de uma circunstância e, por vezes, à conjugação de várias. A disposição menciona «factores naturais e humanos» (63). Embora a utilização da conjunção «e» signifique que ambos são exigidos, nada obsta a que habitualmente predomine um deles, de modo a que, na maioria dos casos, quando as especificidades correspondem à influência de circunstâncias naturais, assentem na denominação de origem e, quando os elementos de diferenciação decorram especialmente da actividade humana, na indicação geográfica (64).

b)      Conceitos equiparados

38.   Os n.os 3 e 4 do artigo 2.° alargam o conceito das denominações de origem, acrescentando as designações tradicionais e outras com conotações físicas.

i)      As denominações tradicionais

39.   Normalmente, os elementos distintivos tradicionais têm o nome de uma cidade, de uma localidade, de uma zona ou de uma região mais ou menos extensa. No entanto, na actividade económica são conhecidos outros sinais de maior alcance que não evocam directa e inequivocamente uma procedência local, embora a sugiram de forma indirecta. É o que acontece com os termos tradicionais que não fazem referência directa a um lugar mas que são capazes de indicar a origem da mercadoria, pois geram no espírito dos consumidores um processo de associação mental com alguma localização (65).

40.   Nos termos do n.° 3 do artigo 2.°, são equiparadas às denominações de origem certas denominações tradicionais, geográficas ou não, que designem um produto agrícola ou um género alimentício originário de uma região ou local determinado e que preencham as condições previstas no segundo travessão da alínea a) do n.° 2 (66).

41.   Nestas designações, também permitidas noutros domínios, como o vitivinícola (67), não surge a relação geográfica, embora a associação com uma demarcação concreta de que resultam certas especificidades se mantenha como elemento básico. São casos invulgares – a disposição refere «certas denominações» – que reúnem os requisitos essenciais do conceito a que são equiparados.

42.   Ao contrário de outros sectores, nos quais a protecção só é concedida em relação aos qualificativos explicitamente mencionados, dá‑se aqui uma protecção geral a produtos agrícolas ou géneros alimentícios «originários de uma região ou local determinado», na condição de a sua qualidade ou as suas características se deverem fundamentalmente ao meio geográfico e aos seus factores naturais e humanos, cujo cultivo, transformação e elaboração decorram no território delimitado.

ii)    Outras designações territoriais

43.   O n.° 4 do artigo 2.° alarga a protecção quando as matérias‑primas dos produtos em questão provenham de uma área geográfica mais vasta ou diferente da área de transformação desde que a área de produção da matéria‑prima se encontre delimitada, existam condições específicas para a sua produção e exista um regime de controlo que garanta a observância dessas condições.

44.   Cabem aqui os casos em que uma mercadoria identificada com uma denominação de origem não é proveniente do lugar indicado (68).

2.      As denominações não susceptíveis de registo

45.   O artigo 3.° faz uma delimitação negativa, impossibilitando a inscrição de determinados nomes, como os genéricos e os que podem induzir o público em erro sobre a verdadeira origem do produto.

a)      As denominações genéricas

46.   De acordo com uma proibição clássica, aplicada pelas administrações nacionais e reconhecida pelo Tribunal de Justiça (69), o n.º 1 do referido artigo veda o acesso ao registo das «denominações que se tornaram genéricas». Esta disposição é completada pelo disposto no n.º 2 do artigo 17.º que exclui também as «designações genéricas», mesmo que estejam protegidas nos países da Comunidade ou consagradas pelo uso noutros Estados onde não exista qualquer sistema de protecção.

47.   O impedimento justifica‑se por já não exercerem a sua função essencial, pelo facto de terem perdido a relação com a região de onde são originários e deixado de caracterizar a mercadoria em si mesma como proveniente de determinado lugar, passando a ser descritivas de um género ou de uma classe de artigos (70).

48.   O próprio regulamento de base, consciente das dificuldades provocadas pela proibição, definiu regras para a sua delimitação. Por um lado, assinala que, «na acepção do presente regulamento, entende‑se por denominação que se tornou genérica o nome de um produto agrícola ou de um género alimentício que, embora diga respeito a um local ou à região onde esse produto agrícola ou género alimentício tenha inicialmente sido produzido ou comercializado, passou a ser o nome comum de um produto ou género alimentício». Por outro lado, acrescenta que, «para determinar se uma designação se tornou genérica todos os factores devem ser tidos em conta e, nomeadamente:

–       a situação existente no Estado‑Membro onde a denominação tem origem e nas zonas de consumo;

–       a situação noutros Estados‑Membros;

–       as disposições legislativas nacionais ou comunitárias pertinentes».

49.   Não acabam aqui as cautelas, pois o mesmo artigo 3.° determina que, antes da data de entrada em vigor das normas, o Conselho deve elaborar uma lista, não exaustiva, indicativa das designações de produtos agrícolas ou géneros alimentícios abrangidos pelo regulamento e que, sendo considerados genéricos, nos termos do n.° 1, não podem, por este motivo, ser objecto de registo. Contudo, na data de leitura das presentes conclusões, essa determinação ainda não foi posta em prática.

b)      As denominações susceptíveis de induzir em erro

50.   O n.° 2 do artigo 3.° recusa a inscrição do nome «quando entrar em conflito com o nome de uma variedade vegetal ou de uma raça animal, podendo assim induzir em erro o consumidor em geral quanto à verdadeira origem do produto».

3.      O processo de registo

51.   Tal como outros direitos de propriedade industrial, a garantia do sinal distintivo de um produto agrícola ou de um género alimentício depende da inscrição num registo, que é um acto de natureza constitutiva e prossegue objectivos análogos aos da marca comunitária (71), ao contrário do que acontece no sector vitivinícola.

52.   Sendo o único método de protecção destes sinais na Comunidade, segundo se infere do n.° 3 do artigo 17.°, este requisito tem que ser respeitado, mesmo pelas designações que antes da entrada em vigor do regulamento de base já estavam protegidas pelos direitos nacionais ou consagradas pelo uso nos Estados que adoptaram outro sistema. Há dois regimes: o normal e o simplificado.

a)      O processo normal

53.   Consiste em duas fases consecutivas: a primeira decorre junto do governo nacional e a segunda junto da Comissão. Esta última inclui a verificação, a oposição – se houver lugar a ela – e a decisão sobre a inscrição.

54.   Para efeitos dos presentes recursos de anulação, apenas há que salientar que o artigo 15.° do regulamento de base (72) cria um comité – a seguir «comité de regulamentação» – ao qual apresenta um projecto, a fim de ser emitido um parecer. Aí, há duas alternativas: se houver acordo, é aprovado; não havendo, o projecto é submetido sem demora ao Conselho. Na falta de parecer do comité, muitas vezes devida à insuficiência de votos, é equiparada a esta última possibilidade. Se, por qualquer razão, o Conselho ainda não tiver deliberado no prazo de três meses, «a Comissão adoptará as medidas propostas».

b)      O processo simplificado

55.   A par destas diligências, o artigo 17.° incluía – a disposição foi eliminada pelo Regulamento n.° 692/2003, já referido – outras mais simples para evitar que os qualificativos já protegidos pelos ordenamentos jurídicos internos ficassem sujeitos aos mesmos obstáculos e atrasos que os novos.

56.   Consistia no conjunto dos seguintes actos: a) no prazo de seis meses contados da data de entrada em vigor do regulamento, comunicação dos Estados‑Membros à Comissão, de entre as suas denominações legalmente protegidas que pretendessem registar ou, nos países em que não existe um sistema de protecção, as consagradas pelo uso; e b) o registo pela referida instituição, segundo o processo do artigo 15.°, das denominações que estivessem em conformidade com os artigos 2.° e 4.°, não sendo aplicável o artigo 7.° e não podendo ser registadas as «denominações genéricas» (73).

c)      O comité científico

57.   Independentemente da tramitação, este regime inclui frequentemente o exame de problemas de natureza particularmente técnica. Para a assistir nestas questões, por decisão de 21 de Dezembro de 1992 (74) a Comissão instituiu um comité científico composto por profissionais altamente qualificados, que tem como atribuição examinar os elementos de definição das indicações e das denominações, suas excepções e o seu carácter genérico, apreciar o carácter tradicional de um produto e os critérios relativos ao risco de confusão do consumidor nos casos de conflito.

E –    O Regulamento n.° 1107/96

58.   Na sequência das notificações previstas no artigo 17.° do regulamento de base, em 12 de Junho de 1996 a Comissão aprovou o Regulamento n.° 1107/96 (75), para tornar públicos os registos efectuados a nível comunitário. O artigo 1.° dispõe que «as denominações constantes do anexo são registadas enquanto indicações geográficas protegidas (IGP) ou denominações de origem protegidas (DOP)».

59.   Este anexo foi alterado e completado várias vezes, normalmente para efeitos de algumas inclusões (76). Foi precisamente a impugnação de uma destas inclusões que deu origem aos presentes recursos.

III – Análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça

60.   O estudo das decisões do Tribunal de Justiça é particularmente importante para se encontrar conceitos a ter em consideração, os objectivos da protecção concedida e o sentido do regulamento de base.

A –    Concepção como direitos de propriedade industrial e comercial

61.   Embora de forma incidental, o acórdão Dassonville (77) debruçou‑se pela primeira vez sobre os sinais distintivos de procedência num processo prejudicial relativo à interpretação dos ex‑artigos 30.°, 31.°, 32.°, 33.°, 36.° e 85.° do Tratado CEE, relativamente à exigência, na Bélgica, de um documento oficial emitido pelo governo do país do exportador para os produtos com denominação de origem. Além de a considerar uma medida de efeito equivalente (n.° 5) declarou que, enquanto não houver um regime comunitário que garanta aos consumidores a origem de um produto, os Estados têm competência para adoptar medidas razoáveis, não discriminatórias nem restritivas, que evitem práticas desleais (n.os 6 e 7).

62.   O acórdão Sekt‑Weinbrand, já referido, abordou a questão de forma mais directa, do ponto de vista da livre circulação de mercadorias. A Comissão considerou que a Alemanha infringiu essa liberdade ao reservar as denominações «Sekt» e «Weinbrand» para os vinhos e brandies nacionais e a de «Prädikatssekt» para os Sekt produzidos no referido país mas com uma proporção mínima de uvas alemãs. O Tribunal de Justiça foi da mesma opinião, considerando que, embora o Tratado não impeça que os Estados legislem nesta matéria, proíbe novas condições arbitrárias e injustificadas com efeitos equivalentes às restrições quantitativas, o que acontece quando se atribui a protecção prevista para as designações de procedência a outras que não o são, tal como as denominações que, nessa altura, têm carácter genérico.

63.   O acórdão admitiu que a restrição à livre circulação só se justificava pela necessidade de garantir as denominações de origem pois estas protegem os interesses dos produtores face à concorrência desleal e os dos consumidores contra as indicações susceptíveis de os induzir em erro (n.° 7). O acórdão Cassis de Dijon (78) aludiu uma vez mais à «lealdade das transacções comerciais» e à «protecção dos consumidores».

64.   No entanto, estes fundamentos não constam do artigo 30.° CE, inaplicável «a situações diferentes das taxativamente previstas» (79), devendo ser interpretados restritivamente (80). Daí terem surgido dúvidas quanto à aplicabilidade da referida disposição aos termos que apontam para a origem de um produto.

65.   Na sua maior parte, a doutrina inclinou‑se pela sua inclusão no conceito de propriedade industrial e comercial referido nessa disposição (81). Invocou‑se, a este respeito, a Convenção da União de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial, de 20 de Março de 1883 (82), cujo artigo 1.°, n.° 2, faz referência, além das marcas e das patentes, às «indicações de proveniência ou denominações de origem».

66.   O acórdão Delhaize e Le Lion (83) subscreveu esta tese ao analisar a possibilidade de o vinho ser engarrafado num lugar diferente do da sua produção, entendendo que negar essa possibilidade só se justificaria «por razões derivadas da protecção da propriedade industrial e comercial, na acepção do artigo 36.° do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 30.° CE], se forem necessárias a fim de garantir que a denominação de origem cumpra a sua função específica» (n.° 16). Idêntica posição foi assumida nos acórdãos Exportur (84) e Bélgica/Espanha (85); segundo este último, «as denominações de origem integram os direitos de propriedade industrial e comercial. A regulamentação aplicável protege os seus beneficiários contra uma utilização abusiva das referidas denominações por terceiros que pretendam aproveitar‑se da reputação adquirida. Visam garantir que o produto que a ostenta provém de uma zona geográfica determinada e apresenta certas características particulares» (n.° 54). Os acórdãos Ravil e Consorzio del Prosciutto di Parma (86) e Salumificio S. Rita (87) reflectem estas mesmas ideias.

B –    Objectivo da protecção

67.   O acórdão Sekt‑Weinbrand, já referido, salientou que a função das denominações de origem e das indicações geográficas é informar e assegurar que o produto indicado «possui efectivamente qualidades e características devidas à sua localização geográfica e proveniência» (n.° 7). Esta doutrina pressupunha a existência da dupla relação, espacial e qualitativa (88), consignada no regulamento de base, o que o acórdão Delhaize e Le Lion, já referido, também reafirmou.

68.   O acórdão Bélgica/Espanha, também já referido, insistiu em que os empresários podem beneficiar da reputação entre os consumidores, para angariar clientes. Expôs que «a reputação das denominações de origem é função da imagem que gozam junto dos consumidores. Esta imagem depende, essencialmente, das características específicas e, mais geralmente, da qualidade do produto. É esta última que está na base, em definitivo, da reputação do produto» (n.° 56).

69.   O enquadramento na propriedade industrial e comercial abre uma nova perspectiva no património dos titulares, baseada na reputação, manifesta ou implícita, dos seus artigos (89), protegendo‑os da usurpação de quem pretenda utilizar uma designação sem base jurídica. Por outras palavras, implica a atribuição de um monopólio de uso. Como afirmado no acórdão Keurkoop (90), para efeitos do artigo 30.° CE tal garantia destina‑se a «definir os direitos exclusivos característicos da referida propriedade» (n.° 14).

70.   Mas, segundo se depreende do acórdão Warsteiner Brauerei (91) e, mais explicitamente, do acórdão CMA, já referido, a protecção das chamadas indicações de proveniência simples não resulta da propriedade industrial e comercial mas da protecção dos consumidores. O n.° 26 deste acórdão rejeita o argumento segundo o qual «o regime controvertido é justificado ao abrigo do artigo 36.° do Tratado CE [...] como beneficiando da derrogação relativa à protecção da propriedade industrial e comercial na medida em que o selo CMA constitui uma simples indicação geográfica de origem».

C –    O regulamento de base

71.   O Tribunal de Justiça debruçou‑se várias vezes sobre o Regulamento n.° 2081/92. Uma tentativa de sistematização da jurisprudência permite distinguir decisões que se referem ao âmbito de aplicação, à extensão da cobertura comunitária e à inscrição no registo e seus efeitos, a fim de se proceder a uma apreciação geral desta matéria.

1.      Âmbito de aplicação

72.   O acórdão Itália/Comissão (92), proferido num recurso em que se impugnava o regulamento relativo às normas comerciais para o azeite (93), esclareceu que os critérios enunciados no regulamento de base «[se] referem [...] a áreas geográficas determinadas e homogéneas, não podendo ser transformados em regras gerais, aplicáveis seja qual for a extensão e a heterogeneidade das zonas em causa» sem que haja «um princípio geral segundo o qual a origem dos diversos produtos agrícolas deve ser imperativa e uniformemente estabelecida em função da zona geográfica em que foram cultivados» (n.° 24).

73.   Além disso, como acrescentou o acórdão Budéjovický Budvar (94), o recurso ao regulamento de base «depende essencialmente da natureza da denominação, no sentido de que se limita às designações referentes a um produto em relação ao qual existe uma ligação particular entre as características e a sua origem geográfica, bem como do âmbito comunitário da protecção conferida».

74.   Mais concretamente, respondendo a uma questão prejudicial submetida pela «Cour de cassation» de França relativamente à utilização da palavra «montagne» em produtos agrícolas e géneros alimentícios, o acórdão Pistre e o., a que já me referi, assinalou a relação necessária entre a qualidade e as características dos produtos, por um lado, e o meio físico, por outro. Esta relação não é evidente naquela palavra que, aliás, sugere ao consumidor qualidades aliadas de modo abstracto a cenários de altitude e não a um determinado lugar, região ou país.

75.   Em todo o caso, como se depreende deste último acórdão, fora do âmbito de aplicação do regulamento de base, os Estados conservam a faculdade de regulamentar nas suas demarcações a utilização de rótulos territoriais. O acórdão Warsteiner Brauerei, já referido, confirmou este critério em relação às indicações simples, ao declarar que o direito comunitário «não se opõe à aplicação de uma regulamentação nacional que proíba a utilização, que comporte o risco de induzir em erro, de uma indicação de origem geográfica sem qualquer conexão entre as características do produto e a sua origem geográfica» (n.° 54). O acórdão Budéjovický Budvar, também já referido, reafirmou este entendimento.

2.      Alcance da protecção

76.   O acórdão Consorzio per la tutela del formaggio Gorgonzola (95) assinalou, por um lado que, no estado actual do direito comunitário, o princípio da livre circulação de mercadorias não obsta a que um Estado‑Membro tome medidas para proteger as menções registadas. Por outro lado, acrescentou que a protecção conferida pelo regulamento de base é extensível a qualquer evocação [alínea b) do n.° 1 do artigo 13.°] mesmo que se indique a verdadeira origem do produto, o que abrange as situações em que o nome incorpora uma parte protegida, sendo irrelevante que haja risco de confusão (n.os 25 e 26).

77.   Ora, entre o fabrico e a comercialização costuma haver várias fases, pelo que os acórdãos Ravil e Consorzio del Prosciutto di Parma e Salumificio S. Rita, já referidos, se pronunciaram sobre a possibilidade de a raladura e a embalagem de um queijo bem como o corte do presunto em fatias serem realizados em lugares diferentes dos de produção. Ambas as decisões sustentaram que nem a obrigação de informar os consumidores de que tais operações foram realizadas noutro lugar nem os controlos fora da região de origem são suficientes para garantir o objectivo visado pelas denominações de origem (96).

3.      A inscrição e respectivos efeitos

78.   Os acórdãos Chiciak e Fol (97) e Consorzio per la tutela del formaggio Gorgonzola, já referido, também abordaram a obrigatoriedade do registo, tendo o segundo recorrido ao primeiro para negar a existência da protecção, mesmo que em maior medida do que a europeia concedida por uma autoridade nacional depois de a Comissão ter efectuado o registo (n.° 18).

79.   Por sua vez, o acórdão Chiciak e Fol delimitou os efeitos da inscrição, ao examinar a eventualidade de alteração unilateral de um nome registado segundo o procedimento simplificado do artigo 17.° do regulamento de base. Rejeitou essa possibilidade, interpretando a norma no sentido de que, «após a sua entrada em vigor, um Estado‑Membro não pode, através da adopção de disposições nacionais, alterar uma denominação de origem para a qual pediu o registo em conformidade com as disposições do artigo 17.° e protegê‑la a nível nacional» (n.° 33).

80.   Relativamente às consequências da inscrição no registo, há que mencionar também o acórdão Bigi (98). Nesse processo tratava‑se de saber se podia ser vendido fora do território italiano queijo ralado com a denominação «parmesão» – país onde é produzido e onde é proibida a utilização dessa designação – pelo facto de não respeitar o caderno de especificações do «Parmigiano Reggiano». A resposta foi muito clara: a partir do momento em que um Estado solicita a inscrição por meio do procedimento simplificado, os produtos que não se adaptam às cláusulas correspondentes não podem ser legalmente comercializados no seu território; além disso, uma vez inscrito na lista, o regime de excepção previsto no n.° 2 do artigo 13.° do regulamento de base só é aplicável aos produtos não originários do seu território.

81.   Noutro plano, a impugnação de uma das alterações do Regulamento n.° 1107/96, incluindo «Spreewälder Gurken» como indicação geográfica protegida (99) permitiu ao Tribunal de Justiça abordar, no acórdão Carl Kühne e o. (100) a repartição de competências entre os Estados e a Comissão no processo de inscrição, subscrevendo o conceito de denominação «consagrada pelo uso» utilizado pelo artigo 17.° do regulamento de base. Quanto ao primeiro aspecto, referiu que a distribuição do trabalho se explica pelo facto de o registo pressupor a verificação de «que estão satisfeitas um certo número de condições, o que exige, em grande medida, conhecimentos aprofundados de certos elementos que são próprios ao Estado‑Membro em causa, elementos estes que as autoridades competentes deste Estado estão melhor colocadas para verificar» (n.° 53), ao passo que a Comissão tem a incumbência de verificar «se as especificações que acompanham um pedido estão em conformidade com o disposto no artigo 4.° do regulamento», ou seja, se incluem os elementos requeridos, se enfermam de erros manifestos, e se «a denominação satisfaz as exigências do artigo 2.°, n.° 2, alíneas a) ou b)» do mesmo regulamento (n.° 54). Quanto ao segundo ponto, entendeu que apreciar se a consagração de um termo está consagrada pelo uso depende de verificações efectuadas pelas autoridades nacionais competentes, eventualmente sob o controlo dos órgãos jurisdicionais nacionais, antes de o pedido de registo ser apresentado à Comissão (n.° 60).

4.      Corolário

82.   Todas estas decisões reflectem a tendência impulsionada pela legislação europeia para fomentar a qualidade dos produtos no âmbito da política agrícola comum, favorecendo a sua reputação, como expressamente reconhecem os referidos acórdãos Ravil e Consorzio del Prosciutto di Parma e Salumificio S. Rita (101) que atribuem às denominações de origem uma dupla finalidade: garantir a proveniência do produto em causa e impedir a utilização fraudulenta do nome, ao mesmo tempo que protegem a propriedade industrial e comercial que, relativamente ao princípio da livre circulação de mercadorias, adquire cada vez maior importância.

IV – Antecedentes dos litígios

A –    A primeira inclusão de «feta» no Regulamento n.° 1107/96 (102)

83.   Em 21 de Janeiro de 1994, as autoridades gregas, ao abrigo do n.° 1 do artigo 17.° do regulamento de base, requereram à Comissão o registo, como denominação de origem protegida, do termo «feta», correspondente a um tipo de queijo. O processo apresentado continha informações relativas à origem geográfica da matéria‑prima utilizada no fabrico, às espécies e raças dos animais produtores do leite utilizado, aos processos de fabrico do queijo e às suas especificidades.

84.   Juntava‑se o decreto ministerial n.° 313025/1994 do Ministério da Agricultura, de 11 de Janeiro de 1994 (103) que salvaguardava a referida designação a nível nacional.

–       De acordo com o n.° 1 do artigo 1.°, «o nome é reconhecido como denominação de origem protegida (DOP) para o queijo branco em salmoura fabricado tradicionalmente na Grécia, em especial nas regiões indicadas no n.° 2 do presente artigo, à base de leite de ovelha ou de uma mistura de leite de ovelha e de leite de cabra».

–       Nos termos do n.° 2 do artigo 1.°, o leite utilizado no fabrico só pode ser proveniente «das regiões da Macedónia, Trácia, Épiro, Tessália, Grécia central, Peloponeso e da província (Nomos) de Lesbos».

–       As disposições seguintes regulamentam os requisitos do leite, o método de produção e as características do queijo, designadamente as qualitativas, organolépticas e gustativas, bem como as especificações das embalagens.

–       O n.° 2 do artigo 6.° proíbe o fabrico, a importação, a exportação, a circulação e a comercialização como «feta» do queijo que não satisfaça as condições referidas.

85.   Face à necessidade de agir com a maior prudência, em 1994 a Comissão encomendou a realização de uma sondagem Eurobarómetro num universo de 12 800 pessoas, cujo relatório final de 24 de Outubro de 1994 indica que:

–       Em média, um cidadão da União Europeia em cada cinco já ouviu o nome ou viu a denominação «feta». Em dois Estados, a saber, a República Helénica e o Reino da Dinamarca, esta denominação é todavia reconhecida por quase toda gente.

–       Entre as pessoas que a identificam, a maioria associa‑a a um queijo e uma boa parte destas pessoas especificam mesmo que se trata de um queijo grego.

–       Três em cada quatro pessoas que conhecem a denominação «feta» precisam que a mesma evoca um país ou uma região com os quais o produto tem alguma relação.

–       Entre as pessoas que já viram ou ouviram o nome, 37,2% consideram que se trata de um nome comum – percentagem que, na Dinamarca atinge 63% – ao passo que 35,2% consideram‑na um produto de origem determinada – na Grécia esta opinião mantém‑se nos 52%. As restantes não manifestaram qualquer opinião.

–       Por último, verifica‑se uma grande divisão de opiniões quanto à questão de saber se se trata de um género alimentício genérico ou com uma origem determinada. Entre os que reagem espontaneamente ao nome e respondem que se trata de um queijo, 50% atribui‑lhe uma proveniência concreta e 47% consideram‑no um nome comum.

86.   No parecer que emitiu em 15 de Novembro de 1994, o comité científico considerou, por quatro votos contra três, que, tendo em conta os dados fornecidos, estavam preenchidos os requisitos para o registo, em especial os do n.° 3 do artigo 2.° do regulamento de base. No mesmo parecer, o comité científico concluiu por unanimidade que o termo não era genérico.

87.   Em 19 de Janeiro de 1996, a Comissão aprovou uma relação de nomes, entre os quais figurava o «feta», susceptíveis de registo em conformidade com o artigo 17.° do referido diploma. O comité de regulamentação não se pronunciou no prazo previsto para o efeito; submetido o assunto ao Conselho, em 6 de Março de 1996, este também nada decidiu no prazo de três meses de que dispunha.

88.   Em 12 de Junho de 1996, a Comissão adoptou o Regulamento n.° 1107/96, incluindo «feta» no anexo, parte A, «Produtos do anexo II do Tratado destinados à alimentação humana», rubrica «queijos», país «Grécia», como denominação de origem protegida («DOP»).

89.   Os Governos da Dinamarca, da Alemanha e da França impugnaram esse registo e interpuseram no Tribunal de Justiça os correspondentes recursos de anulação.

B –    O acórdão «Feta»

90.   Este acórdão pôs termo aos três litígios, anulando «o Regulamento (CE) n.° 1107/96 da Comissão, de 12 de Junho de 1996, relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.° do Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, [...] na parte em que procede ao registo da denominação ‘feta’ como denominação de origem protegida».

91.   No essencial, os demandantes tinham apresentado dois fundamentos relacionados com o n.° 3 do artigo 2.° e com o n.° 1 do artigo 3.° do regulamento de base. No primeiro, alegavam o incumprimento dos requisitos necessários para a inscrição, visto o género alimentício em questão não ser originário de uma região ou de um lugar determinado nem possuir qualidades ou características resultantes fundamental ou exclusivamente do meio físico, com os respectivos factores naturais e humanos, de onde é proveniente. No segundo sustentavam que o termo era genérico e, como tal, insusceptível de registo.

92.   O Tribunal de Justiça iniciou a sua análise por esta última questão, pois a proibição afecta todos os qualificativos, incluindo os que reúnem as condições exigidas para lhes ser dada cobertura (n.° 52).

93.   Tendo tido em consideração, por um lado, as alegações dos Estados recorrentes (n.os 53 a 64) e, por outro, as da Comissão e da Grécia – que, como no caso presente, interveio em apoio da legalidade do regulamento controvertido – (n.os 65 a 77), o Tribunal de Justiça expôs a sua apreciação, em que se destacam os seguintes aspectos:

–       A proibição de acesso constante do artigo 3.° do regulamento de base é igualmente aplicável «às denominações que sempre foram genéricas» (n.° 80).

–       Como alguns governos apresentaram argumentos nesta matéria, «quer no quadro da elaboração da proposta de lista das denominações genéricas» quer no do «procedimento de adopção do regulamento controvertido», revestem grande importância «as considerações» apresentadas pela Comissão antes e durante a tramitação do pedido (n.os 82 a 86).

–       O seu exame revela que a Comissão «minimizou a situação nos Estados‑Membros que não o Estado de origem e negou qualquer pertinência às suas legislações nacionais» (n.° 87), factores que, juntamente com a realidade do país comunitário de onde provém o nome e das zonas de consumo, são expressamente mencionados no n.° 1 do artigo 3.° (n.° 88).

–       Na linha do exposto, de acordo com o segundo travessão do n.° 4 do artigo 7.°, «o facto de o registo de uma denominação [...] poder prejudicar a existência dos produtos que se encontram legalmente no mercado constitui um fundamento de admissibilidade de um direito de oposição por parte de outro Estado‑Membro», o que, embora expressamente previsto para o regime de registo normal, também produz efeitos no simplificado, pois há que ter em consideração «as práticas leais e tradicionais e os riscos de confusão existentes» (n.os 91 a 94).

–       Também é preciso ter em conta a existência de produtos no mercado, legalmente comercializados com a mesma denominação em Estados‑Membros diferentes do Estado de origem que requereu o registo (n.° 96).

–       No caso em apreço, não se teve em conta o facto de que a denominação em causa «tem sido utilizada há muito tempo em certos Estados‑Membros que não a República Helénica» (n.° 101).

94.   Os elementos expostos levaram a considerar que a Comissão não teve em conta «o conjunto dos factores que estava obrigada a tomar em consideração por força do terceiro parágrafo do n.° 1 do artigo 3.° do regulamento de base» e fundamentaram a decisão de anulação acima referida.

95.   A decisão judicial não analisou os requisitos materiais da inscrição, em especial o alegado carácter genérico do termo, limitando‑se a apreciar a análise da Comissão, que considerou incompleta. Também não verificou a existência das formalidades inerentes às denominações tradicionais.

C –    A segunda inclusão de «feta» no Regulamento n.° 1107/96 por força do Regulamento n.° 1829/2002

96.   Na sequência do acórdão referido, o Regulamento (CE) n.° 1070/1999, retirou do registo a inscrição «feta».

97.   Contudo, atendendo às razões da anulação, a Comissão quis avaliar, de modo exaustivo e actualizado, a situação na Comunidade no que diz respeito à produção, ao consumo e ao conhecimento do «feta», enviando, em 15 de Outubro de 1999, um questionário a todos os Estados, que convém abordar apesar do seu carácter meramente indicativo (104).

a)      Quanto à produção do queijo, embora também fabricado na Alemanha e na França, só a Grécia – desde 1935 – e a Dinamarca – desde 1963 – têm legislação específica (105):

–       A Grécia produzia 115 000 toneladas, na sua quase totalidade destinadas ao mercado interno.

–       A Dinamarca chegou às 27 640 toneladas em 1998, basicamente destinadas à exportação.

–       A Alemanha iniciou a produção em 1972, com um resultado que variava entre as 19 757 e as 39 201 toneladas, inicialmente consumidas por imigrantes, mas posteriormente destinadas ao comércio externo.

–       A França começou a produzi‑lo em 1931, chegando às 19 964 toneladas, sendo três quartas partes vendidas a outros países (106).

Saliente‑se que, assim como os gregos utilizam exclusivamente leite de ovelha ou uma mistura de leite de ovelha e de cabra, os dinamarqueses e os alemães utilizam quase exclusivamente leite de vaca, ao passo que os franceses usam leite de ovelha e, em menor medida, de vaca.

b)      Relativamente ao consumo, e sem prejuízo das reservas formuladas a este respeito (107), conclui‑se que 92% tinha lugar na República Helénica quando esta aderiu à Comunidade, diminuindo posteriormente para 73% em consequência do aumento verificado noutros países. Extrapolando o volume de consumo por pessoa e por ano, chegamos aos seguintes valores:

–       Em Espanha, no Luxemburgo, em Portugal, na Itália e nos Países Baixos, é inferior ou igual a 0,010 kg (cerca de 0,08% do total comunitário).

–       Na Irlanda, no Reino Unido, na Áustria, em França, na Suécia, na Bélgica e na Finlândia, oscila entre 0,040 e 0,150 kg (0,32% a 1,22%).

–       Na Alemanha, é de 0,290 kg (2,36%).

–       Na Dinamarca, é de 0,700 kg (5%).

–       Na Grécia atinge os 10,500 kg (85,64%).

c)      Parece que, de um modo geral, os consumidores tendem a relacionar o termo «feta» com o mundo helénico, segundo resulte da rotulagem do queijo (108), do texto das publicações e da publicidade.

98.   Estes dados foram comunicados ao comité científico que, em 24 de Abril de 2001, emitiu um parecer aprovado por unanimidade (109) negando o carácter genérico do termo, com os seguintes fundamentos:

a)      a produção e o consumo do queijo têm lugar na sua maior parte na Grécia, onde utilizam uma matéria‑prima e um método de produção diferentes dos outros Estados‑Membros, proporcionando uma posição dominante no mercado único; nos vários países que não o fabricam nem o consomem, o nome não é utilizado, pelo que não pode ser considerado comum;

b)      no espírito dos consumidores, o vocábulo «feta» evoca uma origem: a grega;

c)      Nos países com legislação específica sobre este género alimentício, as diferença técnicas são assinaláveis; neste contexto, é irrelevante que a expressão seja utilizada na nomenclatura aduaneira comum ou na regulamentação sobre as restituições à exportação.

99.   Confrontando as informações ao seu dispor, a Comissão sugeriu que o «feta» voltasse a ter protecção (110). O comité de regulamentação não deu parecer no prazo fixado pelo seu presidente. Submetida a proposta ao Conselho, passaram três meses sem que este se pronunciasse.

100. Nestas circunstâncias, o Regulamento n.° 1829/2002 aprovou a inscrição como denominação de origem protegida no registo previsto no n.° 3 do artigo 6.° do regulamento de base «dado que o carácter genérico da denominação «feta» não foi provado» (trigésimo quarto considerando) e por constituir uma «denominação tradicional não geográfica» (trigésimo quinto considerando).

D –    O processo «Canadane Cheese e Kouri»

101. Neste processo prejudicial, o Tribunal de Justiça esteve a ponto de subscrever as medidas já antes referidas, adoptadas pelo Governo grego para proteger o «feta». Não o fez porque, tendo o órgão jurisdicional de reenvio retirado as questões apresentadas, a única solução foi arquivar o processo, em 8 de Agosto de 1997.

102. Convém recordar, ainda que sucintamente, esse processo e as minhas considerações nas conclusões apresentadas.

103. Sem prejuízo de algumas práticas anteriores e de uma primeira norma restritiva (111), o Governo grego iniciou a regulamentação progressiva das condições de produção e de distribuição do queijo «feta» com o decreto ministerial n.° 2109/1988 (112) dos Ministérios das Finanças e da Agricultura, dando‑lhe continuidade noutros decretos desses mesmos ministérios, respectivamente n.os 688/1989 (113) e 565/1991 (114), que alteraram as disposições do artigo 83.° do código alimentar, a saber, o decreto ministerial n.° 313025/1994, já referido.

104. Aplicando esta regulamentação, as autoridades helénicas proibiram a venda, com aquele nome, de uma partida de queijo importado da Dinamarca. A empresa dinamarquesa Canadane Cheese Trading AMBA e a empresa grega Afoi G. Kouri AEVE impugnaram a proibição, bem como a condição de que, no mercado, fosse utilizada a expressão «Queijo branco, em salmoura, de leite de vaca pasteurizado, da Dinamarca» (n.os 1 a 6 das conclusões). Nos processos subsequentes, o Conselho de Estado apresentou ao Tribunal de Justiça três questões prejudiciais (n.° 7) para saber se uma legislação que proíbe a venda num país da Comunidade, sob a denominação «feta», de um queijo legalmente produzido e comercializado noutro Estado‑Membro sob esta mesma denominação, é uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, incompatível com o direito comunitário e, sendo caso disso, se havia alguma justificação nessa matéria (n.° 46).

105. Nas minhas conclusões, mencionei a produção e o comércio do referido queijo na Comunidade (n.os 9 a 19), referindo‑me em pormenor ao método de produção na Grécia e às suas principais qualidades: cor branca natural, sabor e aroma característicos (ligeiramente ácido, salgado e gordo) (n.os 15 e 16). Também não deixei de referir em pormenor as disposições legais nacionais relativas ao referido queijo (n.os 20 a 25). Tendo em conta que o regulamento de base ainda não tinha entrado em vigor à data dos factos, analisei a jurisprudência do Tribunal de Justiça e as disposições comunitárias sobre os elementos distintivos de venda dos produtos, tendo proposto a seguinte tipologia:

a)      as denominações comunitárias (n.° 27), que incluem os «euroalimentos» (por exemplo, o mel ou o chocolate), podem ser utilizadas sem restrições;

b)      as denominações genéricas (n.os 28 a 34), que incluem os nomes comuns utilizados para designar os produtos agrícolas ou os géneros alimentícios que fazem parte do património cultural e gastronómico geral, e que podem, em princípio, ser utilizadas por qualquer produtor. Mencionei como tais o «vinagre», a «genebra», a «cerveja», as «massas alimentícias», o «iogurte», o queijo «Edam», os «queijos», a «charcutaria» e o «pão»;

c)      as denominações geográficas (n.os 35 a 44), que designam alimentos, com alusão à sua proveniência de um espaço determinado. Isto pode acontecer directamente, quando a denominação inclui a referência geográfica («queso manchego», «prosciutto di Parma», «faba asturiana» ou «camembert de Normandie»), ou de maneira indirecta, quando a denominação não contém qualquer topónimo («queso de tetilla», «reblochon», «grappa», «ouzo» e «cava»).

106. Indo ao fundo das questões prejudiciais, impunha‑se, em primeiro lugar, verificar se as regras controvertidas configuravam uma medida de efeito equivalente contrária ao artigo 30.° do Tratado CE e, em caso afirmativo, ver se era justificada.

a)      Observando as normas nacionais à luz da jurisprudência, concluí que eram uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa do tipo a que se refere o Tratado (n.os 47 a 49).

b)      Consequentemente, tornava‑se necessário apurar se a limitação tinha acolhimento no próprio artigo 30.° ou, sendo caso disso, no artigo 36.°, ambos do Tratado CE:

–       Para verificar a protecção dos compradores e da manutenção da lealdade nas transacções comerciais, analisei as semelhanças e as diferenças entre os queijos grego e dinamarquês, em função dos ingredientes e do método de produção (n.os 61 e 62), da regulamentação internacional (n.° 63), das regulamentações e das expectativas dos consumidores dos países importadores (n.° 64) e dos outros Estados‑Membros (n.° 65), bem como dos actos comunitários (n.° 66). A conclusão foi a de que os dois produtos não são substancialmente muito diferentes: a defesa dos consumidores e a fiabilidade das trocas podia ser assegurada por meio de uma rotulagem adequada (n.os 67 e 68).

–       Ao invés, tendo em conta que o exame é realizado com base na ordem jurídica helénica, os direitos de propriedade industrial e comercial autorizam a restrição, pois na Grécia a denominação «feta» ajusta‑se às condições salientadas pelo acórdão Exportur: a) indica, de forma indirecta, a procedência do queijo comercializado com esse nome (n.° 73); b) garante um alimento com determinadas características e com uma qualidade que lhe confere grande reputação entre os consumidores desse país (n.os 74 e 75); c) está protegida pelo direito interno (n.° 76); e d) não sofreu na Grécia qualquer processo de erosão irreversível que a tenha transformado em genérica (n.° 77).

107. Estas razões levaram‑me a propor que o Tribunal de Justiça desse a seguinte respostas às questões prejudiciais:

«1)      A regulamentação de um Estado‑Membro que proíbe que um queijo legalmente produzido e comercializado noutro Estado‑Membro sob a denominação de venda ‘feta’ seja comercializado no seu território, sob essa mesma denominação é uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, incompatível com o artigo 30.° do Tratado CE.

2)      A regulamentação de um Estado‑Membro que reserva a denominação ‘feta’ para os produtos nacionais não pode ser justificada pela protecção dos consumidores ou da lealdade das transacções comerciais.

3)      A regulamentação de um Estado‑Membro que visa proteger os direitos que constituem o objecto específico de uma denominação geográfica como a denominação ‘feta’ pode ser justificada pela protecção da propriedade industrial e comercial prevista pelo artigo 36.° do Tratado.»

V –    Os recursos de anulação

108. A Alemanha, e a Dinamarca, com o apoio da França e do Reino Unido, pedem a anulação do Regulamento n.° 1829/2002 (115). A Comissão defende que o regulamento está em conformidade com o direito, sendo neste ponto apoiada pela Grécia que, nas suas observações, sustenta, além disso, que os recursos não devem ser admitidos por terem sido interpostos fora de prazo.

109. Na petição alemã invocam‑se alguns fundamentos formais de nulidade, cuja análise deve anteceder a dos fundamentos materiais que, tanto nesse caso da petição alemã como no do recurso dinamarquês, coincidem substancialmente com os invocados nos processos em que recaiu o acórdão de 16 de Março de 1999, já antes referido. Ou seja, o nome «feta» é genérico, não preenchendo os requisitos para ser considerado tradicional e beneficiar da protecção proporcionada pelo regulamento de base.

110. Na audiência, realizada em 15 de Fevereiro de 2005, compareceram para alegações os representantes da Alemanha, da Dinamarca, da França, da Grécia e da Comissão.

A –    Quanto à admissibilidade dos recursos de anulação

111. O Governo grego alega que, na altura em que interpôs o recurso, em 30 de Dezembro de 2002, já tinham expirado os dois meses previstos no n.° 5 do artigo 230.° CE, pois o regulamento foi publicado no Jornal Oficial de 15 de Outubro anterior.

112. Esta excepção processual não procede, pois o prazo estabelecido no Tratado para impugnar uma disposição é contado de acordo com o previsto no artigo 81.° do Regulamento de Processo (116), cujo n.° 1 dispõe que «quando um prazo para a interposição de recurso ou para a propositura de acção relativamente a um acto de uma instituição começar a correr a partir da data de publicação do acto, esse prazo deve ser contado, nos termos do artigo 80.°, n.° 1, alínea a), a partir do termo do décimo quarto dia subsequente à data da publicação do acto no Jornal Oficial das Comunidades Europeias»; o n.° 2 acrescenta que «os prazos processuais são acrescidos de um prazo de dilação fixo, em razão da distância, de dez dias».

113. Por conseguinte, por força dessas disposições, o prazo de dois meses começou a contar não no dia 15 mas no dia 30 de Outubro, de modo que, se os demandantes entregaram o recurso na Secretaria do Tribunal de Justiça em 30 de Dezembro, fizeram‑no atempadamente.

114. Por conseguinte, não há que ter em conta a questão prévia de inadmissibilidade com base no incumprimento do prazo de recurso.

B –    Questões de forma

115. A Alemanha invoca razões de anulação de natureza adjectiva, por violação do regulamento do regime interno do comité de regulamentação e do regulamento que estabelece o regime linguístico da Comunidade (117) e ainda por insuficiente fundamentação.

1.      Incumprimento dos prazos e do regime linguístico

116. O Governo alemão lembra que a convocatória da sessão do comité de regulamentação de 20 de Novembro de 2001 foi enviada por correio electrónico em 9 de Novembro, acompanhada de textos redigidos somente em francês e inglês, cuja tradução não foi disponibilizada, apesar do protesto apresentado.

117. Alega, por conseguinte, que a convocatória foi feita com menos de catorze dias de antecedência (118) sem um exemplar do anexo em todos os idiomas. A Comissão não nega estes factos, mas discorda das consequências jurídicas.

118. Ao abordar esta questão, convém recordar que a forma não é um fim em si mesmo. Esta ideia tem tanto mais sentido quanto, a não terem ocorrido as falhas, o resultado teria sido o mesmo (119).

119. Não se pode deixar de ter em conta que, segundo a acta da reunião de 20 de Novembro de 2001, só foram trocadas opiniões sobre o dossier «feta» e sobre uma síntese das respostas à sondagem da Comissão. O projecto de regulamento (120) foi discutido e votado em 16 de Maio de 2002.

120. Estes dados permitem distinguir esta situação da do acórdão Alemanha/Comissão (121), invocado pelas demandantes, em que as irregularidades formais detectadas pelo Tribunal de Justiça que vieram a determinar a anulação do acto impugnado se verificaram na reunião em que a proposta foi debatida. Numa síntese da apreciação, o n.° 32 expôs que «[...] a adopção do parecer do comité permanente da construção em violação da obrigação de efectuar este duplo envio no prazo previsto e omitindo o adiamento do voto apesar do pedido formulado neste sentido por um Estado‑Membro está viciada por violação de formalidades substanciais que implica a nulidade da decisão impugnada».

121. Nas conclusões que apresentei nesse processo e na linha do regulamento interno do referido comité, estabeleci uma distinção entre os casos em que são notificados documentos de trabalho geral ou preparatórios de uma reunião e aqueles em que se discute a adopção de uma determinada regulamentação. Em ambos a forma é importante, mas só assume carácter substancial no segundo caso, em relação ao qual produz todos os seus efeitos a determinação do artigo 3.° do regulamento n.° 1, no sentido de os textos das instituições serem redigidos na língua do Estado a que são remetidos.

122. De acordo com este raciocínio, as irregularidades do encontro preparatório de 20 de Novembro de 2001 não são essenciais nem, por conseguinte, implicam a anulação do regulamento recorrido, cuja proposta foi abordada noutro posterior, no qual não foi demonstrado que tivesse qualquer incidência. Também não é líquido que a redução dos dias decorridos entre a convocatória e a reunião ou que a falta de tradução do parecer do comité científico e dos dados da sondagem estivessem na origem da impossibilidade de defesa.

123. Além disso, se estas irregularidades não tivessem ocorrido, dificilmente o resultado da posterior decisão do comité de regulamentação sobre o projecto apresentado pela Comissão poderia ser outro. Pelo contrário, é lógico pensar que a solução teria sido idêntica – falta de maioria de votos –; a anulação do regulamento controvertido daria lugar à anulação do processado posterior ao momento em que ocorreram os vícios pelo que, uma vez estes sanados, o resultado seria o mesmo.

124. É nestes termos que deve ser entendido o décimo considerando do regulamento recorrido, ao assegurar que a informação disponível foi sintetizada pela Comissão de forma geral e pelos Estados‑Membros, que tiveram a oportunidade de corrigir e alterar essa síntese. A nulidade não pode decorrer do facto de esta última afirmação ser parcialmente incorrecta.

2.      Insuficiência de fundamentação

125. Nas minhas conclusões no processo Portugal/Comissão (122) sustentei que a fundamentação de um acto «constitui parte essencial» (123) e que o dever de a referir beneficia os particulares e proporciona ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para exercer plenamente a sua fiscalização jurisdicional (124). A jurisprudência também já declarou que esse dever impõe que se exponha clara e inequivocamente o raciocínio da instituição de que emana a norma impugnada, por forma a que os interessados conheçam as causas da medida adoptada e que o Tribunal de Justiça desempenhe a sua missão; contudo não exige a especificação de todos os antecedentes de facto e de direito pertinentes sempre que tenha de se ter em conta não só o teor literal da decisão mas também o seu contexto, assim como o conjunto de normas jurídicas que regulam a matéria em questão (125) (n.° 83).

126. No regulamento recorrido, a Comissão explica como, a pedido das autoridades gregas, decidiu proceder ao registo de «feta», embora tenha ordenado a sua retirada em consequência do acórdão de 16 de Março de 1999 (primeiro a quinto considerandos). Seguidamente, refere o questionário enviado aos Estados, para avaliar a produção, o consumo e, de um modo geral, o conhecimento que os consumidores comunitários têm daquela designação, expondo e comentando o seu conteúdo (sexto a vigésimo primeiro considerandos). A seguir, refere o parecer do comité científico, cuja parte final integra (vigésimo segundo a trigésimo segundo considerandos). Mais adiante, tem em conta que «a análise global exaustiva dos elementos de ordem jurídica, histórica, cultural, política, social, económica, científica e técnica comunicados pelos Estados‑Membros ou decorrentes das investigações efectuadas ou patrocinadas pela Comissão revelou que, nomeadamente, nenhum dos critérios exigidos pelo artigo 3.° do Regulamento (CEE) n.° 2081/92 para obter o carácter genérico de uma denominação era satisfeito» (trigésimo terceiro considerando), mas que, pelo contrário, «feta» é um nome tradicional não geográfico, incidindo com algum pormenor nos factores naturais e humanos que confluem na criação do queijo que designa (trigésimo quarto a trigésimo sexto considerando). Finalmente, refere a existência no caderno de especificações e de obrigações dos elementos exigíveis (trigésimo sétimo considerando), a necessidade de alterar o Regulamento n.° 1107/96 e a tramitação adoptada (trigésimo nono considerando).

127. O exposto permite concluir pela existência de suficiente fundamentação. Pode‑se discordar do alcance ou do conteúdo do raciocínio desenvolvido, mas essa crítica não impede a regularidade da justificação do que foi decidido.

C –    Fundamentos substantivos

128. No estudo das duas causas substantivas de anulação invocadas convém seguir a ordem proposta pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 16 de Março de 1999, analisando primeiro se o termo «feta» pode ser considerado genérico, para depois apurar se se trata de uma expressão tradicional (126).

1.      «Feta» como denominação genérica

129. Convém fazer uma referência «(a)o genérico» antes de verificar os factores fixados regulamentarmente para a delimitação do termo e os aplicar ao caso em apreço.

a)      Quanto «(a)o genérico»

130. Genérico é tudo aquilo que é comum a várias espécies, incluindo as condições de uma mesma classe ou família, definindo a sua natureza ou as suas qualidades. É o que acontece, por exemplo, com o termo «laranja», que designa todos os frutos com certas características de forma, cor, aroma ou gustativas que os distinguem de qualquer outro (127).

131. Esse carácter pode ser devido à própria expressão – porque sempre foi genérica – ou à sua progressiva generalização. Trata‑se de nomes que nunca tiveram ou que vieram a perder a sua função indicativa, não servindo para estabelecer uma diferença em razão do lugar de proveniência.

132. Como referi nas conclusões que apresentei no processo Canadane e Kouri, embora a jurisprudência não dê qualquer definição de «denominação genérica» (128), a aplicação do conceito aos géneros alimentícios implica incluir neles, os «que fazem parte do património cultural e gastronómico geral e que podem, em princípio, ser utilizados por qualquer produtor» (n.° 28). Neste sentido, também abrange os sinais que não se referem ao fabrico num determinado lugar e, por conseguinte, à proveniência do produto, mas unicamente às suas propriedades ligadas ao facto de terem sido utilizados processos de fabrico muito semelhantes (129).

133. Também inclui outras expressões que inicialmente tiveram um sentido territorial mas vieram a perdê‑lo em resultado de um processo de vulgarização, o que significa que já não servem para caracterizar uma mercadoria com uma origem determinada, pelo que a sua utilização não está reservada às empresas situadas na respectiva região.

134. A causa da vulgarização de um nome é normalmente devida (130) ao facto de alguns comerciantes não estabelecidos no lugar onde o nome surgiu começarem a utilizá‑lo, isoladamente ou em conjunto com um vocábulo «deslocalizador» – embora, neste caso, o processo seja mais lento. Muitas vezes, a utilização começa em zonas que receberam grandes fluxos migratórios, pelo facto de alguns industriais retomarem no país de acolhimento a actividade que exerciam no país de origem ou para satisfazerem a procura dos recém‑chegados, que pretendem desfrutar dos seus alimentos tradicionais; em ambos os casos, o propósito é tirar partido da fama já conseguida pelo produto. À medida que se esbate a relação geográfica prossegue‑se de boa fé, na convicção de que designam exclusivamente uma espécie de produtos com certas características. A conversão termina quando o termo descreve um género e é livremente utilizado.

135. Outro factor nesta sequência é a passividade dos interessados. O nome vai enfraquecendo devido à inércia dos particulares e das autoridades perante a sua utilização abusiva, reavivando‑se se houver uma reacção oportuna. Mas não se pode esquecer que as medidas de defesa diminuem tanto pela falta de regulamentação, inexistente até há pouco tempo, como pela apatia dos tribunais nacionais (131).

b)      Critérios de delimitação

136. O sistema instituído pelo regulamento de base atribui a competência para apreciar o carácter genérico à Comissão, que decide de acordo com o procedimento exposto, ouvido o comité científico. Também cabe, em menor medida, ao Conselho pois, como determina n.° 3 do artigo 3.°, este deve elaborar uma lista de nomes da respectiva classe que designem produtos agrícolas ou géneros alimentícios.

137. Esta organização não impede uma posterior fiscalização jurisdicional da legalidade da decisão em toda a sua dimensão. Não se pretende que o Tribunal de Justiça substitua a instituição referida e analise os possíveis fundamentos extra‑jurídicos que permitiram o registo do nome, mas sim que verifique se a inscrição é juridicamente válida (132).

138. O problema coloca‑se por se tratar de um conceito jurídico indeterminado cuja precisão é feita caso a caso e pelo facto de o registo de uma denominação de origem, na medida em que exprime «a realidade histórica, cultural, jurídica e económica» do produto (133), ser tanto mais difícil quanto mais popular for e mais frequentemente for utilizado.

139. O regulamento de base reconhece que, na maioria dos casos, a delimitação é um trabalho difícil e complicado. Para o tornar mais fácil traça dois métodos: elaboração de uma lista de nomes comuns (n.° 3 do artigo 3.°) e previsão de elementos de apreciação (n.° 1 do mesmo artigo) (134).

140. Como acima referido, ainda não houve acordo para aprovar uma relação dos nomes que, pela sua generalidade, não são susceptíveis de registo (135), o que demonstra a dificuldade da tarefa e faz revestir de especial interesse o outro mecanismo de esclarecimento, cuja simples existência demonstra que não se pode definir «genérico» em contraponto a «exclusivo» (136).

141. Além disso, para a qualificação, é necessário apreciar «todos os factores» e, «em especial», três: a situação existente no território de origem da expressão e nas zonas de consumo, noutros Estados‑Membros e nas legislações nacionais ou comunitárias pertinentes. Por isso, não se exclui o recurso a outros critérios.

i)      A situação no Estado‑Membro de origem do nome e nas zonas de consumo

142. Esta rubrica envolve dois factores: a posição do género alimentício no lugar onde surgiu e a que ocupa nos lugares onde é consumido, sem necessidade de convergência entre duas áreas.

–       A situação no Estado de origem

143. O acórdão Exportur, acima referido, tinha posto em evidência a importância deste critério, ao especificar que a protecção de um sinal só é extensiva ao território de outro país da Comunidade na medida em que continue a ser legítima no de origem. Contudo, para apreciar a conjuntura, além das providências de salvaguarda, há que ter em consideração outros factores como, por exemplo, a importância da produção e do consumo, a opinião dos habitantes ou o interesse demonstrado.

144. Depreende‑se desta situação que, na opinião quase unânime dos gregos, o «feta» designa um «alimento» tradicional próprio, confeccionado com um determinado leite, por meio de um método específico. Se se atender aos dados ao dispor da Comissão, a conclusão não é muito diferente.

145. Os demandantes não negam estes factos, mas colocam a tónica nos restantes factores que são sem dúvida de especial relevo, pois não se trata de alargar de um Estado para outro a defesa de certas designações, mas de proporcionar uma protecção jurídica comum em todos os Estados‑Membros.

–       A situação nas zonas de consumo

146. Assinale‑se que embora, no início, a clientela de um produto habite normalmente no lugar de onde o mesmo é originário, estende‑se depois a outros lugares, perdendo‑se a identificação inicial. É frequente um produto poder ser adquirido em locais muito diferentes, que nada têm que ver com aqueles onde é confeccionado ou de onde procede. Daí o valor que, nessas regiões, o símbolo adquire para a apreciação da sua generalidade.

147. A expressão «zonas de consumo» refere‑se obviamente aos consumidores. A doutrina salientou a importância da opinião destes agentes na altura de qualificar juridicamente a indicação(137), pois são os últimos intérpretes da importância que aquela tem no mercado. Contudo, nos presentes processos, mais do que a protecção dos consumidores, estão em causa os direitos de propriedade industrial e comercial reconhecidos no Tratado.

148. Para começar, parece que só há que ter em consideração as regiões comunitárias. Ora, o «feta», também é produzido e comercializado nos Balcãs. Como o artigo 3.° do regulamento de base obriga a ter em conta «todos» os factores que incidam na qualificação, a verificação pode por enquanto limitar‑se à situação no território da Comunidade e remeter para mais tarde a situação correspondente a outros territórios.

149. Por outro lado, nos locais de compra há que incluir os de proveniência, se forem coincidentes, como acontece neste caso. Daí que não se possa ignorar a opinião dos cidadãos gregos, entre os quais goza de grande reputação, permitindo aos empresários manter uma clientela muito significativa.

150. Deste ponto de vista plural, os consumidores daquele país identificam o «feta» com um produto nacional e uma boa parte dos consumidores dos outros Estados relaciona o referido queijo com a Grécia, sempre que nas etiquetas aparecem menções, expressas ou implícitas, à cultura helénica, embora excepcionalmente se encontrem rótulos, livros, revistas e outras indicações inócuas sem essa relação.

ii)    A situação noutros Estados comunitários

151. Não é necessário que o produto seja consumido em todos os lugares, pelo que este factor projecta‑se em dois âmbitos: por um lado, a conjuntura geral nos países diferentes daquele que pretende a denominação; e, por outro lado, naqueles em que também é produzido.

–       A situação geral nos outros Estados

152. No primeiro âmbito, atendendo aos dados do eurobarómetro e aos resultados da sondagem encomendada pela Comissão, fica‑se com a impressão de que, à semelhança do que acontece nas zonas de consumo, em que se inclui a expressão «feta», os cidadãos e as diferentes publicações associam‑na à cultura grega. Não é o que ocorre na Dinamarca nem na Alemanha e, embora em menor medida, também em França, o que se explica porque nas suas regiões há uma importante produção, aspecto que convém ter em devida conta.

153. Além disso, convém insistir num elemento: uma em cada cinco pessoas interrogadas conhece a palavra; se esta se tivesse generalizado, não seria identificada por um maior número de entrevistados? Recorde‑se que está em jogo a protecção dos direitos de propriedade industrial e comercial em toda a Comunidade e não apenas nos locais onde o queijo é produzido e consumido, uma vez que é provável que a sua aquisição se generalize no futuro. Por outras palavras, a socialização da expressão deve ser plural, sem limitação espacial aos lugares interessados na exploração comercial.

–       A situação nos Estados produtores do queijo

154. Neste segundo âmbito, o acórdão «Feta» advertiu para a necessidade de apurar se existem produtos comercializados com o mesmo nome em Estados‑Membros diferentes do de origem (n.° 96).

155. Para o efeito, o Tribunal de Justiça invocou o segundo travessão do n.° 4 do artigo 7.° do regulamento de base, que refere esta circunstância como um dos fundamentos de oposição ao registo. Mas a aplicação desta disposição foi prevista para as inscrições segundo o procedimento normal (138), ao passo que no caso presente se trata de um nome já garantido por regras nacionais, cuja protecção comunitária é pretendida por meio do procedimento simplificado. Por conseguinte, as situações são diferentes.

156. Em vista do que precede, entendo que o objectivo da decisão judicial é pôr em relevo uma conjuntura – a situação noutros territórios – não para lhe dar primazia sobre as demais mas para evitar que seja minimizada, como tinha feito a Comissão num primeiro momento. Por isso, há que relativizar a ideia exposta no acórdão pois, caso contrário, aceitar‑se‑ia, sem mais, a teoria da inacção, mostrando pouca sensibilidade para a impossibilidade de defesa jurídica de que muitas empresas foram vítimas antes da entrada em vigor da regulamentação de referência, submetendo‑as a um risco grave por permitir um processo de vulgarização através da simples usurpação por terceiros não autorizados; seria contrário à jurisprudência anterior, pois o acórdão SMW Winzersekt, já referido, relativamente à protecção das indicações dos vinhos, considerou essencial para se alcançar o objectivo das denominações de origem «[...] a impossibilidade de um produtor tirar proveito, para o seu próprio produto, da reputação firmada para um produto similar pelos produtores de outra região [...]»; e «[...] que o consumidor final obtivesse informações tão exactas quanto necessárias para apreciação dos produtos em causa»; por último dar maior relevo ao referido factor penalizaria as mercadorias que, pela sua dinâmica, estão no comércio noutros lugares pouco tempo após aparecerem num mercado determinado, pois os concorrentes, com os progressos técnicos actuais, imitá‑las‑iam e utilizariam o mesmo termo.

157. Em resumo, a referência à regularidade no comércio de produtos homónimos tem que ser interpretada de acordo com o sistema de garantia concebido. Esta percepção global significa apenas que, nos casos como os presentes, não se pode deixar de pensar na situação noutros Estados‑Membros. Por si só, de modo algum basta para constituir um obstáculo à inscrição pedida no âmbito do artigo 17.° do regulamento de base.

158. Centrando o debate nessa circunstância, verifica‑se que o nome «feta» é utilizado na produção de um queijo, especialmente na Dinamarca, na Alemanha e em França, utilizando tipos de leite e métodos de produção diferentes dos utilizados na Grécia.

159. A este último respeito, vale a pena resumir o exposto nos n.os 61 e 62 das conclusões Canadane Cheese e Kouri:

a)      A utilização de um ou outro tipo de leite implica que, uma vez que o leite de ovelha e o de cabra têm características químicas e organolépticas diferentes do leite de vaca, se verifiquem as seguintes diferenças no resultado:

–       A utilização de leite de ovelha leva a um produto de cor branca pura, ao passo que no outro caso adquire uma tonalidade branca amarelada, só possível de ocultar utilizando substâncias químicas.

–       Com o leite de ovelha o queijo fica com um sabor gorduroso, salgado e ligeiramente ácido e com muito aroma, o que não acontece com o leite de vaca que, além disso, é mais adocicado.

–       Com a utilização do leite de vaca, o produto fica com menos buracos do que com o leite de ovelha porque a salmoura não tem o mesmo efeito em ambos.

b)      Mesmo que a maturação do queijo seja mais rápida com a ultrafiltração, pois o soro é eliminado antes da formação do requeijão, não parece que o diferente método de produção tenha resultados assinaláveis.

iii) As legislações nacionais ou comunitárias pertinentes

160. O regulamento de base exige que se tomem em consideração as disposições legais em vigor nos Estados‑Membros e na Comunidade.

–       As legislações nacionais

161. A referência às regulamentações internas tem como objectivo averiguar se o termo é protegido no país de origem e noutros Estados, independentemente do volume de negócios que gera. Convém recordar um aspecto já referido: antes da regulamentação comunitária, a maioria dos países não dispunha de estruturas legais de protecção de menções geográficas o que, de certo modo, relativiza a importância deste factor.

162. Neste sentido, as disposições gregas da década de oitenta limitam‑se a confirmar por escrito um uso tradicional do sinal, que remonta a vários séculos, regulando a produção e a comercialização do «feta».

163. Também na Dinamarca foram adoptadas regras relativas a este produto – nos Países Baixos ainda se mantiveram algum tempo – embora sem restrições ao tráfico, já que seria contraditório proteger um nome cuja generalização se defende.

164. Assinale‑se também que, nos termos de um acordo bilateral de 20 de Junho de 1972, já referido, a Áustria reserva a designação para o queijo procedente da Grécia.

–       O direito comunitário

165. Neste domínio, foram trazidos à colação, como elementos para se apreciar a vulgarização de um nome, tanto a nomenclatura combinada utilizada pela Pauta Aduaneira Comum como a regulamentação das restituições à exportação.

166. Contudo, tendo em atenção a finalidade que prosseguem, estes elementos não podem servir de critério delimitador em matéria de direitos de propriedade industrial (139). O mesmo sucede com as normas aprovadas na política agrícola comum em apoio de alguns preços. Ao aprovar e aplicar essas disposições, não se avalia se o destinatário utiliza legitimamente um distintivo concreto. Quando muito, poder‑se‑lhes‑ia reconhecer uma virtualidade orientadora, mas nunca determinante.

167. Um exemplo pode ilustrar os efeitos de uma aplicação rígida da Nomenclatura Combinada (140). O «Mozartkugeln» é uma famosa especialidade austríaca de maçapão e nógado coberta de chocolate com leite. Se for considerado um derivado do chocolate, ainda que o contenha numa proporção mínima, está excluído do regulamento de base, por não estar previsto no anexo I do Tratado; se for considerado um bolo, figura na lista do Anexo I do referido regulamento, embora contenha uma certa percentagem de chocolate.

iv)    Outros factores

168. Recorde‑se a obrigação de apreciar «todos os factores» pertinentes. A doutrina apontou alguns: a utilização do nome em obras de referência como dicionários, livros de viagens ou guias de restaurantes (141); o volume de negócios dentro e fora da região em causa ou à qual, em princípio, a denominação está associada(142); a classificação como genérica num tratado internacional ratificado por, pelo menos, um Estado‑Membro (143).

169. No caso dos autos, pode dar‑se relevo a dois: a situação nas regiões extracomunitárias e o elemento temporal.

–       A situação em Estados terceiros

170. A verificação do que acontece em áreas exteriores à Comunidade deriva da referência às «zonas de consumo» no n.° 1 do artigo 3.° do regulamento de base e no artigo 12.°, que prevê a aplicação das suas disposições «a um produto agrícola ou género alimentício» proveniente «de qualquer país terceiro» desde que se encontrem satisfeitas certas condições.

171. No presente recurso de anulação não se nega que noutras regiões europeias se produzem queijos brancos em salmoura semelhantes ao «feta», como, por exemplo, na Bulgária. Também se produzem tipos de queijo semelhantes no Irão e na Arábia Saudita, onde se utiliza o leite de ovelha bem como nos Estados Unidos e na Nova Zelândia, onde o leite normalmente utilizado é o de vaca (144).

172. Por conseguinte, a percepção desses países serve de um parâmetro para verificar a correcta delimitação do termo, embora não convenha exagerar a sua influência em função do objectivo de protecção em causa, sem prejuízo de, como acontece com outros elementos distintivos, ser territorialmente extensível por meio de acordos internacionais (145).

–       A situação no tempo

173. Mesmo quando a situação no Estado‑Membro que formula o pedido parece referir‑se ao momento presente, a memória do tempo passado repercute‑se na percepção da generalização do nome, fundamentalmente para apurar se este sempre foi comum. Neste processo, a perspectiva histórica assume grande relevância.

174. Recordando o que afirmei nas minhas conclusões no processo Canadane Cheese e Kouri, sublinhe‑se que o termo «feta» tem origem no italiano «fetta», que significa fatia ou rodela. Foi introduzido na Grécia por influência veneziana durante o séc. XIX, para designar o queijo branco tradicional em salmoura, fabricado desde tempos imemoriais em quase toda a Grécia e noutras regiões dos Balcãs.

Na Odisseia, Homero refere que Polifemo «[...] sentou‑se e ordenhou as ovelhas e cabras balantes, pela sua ordem e, tendo terminado, deixou as crias ir aos úberes. Depois, tomou metade do leite branquíssimo, coalhou‑o e dispô‑lo em cestos de vime [...]» (146). Assim fabricava o ciclope Polifemo os queijos que Ulisses e os seus companheiros encontraram na sua caverna. Não é de estranhar que Polifemo, ao utilizar este método de produzir queijo, tão próximo do actualmente praticado na Grécia, nem sonhasse com os problemas jurídicos que a livre circulação desse produto iria provocar no final do séc. XX, não só pela impossibilidade de adivinhar, com vinte e sete séculos de antecedência, os complexos meandros das denominações protegidas como também pela sua própria natureza, pois os ciclopes eram criaturas sem qualquer noção de justiça ou de lei (147). Na Odisseia também se faz alusão a como, nos tempos antigos de Pandareu, as filhas foram raptadas pelos fortes ciclones, depois de os deuses terem morto os seus pais e como Afrodite «as ungiu de mel, queijo e vinho delicioso» (148).

O outro poema homérico, a Ilíada, mostra a importante presença do queijo na Grécia do séc. VIII antes de Cristo (149).

O «feta» é feito com leite de ovelha ou com uma mistura de leite de ovelha e de cabra, pelo método de escorrimento natural sem pressão. As autoridades helénicas não regulamentaram a sua produção até 1988, quando já existia uma pluralidade de variedades locais ou regionais (n.os 14 a 16 das conclusões).

175. A falta de especificações técnicas a nível internacional possibilitou o desenvolvimento em vários países de um método diferente de produção, mais moderno e competitivo, inicialmente destinado a satisfazer a procura dos imigrantes gregos – como reconheceram, na audiência, os representantes da Alemanha e da França. Na segunda metade do séc. XX, começa a ser produzido na Dinamarca, na Alemanha e nos Países Baixos um queijo com leite de vaca comercializado com o mesmo nome mas utilizando um método industrial de ultrafiltração. Em França, é produzido um queijo homónimo com leite de vaca e, nalguns lugares, como na Córsega e nalgumas regiões do Maciço Central, com leite de ovelha, embora nestas últimas sobretudo para aproveitar o leite não consumido na produção do queijo «Roquefort» (n.° 17 das referidas conclusões).

176. O que leva estes comerciantes a designar por «feta» o queijo branco em salmoura produzido com leite de vaca? Sem dúvida alguma o propósito de utilizar um nome que diga algo aos consumidores. Tal como a Comissão afirmou na audiência, procurou‑se a designação que pudesse gerar mais vendas (150).

c)      Apreciação dos critérios e consequências

177. O regulamento de base não estabelece uma hierarquia das condições pertinentes para apreciar a generalização de um sinal, pelo que fica a dúvida de saber se alguma tem primazia sobre as demais.

178. O acórdão Exportur, várias vezes referido, proferido antes da entrada em vigor daquele regulamento, optou por dar maior importância à situação no lugar de origem, doutrina igualmente aceite nas conclusões Canadane Cheese e Kouri (151).

179. Não obstante, o acórdão «Feta», já referido, alterou essa jurisprudência a fim de não minimizar qualquer dos factores expressamente mencionados naquela disposição (152), em especial a situação noutros Estados‑Membros. Por conseguinte, não há qualquer prioridade, todos tendo que ser ponderados – com a possibilidade de se incluir outros; e nada impede que, nessa apreciação, se atribua, com a devida fundamentação, mais importância a algum, pois a sua natureza instrumental destinada à delimitação de um conceito jurídico indeterminado subordina‑os à capacidade de alcançarem o referido objectivo.

180. Nesta ordem de ideias, surge a dúvida de saber se houve alguma evolução do termo «feta» que tenha ampliado o seu significado para designar toda uma espécie de queijos, abstraindo da sua origem, do seu método de produção e dos seus ingredientes.

181. Além da análise de cada um dos factores, é imprescindível uma apreciação conjunta, que inclua:

–       Todos os antecedentes mediatos e imediatos pois, algumas vezes, como no caso dos autos, a perspectiva histórica é fundamental.

–       As alegações de facto e de direito das partes, bem como as provas trazidas ao processo relativamente à inscrição impugnada.

–       O parecer do comité científico, emitido por profissionais altamente qualificados (artigo 3.° da decisão que o criou, já referida) (153).

–       A sondagem oportunamente realizada e as respostas ao questionário enviado pela Comissão (154).

182. Com todos estes elementos fica a convicção de que a generalização não se deu no âmbito comunitário – nem no da própria Grécia, como afirmei nas conclusões Canadane Cheese e Kouri – pois o nome «feta» é indissoluvelmente associado a um género alimentício concreto: o queijo fabricado numa ampla região daquele país, com leite de ovelha ou com uma mistura de leite de ovelha e de leite de cabra, pelo método natural e artesanal de escorrimento sem pressão.

183. Negar o monopólio do nome, inclusivamente nos casos em que a mercadoria pode ser fabricada com as mesmas características noutro lugar, equivale a privar o inventor do seu direito de patente pelo facto de outrem conseguir algo similar uma vez registada a invenção (155).

2.      «Feta» como denominação tradicional

184. Se o Tribunal de Justiça aceitar estas considerações e excluir o carácter genérico da menção, há que recorrer ao n.° 3 do artigo 2.° do regulamento de base, que autoriza que «certas denominações tradicionais, geográficas ou não, que designem um produto agrícola ou um género alimentício originário de uma região ou local determinado e que satisfaça as condições previstas na alínea a), segundo travessão, do n.° 2» sejam equiparadas à de origem.

185. «Feta» não alude directamente a uma localização concreta, pelo que se torna necessário apurar se preenche os requisitos das denominações geográficas, a saber: se é tradicional, se se refere a um género alimentício originário de uma região ou de um lugar, se a sua qualidade ou características se devem fundamental ou exclusivamente ao meio topográfico e se a sua produção, transformação e elaboração ocorrem numa área delimitada, para obter determinado resultado final.

a)      O carácter tradicional da denominação

186. A tradição evoca a transmissão, de geração em geração, de informações, doutrinas, histórias, ritos ou costumes. São considerados tradicionais os comportamentos que se regem pelas ideias, pelas normas e pelos hábitos do passado.

187. De acordo com as considerações expostas sobre a percepção no tempo, não há dúvida de que, para efeitos da referida disposição, o termo «feta» reúne as características essenciais para ser considerado «tradicional». Contudo, por si só, esta interpretação não basta para conseguir a inscrição. Têm que estar preenchidos os restantes requisitos enunciados.

b)      A designação de um produto originário de determinadas zonas territoriais

188. Como afirmei nas conclusões apresentadas no processo Canadane Cheese e Kouri, tal como as denominações «grappa», «ouzo» ou «cava» evocam indirectamente a sua origem italiana, grega ou espanhola ligada a certas regiões, sem que nenhuma dentre elas inclua o nome do lugar correspondente, a denominação «feta» é associada a um queijo produzido na Grécia, se bem que a palavra «feta» tenha origem etimológica no italiano (n.° 73).

189. O problema surge porque se liga a proveniência ao «nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país» (n.° 2 do artigo 2.° do regulamento de base), ao passo que agora a referência é a um fruto ou a um género alimentício originário – note‑se que não se diz «exclusivamente originário» – «de uma região ou de um local determinado» (n.° 3 do artigo 2.° do mesmo regulamento), pois o termo «feta» é associado a uma grande parte da Grécia, tanto histórica como actualmente (156).

190. Para tornear esta dificuldade, propõem‑se algumas reflexões:

a)      O n.° 2 do referido artigo é aplicável às indicações directas, pelo que exige a relação com uma área que excepcionalmente pode incluir totalidade de um país. Em contrapartida, o n.° 3 refere‑se às denominações indirectas, associando à localização geográfica o produto e não o termo gramatical. Por conseguinte, os dois números correspondem a situações diferentes.

b)      Seria um contra‑senso associar uma delimitação territorial a uma denominação tradicional quando a própria disposição não lhe atribui qualquer significado espacial que não existe na maior parte dos casos.

c)      O n.° 3 omite a menção a «um país», de onde os demandantes inferem a impossibilidade de um nome tradicional ter esse alcance. No entanto, existe outra interpretação: a omissão significa que não existe esse limite territorial máximo. O contrário pode impedir que sejam reconhecidas como «região» zonas de vários Estados ou, inclusivamente, dois ou mais Estados (157). O importante é que o género alimentício e não o seu nome seja associado a um espaço delimitado, impedindo uma indefinição superficial.

d)      Por último, parece existir consenso no sentido de o conceito de «região» utilizado pelo legislador comunitário não coincidir com a acepção administrativa do termo (158).

191. Atendendo a essas reflexões, há que reconhecer que «feta» como nome de um queijo oriundo de uma área ampla mas concreta, preenche essa condição. A dimensão da área de procedência é irrelevante; o decisivo é que o produto tenha características que o individualizem.

192. Esta tese não contradiz a doutrina do acórdão CMA, já referido, cujo n.° 27, recordando que o acórdão Exportur admitiu que a protecção das indicações geográficas «sob determinadas condições, se enquadra na protecção da propriedade industrial e comercial, na acepção do artigo [36.°] do Tratado», entendeu que um regime ao abrigo do qual a Alemanha concedeu uma marca de qualidade a produtos fabricados no seu território que preenchessem certos requisitos não devia ser considerado uma indicação geográfica justificável ao abrigo ao artigo 36.° do Tratado CE. Desta jurisprudência não decorre definitivamente a impossibilidade de um distintivo de proveniência afectar a totalidade de um país; além disso, no caso em apreço, discute‑se uma denominação tradicional com características diferentes das do caso controvertido no processo CMA.

c)      A qualidade e características do «feta» e a delimitação territorial da sua produção, transformação e elaboração

193. Relativamente às denominações tradicionais, o n.° 3 do artigo 2.° do regulamento de base remete para o segundo travessão da alínea a) do n.° 2, que exige que a qualidade ou características de um produto se devam essencial ou exclusivamente ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, e cuja produção, transformação e elaboração ocorram numa área determinada. Este requisito corresponde à necessidade de uma relação definida entre o produto e o seu território de proveniência, concretizada nos dois requisitos assinalados no travessão citado.

i)      A qualidade derivada do meio geográfico

194. Admitindo que «feta» denomina um queijo produzido num âmbito preciso, fica por demonstrar a existência desses requisitos quanto à qualidade e às propriedades do «feta».

195. Neste processo invocam‑se como factores da especificidade o clima da zona de fabrico, a riqueza e a diversidade da sua flora, o leite utilizado na elaboração, a partir de ovelhas e de cabras criadas segundo costumes imutáveis e o facto de ser preparado por artesãos experientes, através de um processo de escorrimento natural sem pressão.

196. A verificação da dependência entre estes elementos e as especificidades do produto exige uma apreciação conjunta de todos esses factores, pondo em relevo a relação entre eles, de forma a ser possível obter uma impressão geral (159).

197. Por conseguinte, contra a opinião dos demandantes, a qualidade e as características do queijo «feta» decorrem do meio grego onde é confeccionado, pois há uma relação básica entre a sua cor, aroma, textura, sabor, composição e as suas propriedades intrínsecas, por um lado e, por outro, o meio natural onde teve origem, a cultura que lhe está na base e o método tradicional de produção utilizado na Grécia.

198. Esta conclusão não é posta em causa por haver algumas diferenças entre o queijo originário de umas e outras regiões gregas nem pela falta de uniformidade noutros aspectos, como a orografia ou a qualidade dos pastos, pois predominam as facetas comuns e coincidem os catalizadores básicos. Esta ideia encontra suporte precisamente na delimitação criticada pelos recorrentes, já que se excluiu a parte insular da República Helénica, com excepção do «nomos» de Lesbos (160). As ovelhas e as cabras da Trácia ou da Tessália são muito semelhantes entre si mas, em contrapartida, têm grandes diferenças relativamente às escocesas, francesas ou castelhanas; algo semelhante acontece com a forragem de que se alimentam, com as montanhas ou os prados onde vivem, com o clima e com as restantes condições que intervêm no aparecimento do produto. Recordo o romance «Palomar», de Italo Calvino, em que se narra magistralmente a experiência do protagonista numa loja de Paris»: «Por trás de cada queijo está um prado de um distinto verde sob um distinto céu: prados incrustados pelo sal que as marés da Normandia depositam em cada entardecer; prados perfumados por aromas, ao sol ventoso da Provença; estão distintos rebanhos com as respectivas estabulações e transumâncias; estão segredos de preparação transmitidos através dos séculos. Esta loja é um museu: ao visitá‑la o senhor Palomar sente, tal como no Louvre, que por detrás de cada um dos objectos expostos está a presença da civilização que lhe deu forma e que dele tomou forma» (161).

ii)    A produção, a transformação e a elaboração numa área delimitada

199. A condição de o processo de fabrico do género se realizar integralmente numa área delimitada não é extensiva ao nome, que pode não ter qualquer conotação geográfica.

200. Procura‑se impedir que, ao compartimentar as fases de fabrico ou ao associá‑las a lugares indeterminados, se esbata a associação entre o produto e o ambiente.

201. No caso do «feta», o requisito desta existência poucas dúvidas suscita, pois é imposta pela legislação grega embora com alguns cambiantes, quando os contornos da região onde é confeccionado são mais amplos que os da delimitada para a obtenção da matéria‑prima. Note‑se que foi circunscrita a demarcação de origem do leite utilizado, que tem agora de ser proveniente de animais de raças autóctones, criados com métodos históricos e alimentados com pastos das regiões autorizadas. Mas esta dissociação não é especialmente relevante, uma vez que o regulamento de base não visa uma identidade territorial completa, permitindo circunscrições organizadas em círculos concêntricos, desde que perfeitamente definidos.

202. A dimensão da área assinalada não é muito importante, pois nada impede que abranja a totalidade do território peninsular helénico, embora ocasione algumas diferenças no produto; o essencial é que as distintas fases de fabrico se desenvolvam numa área definida, facto demonstrado na presente lide.

d)      Consequências

203. A análise efectuada nos pontos anteriores confirma a correcção jurídica do regulamento impugnado ao qualificar o vocábulo «feta» como um termo que designa um queijo oriundo de uma parte importante da Grécia, com qualidades ou características procedentes, fundamental ou exclusivamente, do meio geográfico e cuja produção, transformação e elaboração são levadas a cabo numa área definida.

204. Da extensão do território resultam algumas variedades de «feta», mas todas elas apresentam uma homogeneidade substancial, pois têm em comum elementos que reforçam a sua natureza especial.

205. De tudo o que ficou exposto infere‑se que o nome «feta» não é genérico, pois reúne os requisitos para a sua equiparação como nome tradicional a uma denominação de origem, digna de protecção em todo o território comunitário, enquanto manifestação da propriedade industrial e comercial. Por conseguinte, há que julgar improcedentes os fundamentos de anulação deduzidos neste processo, ratificando‑se a validade das normas impugnadas.

VI – Despesas

206. Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento de Processo, sendo julgados improcedentes os pedidos dos dois Estados demandantes e tendo a Comissão pedido a sua condenação nas despesas, devem estes dois Estados suportar as suas próprias despesas e as da referida instituição. De acordo com o n.° 4 do mesmo artigo, os Estados intervenientes no processo deverão suportar as respectivas despesas.

VII – Conclusão

207. Em vista das considerações que antecedem, proponho que o Tribunal de Justiça:

«1)      Negue provimento aos recursos interpostos pela República Federal da Alemanha e pelo Reino da Dinamarca contra o Regulamento (CE) n.° 1829/2002 da Comissão, de 14 de Outubro de 2002, que altera o anexo do Regulamento (CE) n.° 1107/96 da Comissão no respeitante à denominação ‘feta’.

2)      Condene os Estados recorrentes no pagamento das suas próprias despesas e nas da Comissão.

3)      Condene a República Francesa, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e Irlanda do Norte e a República Helénica nas respectivas despesas.»


1 – Língua original: espanhol.


2 – Processo Canadane Cheese Trading e Kouri (C‑317/95, Colect. 1997, p. I‑4681).


3 – Acórdão de 16 de Março de 1999, Dinamarca, Alemanha e França/Comissão, dito «Feta» (C‑289/96, C‑293/96 e C‑299/96, Colect., p. I‑1541).


4 – Regulamento de 14 de Outubro de 2002, que altera o anexo do Regulamento (CE) n.° 1107/96 no respeitante à denominação «feta» (JO L 277, p. 10)


5 – Bíblia de Jerusalém, Livro Primeiro dos Reis, 5, 6 e 7, E. Nácar e A. Colunga, editores, versão directa das línguas originais, editorial Desclee de Brouwer, Bilbau, 1975, pp. 371‑373; [Edição portuguesa: Difusora Bíblica (Missionários Capuchinhos), 10.a edição, Lisboa, 1982, p. 404]. A Bíblia refere igualmente outros produtos de reconhecida qualidade devido à sua origem geográfica, como os touros de Basân, região a Norte do vale do Jordão, onde eram criados animais robustos e de grande bravura (Livro dos Salmos, 22, 13, p. 730); a prata batida importada de Társis e o ouro de Ofir (Jeremias, Lamentação 10, 9, p. 1144); e as vinhas de En‑Gadi (Cântico dos Cânticos, Cântico I, 14, p. 914).


6 – Harte Bavendamm, H., «Geographical Indications and Trademarks: Harmony or Conflict», inSymposium on the International Protection of Geographical Indications, Somerset West, South Africa, 1 e 2 de Setembro, OMPI, Genebra, 1999, p. 59.


7 – Referências recolhidas por Cortés Martín, J. M., in La protección de las indicaciones geográficas en el comercio internacional y comunitario, Ministerio de Agricultura, Pesca y Alimentación, Madrid, 2003, pp. 25 e 26.


8 – Virgílio, La Eneida, tradução e notas de Javier Echave‑Susaeta, editorial Gredos, Madrid, 1977, 1.a reedição. Dodona era o lugar do Épiro onde se encontrava um oráculo de Zeus; aí eram manufacturados uns caldeiros que serviam para a adivinhação, interpretando o ruído do vento quando passava por eles nos ramos das azinheiras onde eram pendurados (livro III, verso 465, p. 223).


9 – Idem, livro III, verso 484, p. 224.


10 – «Quem não sabe distinguir a púrpura de Tiro ou as peles que absorvem o vermelho de Aquino não corre menor risco do que quem é incapaz de distinguir o verdadeiro do falso», Horácio, Epístola X; XVII, Ode I, XXI e XXIX.6, citada por Plaisant M. e Jacq. F., Traité de noms et appellations d’origine, Librairies Techniques, Paris, 1974, p. 1.


11 – Embora em Roma houvesse expressões de uma relativa protecção através da Lex Cornelia de Falsis, que protegia os comerciantes contra a usurpação do seu distintivo por meio de uma actio iniarium ou de uma actio doli. V. Franceschelli, R., Tratatto di Diritto Industriale, Giuffrè, Milão, 1973, pp. 77 e segs.


12 – Ferragio, G.M. «Denominazione di origine, indicazione di provenienza e d’intorni», Rivista di Diritto Industriale, 1990, n.° 2, pp. 224 e segs.


13 – Nalguns casos, a marca colectiva do produto consistia na inicial do nome da localidade onde era fabricada ou no seu brasão de armas; a letra A distinguia os tapetes de Auderdarne; um B identificava as mercadorias provenientes de Bruxelas; um duplo E as de Enghien. Cortés Martin, J. M., op cit., nota 8, que cita Braun, A., Nouveau Traité des marques de fabrique et de commerce, droit belge, droit internationalet droit comparé, Bruxelas, pp. XXIII‑XXIV.


14 – Coiné, H., Derecho privado europeo, vol. 2, «El siglo XIX», Fundación Cultural del Notariado, Madrid, 1996, pp. 213‑214, menciona a seda de Lião, os linhos de Bielfield e as gadanhas de Erzberg, na Estíria.


15 – Em consequência do surto de filoxera que afectou os vinhedos na segunda metade do séc. XIX e nos princípios do séc. XX. Neste sentido, Girardeau, J. M., «The Use of Geographical Indications in a Collective Marketing Strategy: The Example of Cognac», in Symposium […] op. cit., p. 70.


16 – Esta é a orientação da Lei francesa de 1 de Agosto de 1905, relativa à repressão das fraudes na venda das mercadorias e das falsificações dos produtos agrícolas e géneros alimentícios, se bem que só com as leis de protecção de produtos específicos como a Lei de 26 de Julho de 1925, protegendo a denominação «Roquefort» – e com os regulamentos horizontais para algumas classes de géneros – por exemplo, a Lei de 30 de Julho de 1935, que protegia denominações de origem no sector vinícola – tenha sido possível alguma individualização na protecção. Em Espanha, o Estatuto do Vinho, aprovado por Decreto Real de 8 de Setembro de 1932, reconhece a autonomia da denominação de origem como sinal distintivo.


17 – Cervantes. M. de, Don Quijote de la Mancha, edição, introdução e notas de Martín de Riquer, RBA Editores, Barcelona, 1994 (primeira parte, capítulo IV, p. 128) refere estes instrumentos de madeira utilizados para fiar torcendo o fio e dobando a parte fiada, de grande renome quando eram fabricados em madeira das faias da serra de Guadarrama.


18 – Ibidem, segunda parte, capítulo XXXVIII, p. 905.


19 – Ibidem, segunda parte, capítulo XLIX, p. 981.


20 – Ibidem, segunda parte, capítulo XXXII, p. 865.


21 – Ibidem, segunda parte, capítulo XXX, p. 876.


22 – Vega y Carpio, Lope de, El Caballero de Olmedo, edição de Francisco Rico, editorial Cátedra, Madrid, 1981, acto I, estrofe 103, p. 111.


23 – Vega y Carpio, Lope de, Peribáñez y el comendador de Ocaña, edição de Juan Mª Marín, editorial Cátedra, Madrid, 1979, acto I, cena XIII, estrofe 677, p. 89.


24 – Ibidem, acto I, cena XIII, estrofe 739, p. 91.


25 – Shakespeare, William, Hamlet, príncipe da Dinamarca, tradução espanhola de Luís Astrana Marín, 13.a edição, editorial Aguilar, Madrid, 1965, acto I, cena IV, p. 1342.


26 – Ibidem, acto V, cena II, p. 1391.


27 – Proust, Marcel, À la recherche du temps perdu, vol. III, Sodome et Gomorrhe, p. 330.


28 – Ibidem, vol. III, La prisonnière, p. 542.


29 – Carpentier, Alejo, La consagración de la primavera, Siglo XXI de España Editores, 7.a edição, Madrid, 1979, III parte, capítulo 18, p. 219.


30 – Ibidem, VII parte, capítulo 35, p. 463.


31 – Ibidem, VII parte, capítulo 36, p. 480. Além disso, esta novela conta que um dos seus personagens, Teresa, tinha a rara habilidade de «detectar qualquer fraude ou corte na compra de caviares, na origem do foie‑gras ou na autenticidade dos vinhos de grandes marcas e de grandes colheitas». Esta mulher invectiva o cozinheiro, dizendo‑lhe: «Sabes que isso de milésimes não quer dizer nada aos meus compatriotas, porque tanto lhes dá uma coca‑cola como uma pepsi‑cola, mas a mim não me enganas tu com as garrafas de Mouton‑Rotschild cheias de tinto galego. E da próxima vez que tentes fazer passar champanhe de segunda por um Don Perignon, recambio‑te para França [...]» (III parte, capítulo 18, p. 219).


32 – Maroño Gargallo, M. M., La protección jurídica de las denominaciones de origen en los Derechos español y comunitario, Marcial Pons, Madrid, 2002, p. 176.


33 – «[...] os direitos de propriedade industrial destinam‑se a atribuir um direito exclusivo para a totalidade de um mercado, entendido este como âmbito territorial no qual há liberdade de circulação de mercadorias [...] quando o mercado se alarga, passando a ser supranacional, sem se adaptar ao novo âmbito o exclusivo conferido pelos direitos de propriedade industrial, surge inevitavelmente um conflito [...]» Bercovitz, A., «La propiedad industrial e intelectual en el Derecho comunitario», na obra colectiva Tratado de Derecho Comunitario Europeo, tomo II, Civitas, Madrid, 1986, p. 532.


34 – O artigo III‑154.° do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa (JO 2004, C 130, p. 1) adopta a mesma orientação como um dos fundamentos para as proibições ou restrições à importação, à exportação ou ao trânsito de mercadorias.


35 – JO 1970, L 13, p. 29 (não existe versão portuguesa).


36 – JO 1979, L 33, p. 1; EE 13 F9 p. 162. Em termos idênticos, v. n.° 2 do artigo 18.° da Directiva 2000/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Março de 2000, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à rotulagem, apresentação e publicidade dos géneros alimentícios (JO L 109, que derroga a anterior).


37 – Tudo dependerá da concepção a que se dê primazia: a tradicional, para apoiar os produtos cujos características específicas se devem essencialmente aos factores naturais da região de origem, ou outra, mais ampla, que abstraia dessas especificidades. Neste sentido, não é de excluir que se protejam denominações de origem de outros bens. Assim, Pellicer, R., «Primeros pasos de una política comunitaria de defensa de la calidad de los produtos alimenticios. Reglamento sobre la ‘especificidad’ e Reglamento sobre denominaciones de origen e indicaciones geográficas», in Gaceta Jurídica, B‑83 e B‑84, Maio de 1993, pp. 13 e 15, respectivamente: concretamente, B‑84, p. 16.


38 – JO L 208, p. 1.


39 – O Regulamento (CE) n.° 692/2003 do Conselho, de 8 de Abril de 2003, que altera o Regulamento (CEE) n.° 2081/92 relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO L 99, p. 1) vai nesta direcção, embora timidamente, explicando que «Afigura‑se também necessário, para responder às expectativas de determinados produtores, alargar a lista de produtos agrícolas a que se refere o Anexo II do presente Regulamento (CEE) n.° 2081/92. Acresce que se considera oportuno alargar a lista a que se refere o Anexo I do mesmo regulamento, para incluir os géneros alimentícios resultantes de produtos referidos no anexo I do Tratado que tenham sofrido uma transformação ligeira» (primeiro considerando).


40 – JO L 30, p. 989 (não existe versão portuguesa).


41 – JO L 179, p. 1. Teve como precedente o Regulamento (CEE) n.° 816/70 do Conselho, de 28 de Abril de 1970, relativo às disposições complementares da organização comum do mercado vitivinícola (JO L 99, p. 1; não existe versão portuguesa) e o Regulamento (CEE) n.° 817/70 de 28 de Abril de 1970, que estabelece disposições especiais relativas aos vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas (JO L 99, p. 20; não existe versão portuguesa). Foram substituídos, respectivamente, pelos Regulamentos (CEE) n.° 337/79 e n.° 338/79 do Conselho, de 5 de Fevereiro de 1979 (JO L 54, pp. 1 e 48; EE 03 F15 pp. 160 e 207) os quais, por sua vez, foram substituídos pelos Regulamentos (CEE) n.° 822/87 e n.° 823/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987 (JO L 84, pp. 1 e 59), derrogados pelo Regulamento n.° 1493/1999, actualmente em vigor.


42 – Por força do Regulamento (CEE) n.° 1576/89 do Conselho, de 29 de Maio de 1989, que estabelece as regras gerais relativas à definição, à designação e à apresentação das bebidas espirituosas (JO L 160, p. 1) e do Regulamento (CEE) n.° 1601/91 do Conselho, de 10 de Junho de 1991, que estabelece as regras gerais relativas à definição, designação e apresentação dos vinhos aromatizados, das bebidas aromatizadas à base de vinho e dos cocktails aromatizados de produtos vitivinícolas (JO L 149, p. 1), produtos a que são reservados termos geográficos em exclusivo, atendendo às zonas onde «adquiram as suas características e as suas qualidades definitivas» [alínea b) do n.° 3 do artigo 5.° e alínea b) do n.° 2 do artigo 6.°, respectivamente].


43 – Como decorre da alínea a) do n.° 1 do artigo 2.°, esta regra visa proteger os consumidores contra qualquer erro ou confusão induzidos pela designação das mercadorias. No sector dos vinhos, o equivalente era o Regulamento (CEE) n.° 2392/89 do Conselho, de 24 de Julho de 1989, que estabelece as regras gerais para a designação e a apresentação dos vinhos e dos mostos de uvas (JO L 232, p. 13), revogado pelo referido Regulamento n.° 1493/1999.


44 – Salignon, G. «La jurisprudence et la réglementation communautaires relatives à la protection des appellations d’origine, des dénominations géographiques et des indications de provenance», Revue du Marché Unique Européen, n.° 4, 1994, p. 107.


45 – Objectivo anunciado pela Comissão em 1985 no «Livro Verde» sobre o futuro da agricultura europeia [Bol‑CE 7/8‑1985, n.os 1.2.1 e segs. e COM(85) 333 final], bem como na Comunicação sobre o estabelecimento do mercado interior: legislação comunitária sobre produtos alimentícios [Bol‑CE 11‑1985, n.° 2.1.18 e COM(85) 603 final].


46 – Em especial no acórdão de 20 de Fevereiro de 1979, Rewe‑Zentral, conhecido como «Cassis de Dijon» (120/78, Colect., p. 327), referido mais adiante.


47 – Esta proposta constava de um Memorando de Janeiro de 1988, dirigido ao Conselho pelo Governo francês, intitulado «Contribuição para a conclusão do Mercado Interior dos géneros alimentícios», no qual, além de sugerir a harmonização da salvaguarda das denominações de origem dos alimentos, incentivava a Comissão a continuar a preparar regras de harmonização vertical – especialmente para os produtos básicos – a introduzir na esfera comunitária um sistema de reconhecimento das especialidades alimentícias que faziam parte das tradições culinárias de cada Estado‑Membro e a chegar a acordos de certificação de qualidade. V. Brouwer, O., «Community Protection of Geographical Indications and Specific Character as a Means of Enhancing Foodstuffs Quality», Common Market Law Review, n.° 28‑1991, p. 618.


48 – Por exemplo, na Comunicação de 24 de Outubro de 1989 da Comissão, relativa às denominações de venda dos produtos alimentícios (JO C 271, p. 2).


49 – Aprovou várias resoluções entre as quais se destaca a de 28 de Abril de 1989, propondo instaurar na Comunidade um regime de protecção das denominações de origem, embora circunscrita aos queijos.


50 – Na mesma data, adoptou também o Regulamento (CEE) n.° 2082/92, relativo aos certificados de especificidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO L 208, p. 9), cujo objectivo central é também o de implantar um método de diferenciação no mercado, a fim de que alguns produtores aumentem as vendas ou melhorem as suas margens, criando um regime tradicional de registo e rotulagem para os produtos com especificidades controladas mas, ao contrário das denominações de origem e das indicações geográficas, sem ligar a produção ou a elaboração a um lugar determinado, coexistindo com as regulamentações nacionais de certificação.


51 – Maroño Gargallo, M. M., op. cit., p. 217.


52 – Referidas na nota 2, n.° 36. V. também n.° 42, em que se enunciam as consequências do registo segundo o regime previsto no regulamento de base.


53 – Com esta fórmula, adopta‑se uma noção da figura similar à consagrada tradicionalmente nos textos internacionais e nos direitos nacionais. A leitura da disposição recorda a definição do n.° 1 do artigo 2.° do Acordo de Lisboa relativo à Protecção das Denominações de Origem e ao seu Registo Internacional, de 31 de Outubro de 1958, revisto em Estocolmo em 14 de Julho de 1967, Recueil des traités des Nations unies, vol. 923, n.° 13172, p. 205 (D. R. n.° 240, I série, de 17.10.1990); também está próxima do artigo 79.° da lei espanhola 25/1970, de 2 de Dezembro de 1970 (BOE n.° 291) que aprovou o Estatuto da vinha, do vinho e dos álcoois e do artigo 22.° da lei 24/2003, de 10 de Julho (BOE n.° 165) relativa à vinha e ao vinho, que revoga a anterior.


54 – Alguns autores entendem que existe apenas uma distinção de grau e não de essência, como Sordelli, L., «Indicazioni geografiche e denominazioni di origine nella disciplina comunitaria», Diritto Industriale, 1994, pp. 837 e segs.; outros afirmam que a diferença não é nítida: v. López Benítez, M., Las denominaciones de origen, Cedecs, Córdoba, 1996, p. 85, opinião expressa no parecer de 3 de Julho de 1991 do Comité Económico e Social relativamente à proposta de Regulamento (CEE) do Conselho relativo à protecção das indicações geográficas e das denominações de origem dos produtos agrícolas e géneros alimentícios (JO C 269, p. 62).


55 – A acta do Comité especial de agricultura n.° 7290/92, de 12 de Junho de 1992, refere que «A Comissão e o Conselho declaram que, para efeitos do disposto nas alíneas a) e b) do n.° 2 do artigo 2.°, o Grão‑Ducado do Luxemburgo será considerado um caso excepcional. O Conselho e a Comissão confirmam que o artigo 2.° do regulamento abrange a Marca Nacional Luxemburguesa». V. Pellicer, R., op. cit., B‑84, pp. 16 e 17.


56 – Como oportunamente sugeriu o Comité Económico e Social no parecer sobre a proposta de regulamento antes referido.


57 – Esta possibilidade foi avançada pelo advogado‑geral F. G. Jacobs nas conclusões que apresentou no processo em que recaiu o acórdão de 5 de Novembro de 2002, Comissão/Alemanha, conhecido por «CMA» (C‑325/00, Colect., p. I‑9977) ao expor, no n.° 40, que a delimitação «se aplica essencialmente nos casos em que o Estado‑Membro em questão é particularmente pequeno (por exemplo, o Luxemburgo) e, porventura, nos casos em que o registo é pedido para a totalidade de um Estado‑Membro, relativamente a um determinado produto cuja qualidade e reputação é imputável a esse Estado‑Membro».


58 – A Lei francesa de 6 de Julho de 1966 admite sem restrições que o nome de um país sirva de denominação de origem. Também não se encontra qualquer limite superficial no Acordo relativo aos aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio, que figura do anexo 1.C do Acordo OMC, aprovado pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986‑1994) (JO L 336, p. 1). O artigo 22.° dispõe que se entende por indicações geográficas as indicações «que identifiquem um produto como sendo originário do território de um membro, ou de uma região ou localidade desse território, caso determinada qualidade, reputação ou outra característica do produto seja essencialmente atribuível à sua origem geográfica». O mesmo acontece com o Acordo de Lisboa de 1958, já referido, relativamente às denominações de origem.


59 – É o que decorre do conceito de «região determinada» constante do Anexo VI.A do Regulamento n.° 1493/1999, já referido, limitando a região a uma área ou um conjunto de áreas vitícolas». Mais explicitamente, o terceiro considerando do Regulamento n.° 1576/89, também já referido, entende que «[...] é conveniente que o direito comunitário reserve para certos territórios, entre os quais podem constar, a título excepcional, determinados países, a utilização de denominações geográficas que se lhes refiram [...]», pelo que o n.° 3 do artigo 5.° prevê uma excepção concreta a favor do Luxemburgo – «marque nationale luxembourgeoise».


60 – Cortés Martín, J. M., op. cit., p. 351. Neste sentido, já foi assinalado, e com razão, que a possibilidade de reconhecer essa associação «diminui à medida que se alarga o âmbito territorial a que se deve referir a denominação (n.° 8 das conclusões apresentadas pelo advogado‑geral La Pergola no processo «feta»).


61 – Regulamento (CE) n.° 2325/97 da Comissão, de 24 de Novembro de 1997, que completa o anexo do Regulamento (CE) n.° 1107/96 relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.° do Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho (JO L 322, p. 33).


62 – Regulamento (CE) n.° 1778/2001 da Comissão, de 7 de Setembro de 2001, que completa o anexo do Regulamento (CE) n.° 1107/96, referido na nota anterior (JO L 240, p. 6).


63 – No n.° 45 das conclusões que apresentou no processo Windsurfing Chiemsee (acórdão de 4 de Maio de 1999, C‑108/97 e C‑109/97, Colect., p. I‑2779), o advogado‑geral G. Cosmas enumerou como factores naturais as matérias‑primas, o solo e o clima da região; como factores humanos, a concentração de empresas similares na região, a especialização no fabrico ou na elaboração de certos produtos e a manutenção da qualidade em determinados níveis.


64 – Na realidade, muitas águas minerais – em que prevalecem os factores naturais – foram registadas como denominações de origem, ao passo que produtos de padaria, de confeitaria ou de ou de pastelaria o foram como indicações geográficas. Tenha‑se em atenção que o Regulamento n.° 692/2003, já referido, suprimiu as águas minerais e as águas de nascente do âmbito de aplicação do regulamento de base, pelo que, passados dez anos após a sua aprovação, estas denominações deixaram de estar incluídas no registo (artigo 2.°).


65 – Fernández Novoa, C., La protección internacional de las denominaciones geográficas de los productos, Tecnos, Madrid, 1970, p. 3.


66 – Na proposta de regulamento (JO C 30, p. 11), a equiparação era feita com as indicações geográficas. Por outro lado, o facto de não se prever a extensão a estas últimas foi considerado discriminatório por alguns autores: Beier, F. K., e Knaak, R., «The Protection of Direct and Indirect Geographical Indications of Source in Germany and The European Community», International Review of Industrial Property and Copyright Law, vol. 25‑1994, p. 32; Tilmann, W., «EG‑Schutz für Geographische Herkünftsangaben», Gewerblicher Rechtsshutz und Urheberrecht, 1992, p. 833; e Jiménez Blanco, P., Las denominaciones de origen en el Derecho del comercio internacional, Eurolex, Madrid, 1996, p. 52.


67 – O Regulamento n.° 1493/1999, já referido, dispõe no Anexo VI que as denominações «muscadet», «blanquette», «vinho verde», «cava» e «manzanilla» são reconhecidas como nomes das respectivas regiões, determinadas e regulamentadas pelos Estados‑Membros antes de 1 de Março de 1986. Do mesmo modo, o Regulamento (CEE) n.° 1576/89, também já referido, protege as denominações «pacharán», «korn», «kornbrand» e «jägertee».


68 – A introdução desta excepção no regulamento teve origem numa proposta do Reino Unido para inscrever o «Queijo Stilton», cuja elaboração se iniciou nesta cidade inglesa mas foi pouco mais tarde transferida para um lugar próximo, conservando o nome pelo qual era tradicionalmente conhecido.


69 – Acórdão de 20 de Fevereiro de 1975, Comissão/Alemanha, conhecido como «Sekt‑Weinbrand» (12/74, Recueil, p. 181, Colect., p. 95).


70 – Fernández Novoa, C., op. cit., p. 39; no mesmo sentido, Mattera, A., El mercado único, sus reglas y su funcionamiento, Civitas, Madrid, 1991, p. 447.


71 – Que se rege pelo Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993 (JO 1994, L 11, p. 1).


72 – Este conceito tem nova redacção no Regulamento (CE) n.° 806/2003 do Conselho, de 14 de Abril de 2003, que adapta à Decisão 1999/468/CE as disposições relativas aos comités que assistem a Comissão no exercício das suas competências de execução previstas em actos do Conselho adoptados pelo procedimento consultivo (maioria qualificada) (JO L 122, p. 1).


73 – Os pormenores deste protocolo constam da Comunicação da Comissão aos operadores interessados nas denominações de origem e as indicações geográficas dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios sobre o processo simplificado de registo a nível comunitário estabelecido no artigo 17.° do Regulamento (CEE) n.° 2081/92 (JO C 273, de 9 de Outubro de 1993, p. 4). A doutrina criticou fortemente a inexistência de um acto incontestável pelo qual os particulares afectados pelo registo possam manifestar a sua oposição; entre outros, Cortés Martín, op. cit., pp. 386 e 387. Segundo o décimo terceiro considerando do Regulamento n.° 692/2003, já referido, esta falta determinou – juntamente com outros motivos – a eliminação do processo simplificado.


74 – Decisão 93/53/CEE, de 21 de Dezembro de 1992, relativa à criação do Comité científico das denominações de origem, indicações geográficas e certificados de especificidade (JO 1993, L 13, p. 16), alterada pelas Decisões 94/437/CE, de 14 de Junho de 1994 (JO L 180, p. 47) e 97/656/CE, de 2 de Outubro de 1997 (JO L 277, p. 30).


75 – Relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92 (JO L 148, p. 1).


76 – Regulamentos (CE) n.° 1263/96 da Comissão, de 1 de Julho de 1996 (JO L 163, p. 19); n.° 123/97, de 23 de Janeiro de 1997 (JO L 22, p. 19); n.° 1065/97, de 12 de Junho de 1997 (JO L 156, p. 5); n.° 134/98, de 20 de Janeiro de 1998 (JO L 15, p. 6); n.° 644/98, de 20 de Março de 1998 (JO L 87, p. 8); n.° 1549/98, de 17 de Julho de 1998 (JO L 202, p. 25); n.° 83/1999, de 13 de Janeiro de 1999 (JO L 8, p. 17); n.° 590/1999, de 18 de Março de 1999 (JO L 74, p. 8); n.° 1070/1999, de 25 de Maio de 1999 (JO L 130, p. 18); n.° 2317/1999, de 29 de Outubro de 1999 (JO L 280, p. 66); n.° 813/2000, de 17 de Abril de 2000 (JO L 100, p. 5); n.° 2703/2000, de 11 de Dezembro de 2000 (JO L 311, p. 25); n.° 913/2001, de 10 de Maio de 2001 (JO L 129, p. 8); n.° 1347/2001, de 28 de Junho de 2001 (JO L 182, p. 3); n.° 1660/2003, de 19 de Setembro de 2003 (JO L 234, p. 10); os já referidos n.° 2325/97 e n.° 1778/2001; e n.° 1829/2002, ora impugnado.


77 – Acórdão de 11 de Julho de 1974 (8/74, Recueil, p. 837, Colect., p. 423).


78 – Acórdão de 20 de Fevereiro de 1979, já referido, conhecido como «Cassis de Dijon», licor de frutas francês com 15° a 20°, de venda livre naquele país, que se pretendia colocar no mercado na Alemanha, para o que tinha de possuir um grau alcoólico não inferior a 25°.


79 – Acórdãos de 17 de Junho de 1981, Comissão/Irlanda (113/80, Colect., p. 1625, n.° 7); de 9 de Junho de 1982, Comissão/Itália (95/81, Colect., p. 2187, n.os 20 e 21); e de 7 de Maio de 1997, Pistre e o. (C‑321/94 a C‑324/94, Colect., p. I‑2343, n.° 52).


80 – Acórdão de 19 de Março de 1991, Comissão/Grécia (C‑205/89, Colect., p. I‑1361, n.° 9).


81 – Por exemplo, Beier, F‑K., «Propiedad intelectual y libre circulación de mercancías en el mercado interior y en el comercio con terceros Estados», Revista General de Derecho, n.° 549, Junho de 1990, p. 4521 e nota 31 na p. 4519; no mesmo sentido, v. Bercovitz, A., op. cit., p. 520.


82 – Revista em Estocolmo em 14 de Julho de 1967, Recueil des traités des Nations unies, vol. 828, n.° 11851, p. 305.


83 – Acórdão de 9 de Junho de 1992 (C‑47/90, Colect., p. I‑3669).


84 – Acórdão de 10 de Novembro de 1992 (C‑3/91, Colect., p. I‑5529).


85 – Acórdão de 16 de Maio de 2000 (C‑388/95, Colect., p. I‑3123).


86 – Acórdão de 20 de Maio de 2003 (C‑469/00, Colect., p. I‑5053, n.° 49).


87 – Acórdão de 20 de Maio de 2003 (C‑108/01, Colect., p. I‑5121, n.° 64).


88 – A doutrina criticou duramente a existência de uma relação dualista até mesmo para as indicações de proveniência. V., entre outros, Beier, F.‑K., «La nécessité de protéger les indications de provenance et les appellations d’origine dans le Marché Commun. En marge de l’Arrêt Sekt/Weinbrand de la Cour de Justice des Communautés européennes du 20 février 1975», Propriété Industrielle, OMPI/BIRPI, 1977, p. 160.


89 – Por exemplo, existe referência expressa à «reputação» nos acórdãos de 23 de Maio de 1978, Hoffmann‑La Roche (102/77, Colect., p. 391, n.° 7); de 11 de Julho de 1996, Eurim‑Pharm (C‑71/94, C‑72/94 e C‑73/94, Colect., p. I‑3603, n.° 31), ambos relativas a marcas; de 10 de Novembro de 1992, Exportur, já referido, n.° 28; ou de 13 de Dezembro de 1994, SMW Winzersekt (C‑306/93, Colect. p. I‑5555, n.° 25).


90 – Acórdão de 14 de Setembro de 1982 (144/81, Recueil, p. 2853).


91 – Acórdão de 7 de Novembro de 2000 (C‑312/98, Colect., p. I‑9187), que responde a uma questão prejudicial apresentada num litígio sobre a rotulagem de uma cerveja.


92 – Acórdão de 14 de Dezembro de 2000 (C‑99/99, Colect., p. I‑11535).


93 – Regulamento (CE) n.° 2815/98 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1998 (JO L 349, p. 56).


94 – Acórdão de 18 de Novembro de 2003 (C‑216/01, Colect., p. I‑0000).


95 – Acórdão de 4 de Março de 1999 (C‑87/97, Colect., p. I‑1301). Nesse caso, estavam em confronto as denominações «Cambozola», queijo importado pela Itália a partir de outro Estado‑Membro onde é fabricado legalmente, e «Gorgonzola», queijo italiano cuja denominação de origem consta do registo comunitário. O Tribunal de Justiça entendeu que, embora o aspecto exterior de ambos seja diferente, é legítimo considerar que existe evocação de um nome protegido quando o número de sílabas coincide e as duas últimas são iguais, gerando uma semelhança fonética e visual entre os dois termos.


96 – Nestes acórdãos, como os cadernos de especificações das denominações de origem não são publicados, estuda‑se igualmente a sua oponibilidade a terceiros.


97 – Acórdão de 9 de Junho de 1998 (C‑129/97 e C‑130/97, Colect., p. I‑3315). A situação de facto consistia no facto de, tendo o Governo francês inscrito a denominação «époisses de Bourgogne» por meio do procedimento simplificado, solicitou a sua alteração, de forma a incluir apenas a denominação «époisses».


98 – Acórdão de 25 de Junho de 2002 (C‑66/00, Colect., p. I‑5917).


99 – Por força do Regulamento (CE) n.° 590/1999 da Comissão, de 18 de Março de 1999 que completa o anexo do Regulamento (CE) n.° 1107/96, já referido (JO L 74, p. 8).


100 – Acórdão de 6 de Dezembro de 2001 (C‑269/99, Colect., p. I‑9517).


101 – O advogado‑geral S. Alber manifestou‑se neste mesmo sentido nas conclusões que apresentou em ambos os processos (n.os 92 e 97, respectivamente).


102 – Vejam‑se os antecedentes factuais referidos nos n.os 22 a 47 do acórdão «feta», que abordarei mais adiante.


103 – FEK B 8.


104 – A síntese geral do questionário figura como anexo 1 na contestação da Comissão. A sua orientação é patente no próprio Regulamento n.° 1829/2002 que, no seu décimo sétimo considerando, adverte que «a inexistência de um quadro regulamentar específico em quase todos os Estados‑Membros, bem como a definição bastante geral do termo ‘feta’ na nomenclatura aduaneira combinada, levam a estimativas aproximativas e a dados estatísticos muito divergentes aquando da análise cruzada das respostas transmitidas. Por outro lado, é difícil em muitos Estados‑Membros distinguir a produção da reexportação, o que pode falsear as estatísticas».


105 –      Os Países Baixos também tiveram uma regulamentação deste género entre 1981 e 1998. A Áustria reserva o termo para os produtos gregos, por força da convenção celebrada com a Grécia em 20 de Junho de 1972, em aplicação do acordo de 5 de Junho de 1970 entre os dois países, relativo à protecção das indicações de procedência, das denominações de produtos agrícolas, artesanais e industriais (BGBl. 378/1972 e 379/1972; Österreichisches Patentblatt n.° 11/1972, de 15 de Novembro de 1972).


106 – Segundo informou o seu representante na audiência, a produção neste Estado foi de 10 325 toneladas em 2003 e de 11 200 toneladas em 2004.


107 –      Segundo o décimo nono considerando do Regulamento n.° 1829/2002, a avaliação bruta «nem sempre é adequada, podendo mesmo estar na origem de resultados aberrantes, uma vez que a impossibilidade de ter em conta as existências, as quantidades reexportadas ou outros elementos pode resultar num consumo teoricamente negativo em certos Estados‑Membros».


108 –      Na audiência ficou demonstrado que os produtores alemães e os dinamarqueses utilizam etiquetas com estas indicações, tal como consta dos documentos que a Comissão juntou ao processo.


109 – Figura na íntegra como anexo 3 da contestação da Comissão. As apreciações estão transcritas nos trigésimo a trigésimo segundo considerandos do Regulamento n.° 1892/2002.


110 – Embora a doutrina defenda que uma solução do conflito só teria sido possível por meio de um compromisso. Fluir, A., «Feta als geschützte Ursprungsbezeichnung – eine Leidensgeschichte», European Law Reporter, 2002, n.° 11, p. 437.


111 – O decreto ministerial n.° 15294/1987 dos Ministérios das Finanças e da Agricultura (FEK B 347).


112 – FEK B 892.


113 – FEK B 663.


114 – FEK B 667.


115 – No Tribunal de Primeira Instância também entraram vários recursos deste tipo contra o referido regulamento, interpostos por Alpenhain‑Camembert‑Werk e o. (T‑307/02), pela Confédération générale des producteurs de lait de brebis et des industriels de Roquefort (T‑381/02) e por Arla Foods e o. (T‑397/02). O despacho de 6 de Julho de 2004 (Colect., p. II‑0000), proferido no primeiro dos referidos processos, aceitando a excepção colocada pela Comissão, decidiu pela inadmissibilidade, por considerar que o acto impugnado não afectava individualmente as demandantes, empresas alemãs cuja actividade consiste na produção de queijo comercializado como «feta». Os outros dois processos encontram‑se ainda pendentes.


116 – Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, reformulado em 19 de Junho de 1991 (JO L 176, p. 7) e várias vezes alterado (última publicação oficial no JO C 193, de 14 de Agosto de 2003, p. 1).


117 – Regulamento n.° 1 do Conselho, de 15 de Abril de 1958, que estabelece o regime linguístico da Comunidade Económica Europeia (JO 1958, 17, p. 385; EE 01 F1 p. 8).


118 – A comunicação da ordem do dia e das propostas de medidas, bem como dos restantes documentos de trabalho com uma antecedência mínima de catorze dias em relação à data da reunião, está prevista no artigo 3.° do regulamento interno aprovado pela Decisão 1999/468/CE do Conselho (JO 2001, C 38, p. 3). Tenha‑se em conta também a Decisão 1999/468/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999 que fixa as regras de exercício das competências de execução atribuídas à Comissão (JO L 184, p. 23) e o Regulamento n.° 806/2003, já referido.


119 – Manifestei posição análoga nas conclusões apresentadas no processo Aalborg Portland e o. (acórdão de 7 de Janeiro de 2004, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123), referindo que só cabe anular o acto que decide um processo «se se verificar que, se o meio processual tivesse sido escrupulosamente respeitado, o resultado poderia ter sido outro, mais favorável ao interessado, ou se, precisamente devido à existência do vício de forma, não se pode saber se a decisão teria sido diferente». Acrescentava igualmente que «os vícios de forma não têm vida própria separada da substância do litígio. Se se anular uma decisão proferida no termo de uma actuação formal defeituosa, porque, devido aos vícios do iter seguido para a sua adopção, é incorrecta quanto ao fundo, a anulação é determinada pela incorrecção substantiva da decisão, não pela existência do vício processual. O vício de forma só atinge identidade própria quando, pelo facto de ter existido, não é possível fazer um juízo sobre a decisão adoptada».


120 – De acordo com o sumário da acta da reunião, não se chegou a acordo, tendo a proposta recebido 47 votos a favor, 23 contra e 17 abstenções. O referido documento, tal como as outras actas do comité de indicações geográficas e de denominações de origem de produtos agrícolas e de géneros alimentícios, podem ser consultadas em www.europa.eu.int/comm/agriculture/minco/regco.


121 – Acórdão de 10 de Fevereiro de 1998 (C‑263/95, Colect., p. I‑441).


122 – Acórdão de 11 de Novembro de 2004 (C‑249/02, Colect., p. I‑0000).


123 – Acórdão de 23 de Fevereiro de 1988, Reino Unido/Conselho (131/86, Colect., p. 905, n.° 37).


124 – Acórdão de 20 de Março de 1959, Nold KG/Alta Autoridade (18/57, Recueil, pp. 89 e segs., Colect., pp. 315 e segs.).


125 – Acórdãos de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão (C‑350/88, Colect., p. I‑395) e de 15 de Abril de 1997, Irish Farmers Association e o. (C‑22/94, Colect., p. I‑1809).


126 – Na sua petição, a Dinamarca também seguiu esta ordem, ao passo que a da Alemanha discute, à cabeça, o carácter tradicional da denominação, a fim de salientar o seu carácter genérico.


127 – Cito o exemplo que figura no Diccionario de la Real Academia Española, vigésima segunda edição.


128 – Não obstante, como observei no n.° 28 das referidas conclusões apresentadas no processo Canadane Cheese e Kouri, considerei como tais: «vinagre» (acórdão de 9 de Dezembro de 1981, Comissão/Itália, 193/80, Recueil, p. 3019), «genebra» (acórdão de 26 de Novembro de 1985, Miro, 182/84, Recueil, p. 3731), «cerveja» (acórdão de 12 de Março de 1987, Comissão/Alemanha, 178/84, Colect., p. 1227), «massa» (acórdãos de 14 de Julho de 1988, Glocken e o., 407/85, Colect., p. 4233; e Zoni, 90/86, Colect., p. 4285), «iogurte» (acórdão de 14 de Julho de 1988, Smanor, 298/87, Colect., p. 4489), queijo «Edam» (acórdão de 22 de Setembro de 1988, Deserbais, 286/86, Colect., p. 4907), «queijos» (acórdãos de 11 de Outubro de 1990, Comissão/Itália, C‑210/89, Colect., p. I‑3697; e de 11 de Outubro de 1990, Nespoli e Crippa, C‑196/89, Colect., p. I‑3647), «charcutaria» (acórdão de 13 de Novembro de 1990, Bonfait, C‑269/89, Colect., p. I‑4169) e «pão» (acórdãos de 19 de Fevereiro de 1981, Kelderman, 130/80, Recueil, p. 527; de 14 de Julho de 1994, Van der Veldt, C‑17/93, Colect., p. I‑3537; e de 13 de Março de 1997, Morellato, C‑358/95, Colect., p. I‑1431).


129 – Conclusões do advogado‑geral A. Saggio no processo Guimont no acórdão de 5 de Dezembro de 2000 (C‑448/98, Colect., p. I‑10663, n.° 11).


130 – Ao contrário do que acontece em matéria de marcas, o regulamento de base não indica as razões de generalização, pelo que foi objecto de algumas críticas. V. Lobato García‑Miján, L., «La protección de las Denominaciones de origen: estudio del reglamento (CEE) 2081/92», in Estudios de Derecho Mercantil en homenaje al profesor Manuel Brosseta Pont, tomo II, Tirant lo Blanch, Valência, 1995, pp. 1985 e segs. Quanto ao processo de vulgarização, v. Fernández Novoa, C., op. cit., p. 42.


131 – Na jurisprudência inglesa, por exemplo, o acórdão da High Court de Londres (Chancery Division) de 31 de Julho de 1967, que recaiu no processo «Wine Products Ltd & others/Mackenzie & Co. Ltd & others», autorizou os empresários australianos e sul‑africanos a utilizar no mercado inglês o termo «Jerez» («Sherry»), que é uma localidade espanhola, sempre que acompanhado do adjectivo «australiano» ou «sul‑africano» («Australian Sherry» ou «South African Sherry»), considerando que seria injusto permitir aos produtores de Jerez oporem‑se a estas expressões, uma vez que tinham conhecimento dessa utilização – v. conclusões do advogado‑geral J.‑P. Warner no processo Sekt‑Weinbrand, já referido. Na jurisprudência francesa, o acórdão de 25 de Agosto de 1984 da Cour d’appel de Montpellier, relativa às denominações «Jijona» e «Alicante» deu lugar a muitos comentários ao ser examinado à luz dos argumentos apresentados pelo Tribunal de Justiça no acórdão «Exportur» relativamente a uma questão prejudicial suscitada nesse caso.


132 – Em certa medida, relativizo aqui o exposto pelo advogado‑geral P. Léger no n.° 40 das conclusões apresentadas no processo Bigi, já referido, segundo o qual, «uma vez que a apreciação do carácter genérico ou não de uma denominação é, nos termos do regulamento, da competência da Comissão, considero que não cabe ao Tribunal de Justiça substituir‑se à Comissão nesta questão. O papel do Tribunal de Justiça consiste apenas em efectuar o controlo da legalidade das decisões tomadas pela Comissão (ou pelo Conselho) na matéria, em conformidade com as disposições do artigo 230.° CE». Assim, como esta segunda parte não admite discussão, entendo que, quando se anula o acto na origem da análise jurídica do Tribunal de Justiça sobre o carácter genérico de um nome, não se substitui a outra instituição nem se lhe retiram as suas atribuições.


133 – Palavras do advogado‑geral P. Léger no n.° 50 das conclusões apresentadas no processo Bigi.


134 – Esta dualidade corresponde à adopção de uma solução ecléctica face à diferente concepção do nível de garantia nos vários Estados‑Membros.


135 – Os n.os 22 a 28 do acórdão «feta» descrevem o percurso da Comissão para elaborar uma proposta de relação indicativa, não taxativa, das denominações cujo registo não é permitido por serem consideradas genéricas.


136 – López Escudero, M., «Parmigiano, feta, époisse y otros manjares en Luxemburgo: las denominaciones geográficas ante el TJCE», Une Communauté de droit: Fetschrift für Gil Carlos Rodríguez Iglesias, BMW‑Berliner Wissenschafts‑Verlag, 2003, pp. 409 e segs., critica duramente a tese de que, para apreciar o carácter genérico de um produto, é indispensável uma relação exclusiva com uma região.


137 – Por exemplo, Fernández Novoa, C., op. cit., p. 46; na doutrina alemã, Bussman, K., «Herkunftsangabe oder Gattungsbezeichnung», Gewerblicher Rechtsschutz Und Urheberrecht, 1965, pp. 281 e segs.


138 – O procedimento dá lugar a inscrição no anexo do Regulamento (CE) n.° 2400/96 da Comissão, de 17 de Dezembro de 1996, relativo à inscrição de determinadas denominações no registo das denominações de origem protegidas e das indicações geográficas protegidas previsto no Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, (JO L 327, p. 11), várias vezes alterado.


139 – Neste mesmo sentido, Cortés Martín, J. M., op. cit., p. 381.


140 – Citado de Cortés Martín, J. M., op. cit., nota 1206, p. 335.


141 – Fernández Novoa, C., op. cit., p. 43.


142 – Rochard, D., «Rillettes du Mans», «Rillettes dela Sarthe»: dénominations génériques ou IGP? C’est le juge qui va déguster!», Revue de Droit Rural, n.° 251, 1997, p. 175.


143 – Rochard, D., op. cit., menciona concretamente a Convenção de Stresa de 1 de Junho de 1951, que autoriza os signatários a utilizar as denominações do anexo II, desde que respeitem as regras de fabrico e indiquem o país de produção; por sua vez, as do anexo II podem ser utilizadas pelos fabricantes da região geográfica correspondente. Saliente‑se que a referida convenção – que não é aplicável ao «feta» – foi assinada pela Dinamarca, que pouco depois a denunciou, não tendo sido subscrita pela Grécia.


144 – V. n.° 19 das conclusões apresentadas no processo Canadane Cheese e Kouri.


145 – No âmbito internacional, v., por exemplo, o Acordo Euromediterrânico que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República Árabe do Egipto, por outro, celebrado no Luxemburgo em 25 de Junho de 2001 (JO 2004, L 304, p. 39), em especial o artigo 37.°, o anexo VI e a declaração comum relativa a ambos; o Acordo de Parceria Económica, de Concertação Política e de Cooperação entre a Comunidade Europeia e os seus Estados‑Membros, por um lado, e os Estados Unidos Mexicanos, por outro, celebrado em Bruxelas em 8 de Dezembro de 1997 (JO 2000, L 276, p. 45), em especial o artigo 12.°; ou o Acordo provisório sobre comércio e matérias conexas entre a Comunidade Europeia e a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, por um lado, e a República da Bulgária, por outro, assinado em Bruxelas em 8 de Março de 1993 (JO L 323, p. 2).


146 –      Homero, Odisseia, canto IX, estrofes 244 a 247.


147 –      Ibidem, canto IX: «os feros ciclopes são criaturas sem lei» (verso 107); «não debatem em assembleias nem conhecem regras de justiça» (estrofes 112 e 113); «cada um tem a sua lei, a sua mulher e os seus filhos e não pensa nos outros» (estrofes 114 e 115); são «homens de enorme força, brutal, sem noção de justiça nem de lei» (estrofes 214 e 215)].


148 –      Ibidem, canto XX, estrofe 69.


149 –      Homero, Ilíada, canto XI, estrofe 539, conta como Hecamede, de belos caracóis, com um ralador de cor de bronze ralou queijo de cabra sobre vinho, preparando uma mistela para Patroclo e Nestor.


150 – V. O’Connor B., e Kirieeva, I., «What’s in a name?: The Feta cheese saga», International trade law and regulation, vol. 9, 2003, pp. 117 e segs.


151 – Esta posição segue o disposto no artigo 6.° do Acordo de Lisboa, já referido, face ao estipulado no n.° 6 do artigo 24.° do acordo relativo aos aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio, também já referido, que dá primazia à situação da denominação nas zonas de consumo.


152 – O artigo 3.° do regulamento de base dispõe expressamente que «[...] para determinar se uma designação se tornou genérica todos os factores devem ser tidos em conta e, nomeadamente: – a situação existente no Estado‑Membro onde a denominação tem origem e nas zonas de consumo; – a situação noutros Estados‑Membros; – as disposições legislativas nacionais ou comunitárias pertinentes [...]».


153 – Se bem que a Dinamarca discuta o parecer, não apresenta nenhuma razão de peso para o desqualificar.


154 – Vencendo os receios iniciais, a utilidade das sondagens de opinião é reconhecida nos acórdãos Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 53, e de 16 de Julho de 1998, Gut Springenheide e Tusky (C‑210/96, Colect., p. I‑4657, n.° 37). Se bem que se refiram a estes métodos no âmbito das marcas e o raciocínio tenha como destinatários os órgãos jurisdicionais nacionais, a doutrina pode ser extrapolada para o âmbito das denominações de origem e para o da actuação das instituições comunitárias.


155 – Precisamente em matéria de patentes, o acórdão de 5 de Dezembro de 1996, Merck e Beecham (C‑267/95 e C‑268/95, Colect., p. I‑6285) afirma que o objecto específico da propriedade industrial e comercial no referido âmbito é, «nomeadamente, assegurar ao titular, como forma de recompensar o esforço criador do inventor, o direito exclusivo de utilizar uma invenção tendo em vista o fabrico e o primeiro lançamento em circulação de produtos industriais, quer directamente, quer mediante a concessão de licenças a terceiros, bem como a faculdade de se opor a qualquer violação do referido direito» (n.° 30).


156 – Os regulamentos gregos e o caderno de especificações e obrigações apensado ao requerimento de inscrição no registo comunitário permitem a produção na Macedónia, Trácia, Épiro, Tessália, Grécia Central, Peloponeso – quase todo o território continental da Grécia – e no «nomos» – circunscrição administrativa – de Lesbos.


157 –      Não se pode perder de vista a trajectória da União Europeia, com sucessivos alargamentos, alguns deles a Estados de reduzida dimensão. O fenómeno irá seguramente prosseguir e, porventura, a protecção concedida a algum produto numa zona do actual território comunitário pode vir a ser extensível a outras zonas dos novos Estados‑Membros.


158       O próprio advogado‑geral La Pergola admitiu essa ideia nas conclusões que apresentou no processo feta (n.° 8).


159 – Já o referi no n.° 75 das minhas conclusões no processo Canadane Cheese e Kouri, sublinhando que, a não ser assim, «se impediria a protecção de muitas denominações geográficas, já que as técnicas de produção modernas permitem, quase sem restrições, fabricar um produto em qualquer lugar».


160 – O que significa que nem sequer abrange a totalidade desta ilha.


161 – Calvino, I., Palomar, ed. Giulio Einaudi, Turim, 1983, p. 85; (edição portuguesa: Editorial Teorema, 1985, tradução João Reis, p. 81).

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