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Document 52016IE0889

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Iniciativa de cidadania europeia (revisão)» (parecer de iniciativa)

OJ C 389, 21.10.2016, p. 35–42 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

21.10.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 389/35


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Iniciativa de cidadania europeia (revisão)»

(parecer de iniciativa)

(2016/C 389/05)

Relator:

Antonio LONGO

Em 21 de janeiro de 2016, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre a

Iniciativa de cidadania europeia (revisão).

(parecer de iniciativa)

O subcomité incumbido da preparação dos correspondentes trabalhos emitiu parecer em 17 de maio de 2016.

Na 518.a reunião plenária de 13 e 14 de julho (sessão de 13 de julho), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 107 votos a favor, 1 voto contra e 1 abstenção, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE), quatro anos após a entrada em vigor do Regulamento sobre a iniciativa de cidadania europeia, sublinha o papel central dos cidadãos no projeto europeu e a capacidade de este instrumento contribuir para colmatar o défice democrático, apoiando a cidadania ativa e a democracia participativa.

1.2.

O Comité apoia as posições já tomadas pelo Parlamento Europeu, o Comité das Regiões e a Provedora de Justiça Europeia e considera que a iniciativa de cidadania europeia não manifestou o seu pleno potencial em virtude de um regulamento que necessita de revisão.

1.3.

O CESE, com efeito, assinalou problemas significativos de caráter técnico, jurídico e burocrático, bem como uma sobrecarga evidente de competências na Comissão Europeia, que impedem a completa divulgação, a implementação e o seguimento das iniciativas bem-sucedidas.

1.4.

O Comité, tendo em vista a revisão do regulamento, propõe as seguintes medidas:

1.4.1.

Permitir que os comités de cidadãos iniciem a recolha das declarações de apoio numa data à sua escolha.

1.4.2.

Conferir reconhecimento jurídico aos comités de cidadãos, de modo a limitar a responsabilidade penal dos organizadores ao dolo ou à culpa grave, de acordo com o modelo da Diretiva 2008/99/CE relativa à proteção do ambiente através do direito penal.

1.4.3.

Criar um balcão único físico e em linha onde os cidadãos possam obter informações e orientações sobre a apresentação de iniciativas.

1.4.4.

Examinar as propostas destinadas a reduzir a idade mínima de apoio e participação numa iniciativa de cidadania, tal como solicitado pelo Parlamento Europeu e pelo Comité das Regiões.

1.4.5.

Resolver o evidente conflito de interesses no seio da Comissão, separando as funções de «mentor institucional» e «juiz». Neste sentido, o CESE, que reitera a sua vontade de prosseguir os esforços já envidados, pode ser um candidato natural a desempenhar o papel de facilitador e mentor institucional.

1.4.6.

Garantir o seguimento adequado das iniciativas bem-sucedidas, convidando a Comissão a elaborar uma proposta legislativa no prazo de 12 meses a contar do final da campanha ou a uma fundamentação adequada da sua decisão de não apresentar qualquer proposta. Na ausência de proposta, o CESE espera que o Parlamento Europeu exerça pressão junto da Comissão ao abrigo do artigo 225.o do TFUE.

1.5.

O CESE salienta que alguns problemas não implicam necessariamente a revisão do regulamento e que, por conseguinte, devem ser resolvidos com rapidez, a fim de não desencorajar potenciais promotores. De modo a tornar este instrumento mais eficaz e fácil de utilizar, o Comité preconiza a implementação das seguintes iniciativas:

1.5.1.

Para tornar o processo de registo mais transparente, a Comissão deve adotar procedimentos claros e simples e fornecer respostas detalhadas e possíveis soluções no caso de iniciativas consideradas não elegíveis, de modo a permitir aos comités reformulá-las e voltar a apresentá-las.

1.5.2.

A Comissão deve prosseguir as negociações com os Estados-Membros para simplificar, reduzir e harmonizar o sistema de normas nacionais previsto para a recolha de dados. Propõe-se, em especial, reduzir os pedidos de documentos de identificação pessoais e permitir a todos os cidadãos europeus assinarem as iniciativas dos países de residência.

1.5.3.

Tornar gratuito de forma permanente o programa informático para a recolha de assinaturas em linha (OCS) (1), a fim de simplificar a recolha e a classificação das referidas assinaturas e a respetiva verificação pelas autoridades nacionais. Espera-se que este instrumento se torne igualmente acessível às pessoas com deficiência.

1.6.

O Comité, de um ponto de vista mais geral de divulgação e de apropriação da ICE, recomenda:

1.6.1.

Reforçar a informação e a sensibilização dos cidadãos acerca do instrumento da ICE com campanhas específicas, de modo que os comités de cidadãos possam informar os signatários sobre os resultados alcançados e, sobretudo, através de um maior empenho da Comissão na publicação dos seguimentos das iniciativas bem-sucedidas.

1.6.2.

Garantir o multilinguismo e explorar novas formas de associar a recolha de assinaturas em linha e os meios de comunicação social e digital, a fim de atingir uma audiência cada vez maior.

1.6.3.

Permitir, por princípio, que todos os cidadãos da União sejam promotores de uma ICE, garantindo a possibilidade de apoio às despesas essenciais de uma campanha no caso de uma ICE ter sido formalmente registada.

1.7.

O Comité propõe a criação de um fórum institucional sobre a participação dos cidadãos europeus que se torne um lugar permanente de debate no Comité, tendo como modelo o Fórum Europeu sobre Migração, valorizando os progressos já realizados com o Dia da Iniciativa de Cidadania Europeia. O tema poderia ser objeto de uma proposta mais específica e articulada por parte do Comité a abordar num parecer de iniciativa sobre esta matéria.

2.   Introdução

2.1.

O direito à iniciativa de cidadania europeia foi introduzido pelo Tratado de Lisboa (2) como um instrumento inovador da democracia participativa transnacional. Permite que um milhão de cidadãos da UE de, pelo menos, sete Estados-Membros convidem a Comissão Europeia a apresentar propostas legislativas em domínios da competência da UE. Deste modo pretende-se associar ativamente os cidadãos ao processo de decisão europeu, proporcionando-lhes uma forma indireta de direito de iniciativa legislativa.

2.2.

As regras e os procedimentos que regem a iniciativa de cidadania europeia (ICE) estão definidos num regulamento da UE adotado em 16 de fevereiro de 2011 e em vigor desde 1 de abril de 2012 (3).

2.3.

Uma iniciativa de cidadania europeia pode ser organizada e/ou assinada por todos os cidadãos europeus que tenham atingido a idade do direito de voto nas eleições para o Parlamento Europeu (4). As organizações não podem gerir uma iniciativa. No entanto, podem promover ou apoiar iniciativas, desde que o façam com total transparência.

2.4.

O procedimento previsto para a iniciativa de cidadania europeia pode resumir-se em três etapas:

2.4.1.

A fase de arranque, que prevê a criação de um «comité de cidadãos» (5), o registo formal da iniciativa (6), sujeito a uma avaliação da elegibilidade por parte da Comissão (7), e a certificação do sistema de recolha de assinaturas em linha (8).

2.4.2.

Na fase de recolha é necessário atingir um milhão de «declarações de apoio» (assinaturas) num período máximo de 12 meses em pelo menos sete países da UE (9). Este resultado deve ser certificado pelas autoridades nacionais competentes (10).

2.4.3.

Na fase de apresentação, a iniciativa é examinada pela Comissão, após uma reunião com os organizadores e uma audição pública no Parlamento Europeu. A Comissão dispõe de um prazo de três meses para responder com uma comunicação específica e decidir se adota a proposta, dando início ao processo legislativo.

3.   Os primeiros quatro anos da iniciativa de cidadania europeia

3.1.

Até à data, mais de seis milhões de cidadãos europeus assinaram uma iniciativa de cidadania europeia. Embora tenham sido apresentadas 56 iniciativas, só 36 foram registadas pela Comissão, das quais apenas três recolheram pelo menos um milhão de assinaturas (11). Nenhuma iniciativa bem-sucedida deu origem a uma nova proposta legislativa, apesar de, em alguns casos, a Comissão Europeia ter tido em conta a posição da opinião pública sobre aspetos específicos.

3.2.

As consideráveis dificuldades técnicas, jurídicas e burocráticas encontradas pelos organizadores e o escasso impacto legislativo das iniciativas bem-sucedidas abalaram nos alicerces a credibilidade da ICE, o que é patente na diminuição drástica das iniciativas registadas, que baixaram de 16 em 2012 para cinco em 2015 (12), e do número de declarações de apoio recolhidas, de mais de cinco milhões em 2012 para poucos milhares em 2015 (13).

3.3.

Durante estes quatro anos, muitos organizadores e representantes da sociedade civil organizada (14) denunciaram as insuficiências e a rigidez de um instrumento que deveria ser claro, simples e fácil de utilizar. Estas orientações foram confirmadas numa audição pública organizada pelo CESE em 22 de fevereiro de 2016.

3.4.

Em fevereiro de 2015, três anos após a sua entrada em vigor, o Parlamento Europeu publicou um estudo (15) sobre o estado da implementação do regulamento, preconizando a sua revisão. Em outubro de 2015, as conclusões desse estudo foram integradas numa resolução (16) através da qual o Parlamento apresentava à Comissão um pedido formal nesse sentido com propostas claras e precisas.

3.5.

A Provedora de Justiça Europeia, na sequência de um inquérito para verificar o funcionamento eficaz do procedimento aplicável à iniciativa de cidadania europeia e o papel e as responsabilidades da Comissão, elaborou, em março de 2015, 11 orientações para melhorar a iniciativa (17).

3.6.

O Comité das Regiões adotou, em outubro de 2015, um parecer, também ele favorável, a uma revisão rápida e substancial do regulamento (18).

3.7.

A Comissão, em resposta aos numerosos pedidos de alteração do regulamento, publicou em abril de 2015, como previsto no regulamento, um relatório (19) sobre os resultados alcançados até então e depois, em fevereiro de 2016, um seguimento (20) sobre as propostas apresentadas pelo Parlamento. Em ambos os casos, embora reconhecendo as dificuldades enfrentadas pelos organizadores das ICE e aceitando a necessidade de melhorar a aplicação do quadro regulamentar em vigor, a Comissão várias vezes rejeitou quaisquer possibilidades de revisão a breve trecho do atual regulamento.

3.8.

Há neste momento uma perceção generalizada por parte das instituições europeias, das organizações e dos representantes da sociedade civil organizada de que, apesar de alguns resultados positivos, a iniciativa de cidadania europeia está longe de ter atingido o seu pleno potencial enquanto proposta política e de participação ativa dos cidadãos.

3.9.

Os principais problemas identificados tanto pelas instituições como pelas partes interessadas são:

3.9.1.

Falta de conhecimento e de consciência dos cidadãos e das instituições nacionais sobre a ICE (21).

3.9.2.

Os comités de cidadãos depararam-se com uma série de obstáculos técnicos, jurídicos e burocráticos no registo e recolha de declarações de apoio a ponto de comprometerem o sucesso da própria iniciativa.

3.9.3.

Os cidadãos que pretendem assinar uma iniciativa depararam-se com inúmeras dificuldades relacionadas com as diversas leis nacionais em matéria de tratamento de dados.

3.9.4.

As poucas iniciativas bem-sucedidas não foram tidas em conta pela Comissão na elaboração de novas propostas legislativas, mas apenas no caso de iniciativas legislativas indiretamente com elas relacionadas.

3.10.

As principais dificuldades encontradas pelos comités de cidadãos foram:

3.10.1.

A ausência de um reconhecimento jurídico para os comités de cidadãos. Este facto tem um impacto negativo em aspetos práticos importantes da iniciativa de cidadania europeia, como a angariação de fundos e a abertura de uma conta corrente. Além disso, o facto de os organizadores serem pessoalmente responsáveis «pelos danos que causarem na organização de uma iniciativa de cidadania» (22) tem um efeito dissuasivo.

3.10.2.

A aplicação demasiado rígida dos critérios de elegibilidade das ICE. Cerca de 40 % das iniciativas foram declaradas não elegíveis pela Comissão Europeia na primeira fase do processo, isto é, no «registo» da iniciativa (23). Segundo o Parlamento Europeu, importa examinar mais aprofundadamente o conflito de interesses da Comissão, a qual, por um lado, deve informar os organizadores e avaliar a elegibilidade das iniciativas e, por outro, é o destinatário das próprias iniciativas (24).

3.10.3.

A sobreposição de atividades no calendário de uma iniciativa de cidadania europeia. O tempo necessário para certificar em cada Estado-Membro os sistemas de recolha por via eletrónica reduz o prazo, já de si curto, de 12 meses para a recolha das declarações de apoio.

3.10.4.

Falta de apoio adequado por parte da Comissão, em especial durante o lançamento e a gestão da iniciativa. Cabe dar especial atenção aos serviços de alojamento e de recolha de assinaturas em linha disponibilizados gratuitamente pela Comissão e às dificuldades dos organizadores na elaboração e divulgação de documentação multilingue.

3.10.5.

A gestão de uma iniciativa de cidadania europeia é um processo oneroso. A demonstrá-lo está o facto de as três iniciativas bem-sucedidas terem tido o apoio de grandes organizações da sociedade civil a nível técnico, organizativo e financeiro para a realização das suas atividades. De modo a não desvirtuar o princípio fundador da iniciativa de cidadania europeia, muitos organizadores salientaram a necessidade de receber maior apoio a nível da UE para o lançamento da campanha.

3.10.6.

A excessiva rigidez na recolha e gestão dos dados pessoais. Em alguns Estados-Membros, as normas nesta matéria desencorajaram a organização e participação em novas iniciativas. Além disso, em alguns países a legislação sobre a recolha de dados prevê que apenas se tomem em conta as assinaturas recolhidas entre os cidadãos residentes em território nacional, privando, de facto, 11 milhões de pessoas do seu direito de participação (25).

3.10.7.

A falta de envolvimento dos promotores nas atividades de seguimento. Dado o escasso acompanhamento das iniciativas bem-sucedidas, as reuniões e as audições parecem ser insuficientes para criar uma ação legislativa concreta por parte da Comissão.

3.11.

2016 é um ano decisivo para a ICE, uma vez que poderá levar ao processo de revisão da iniciativa. Este parecer de iniciativa pretende ser o contributo do CESE para este processo, reconhecendo as enormes potencialidades por explorar de um instrumento tão importante e inovador nos processos de decisão europeus, na ótica de uma verdadeira cidadania europeia.

4.   O CESE e a iniciativa de cidadania europeia

4.1.

O CESE, enquanto ponte entre as instituições europeias e a sociedade civil organizada, tem estado envolvido desde o início no debate sobre a iniciativa de cidadania europeia. São prova disso os pareceres já adotados (26) e a criação de um grupo eventual que acompanha em permanência a evolução e aplicação de tal direito (27).

4.2.

O CESE está também ativamente envolvido no processo das ICE (28) com o duplo papel de facilitador das iniciativas e mentor institucional. Entre as iniciativas e as competências do CESE, recorde-se:

4.2.1.

O «Dia da Iniciativa de Cidadania Europeia» é organizado anualmente para avaliar com todos os atores envolvidos a evolução e eficácia da ICE. Este evento facilita o intercâmbio de boas práticas e a ligação em rede dos proponentes e outras partes interessadas.

4.2.2.

A criação de um serviço de assistência a iniciativas de cidadania europeia, que prevê, nomeadamente, a tradução para as línguas oficiais da União Europeia da descrição das iniciativas que tenham sido validadas pela Comissão.

4.2.3.

A disponibilização de salas para promover a divulgação das campanhas.

4.2.4.

A elaboração de um guia prático, já na sua terceira edição, para dar a conhecer e promover a iniciativa de cidadania europeia (29). O Comité atribui também um papel-chave à ICE numa outra publicação, intitulada «Passaporte Europeu para a Cidadania Ativa» (30), destinada a informar os cidadãos europeus sobre os seus direitos e a promover a democracia participativa transnacional.

4.2.5.

A criação, em 2016, de um arquivo público da documentação académica e científica sobre a ICE, aberto a todos os cidadãos e de consulta gratuita.

4.2.6.

A apresentação em plenária ou, alternativamente, em reunião de secção de todas as iniciativas registadas com maior êxito e que não colidam com a política oficial expressa nos pareceres do Comité. Tal permite ao CESE, sem prejuízo da sua neutralidade, conferir-lhes a visibilidade adequada.

4.2.7.

O CESE participa com os seus próprios delegados nas audições organizadas no Parlamento Europeu sobre as iniciativas bem-sucedidas, a fim de contribuir para o processo de análise e aprofundamento das mesmas pela Comissão.

5.   Observações na generalidade

5.1.

O CESE reafirma com convicção o seu apoio à iniciativa de cidadania europeia. Quatro anos após a entrada em vigor do regulamento sobre a ICE, destacam-se dados encorajadores em termos de participação, mas também um enorme potencial por explorar. O Comité considera, com efeito, que a implementação correta e integral da iniciativa de cidadania europeia pode ajudar a colmatar o fosso crescente entre os cidadãos e a União Europeia.

5.2.

O CESE partilha das opiniões já expressas pelo Parlamento Europeu, o Comité das Regiões e a Provedora de Justiça Europeia, segundo as quais a implementação parcial e limitada da ICE se deve a uma multiplicidade de fatores. Em particular, são de assinalar limitações de caráter técnico, jurídico e burocrático, mas também um «curto-circuito» institucional manifesto devido a uma sobrecarga de competências e de responsabilidades na Comissão Europeia.

5.3.

O CESE considera, aliás, que alguns destes problemas foram resolvidos com êxito pela Comissão, como é o caso da disponibilização de um sistema de recolha de assinaturas em linha gratuito, mas que outros, infelizmente, não poderão ser resolvidos sem uma revisão do próprio regulamento.

5.4.

O Comité insta, por conseguinte, a Comissão a adotar uma abordagem em duas frentes: agir atempadamente para resolver e/ou simplificar os problemas técnicos e burocráticos mais simples e evidentes; apresentar o mais rapidamente possível uma proposta de revisão do regulamento, a fim de abordar as questões institucionais, jurídicas e organizativas mais complexas.

6.   Observações na especialidade

6.1.

Para tornar o instrumento ICE mais simples e eficiente, o CESE apresenta as seguintes propostas de revisão do regulamento:

6.1.1.

Permitir que os comités de cidadãos iniciem numa data à sua escolha a recolha de declarações de apoio. Este aspeto é crucial para tornar efetivos os 12 meses de recolha de assinaturas.

6.1.2.

Conferir reconhecimento jurídico aos comités de cidadãos, se necessário, conferindo-lhes um estatuto especial, de modo a limitar a responsabilidade penal dos organizadores ao dolo ou à culpa grave, de acordo com o modelo da Diretiva 2008/99/CE relativa à proteção do ambiente através do direito penal.

6.1.3.

Criar um balcão único físico e em linha em que os cidadãos interessados podem obter informações e orientações sobre a apresentação de iniciativas. É fundamental proporcionar aos comités de cidadãos a assistência técnica e jurídica adequada de modo a facilitar a apresentação de propostas e aumentar a proporção de iniciativas elegíveis.

6.1.4.

Examinar as propostas para a redução da idade mínima de apoio e participação numa iniciativa de cidadania, tal como solicitado pelo Parlamento Europeu e pelo Comité das Regiões, para oferecer aos jovens a possibilidade de participarem ativamente no processo de construção da União Europeia.

6.1.5.

Separar as funções de «mentor institucional» e de «juiz», atualmente a cargo da Comissão. Este aspeto é crucial para solucionar o evidente conflito de interesses no interior da Comissão e promover a implementação plena e efetiva da ICE.

6.1.5.1.

O CESE, que confirma a sua disponibilidade para prosseguir os esforços já envidados, pode ser um candidato natural a desempenhar o papel de facilitador e mentor institucional.

6.1.6.

Assegurar o seguimento adequado das iniciativas bem-sucedidas. Respeitando o direito de iniciativa da Comissão Europeia, convida esta instituição a elaborar uma proposta legislativa no prazo de 12 meses a contar do final da campanha ou a fundamentar adequadamente a sua decisão de não apresentar qualquer proposta. Se a proposta não for apresentada dentro do prazo estabelecido, o CESE espera que o Parlamento Europeu exerça pressão junto da Comissão ao abrigo do artigo 225.o do TFUE. Além disso, a Comissão deverá iniciar uma relação mais estreita com os proponentes de tais iniciativas — o que vai além das simples audições a realizar no Parlamento Europeu —, a fim de assegurar que a proposta elaborada vai ao encontro das expectativas das pessoas que a apoiaram.

6.2.

O Comité constata igualmente que a Comissão Europeia deve:

6.2.1.

Tornar o processo de registo mais transparente e eficaz. Em particular, a Comissão deveria desempenhar um papel mais ativo, fornecendo respostas detalhadas e possíveis soluções no caso de uma iniciativa ser considerada não elegível, permitindo que os comités a possam reformular e tornar compatível com os critérios fixados pela legislação em vigor.

6.2.2.

Prosseguir as negociações com os Estados-Membros no sentido de simplificar, reduzir e harmonizar o sistema de normas nacionais para a recolha de dados, necessária para assinar uma declaração de apoio. Propõe, em especial, reduzir ao mínimo os pedidos de documentos de identificação pessoais e permitir a todos os cidadãos europeus assinarem as iniciativas dos países de residência (31).

6.2.3.

Tornar permanente o sistema de recolha de assinaturas em linha gratuito, que simplifica a recolha e a classificação das declarações de apoio e a respetiva verificação pelas autoridades nacionais. Espera-se que este instrumento se torne igualmente acessível às pessoas com deficiência.

6.3.

Recomenda em concreto:

6.3.1.

Reforçar os processos de informação e de sensibilização sobre a iniciativa de cidadania europeia. Tal deverá ser feito principalmente através de campanhas específicas promovidas pela Comissão e pelos Estados-Membros. Neste contexto, propõe igualmente que se autorizem os comités de cidadãos a informar os apoiantes interessados sobre os desenvolvimentos e resultados alcançados na campanha (com autorização prévia destes últimos). O mesmo se aplica à Comissão, que deve divulgar melhor o seguimento das iniciativas bem-sucedidas e informar, em primeiro lugar, os comités de cidadãos.

6.3.2.

Garantir o multilinguismo enquanto requisito indispensável para conseguir uma taxa elevada de participação e explorar novas formas de associar a recolha de assinaturas em linha e os meios de comunicação social e digital, a fim de atingir um público cada vez mais vasto.

6.3.3.

Permitir, por princípio, que todos os cidadãos da União sejam promotores de uma ICE, garantindo a possibilidade de apoio às despesas essenciais de uma campanha no caso de uma ICE ter sido formalmente registada.

6.4.

Por último, o Comité propõe a criação de um fórum institucional sobre a participação dos cidadãos europeus, que se torne um lugar permanente de debate no Comité com base no modelo do Fórum Europeu sobre Migração, valorizando os progressos já realizados com o Dia da Iniciativa de Cidadania Europeia. Neste contexto, de modo a garantir uma participação qualificada, o CESE convidaria, entre outros, os representantes das instituições envolvidas, um representante de cada comité de cidadãos cuja iniciativa tenha sido formalmente registada, assim como todas as partes interessadas. O tema poderia ser objeto de uma proposta mais específica e articulada por parte do Comité a abordar num parecer de iniciativa sobre esta matéria.

Bruxelas, 13 de julho de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  OCS é o acrónimo de Online Collection Software [software de recolha por via eletrónica] e é um instrumento fornecido gratuitamente pela Comissão Europeia para a recolha de dados em linha. Este instrumento facilita as atividades de recolha de dados e a verificação pelas autoridades nacionais, para além de estar em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 211/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento de Execução (UE) n.o 1179/2011 da Comissão. https://joinup.ec.europa.eu/software/ocs/description

(2)  Artigo 11.o, n.o 4, do TUE e artigo 24.o, 1.o parágrafo, do TFUE.

(3)  Regulamento (UE) n.o 211/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de fevereiro de 2011 sobre a iniciativa de cidadania, http://ec.europa.eu/citizens-initiative/public/welcome?lg=pt

(4)  Regra geral, 18 anos de idade em todos os Estados-Membros, exceto na Áustria, onde é de 16 anos.

(5)  O comité de cidadãos deve ser composto por, pelo menos, sete cidadãos da UE residentes em sete Estados-Membros da UE.

(6)  A iniciativa deve ser descrita num máximo de 800 carateres (100 para o título, 200 para a descrição e 500 para detalhes sobre os objetivos).

(7)  Regulamento (UE) n.o 211/2011, artigo 4.o, n.o 2. Antes de registar oficialmente a iniciativa e de a publicar no seu sítio web, a Comissão dispõe de 2 meses para verificar se: 1) o comité de cidadãos foi formado e as pessoas de contacto foram designadas; 2) a iniciativa não está manifestamente fora do âmbito de competência da Comissão para apresentar uma proposta legislativa para efeitos de aplicação dos Tratados da UE; 3) a iniciativa não é manifestamente abusiva, frívola ou vexatória; 4) a iniciativa não é manifestamente contrária aos valores da União consagrados nos Tratados. A decisão de registar ou não uma proposta de iniciativa assenta em fundamentos jurídicos, podendo, portanto, ser contestada. Se recusar o registo, a Comissão informa os organizadores dos seus motivos e de todas as vias possíveis de recurso judiciais e extrajudiciais de que dispõem. Tal inclui a possibilidade de recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia ou de apresentar uma queixa junto do Provedor de Justiça Europeu (queixa por má administração).

(8)  Regulamento (UE) n.o 211/2011, artigo 6.o. O regulamento prevê que sejam as autoridades competentes de cada Estado-Membro onde são recolhidas as declarações de apoio as responsáveis pelo processo.

(9)  O regulamento prevê a obrigação de uma quota mínima de assinaturas por país proporcional ao número de habitantes http://ec.europa.eu/citizens-initiative/public/signatories

(10)  Regulamento (UE) n.o 211/2011, artigo 15.o.

(11)  As propostas que foram bem-sucedidas são «A água e o saneamento são um direito humano! A água não é um bem comercial, mas um bem público!», «Stop Vivisection» (não à vivissecção) e «Um de nós»: http://ec.europa.eu/citizens-initiative/public/initiatives/successful

(12)  O número de iniciativas registadas foi diminuindo progressivamente ao longo dos anos: 16 em 2012, 9 em 2013, 5 em 2014 e 5 em 2015.

(13)  Os dados sobre as assinaturas recolhidas em apoio de uma iniciativa de cidadania europeia nos últimos três anos mostram claramente uma diminuição da participação e do interesse dos cidadãos. Em 2013, foram recolhidas 5 402 174 assinaturas, 628 865 em 2014 e apenas 8 500 em 2015.

(14)  C. Berg, J. Tomson, «An ECI that works! Learning from the first two years of the European Citizens’ Initiative» [Uma iniciativa de cidadania europeia que funcione! Ilações dos dois primeiros anos da ICE], 2014. http://ecithatworks.org/

(15)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, «Implementation of the European Citizens» Initiative: «The experience of the first three years» [Aplicação da iniciativa de cidadania europeia: a experiência dos primeiros três anos], 2015. www.europarl.europa.eu/thinktank

(16)  Resolução do Parlamento Europeu, de 28 de outubro de 2015, sobre a Iniciativa de Cidadania Europeia [2014/2257(INI)]. Relator: György Schöpflin.

(17)  Caso: OI/9/2013/TN. Aberto em: 18.12.2013; Decisão em: 4.3.2015 http://www.ombudsman.europa.eu/en/cases/decision.faces/it/59205/html.bookmark

(18)  Comité das Regiões, Parecer sobre a «Iniciativa de Cidadania Europeia» (JO C 423 de 17.12.2015, p. 1).

(19)  Relatório COM(2015) 145 final — Relatório sobre a aplicação do Regulamento (UE) n.o 211/2011 sobre a iniciativa de cidadania, 2015.

(20)  «Follow up to the European Parliament resolution on the European Citizens’ Initiative» [Seguimento da resolução do Parlamento Europeu sobre a iniciativa de cidadania europeia], adotado pela Comissão em 2 de fevereiro de 2016.

(21)  Estudo do Eurobarómetro intitulado «The promise of EU» [A promessa da UE], setembro de 2014, p. 55.

(22)  Regulamento (UE) n.o 211/2011, artigo 13.o. Considere-se o risco de erros no tratamento de dados pessoais.

(23)  Afigura-se particularmente restritiva a interpretação da frase «a proposta de iniciativa de cidadania não está manifestamente fora da competência da Comissão para apresentar uma proposta de ato jurídico da União para efeitos de aplicação dos Tratados». Desta forma, todas as iniciativas destinadas a alterar os Tratados foram sistematicamente chumbadas. A única exceção foi a iniciativa «Deixe-me votar», pela qual se pretendiam integrar os direitos dos cidadãos europeus referidos no artigo 20.o, n.o 2, do TFUE com o direito de votar em todas as eleições no Estado-Membro de residência nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.

(24)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, «Implementation Of The European Citizens’ Initiative: The Experience Of The First Three Years» [Aplicação da iniciativa de cidadania europeia: a experiência dos primeiros três anos], 2015, cap. 3.1.4.

(25)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, «Implementation Of The European Citizens’ Initiative: The Experience Of The First Three Years» [Aplicação da iniciativa de cidadania europeia: a experiência dos primeiros três anos], 2015, cap. 6.

Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, «Disenfranchisement of EU citizens resident abroad», Executive Summary [Privação do direito de voto dos cidadãos da UE que residem no estrangeiro — síntese].

(26)  Parecer do CESE sobre o tema «Iniciativa de Cidadania» (JO C 44 de 11.2.2011, p. 182).

Parecer do CESE sobre a «Aplicação do Tratado de Lisboa: Democracia participativa e a iniciativa de cidadania (artigo 11.o do TUE)» (JO C 354 de 28.12.2010, p. 59).

(27)  O Grupo Eventual para as Iniciativas de Cidadania Europeias foi criado em outubro de 2013 e o seu mandato foi renovado em 2015.

(28)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.en.members-former-eesc-presidents-henri-malosse-speeches-statements&itemCode=35383

(29)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.fr.publications.36745

(30)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.fr.publications.35347

(31)  Os cidadãos britânicos e irlandeses que residem na Bulgária, França, Áustria, República Checa e Portugal continuam a ser privados desse direito.


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