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Document 61965CJ0057

Acórdão do Tribunal de 16 de Junho de 1966.
Firma Alfons Lütticke GmbH contra Hauptzollamt von Saarlouis.
Pedido de decisão prejudicial: Finanzgericht des Saarlandes - Alemanha.
Processo 57-65.

English special edition 1965-1968 00361

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1966:34

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

16 de Junho de 1966 ( *1 )

No processo 57/65,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.o do Tratado CEE, pelo Finanzgericht des Saarlandes (Segunda Secção), destinado a obter uma decisão a título prejudicial no processo pendente neste órgão jurisdicional entre

Alfons Lütticke GmbH, Colónia-Deutz,

recorrente,

mandatário ad litem: Peter Wendt, Bieberstraße 3, Hamburgo, 13

e

Hauptzollamt (Gabinete Principal das Alfandegas) Saarland,

recorrido,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

composto por: Ch. L. Hammes, presidente, L. Delvaux e W. Strauß, presidentes de secção, A. M. Donner, A. Trabucchi, R. Lecourt e R. Monaco, juízes,

advogado-geral: J. Gand

secretário: A. Van Houtte

profere o presente

Acórdão

(A parte relativa à matéria de facto não é reproduzida)

Fundamentos da decisão

1. Quanto às duas primeiras

Na primeira questão, o Finanzgericht des Saarlandes pede ao Tribunal de Justiça que determine se o primeiro parágrafo do artigo 95o do Tratado tem efeito directo e atribui aos particulares direitos individuais que os órgãos jurisdicionais nacionais devam salvaguardar.

Em caso de resposta negativa, o Finanzgericht coloca a questão de saber se, a partir de 1 de Janeiro de 1962, o terceiro parágrafo do mencionado artigo tem o efeito e cria os direitos antes referidos.

As duas questões devem ser objecto de tratamento conjunto, devendo definir-se, em primeiro lugar, as relações entre os referidos parágrafos do artigo 95.o

O primeiro parágrafo do artigo 95.o determina, enquanto norma geral e permanente da ordem jurídica comunitária, que as imposições internas que incidem sobre os produtos dos outros Estados-membros não devem ser superiores àquelas que incidem sobre os produtos nacionais similares.

Esse regime, frequentemente adoptado pelo Tratado para assegurar a igualdade dos nacionais dos Estados-membros da Comunidade face às legislações nacionais, constitui o fundamento indispensável do mercado comum em matéria fiscal.

Para facilitar a adaptação das legislações nacionais a essa norma, o terceiro parágrafo do artigo 95.o concede aos Estados-membros um prazo que se estende até ao início da segunda etapa do período de transição, isto é, até 1 de Janeiro de 1962, para eliminar ou corrigir «as disposições existentes à data de entrada em vigor do presente Tratado que sejam contrárias às disposições precedentes».

Assim, o artigo 95.o enuncia uma norma geral, dotada de uma simples cláusula suspensiva no que respeita às disposições existentes à data da sua entrada em vigor.

De onde se deve concluir que, findo o referido prazo, a norma geral produz, sem reserva, a totalidade dos seus efeitos.

As questões colocadas pelo Finanzgericht devem ser abordadas à luz das considerações precedentes.

O artigo 95.o, primeiro parágrafo, estabelece uma proibição das discriminações que traduz uma obrigação clara e incondicional.

Com excepção do disposto no terceiro parágrafo, esta obrigação não é acompanhada de qualquer condição, nem está subordinada, na sua execução ou efeitos, à intervenção de qualquer acto seja das instituições da Comunidade seja dos Estados-membros.

Esta proibição é, pois, completa, juridicamente perfeita e, consequentemente, susceptível de produzir um efeito directo nas relações jurídicas entre os Estados-membros e os seus nacionais.

O facto de esse artigo designar os Estados-membros como destinatários da obrigação de não discriminação não significa que os particulares dele não possam beneficiar.

É certo que o terceiro parágrafo do artigo 95.o comporta, para os Estados-membros, uma obrigação de «eliminar» ou de «corrigir» as disposições contrárias aos princípios enunciados nos parágrafos precedentes.

No entanto, essa obrigação não lhes deixa qualquer margem de decisão quanto ao prazo em que devem ter lugar estas operações, isto é, antes de 1 de Janeiro de 1962.

A partir dessa data, basta que o juiz nacional declare, sendo esse o caso, que os actos de execução das normas nacionais adoptadas foram praticados depois dessa data, para admitir, com força geral, o efeito directo do primeiro parágrafo.

Deste modo, o disposto no terceiro parágrafo apenas obsta à aplicação da norma geral no que se refere aos actos de execução das disposições existentes à data da entrada em vigor do Tratado, adoptados antes de 1 de Janeiro de 1962.

Quer nas observações escritas quer nas observações orais que apresentaram ao longo do processo, os três governos basearam-se no artigo 97.o para sustentarem uma interpretação diferente do artigo 95.o

O referido artigo, ao permitir que os Estados-membros que cobrem o imposto sobre o volume de negócios segundo o sistema do imposto cumulativo em cascata fixem as taxas médias por produto ou grupo de produtos, constitui uma norma especial para adaptação do artigo 95.o e esse preceito, pela sua natureza, não é de molde a produzir um efeito directo nas relações entre os Estados-membros e os seus nacionais.

Em todo o caso, esta situação, específica do artigo 97.o, não pode interferir na interpretação do artigo 95.o

Do exposto resulta que, sem prejuízo da excepção prevista no terceiro parágrafo para as disposições existentes da data da entrada em vigor do Tratado até 1 de Janeiro de 1962, a proibição do artigo 95.o produz efeitos directos e atribui aos particulares direitos individuais que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar.

2. Quanto à terceira questão

Na terceira questão, o Finanzgericht pede ao Tribunal que determine se «os parágrafos primeiro e terceiro do artigo 95.o do Tratado CEE, conjuntamente com os artigos 12.o ou 13.o, têm efeito directo e atribuem aos particulares direitos individuais que os órgãos jurisdicionais nacionais devam salvaguardar».

Essa questão foi colocada para o caso do Tribunal responder negativamente às duas primeiras questões, pelo que não há que lhe responder. No entanto, deve esclarecer-se que os artigos 12.o e 13.o, por um lado, e o artigo 95.o, por outro, não podem ser aplicados conjuntamente a uma única e mesma situação.

Os encargos de efeito equivalente a direitos aduaneiros, por um lado, e as imposições internas, por outro, estão sujeitos a regimes diferentes. A este propósito, observe-se que um imposto destinado a compensar o efeito de uma imposição interna, compartilha, por esse facto, da natureza interna da imposição cujo efeito se destina a compensar.

Quanto às despesas

As despesas efectuadas pelo Governo neerlandês, pela Comissão da Comunidade Económica Europeia e pelos Governos alemão e belga, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes no processo pendente no Finangericht des Saarlandes, a natureza de um incidente suscitado perante esse órgão jurisdicional, compete a este decidir quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

vistos os autos,

ouvido o relatório do juiz-relator,

ouvidas as alegações da recorrente no processo principal, da Comissão da Comunidade Económica Europeia e do Governo alemão

ouvidas as conclusões do advogado-geral,

vistos os artigos 12.o, 13.o, 95.o e 97.o do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia,

visto o Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da Comunidade Económica Europeia,

visto o Regulamento Processual do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

declara:

 

1)

O primeiro parágrafo do artigo 95.o produz efeitos directos e atribui aos particulares direitos individuais que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar;

 

2)

Por conseguinte, o primeiro e o terceiro parágrafos do artigo 95.o apenas se aplicam às disposições existentes à data da entrada em vigor do Tratado a partir do início da segunda fase do período de transição;

 

e decide:

 

Cabe ao Finanzgericht des Saarlandes decidir quanto às despesas do presente processo.

 

Hammes

Delvaux

Strauß

Donner

Trabucchi

Lecourt

Monaco

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 16 de Junho de 1966.

O secretário

A. Van Houtte

O presidente

Ch. L. Hammes


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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