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Document 62010CJ0225

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 20 de Outubro de 2011.
    Juan Pérez Garcia e outros contra Familienkasse Nürnberg.
    Pedido de decisão prejudicial: Sozialgericht Nürnberg - Alemanha.
    Segurança social - Regulamento (CEE) n.º 1408/71 - Artigos 77.º e 78.º - Titulares de pensões devidas nos termos da legislação de vários Estados-Membros - Filhos deficientes - Abonos de família por filhos a cargo - Direito às prestações no anterior Estado-Membro de emprego - Existência de um direito às prestações no Estado-Membro de residência - Inexistência de pedido - Escolha do pagamento de uma prestação de invalidez incompatível com as prestações para filhos a cargo - Conceito de ‘prestação por filhos a cargo’ - Manutenção dos direitos adquiridos no anterior Estado-Membro de emprego.
    Processo C-225/10.

    Colectânea de Jurisprudência 2011 I-10111

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:678

    Processo C‑225/10

    Juan Pérez García e o.

    contra

    Familienkasse Nürnberg

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sozialgericht Nürnberg)

    «Segurança social – Regulamento (CEE) n.° 1408/71 – Artigos 77.° e 78.° – Titulares de pensões devidas nos termos da legislação de vários Estados‑Membros – Filhos deficientes – Abonos de família por filhos a cargo – Direito às prestações no anterior Estado‑Membro de emprego – Existência de um direito às prestações no Estado‑Membro de residência – Inexistência de pedido – Escolha do pagamento de uma prestação de invalidez incompatível com as prestações por filhos a cargo – Conceito de ‘prestação por filhos a cargo’ – Manutenção dos direitos adquiridos no anterior Estado‑Membro de emprego»

    Sumário do acórdão

    Segurança social dos trabalhadores migrantes – Prestações familiares – Titulares de pensões ao abrigo da legislação de vários Estados‑Membros – Prestações por filhos a cargo e por órfãos de titulares de pensões – Filhos deficientes

    [Regulamento n.° 1408/71 do Conselho, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i)]

    Os artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, devem ser interpretados no sentido de que os titulares de uma pensão de velhice e/ou de invalidez, ou o órfão de um trabalhador, que tenham estado sujeitos à legislação de vários Estados‑Membros, mas cujos direitos à pensão e à pensão de orfandade se baseiam apenas na legislação do anterior Estado‑Membro de emprego, têm o direito de exigir às autoridades competentes desse Estado a totalidade dos abonos de família previstos por essa legislação em benefício dos filhos deficientes, mesmo quando não tenham requerido no Estado‑Membro de residência os abonos equivalentes de montante mais elevado previstos na legislação deste último Estado, pelo facto de terem optado pela concessão de outra prestação por deficientes que é com eles incompatível, quando o direito aos abonos de família no anterior Estado‑Membro de emprego tiver sido adquirido apenas ao abrigo da legislação deste último. Tal é igualmente aplicável quando, em virtude da legislação do Estado‑Membro de residência, os interessados não estão em condições de optar pelo pagamento dos abonos de família nesse Estado.

    (cf. n.os 57, 59, disp. 1‑2)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    20 de Outubro de 2011 (*)

    «Segurança social – Regulamento (CEE) n.° 1408/71 – Artigos 77.° e 78.° – Titulares de pensões devidas nos termos da legislação de vários Estados‑Membros – Filhos deficientes – Abonos de família por filhos a cargo – Direito às prestações no anterior Estado‑Membro de emprego – Existência de um direito às prestações no Estado‑Membro de residência – Inexistência de pedido – Escolha do pagamento de uma prestação de invalidez incompatível com as prestações por filhos a cargo – Conceito de ‘prestação por filhos a cargo’ – Manutenção dos direitos adquiridos no anterior Estado‑Membro de emprego»

    No processo C‑225/10,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Sozialgericht Nürnberg (Alemanha), por decisão de 26 de Abril de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de Maio de 2010, no processo

    Juan Pérez García,

    José Arias Neira,

    Fernando Barrera Castro,

    Dolores Verdún Espinosa, na qualidade de sucessora de José Bernal Fernández,

    contra

    Familienkasse Nürnberg,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus A. Rosas, A. Ó Caoimh (relator) e A. Arabadjiev juízes,

    advogado‑geral: P. Mengozzi,

    secretário: C. Strömholm, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 14 de Abril de 2011,

    vistas as observações apresentadas:

    –        em representação de F. Barrera Castro, por A. González Maeztu, chefe de secção no Consulado‑Geral de Espanha em Frankfurt am Main,

    –        em representação do Governo alemão, por N. Graf Vitzthum, na qualidade de agente,

    –        em representação do Governo espanhol, por B. Plaza Cruz e S. Centeno Huerta, na qualidade de agentes,

    –        em representação da Comissão Europeia, por V. Kreuschitz, na qualidade de agente,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de Junho de 2011,

    profere o presente

    Acórdão

    1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 77.° e 78.° do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de Dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006 (JO L 392, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 1408/71»).

    2        Este pedido foi apresentado no âmbito de quatro litígios que opõem J. Pérez García, J. Arias Neira, F. Barrera Castro e D. Verdún Espinosa, na sua qualidade de sucessora de J. Bernal Fernández, à Familienkasse Nürnberg (Caixa de abonos de família de Nuremberga) devido à recusa desta em lhes conceder as prestações por filhos a cargo, a título dos seus filhos maiores deficientes.

     Quadro jurídico

     Regulamentação da União

    3        O artigo 1.°, alínea u), do Regulamento n.° 1408/71 prevê que, para efeitos da sua aplicação:

    «i)      a expressão ‘prestações familiares’ designa quaisquer prestações em espécie ou pecuniárias destinadas a compensar os encargos familiares no âmbito de uma legislação prevista no n.° 1, alínea h), do artigo 4.°, excluindo os subsídios especiais de nascimento ou de adopção mencionados no Anexo II;

    ii)      a expressão ‘abonos de família’ designa as prestações periódicas pecuniárias, concedidas exclusivamente em função do número e, eventualmente, da idade dos membros da família.»

    4        Nos termos do seu artigo 4.°, n.° 1, alínea h), o referido regulamento aplica‑se a «todas as legislações relativas aos ramos de segurança social que respeitam a [...] prestações familiares».

    5        Segundo o artigo 10.°‑A, n.° 1, do Regulamento n.° 1408/71, as disposições do título III não se aplicam às prestações pecuniárias especiais de carácter não contributivo, beneficiando as pessoas a quem o referido regulamento é aplicável destas prestações exclusivamente no território do Estado‑Membro em que residam e ao abrigo da legislação desse Estado, na medida em que tais prestações sejam mencionadas no Anexo II‑A.

    6        O Anexo II‑A do Regulamento n.° 1408/71, sob a epígrafe «Prestações pecuniárias especiais de carácter não contributivo», inclui, na secção «H. Espanha», as seguintes referências:

    «a)      Rendimento mínimo garantido [Lei 13/1982 relativa à integração social das pessoas deficientes (Ley 13/1982 de Integración Social de los Minusválidos), de 7 de Abril de 1982 (BOE n.° 103, de 30 de Abril de 1982, p. 11106)];

    […]

    c)      Pensões de invalidez e de reforma, de natureza não contributiva, referidas no n.° 1 do artigo 38.° do [texto consolidado da Lei geral da segurança social aprovada pelo Real Decreto Legislativo n.° 1/1994 (Real Decreto Legislativo 1/1994 por el que se aprueba el texto refundido de la Ley General de Seguridad Social), de 20 de Junho de 1994 (BOE n.° 154, de 29 de Junho de 1994, p. 20658)].

    […]»

    7        Como resulta da sua epígrafe, o título III do Regulamento n.° 1408/71 contém disposições especiais relativas às diferentes categorias de prestações.

    8        Constando do capítulo 7, intitulado «Prestações Familiares», do referido título III, o artigo 76.° do Regulamento n.° 1408/71, intitulado «Regras de prioridade em caso de cumulação de direitos a prestações familiares por força da legislação do Estado competente e por força da legislação do Estado‑Membro de residência dos membros da família», tem a seguinte redacção:

    «1.      Sempre que, durante o mesmo período, para o mesmo membro da família e por motivo do exercício de uma actividade profissional, estejam previstas prestações familiares na legislação do Estado‑Membro em cujo território os membros da família residem, o direito às prestações familiares devidas por força da legislação de outro Estado‑Membro, eventualmente em aplicação dos artigos 73.° e 74.°, é suspenso até ao limite do montante previsto pela legislação do primeiro Estado‑Membro.

    2.      Se não for apresentado qualquer pedido de prestações no Estado‑Membro em cujo território residem os membros da família, a instituição competente do outro Estado‑Membro pode aplicar o disposto no n.° 1, como se as prestações fossem concedidas no primeiro Estado‑Membro.»

    9        No mesmo título III, o capítulo 8, intitulado «Prestações por filhos a cargo de titulares de pensões ou de rendas e prestações por órfãos», inclui um artigo 77.° com a seguinte redacção:

    «1.      O termo ‘prestações’, na acepção do presente artigo, designa os abonos de família previstos em relação aos titulares de uma pensão ou de uma renda de velhice, invalidez, acidente de trabalho ou doença profissional, bem como os acréscimos ou os suplementos dessas pensões ou rendas previstos em benefício dos filhos daqueles titulares, com excepção dos suplementos concedidos em consequência dos seguros de acidentes de trabalho e doenças profissionais.

    2.      Independentemente do Estado‑Membro em cujo território residem o titular de pensões ou de rendas ou os filhos, as prestações serão concedidas em conformidade com as seguintes regras:

    a)      Ao titular de uma pensão ou de uma renda devida ao abrigo da legislação de um único Estado‑Membro, em conformidade com a legislação do Estado‑Membro competente em relação à pensão ou à renda;

    b)      Ao titular de pensões ou de rendas devidas ao abrigo das legislações de vários Estados‑Membros:

    i)      Em conformidade com a legislação do Estado em cujo território resida, quando o direito a uma das prestações referidas no n.° 1 foi adquirido por força da legislação desse Estado, tomando em conta, se for caso disso, o disposto no n.° 1, alínea a), do artigo 79.°,

    […]»

    10      Constando igualmente do referido capítulo 8, o artigo 78.° do Regulamento n.° 1408/71, intitulado «Órfãos», dispõe:

    «1.      O termo ‘prestações’, na acepção do presente artigo, designa os abonos de família e, se for caso disso, os abonos suplementares ou especiais previstos em benefício dos órfãos.

    2.      Independentemente do Estado‑Membro em cujo território residem o órfão ou a pessoa singular ou colectiva que o tenha efectivamente a cargo, as prestações em benefício dos órfãos são concedidas, em conformidade com as seguintes regras:

    a)      Em relação ao órfão de um trabalhador assalariado ou não assalariado falecido que esteve sujeito à legislação de um único Estado‑Membro, em conformidade com a legislação deste Estado;

    b)      Em relação ao órfão de um trabalhador assalariado ou não assalariado falecido que esteve sujeito às legislações de vários Estados‑Membros:

    i)      Em conformidade com a legislação do Estado em cujo território resida o órfão, quando o direito a uma das prestações referidas no n.° 1 for adquirido por força da legislação desse Estado, tomando em conta, se for caso disso, o disposto no n.° 1, alínea a), do artigo 79.°;

    […]»

    11      Nos termos do artigo 5.° do Regulamento n.° 1408/71, «[o]s Estados‑Membros mencionarão […] as prestações referidas nos artigos 77.° e 78.°, em declarações notificadas e publicadas […]».

    12      Na sua declaração efectuada em conformidade com o referido artigo 5.° (JO 2003, C 210, p. 1), a República Federal da Alemanha indicou que os abonos para filhos pagos em relação aos filhos de titulares de pensões ou de rendas em virtude da Lei relativa aos abonos por filhos a cargo (Bundeskindergeldgesetz, a seguir «BKGG») constituem abonos de família abrangidos pelos artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71.

    13      Na sua declaração efectuada para os mesmos efeitos (JO 2005, C 79, p. 9), o Reino de Espanha indicou que os abonos de família e as prestações por órfãos previstos no Real Decreto Legislativo 1/1994 se subsumiam a essas disposições.

     Legislação nacional

     Legislação alemã

    14      A BKGG, na sua versão publicada em 28 de Janeiro de 2009 (BGBl. 2009 I, p. 142), confere aos pensionistas um direito a abonos por filhos a cargo até que estas atinjam a idade de 18 anos, ou, em certas condições, de 25 anos (a seguir «abono alemão por filhos a cargo»). Para os filhos deficientes que não possam subsistir de forma independente, o BKGG prevê que esse abono é pago sem limite de idade se a deficiência for detectada antes dos 25 anos de idade. O montante do abono depende do número de filhos a cargo.

     Legislação espanhola

    15      Segundo a decisão de reenvio, os filhos deficientes que atingiram a idade de 18 anos podem requerer uma pensão de invalidez não contributiva sob a forma de um auxílio especial na acepção da Lei 13/1982 (a seguir «abono espanhol não contributivo para deficientes»).

    16      Por outro lado, o Real Decreto Legislativo 1/1994 prevê o pagamento aos titulares de pensões ou de rendas que residam em território nacional de um abono por cada filho a cargo que resida nesse mesmo território e que não tenha atingido os 18 anos de idade, quando o rendimento familiar não exceda um determinado montante e nenhum dos pais tenha direito a prestações da mesma natureza de acordo com outro regime público de protecção social (a seguir «abono espanhol por filhos a cargo»). Este abono é pago a título vitalício por cada descendente deficiente cuja invalidez seja igual ou superior a 65%, qualquer que seja a sua idade e sem limite de recursos. Uma invalidez igual ou superior, respectivamente, a 33%, 65% e 75% acarreta uma majoração correspondente ao montante de base do abono. No entanto, no caso de um filho deficiente, esse abono não é concedido se este último beneficiar de um abono análogo previsto por outro regime público de segurança social, de um «auxílio especial» concedido nos termos da Lei 13/1982 ou de uma «pensão de invalidez na sua modalidade não contributiva»; o interessado deve, nesse caso, escolher um destes abonos declarados incompatíveis.

     Litígios no processo principal e questões prejudiciais

    17      Resulta de decisão de reenvio que J. Pérez García, J. Arias Neira, F. Barrera Castro e J. Bernal Fernández, este último falecido na pendência do processo principal, são cidadãos espanhóis residentes em Espanha que trabalharam na Alemanha como trabalhadores migrantes. A esse título, cada um deles é ou era titular de uma pensão de velhice e/ou de invalidez tanto em Espanha como na Alemanha, atribuindo‑lhes este último Estado um direito à pensão «interna» com base apenas nas disposições do direito alemão. Por outro lado, cada um é ou era pai de um filho deficiente com mais de 18 anos. Segundo a decisão de reenvio, é concedido em Espanha, a título da deficiência dos filhos, o abono espanhol não contributivo para deficientes previsto pela Lei 13/1982, mas não o abono espanhol por filhos a cargo previsto pelo Real Decreto Legislativo 1/1994.

    18      Por decisões tomadas entre os meses de Novembro de 2007 e Junho de 2008, a Familienkasse Nürnberg recusou ou revogou, consoante os casos, o pagamento a J. Pérez García, J. Arias Neira, F. Barrera Castro e J. Bernal Fernández do abono alemão por filhos a cargo, pelo facto, no essencial, de terem direito em Espanha a prestações familiares de montante mais elevado do que a prestação correspondente que lhes é devida na Alemanha, podendo a qualquer momento reclamá‑las. A este respeito, o ponto determinante é que são devidas prestações familiares espanholas, embora o filho a cargo não possa receber o abono espanhol não contributivo para deficientes.

    19      Tendo a sua reclamação das referidas decisões sido indeferida, J. Pérez García, J. Arias Neira, F. Barrera Castro e J. Bernal Fernández interpuseram recurso, cada um na parte em que lhes diz respeito, para o Sozialgericht Nürnberg, com vista a obter o pagamento do abono alemão por filhos a cargo. Tendo J. Bernal Fernández falecido em 20 de Abril de 2009, a sua viúva, D. Verdún Espinosa, deu continuidade ao processo na sua qualidade de sucessora.

    20      Na sua decisão de reenvio, o referido órgão jurisdicional considera que, em todos os processos pendentes, o direito ao abono espanhol por filhos a cargo está «adquirido», na acepção dos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71, uma vez que estão reunidas as condições legais para a concessão dessas prestações. Consequentemente, uma vez que o direito a essas prestações só é excluído pelo facto de os pais do filho deficiente terem exercido uma possibilidade de escolha prevista pelo direito espanhol, o referido órgão jurisdicional entende que a obtenção do abono espanhol não contributivo para deficientes impede os interessados de requererem o benefício do abono alemão por filhos a cargo relativamente ao Estado‑Membro que, não sendo o da residência, só intervém a título subsidiário em aplicação das referidas disposições.

    21      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, daqui não resulta nenhuma violação da livre circulação dos trabalhadores migrantes. Com efeito, é certo que, quando uma pessoa titular de uma pensão espanhola e de uma pensão alemã transfere a sua residência da Alemanha para Espanha, perde o direito prioritário ao abono alemão por filhos a cargo que o artigo 77.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71 lhe conferia ao abrigo das disposições do anterior Estado‑Membro da sua residência, mas adquire, em virtude da mesma disposição, um direito prioritário às prestações por filhos a cargo, que são mais elevadas, no novo Estado‑Membro de residência. O mesmo se passa no âmbito do artigo 78.°, n.° 2, alínea b), i) do referido regulamento.

    22      O órgão jurisdicional de reenvio considera, em contrapartida, que um direito ao abono alemão por filhos a cargo pode ser reconhecido num montante igual à diferença entre as prestações em causa quando o filho deficiente que recebe um abono espanhol não contributivo para deficientes não for ou já não for considerado uma pessoa a cargo em Espanha. Seria esse o caso, por exemplo, se o filho deficiente deixasse de residir em comum e permanentemente com os seus pais para viver em habitação própria ou numa comunidade terapêutica. Com efeito, nesse caso, seria excluída a possibilidade de escolher entre o abono espanhol por filhos a cargo e o abono espanhol não contributivo para deficientes.

    23      Nestas condições, o Sozialgericht Nürnberg decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)      O artigo 77.°, n.° 2, alínea b), ponto i), do Regulamento […] n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que as prestações familiares [por filhos] a cargo previstas para os titulares de uma pensão ou de uma renda de velhice, invalidez, acidente de trabalho ou doença profissional que beneficiam de pensões ou de rendas devidas ao abrigo das legislações de vários Estados‑Membros (os denominados duplos ou múltiplos pensionistas) e cujo direito à pensão ou à renda se baseia na legislação do antigo Estado de emprego (direito nacional à pensão ou à renda) não têm de ser concedidas pelo antigo Estado de emprego, quando no Estado de residência, embora se encontre prevista uma prestação comparável mais elevada, esta é incompatível com uma outra prestação pela qual o interessado optou no exercício de uma faculdade de escolha?

    2)      O artigo 78.°, n.° 2, alínea b), ponto i), do Regulamento […] n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que as prestações para órfãos previstas para os órfãos de um trabalhador assalariado ou não assalariado falecido que esteve sujeito às legislações de vários Estados‑Membros e cujo direito virtual às prestações para órfãos tem por base a legislação do antigo Estado de emprego (direito nacional potencial à pensão [ou à renda]) não têm de ser concedidas pelo antigo Estado de emprego, quando no Estado de residência esteja efectivamente prevista uma prestação comparável mais elevada, mas incompatível com uma outra prestação pela qual o interessado optou no exercício de uma faculdade de escolha?

    3)      A mesma interpretação é igualmente válida em relação a uma prestação abrangida pelos artigos 77.° ou 78.° do Regulamento […] n.° 1408/71, que, quanto ao seu fundamento legal, se encontra prevista no Estado de residência dos filhos, mas em relação à qual não existe uma possibilidade de escolha?»

     Quanto às questões prejudiciais

     Quanto às duas primeiras questões

    24      Com as suas duas primeiras questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71 devem ser interpretados no sentido de que os titulares de uma pensão de velhice e/ou de invalidez, ou o órfão de um trabalhador falecido, tendo estado sujeitos à legislação de vários Estados‑Membros, mas cujos direitos à pensão e à pensão de orfandade se baseiam apenas na legislação do anterior Estado‑Membro de emprego, têm o direito de exigir das autoridades competentes desse Estado os abonos de família previstos por essa legislação em benefício dos filhos deficientes, ainda que não tenham requerido no Estado‑Membro de residência abonos análogos de montante mais elevado previstos pela legislação deste último Estado, por terem optado pela concessão de outra prestação por deficientes que é incompatível com estas.

    25      Estas questões são colocadas no âmbito de litígios em que, como resulta do n.° 17 do presente acórdão, os titulares das pensões em causa assim como o órfão em causa (a seguir «interessados») optaram por receber das instituições competentes do seu Estado‑Membro de residência uma prestação não contributiva para deficientes, cujo pagamento exclui, em virtude das normas do direito interno desse Estado, a possibilidade de beneficiar dos abonos previstos para os filhos a cargo, mesmo quando estes são deficientes.

    26      Nestas circunstâncias, as instituições competentes do antigo Estado‑Membro de emprego consideram que decorre dos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71 que só o Estado‑Membro de residência é obrigado a conceder aos interessados os abonos de família, na medida em que, em conformidade com estas disposições, nele seja «adquirido» um direito a esses abonos ao abrigo da legislação desse Estado‑Membro, estando preenchidos todos os pressupostos para a concessão de tais abonos, ainda que os interessados tenham escolhido não os receber.

    27      Embora o Governo espanhol precise, nas suas observações escritas, que o abono espanhol não contributivo para deficientes a que se refere a decisão de reenvio está prevista não pela Lei 13/1982, mas pelo Real Decreto Legislativo 1/1994, esse governo admite no entanto que esta precisão não afecta a pertinência das questões colocadas uma vez que, em todo o caso, seja qual for a natureza da prestação escolhida pelos interessados em Espanha, cada uma delas é, como resulta do n.° 16 do presente acórdão, incompatível com o abono espanhol por filhos a cargo previsto por este real decreto legislativo em benefício dos filhos deficientes.

    28      A título liminar, importa, no caso concreto, verificar se, como pressupõe o órgão jurisdicional de reenvio, pelo menos uma das prestações sociais em causa no processo principal é abrangida pelos artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71. Com efeito, se esse não for o caso, as questões colocadas por esse órgão jurisdicional relativas à interpretação destas disposições seriam desprovidas de pertinência.

     Quanto às prestações abrangidas pelos artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71

    29      Segundo o n.° 1 dos artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71, as «prestações» aí referidas são os «abonos de família» e, se for caso disso, estando em causa órfãos, prestações suplementares ou especiais previstas para estes.

    30      Ora, em virtude do artigo 1.°, alínea u), ii), do referido regulamento, os termos «abonos de família» designam, para efeitos da aplicação deste regulamento, as prestações periódicas pecuniárias, concedidas exclusivamente em função do número e, eventualmente, da idade dos membros da família.

    31      Daqui resulta que os «abonos de família» cujo pagamento é previsto pelos referidos artigos 77.° e 78.° são apenas as prestações que correspondam a essa definição, excluindo qualquer outro abono por filhos a cargo (v., neste sentido, acórdãos de 27 de Setembro de 1988, Lenoir, 313/86, Colect., p. 5391, n.os 10 e 11; de 20 de Março de 2001, Fahmi e Esmoris Cerdeiro‑Pinedo Amado, C‑33/99, Colect., p. I‑2415, n.os 33 a 35; e de 31 de Maio de 2001, Leclere e Deaconescu, C‑43/99, Colect., p. I‑4265, n.os 41 e 42).

    32      No caso em apreço, importa, desde logo, observar que o abono espanhol não contributivo para deficientes pelo qual optaram os interessados no seu Estado‑Membro de residência, quer se trate de uma «pensão de invalidez não contributiva», nos termos do Real Decreto Legislativo 1/1994, ou de um «auxílio especial», nos termos da Lei 13/1982, consta do Anexo II‑A do Regulamento n.° 1408/71, que enuncia, na sua secção H, prestações especiais de carácter não contributivo espanholas excluídas, por força do artigo 10.°‑A deste mesmo regulamento, do título III do mesmo. Não se contesta que esta prestação constitui uma prestação especial de natureza não contributiva. Assim, a referida prestação não decorre do conceito de «abonos de família», na acepção do artigo 1.°, alínea u), ii), do referido regulamento, e não constitui por isso uma «prestação» que decorre dos seus artigos 77.° e 78.°

    33      Por outro lado, é igualmente pacífico que o abono alemão por filhos a cargo previsto no anterior Estado‑Membro de emprego dos trabalhadores em causa a favor dos filhos deficientes, que é mencionado pela República Federal da Alemanha na sua declaração efectuada nos termos do artigo 5.° do Regulamento n.° 1408/71 como sendo uma das prestações referidas nos artigos 77.° e 78.° deste regulamento, constitui, para aquele Estado, uma prestação abrangida pelo conceito de «abono de família», na acepção do referido artigo 1.°, alínea u), ii).

    34      Em contrapartida, a Comissão Europeia, a exemplo de F. Barrera Castro, alega que, ao invés do que supõe o órgão jurisdicional de reenvio nas suas questões, o abono espanhol por filhos a cargo pago aos pais de filhos deficientes nos termos do Real Decreto Legislativo 1/1994 não se enquadra nos referidos artigos 77.° e 78.° Com efeito, essa prestação não se pode considerar atribuída exclusivamente em função do número e, se for caso disso, da idade dos membros da família, uma vez que são igualmente determinantes critérios adicionais ou de natureza diferente, a saber, a deficiência e o grau ou a gravidade da mesma. Esta análise seria confirmada pela incompatibilidade da referida prestação com a prevista pela Lei 13/1982. Com efeito, essa incompatibilidade interna só se pode explicar se o legislador espanhol considerar que estas duas prestações são semelhantes ou, pelo menos, prosseguem o mesmo objectivo.

    35      Impõe‑se concluir que, na sua declaração efectuada em conformidade com o artigo 5.° do Regulamento n.° 1408/71, o Reino de Espanha indicou expressamente que o abono espanhol por filhos a cargo, bem como as prestações por órfãos previstas pelo Real Decreto Legislativo 1/1994, constituem prestações abrangidas, respectivamente, pelos artigos 77.° e 78.° do referido regulamento.

    36      Ora, como o Tribunal de Justiça já declarou, embora o facto de certas prestações por filhos a cargo de titulares de pensões ou de rendas concedidas ao abrigo de uma lei ou de uma regulamentação nacional não terem sido mencionados na declaração referida no artigo 5.° do Regulamento n.° 1408/71 não possa, por si só, levar a concluir que essas prestações não são abrangidas pelos artigos 77.° e 78.° deste regulamento, em contrapartida, há que considerar que, quando tais prestações foram mencionadas na referida declaração, estão abrangidas por essas disposições (v., neste sentido, acórdão de 11 de Junho de 1991, Athanasopoulos e o., C‑251/89, Colect., p. I‑2797, n.° 28).

    37      Daqui resulta que, como o abono alemão por filhos a cargo previsto no anterior Estado‑Membro de emprego dos interessados, o abono espanhol por filhos a cargo previsto pelo Real Decreto Legislativo 1/1994 no seu Estado‑Membro de residência constitui uma prestação que se enquadra nos «abonos de família», na acepção do artigo 1.°, alínea u), ii), do Regulamento n.° 1408/71, e é, por isso, uma «prestação» para efeitos dos artigos 77.° e 78.° deste regulamento.

    38      Nestas condições, como pede o órgão jurisdicional de reenvio, importa analisar se as instituições competentes do anterior Estado‑Membro de emprego podem recusar o pagamento aos interessados dos abonos de família aos quais estes têm direito em virtude apenas da legislação nacional desse Estado‑Membro, uma vez que, segundo os artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71, é o seu novo Estado‑Membro de residência que doravante é exclusivamente competente para proceder ao pagamento desses abonos, uma vez que os referidos interessados deixaram o anterior Estado‑Membro de emprego para regressar ao seu Estado‑Membro de origem.

     Quanto ao Estado‑Membro competente para o pagamento dos abonos de família

    39      A este respeito, há que recordar que, por força dos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71, quando o titular de pensões ou rendas, ou o trabalhador falecido, tenha estado sujeito à legislação de vários Estados‑Membros, os abonos de família serão concedidos nos termos da legislação do Estado‑Membro em cujo território reside o titular das pensões ou rendas, ou o órfão do trabalhador falecido. O Estado‑Membro de residência é assim designado por estas disposições do Regulamento n.° 1408/71 como único competente para conceder os abonos de família em causa (v., neste sentido, acórdão de 27 de Fevereiro de 1997, Bastos Moriana e o., C‑59/95, Colect., p. I‑1071, n.os 15 e 18).

    40      Todavia, segundo a própria letra das referidas disposições do Regulamento n.° 1408/71, só quando um direito aos abonos de família é «adquirido» ao abrigo da legislação do Estado‑Membro de residência é que este é designado pelo Regulamento n.° 1408/71 como o Estado competente.

    41      A apreciação desta última condição, que é uma questão de direito interno, é da competência do tribunal nacional (v. acórdão de 24 de Setembro de 2002, Martínez Domínguez e o., C‑471/99, Colect., p. I‑7835, n.° 25).

    42      Todavia, no presente processo, o órgão jurisdicional de reenvio pretende precisamente determinar o alcance do termo «adquirido», na acepção dos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71. Com efeito, pretende saber se o direito aos abonos de família previsto no Estado‑Membro de residência se pode considerar «adquirido», na acepção destas disposições, quando este direito só seja excluído em razão da própria escolha dos interessados de optarem pela concessão de uma outra prestação incompatível com os referidos abonos de família, tendo aqueles exercido um direito de escolha previsto pelo direito interno. Essa questão de interpretação de uma regra de direito da União é manifestamente da competência exclusiva do Tribunal de Justiça.

    43      A este respeito, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para poder considerar os abonos de família «adquiridos» nos termos da legislação de um Estado‑Membro, a lei deste Estado deve reconhecer o direito ao pagamento de prestações em benefício do membro da família que trabalha neste Estado, sendo, por isso, essas prestações devidas nos termos dessa legislação (v., por analogia, acórdãos de 20 de Abril de 1978, Ragazzoni, 134/77, Recueil, p. 963, n.° 8, Colect., p. 345, e de 13 de Novembro de 1984, Salzano, 191/83, Recueil, p. 3741, n.° 7).

    44      Ora, segundo jurisprudência igualmente constante do Tribunal de Justiça, o reconhecimento desse direito exige que a pessoa interessada preencha todos os pressupostos, tanto formais como materiais, impostos pela legislação interna deste Estado para poder exercer esse direito, entre os quais pode constar, se for caso disso, a condição de ter sido apresentado um pedido prévio no sentido do pagamento dessas prestações (v., por analogia, acórdãos Ragazzoni, já referido, n.os 8 e 9; Salzano, já referido, n.os 7 e 10; de 23 de Abril de 1986, Ferraioli, 153/84, Colect., p. 1401, n.° 14; de 4 de Julho de 1990, Kracht, C‑117/89, Colect., p. I‑2781, n.° 11; e de 9 de Dezembro de 1992, McMenamin, C‑119/91, Colect., p. I‑6393, n.° 26).

    45      Daqui decorre que, quando, como no processo principal, os abonos de família previstos pela legislação nacional do Estado‑Membro de residência não podem ser requeridos pelos interessados porque estes optaram por outra prestação cuja concessão exclui o pagamento destes abonos, o direito a estes últimos, como defende o Governo espanhol e como reconhece também o Governo alemão, não se pode considerar «adquirido» na acepção dos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71. Com efeito, estes interessados não preenchem todas as condições formais e materiais para a concessão dos referidos abonos.

    46      Nestas circunstâncias, a regra constante das referidas disposições do Regulamento n.° 1408/71, segundo a qual o Estado‑Membro de residência dos interessados é exclusivamente competente para conceder os abonos de família aos titulares de pensões ou de rendas, ou aos órfãos de um trabalhador falecido que tenha estado sujeito à legislação de vários Estados‑Membros, não é então aplicável.

    47      O Governo alemão alega no entanto que, quando, como no processo principal, o direito aos abonos de família no Estado‑Membro de residência for excluído unicamente porque os interessados optaram por outra prestação nesse mesmo Estado, há que aplicar por analogia o artigo 76.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1408/71. Transposta para o caso vertente, a aplicação desta disposição implicaria que as instituições alemãs competentes podiam fazer como se os interessados tivessem escolhido beneficiar de abonos de família previstos pela legislação espanhola, renunciando assim ao direito aos abonos de família previstos pela legislação alemã. Esta analogia impõe‑se, por um lado, em razão do carácter análogo dos interesses em presença, devendo os filhos a cargo de titulares de pensões ser tratados da mesma maneira que os filhos a cargo de trabalhadores. Por outro lado, apoia‑se também no sentido e objecto do referido artigo 76.°, n.° 2. Com efeito, esta disposição visa não apenas evitar as sobreposições de prestações mas também assegurar uma justa repartição das despesas entre os Estados‑Membros. A não apresentação deliberada de pedido de pagamento dos abonos de família não deve por isso acarretar a transferência do dever de as conceder do Estado‑Membro prioritário para aquele que só é competente a título subsidiário.

    48      Esta argumentação não pode, contudo, ser acolhida.

    49      É certo que, posteriormente ao período no decurso do qual os factos pertinentes se desenvolveram nos processos que deram origem aos acórdãos referidos nos n.os 43 e 44 do presente acórdão, o artigo 76.° do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão então em vigor, a que se referiam esses acórdãos, foi alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 3427/89 do Conselho, de 30 de Outubro de 1989 (JO L 331, p. 1), a fim de aí incluir um n.° 2 para permitir ao Estado‑Membro de emprego suspender o direito aos abonos de família se um pedido de pagamento destas prestações não tiver sido apresentado no Estado‑Membro de residência e, por consequência, este último não tiver efectuado nenhum pagamento.

    50      Todavia, esta circunstância não priva de utilidade a referida jurisprudência para efeitos da interpretação dos artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71. Com efeito, diferentemente da anterior versão do artigo 76.° do Regulamento n.° 1408/71, que visa o caso de sobreposição de direitos a abonos de família quando essas prestações sejam devidas pelo exercício de uma actividade profissional no Estado‑Membro de residência dos membros da família e em virtude da legislação de outro Estado‑Membro, os referidos artigos 77.° e 78.° relativos ao direito aos abonos de família dos titulares de pensões ou de rendas e dos órfãos de trabalhadores não foram completados pelo Regulamento n.° 3427/89, que todavia alterou em vários aspectos a versão então em vigor das disposições do Regulamento n.° 1408/71 respeitantes à concessão de abonos de família (v., neste sentido, acórdão de 14 de Outubro de 2010, Schwemmer, C‑16/09, Colect., p. I‑0000, n.° 57).

    51      Além disso e sobretudo, a regulamentação da União em matéria de coordenação das legislações nacionais de segurança social, tendo em conta os objectivos que a enformam, não pode, salvo excepção expressa conforme com esses objectivos, ser aplicada de modo a privar o trabalhador migrante ou os seus sucessores das prestações concedidas por força apenas da legislação de um Estado‑Membro, apenas com base nos períodos de seguro completados nos termos dessa legislação (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 5 de Julho de 1967, Colditz, 9/67, Recueil, pp. 297, 304, Colect. 1965‑1968, p. 633; de 6 de Março de 1979, Rossi, 100/78, Colect., p. 447, n.° 14; Schwemmer, já referido, n.° 58 e jurisprudência referida; e de 30 de Junho de 2011, da Silva Martins, C‑388/09, Colect., p. I‑0000, n.° 75).

    52      Assim, quanto aos artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71, o Tribunal de Justiça já declarou que estas disposições não podem ser interpretadas de forma a privar o trabalhador, ou o órfão de um trabalhador, das prestações mais favoráveis, através da substituição das prestações anteriormente obtidas ao abrigo apenas da legislação de um outro Estado‑Membro pelas prestações concedidas no Estado‑Membro da nova residência (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 12 de Junho de 1980, Laterza, 733/79, Recueil, p. 1915, n.os 9 e 10; de 9 de Julho de 1980, Gravina, 807/79, Recueil, p. 2205, n.° 8; de 24 de Novembro de 1983, D’Amario, 320/82, Recueil, p. 3811, n.° 5; de 14 de Dezembro de 1988, Ventura, 269/87, Colect., p. 6411, n.° 14; e Bastos Moriana e o., já referido, n.° 16).

    53      Ora, no processo principal, é pacífico que, como resulta da própria redacção das questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, cada um dos interessados dispunha na Alemanha de um direito a uma pensão, adquirido com base apenas na legislação alemã por força dos períodos de seguro cumpridos nesse Estado‑Membro.

    54      Nestas condições, os artigos 77.° e 78.° do Regulamento n.° 1408/71 não podem ser interpretados no sentido de que o anterior Estado‑Membro de emprego se pode recusar a pagar aos interessados abonos de família concedidos ao abrigo apenas da legislação desse Estado, pelo único motivo de que esses interessados podiam ter requerido abonos de família de montante mais elevado no respectivo Estado‑Membro de residência.

    55      Por conseguinte, uma vez que, no processo principal, é pacífico que, como resulta dos n.os 39 a 46 do presente acórdão, o direito aos abonos de família não está «adquirido» pelos interessados ao abrigo da legislação do Estado‑Membro de residência, incumbe às instituições competentes do anterior Estado‑Membro de emprego, em que foi adquirido o direito a esses abonos apenas com base na legislação desse Estado, pagar a totalidade do respectivo montante segundo as condições e limites fixados por esta legislação (v., neste sentido, acórdãos de 7 de Maio de 1998, Gómez Rodríguez, C‑113/96, Colect., p. I‑2461, n.° 32, e Martínez Domínguez e o., já referido, n.os 21 e 22).

    56      Em face do exposto, há que responder às duas primeiras questões que os artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento n.° 1408/71 devem ser interpretados no sentido de que os titulares de uma pensão de velhice e/ou de invalidez, ou o órfão de um trabalhador, que tenham estado sujeitos à legislação de vários Estado‑Membros, mas cujos direitos à pensão e à pensão de orfandade se baseiam apenas na legislação do anterior Estado‑Membro de emprego, têm o direito de exigir às autoridades competentes desse Estado a totalidade dos abonos de família previstos por essa legislação em benefício dos filhos deficientes, mesmo quando não tenham requerido no Estado‑Membro de residência os abonos equivalentes de montante mais elevado previstos na legislação deste último Estado, pelo facto de terem optado pela concessão de outra prestação por deficientes que é com eles incompatível, quando o direito aos abonos de família no anterior Estado‑Membro de emprego tiver sido adquirido apenas ao abrigo da legislação deste último.

     Quanto à terceira questão

    57      Tendo em conta o que foi dito nos n.os 39 a 46 do presente acórdão, numa situação em que os interessados não estejam em condições, por força da legislação do Estado‑Membro de residência, de optar pelo pagamento de abonos de família nesse Estado, pelo facto de, por exemplo, não se poder considerar que os filhos em causa estão a cargo dos pais, a resposta dada pelo Tribunal de Justiça no número anterior aplica‑se mutatis mutandis a essa situação.

    58      Com efeito, também nessa situação, o direito aos abonos de família não se pode considerar «adquirido», na acepção dos artigos 77.°, n.° 2, alínea a), e 78.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 1408/71, no Estado‑Membro de residência, quando o órgão jurisdicional de reenvio verificar que, nessa situação, os pressupostos materiais para a concessão dos referidos abonos previstos pelo direito nacional não estão preenchidos, de modo que essas prestações não são devidas.

    59      Por conseguinte, há que responder à terceira questão no sentido de que a resposta à mesma é idêntica à dada às duas primeiras questões, uma vez que, em virtude da legislação do Estado‑Membro de residência, os interessados não estão em condições de optar pelo pagamento dos abonos de família nesse Estado.

     Quanto às despesas

    60      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

    1)      Os artigos 77.°, n.° 2, alínea b), i), e 78.°, n.° 2, alínea b), i), do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de Dezembro de 1996, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, devem ser interpretados no sentido de que os titulares de uma pensão de velhice e/ou de invalidez, ou o órfão de um trabalhador, que tenham estado sujeitos à legislação de vários Estados‑Membros, mas cujos direitos à pensão e à pensão de orfandade se baseiam apenas na legislação do anterior Estado‑Membro de emprego, têm o direito de exigir às autoridades competentes desse Estado a totalidade dos abonos de família previstos por essa legislação em benefício dos filhos deficientes, mesmo quando não tenham requerido no Estado‑Membro de residência os abonos equivalentes de montante mais elevado previstos na legislação deste último Estado, pelo facto de terem optado pela concessão de outra prestação por deficientes que é com eles incompatível, quando o direito aos abonos de família no anterior Estado‑Membro de emprego tiver sido adquirido apenas ao abrigo da legislação deste último.

    2)      A resposta à terceira questão é idêntica à dada às duas primeiras questões, uma vez que, em virtude da legislação do Estado‑Membro de residência, os interessados não estão em condições de optar pelo pagamento dos abonos de família nesse Estado.

    Assinaturas


    * Língua do processo: alemão.

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