ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

21 de dezembro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Contratos públicos — Diretiva 89/665/CEE — Procedimentos de recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos — Artigo 1.o, n.o 3 — Interesse em agir — Artigo 2.o‑A, n.o 2 — Conceito de ‘proponente interessado’ — Direito de o proponente definitivamente excluído pela entidade adjudicante interpor recurso da decisão posterior de adjudicação do contrato»

No processo C‑355/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria), por decisão de 20 de maio de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 13 de julho de 2015, no processo

Bietergemeinschaft Technische Gebäudebetreuung GesmbH und Caverion Österreich GmbH

contra

Universität für Bodenkultur Wien,

VAMED Management und Service GmbH & Co. KG in Wien,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente de secção, M. Safjan e D. Šváby (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Bietergemeinschaft Technische Gebäudebetreuung GesmbH und Caverion Österreich GmbH, por J. Schramm, Rechtsanwalt,

em representação da Universität für Bodenkultur Wien, por O. Sturm, Rechtsanwalt,

em representação do Governo austríaco, por M. Fruhmann, na qualidade de agente,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por S. Varone, avvocato dello Stato,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann e A. Tokár, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos procedimentos de recurso em matéria de celebração dos contratos de direito público de fornecimentos e de obras (JO 1989, L 395, p. 33), conforme alterada pela Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2007 (JO 2007, L 335, p. 31) (a seguir «Diretiva 89/665»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Bietergemeinschaft Technische Gebäudebetreuung GesmbH und Caverion Österreich GmbH (a seguir, globalmente, «consórcio») à Universität für Bodenkultur Wien (Universidade de Recursos Naturais e Ciências da Vida de Viena, Áustria; a seguir «BOKU Wien») a propósito da adjudicação por esta última de um acordo‑quadro sobre contratos públicos de serviços à VAMED Management und Service GmbH & Co. KG in Wien (a seguir «Vamed»).

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 89/665

3

Nos termos dos considerandos 3, 4, 6, 8, 18, 25 e 27 da Diretiva 2007/66, diretiva que alterou a Diretiva 89/665:

«(3)

A consulta dos interessados diretos, bem como a jurisprudência do Tribunal de Justiça, revelaram algumas deficiências nos mecanismos de recurso existentes nos Estados‑Membros. Devido a tais deficiências, os mecanismos estabelecidos [nomeadamente na Diretiva 89/665] nem sempre permitem garantir o respeito do direito comunitário, em especial numa fase em que as violações ainda podem ser corrigidas. […]

(4)

Entre as deficiências assinaladas figura, em especial, a inexistência de um prazo que permita interpor um recurso eficaz entre o momento da decisão de adjudicação e o da celebração do contrato em causa. Por vezes, essa inexistência conduz a que as entidades adjudicantes, que pretendem tornar irreversíveis as consequências da decisão de adjudicação contestada, procedam rapidamente à assinatura do contrato. A fim de obviar a esta deficiência, que constitui um obstáculo sério a uma tutela jurisdicional efetiva dos proponentes em causa, nomeadamente dos proponentes que ainda não tenham sido definitivamente excluídos, é necessário prever um prazo suspensivo mínimo, durante o qual a celebração do contrato em questão fique suspensa […]

[…]

(6)

O prazo suspensivo deverá proporcionar aos proponentes interessados tempo suficiente para analisarem a decisão de adjudicação e avaliarem da oportunidade de interpor recurso. Quando a decisão de adjudicação é notificada aos proponentes, deverão ser‑lhes fornecidas as informações relevantes indispensáveis para poderem interpor um recurso eficaz. […]

[…]

(8)

[…] [N]ão é necessário um prazo suspensivo se o único proponente interessado for o adjudicatário do contrato e não houver candidatos interessados. Neste caso, não há qualquer outra pessoa no processo de concurso interessada em receber a notificação e em beneficiar do prazo suspensivo para interpor recurso.

[…]

(18)

A fim de evitar violações graves das exigências em matéria de prazo suspensivo e de suspensão automática, que constituem pré‑requisitos da eficácia dos recursos, deverão ser aplicadas sanções efetivas. Por conseguinte, os contratos celebrados em violação do prazo suspensivo ou da suspensão automática deverão ser considerados, em princípio, desprovidos de efeitos se conjugados com violações [nomeadamente, da Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114; retificação no JO 2004, L 351, p. 44)], na medida em que tais violações tenham afetado as hipóteses do proponente que interpôs recurso de obter o contrato.

[…]

(25)

[…] [A] necessidade de garantir ao longo do tempo a segurança jurídica das decisões tomadas pelas entidades adjudicantes requer o estabelecimento de um prazo mínimo razoável de prescrição dos recursos cuja finalidade seja determinar […] que o contrato não produz efeitos.

[…]

(27)

[…] Por razões de segurança jurídica, a invocabilidade da privação de efeitos de um contrato é limitada a um período determinado. Deverá ser respeitada a efetividade desse limite.»

4

O artigo 1.o da Diretiva 89/665 tem a seguinte redação:

«1.   A presente diretiva é aplicável aos contratos a que se refere a Diretiva [2004/18], salvo os contratos excluídos nos termos dos artigos 10.° a 18.° dessa diretiva.

[…]

Os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para assegurar que, no que se refere aos contratos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva [2004/18], as decisões das entidades adjudicantes possam ser objeto de recursos eficazes e, sobretudo, tão céleres quanto possível, nos termos dos artigos 2.° a 2.°‑F da presente diretiva, com fundamento na violação, por tais decisões, do direito comunitário em matéria de contratos públicos ou das normas nacionais de transposição desse direito.

[…]

3.   Os Estados‑Membros devem garantir o acesso ao recurso, de acordo com regras detalhadas que os Estados‑Membros podem estabelecer, a qualquer pessoa que tenha ou tenha tido interesse em obter um determinado contrato e que tenha sido, ou possa vir a ser, lesada por uma eventual violação.

[…]»

5

A Diretiva 89/665 prevê várias hipóteses em que, após a adoção da decisão de adjudicação do contrato, a entidade adjudicante está proibida de, durante algum tempo, celebrar o contrato com a entidade adjudicatária. Esta proibição resulta nomeadamente do efeito suspensivo automático inerente aos eventuais recursos prévios interpostos junto da entidade adjudicante, nos termos do artigo 1.o, n.o 5, desta diretiva, e aos recursos numa instância jurisdicional responsável pelos procedimentos de recurso em primeira instância, nos termos do artigo 2.o, n.o 3, da referida diretiva. Essas proibições completam a obrigação, imposta pelo artigo 2.o‑A desta diretiva à entidade adjudicante, de respeitar um prazo suspensivo entre a adoção da decisão de adjudicação de um contrato e a celebração do contrato com o adjudicatário desse contrato. O referido artigo 2.o‑A dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros devem garantir que as pessoas a que se refere o n.o 3 do artigo 1.o disponham de um prazo suficiente para assegurar o recurso eficaz das decisões de adjudicação de contratos tomadas por entidades adjudicantes, mediante a aprovação das disposições necessárias que respeitem as condições mínimas estabelecidas no n.o 2 do presente artigo e no artigo 2.o‑C.

2.   A celebração de um contrato na sequência da decisão de adjudicação de um contrato abrangido pela Diretiva [2004/18] não pode ter lugar antes do termo de um prazo mínimo de 10 dias consecutivos, a contar do dia seguinte à data em que a decisão de adjudicação do contrato tiver sido enviada aos proponentes e candidatos interessados, em caso de utilização de telecópia ou de meios eletrónicos, ou, em caso de utilização de outros meios de comunicação, antes do termo de um prazo mínimo, alternativamente, de 15 dias consecutivos a contar do dia seguinte à data em que a decisão de adjudicação tiver sido comunicada aos proponentes e candidatos interessados ou de 10 dias consecutivos a contar do dia seguinte à data de receção da decisão de adjudicação do contrato.

Considera‑se que os proponentes estão interessados se ainda não tiverem sido definitivamente excluídos. Uma exclusão é definitiva se tiver sido notificada aos proponentes interessados e se tiver sido considerada legal por uma instância de recurso independente ou já não puder ser objeto de recurso.

[…]

A comunicação da decisão de adjudicação a cada um dos proponentes e candidatos interessados é acompanhada:

de uma exposição sintética dos motivos relevantes […], e

da indicação exata do prazo suspensivo aplicável nos termos das disposições de direito interno que transpõem o presente número.»

6

Nos termos do artigo 2.o‑B, primeiro parágrafo, da Diretiva 89/665:

«Os Estados‑Membros podem prever que os prazos a que se refere o n.o 2 do artigo 2.o‑A da presente diretiva não sejam aplicáveis nos seguintes casos:

[…]

b)

Se o único proponente interessado, na aceção do n.o 2 do artigo 2.o‑A da presente diretiva, for o adjudicatário do contrato e não houver outros candidatos interessados;

[…]»

7

O artigo 2.o‑D, n.o 1, desta diretiva prevê:

«Os Estados‑Membros devem assegurar que o contrato seja considerado desprovido de efeitos por uma instância de recurso independente da entidade adjudicante ou que a não produção de efeitos do contrato resulte de uma decisão dessa instância de recurso em qualquer dos seguintes casos:

[…]

b)

Em caso de violação do n.o 5 do artigo 1.o, do n.o 3 do artigo 2.o ou do n.o 2 do artigo 2.o‑A da presente diretiva, se essa violação tiver privado o proponente que interpôs recurso da possibilidade de prosseguir as vias de impugnação pré‑contratuais. Caso tal violação, conjugada com uma violação da Diretiva [2004/18], tiver afetado as hipóteses do proponente que interpôs recurso de obter o contrato;

[…]»

Diretiva 2004/18

8

De acordo com o artigo 7.o, alínea b), da Diretiva 2004/18, conforme alterada pelo Regulamento (UE) n.o 1251/2011 da Comissão, de 30 de novembro de 2011 (JO 2011, L 319, p. 17, a seguir «Diretiva 2004/18»), esta diretiva é aplicável aos contratos públicos de serviços adjudicados por entidades adjudicantes diferentes das autoridades governamentais centrais, cujo valor estimado, sem imposto sobre o valor acrescentado (IVA), seja igual ou superior a 200000 euros.

9

O artigo 44.o, n.o 1, da referida diretiva dispõe:

«Os contratos são adjudicados com base nos critérios estabelecidos nos artigos 53.° e 55.°, tendo em conta o artigo 24.o, após verificada a aptidão dos operadores económicos não excluídos ao abrigo dos artigos 45.° e 46.°, pelas entidades adjudicantes de acordo com os critérios relativos à capacidade económica e financeira, aos conhecimentos ou capacidades profissionais e técnicos referidos nos artigos 47.° a 52.° e, eventualmente, com as regras e critérios não discriminatórios referidos no n.o 3.»

Direito austríaco

10

O § 331 da Bundesvergabegesetz 2006 (Lei federal de 2006 relativa aos contratos públicos, BGBl. I, 17/2006), na versão aplicável no processo principal, figura na parte desta lei relativa aos processos declarativos. Nos termos do n.o 1 desta disposição:

«Uma empresa que se mostrou interessada na celebração de um contrato abrangido pelo âmbito de aplicação da presente lei federal pode, desde que tenha sofrido ou possa vir a sofrer um dano devido à alegada ilegalidade, requerer a declaração […]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11

Em outubro de 2012, a BOKU Wien abriu um procedimento de adjudicação de concurso público, sob a forma de procedimento por negociação com publicação prévia de anúncio, para celebrar com um único adjudicatário um acordo‑quadro na área de gestão, conservação e manutenção técnicas do equipamento técnico dos seus edifícios e instalações laboratoriais.

12

Apenas o consórcio e a Vamed apresentaram propostas dentro do prazo fixado.

13

Por decisão de 20 de dezembro de 2013, o consórcio foi notificado da sua exclusão do referido procedimento concursal por não ter apresentado no prazo fixado o original da prova da constituição de uma garantia bancária.

14

Por acórdão de 31 de janeiro de 2014, o Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal, Áustria) negou provimento ao recurso interposto dessa decisão pelo consórcio. Por despacho de 25 de maio de 2014, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria) negou também provimento ao recurso extraordinário de «Revision» interposto desse acórdão.

15

Por decisão de adjudicação de 14 de março de 2014, a BOKU Wien notificou à Vamed que a sua proposta tinha sido selecionada. O acordo‑quadro foi de seguida celebrado, tendo a Vamed começado a executar as prestações em causa.

16

O consórcio interpôs recurso da referida decisão de adjudicação no Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal). Por acórdão de 8 de agosto de 2014, foi negado provimento a esse recurso, com fundamento em que os direitos de um proponente cuja proposta tenha sido regularmente afastada não podem ser lesados por ilegalidades que afetam a seleção de outra proposta para efeitos da adjudicação.

17

No âmbito do recurso de «Revision» interposto deste último acórdão no órgão jurisdicional de reenvio, o consórcio alega que a situação em causa no processo principal e o caso que deu origem ao acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), são semelhantes. Com efeito, em ambos os casos, só concorreram dois proponentes e, embora o consórcio tenha efetivamente sido excluído, este sustenta que a proposta da Vamed devia ter sido afastada, pois apresentava cálculos sobre aspetos essenciais que eram inexplicáveis ou incompreensíveis economicamente. Assim, como no contexto desse acórdão, há dois proponentes, cada um com um interesse económico equivalente na exclusão da proposta do outro, podendo invocá‑lo mesmo que a sua proposta tenha de ser afastada.

18

O órgão jurisdicional de reenvio expõe que, nos termos do § 331 da Lei federal de 2006 relativa aos contratos públicos, a admissibilidade de um recurso destinado a obter a declaração da irregularidade de uma decisão em matéria de contratação pública depende do facto de o operador económico recorrente ter tido interesse na celebração do contrato em causa e de essa irregularidade o ter lesado ou o poder lesar.

19

Após examinar o acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), o órgão jurisdicional de reenvio observa que, no contexto desse acórdão, a irregularidade da proposta do proponente autor do recurso judicial foi declarada não pela entidade adjudicante no âmbito do procedimento concursal em causa, mas no âmbito do processo judicial instaurado por esse proponente a fim de impugnar a decisão de adjudicação desse contrato a outro proponente. Esse órgão jurisdicional salienta que, no n.o 33 desse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que, no caso de a regularidade da proposta de cada um dos proponentes ser posta em causa no âmbito do mesmo processo e com base em fundamentos de natureza idêntica, ambos podem alegar um interesse legítimo equivalente na exclusão da proposta do outro. Segue‑se que, nessa situação, o proponente cuja proposta não tenha sido selecionada beneficia de uma tutela jurisdicional mesmo que essa proposta não seja conforme com as especificações técnicas do contrato em causa.

20

O órgão jurisdicional de reenvio duvida que o ensinamento do acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), também seja aplicável quando, tendo dois proponentes inicialmente apresentado uma proposta, a exclusão do proponente que pretende impugnar a decisão de adjudicação tenha sido, prévia e definitivamente, declarada pela própria entidade adjudicante. As dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio baseiam‑se em diversos elementos que retira da Diretiva 89/665, entre os quais figura, em primeiro lugar, o conceito de «proponente interessado» na aceção do artigo 2.o‑A, n.o 2, desta diretiva.

21

No entanto, apesar de considerar que a diretiva em apreço não protege os proponentes definitivamente excluídos das irregularidades suscetíveis de viciar a decisão de adjudicação do contrato posterior à sua exclusão definitiva, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre se o princípio da igualdade de tratamento aplicável aos proponentes justifica que a esse proponente definitivamente excluído seja, não obstante, conferido um direito de recurso dessa decisão, quando esta aproveite apenas ao outro proponente concorrente.

22

Além disso, caso se considere que o proponente definitivamente excluído do procedimento de adjudicação dispõe, não obstante, de um direito de recurso da decisão de adjudicação, o órgão jurisdicional de reenvio expõe, por um lado, que o Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal) também entendeu que não havia que ter em conta os motivos de eliminação da proposta da Vamed alegados pelo consórcio, porque não resultavam manifestamente dos autos do processo. Ora, tal posição pode ser justificada pelo imperativo da tão célere quanto possível interposição dos recursos, mencionado no artigo 1.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 89/665. Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre a importância, no âmbito do direito à tutela jurisdicional efetiva, do facto de os motivos que justificam que as duas propostas concorrentes sejam afastadas serem da mesma natureza ou de natureza diferente.

23

Neste contexto, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões:

«1)

O artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva [89/665,] tendo [presente o acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448)], deve ser interpretado no sentido de que a um proponente cuja proposta foi excluída com caráter definitivo pela entidade adjudicante e que, por isso, não é um proponente interessado nos termos do artigo 2.o‑A da Diretiva 89/665, pode ser recusada a interposição de um recurso contra a decisão de adjudicação (decisão sobre a celebração de um acordo‑quadro) e contra a celebração do contrato (incluindo a pretensão de reconhecimento do direito à indemnização por danos nos termos do artigo 2.o, n.o 7, da diretiva), mesmo no caso em que apenas dois proponentes tenham apresentado propostas e a proposta do proponente vencedor, a quem o concurso foi adjudicado, segundo as alegações do proponente não interessado [que interpôs esse recurso], devia ter sido igualmente excluída?

2)

O artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665, tendo [presente o acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448)], deve ser interpretado no sentido de que, ao proponente [não] interessado (de acordo com o artigo 2.o‑A da diretiva) apenas pode ser permitido interpor recurso,

a)

quando a irregularidade da proposta do proponente vencedor resultar manifestamente dos autos do recurso?

b)

quando a irregularidade da proposta do proponente vencedor se verificar por motivos de natureza idêntica?»

Quanto às questões prejudiciais

24

A título preliminar, recorde‑se que, em conformidade com o seu artigo 1.o, n.o 1, a Diretiva 89/665 só é aplicável aos recursos relativos a procedimentos de adjudicação de contratos públicos visados na Diretiva 2004/18 e não excluídos do âmbito de aplicação desta última diretiva pelos seus artigos 10.° a 18.o

25

Embora a decisão de reenvio não contenha indicações sobre o valor do acordo‑quadro em causa no processo principal relativamente ao limiar de aplicação da Diretiva 2004/18, fixado em 200000 euros para os contratos públicos de serviços adjudicados por entidades adjudicantes diferentes das autoridades governamentais centrais, em conformidade com o artigo 7.o, alínea b), desta diretiva, decorre de vários elementos dos autos do processo nacional que esse limiar foi largamente ultrapassado no caso desse acordo‑quadro, o que, porém, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

26

Uma vez que, além do mais, o referido acordo‑quadro não está, pela sua natureza, abrangido pelas exclusões previstas nos artigos 10.° a 18.° da Diretiva 2004/18, nada se opõe a que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas.

Quanto à primeira questão

27

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665, atento o acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a um proponente que tenha sido excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público por uma decisão da entidade adjudicante que se tornou definitiva e que, por conseguinte, não é um proponente interessado na aceção do artigo 2.o‑A desta diretiva, seja recusado o acesso a um recurso da decisão de adjudicação do contrato público em causa e da celebração do contrato, quando só esse proponente excluído e o adjudicatário desse contrato apresentaram propostas e o referido proponente sustenta que a proposta desse adjudicatário também devia ter sido afastada.

28

A este respeito, há que recordar que, nos termos do disposto no artigo 1.o, n.o 1, terceiro parágrafo, e no artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665, para que possam ser considerados eficazes, os recursos das decisões tomadas por uma entidade adjudicante devem pelo menos ser acessíveis a quem tenha ou tenha tido interesse em que lhe seja adjudicado um determinado contrato e tenha sido ou possa vir a ser lesado por uma violação alegada (acórdão de 5 de abril de 2016, PFE, C‑689/13, EU:C:2016:199, n.o 23).

29

Nos n.os 26 e 27 desse acórdão, o Tribunal de Justiça sublinhou que o acórdão de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), constitui a concretização do exigido no artigo 1.o, n.o 1, terceiro parágrafo, e no artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665, em circunstâncias em que, na sequência de um procedimento de adjudicação de um contrato público, dois proponentes interpõem recursos com vista à sua exclusão recíproca. Com efeito, nessa situação, ambos os proponentes têm interesse em que determinado contrato lhes seja adjudicado.

30

Contudo, a situação em causa no processo principal distingue‑se nitidamente das situações em causa nos dois processos que deram lugar aos acórdãos de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), e de 5 de abril de 2016, PFE (C‑689/13, EU:C:2016:199).

31

Por um lado, as propostas dos proponentes interessados nos processos que deram origem aos dois acórdãos referidos, diferentemente da proposta apresentada pelo consórcio no processo principal, não foram objeto de uma decisão de exclusão pela entidade adjudicante.

32

Por outro lado, foi no âmbito de um só e mesmo procedimento de recurso relativo à decisão de adjudicação do contrato que, naqueles dois processos, cada um dos proponentes impugnava a regularidade da proposta do outro, tendo ambos um interesse legítimo equivalente na exclusão da proposta do outro, o que podia levar a que se declarasse que a entidade adjudicante não podia proceder à seleção de uma proposta regular (v., neste sentido, acórdãos de 4 de julho de 2013, Fastweb, C‑100/12, EU:C:2013:448, n.o 33, e de 5 de abril de 2016, PFE, C‑689/13, EU:C:2016:199, n.o 24). Em contrapartida, no presente processo principal, o consórcio interpôs recurso, em primeiro lugar, da decisão de exclusão a seu respeito e, a seguir, da decisão de adjudicação do contrato, e foi no âmbito do segundo processo que invocou a irregularidade da proposta do adjudicatário.

33

Segue‑se que o princípio jurisprudencial resultante dos acórdãos de 4 de julho de 2013, Fastweb (C‑100/12, EU:C:2013:448), e de 5 de abril de 2016, PFE (C‑689/13, EU:C:2016:199), não é aplicável à situação processual e contenciosa em causa no processo principal.

34

Deve ainda salientar‑se que, como decorre do artigo 1.o, n.o 3, e do artigo 2.o‑A da Diretiva 89/665, esta garante o exercício de recursos eficazes das decisões irregulares adotadas no âmbito de procedimentos de adjudicação de contratos públicos, permitindo que os proponentes excluídos impugnem não só a decisão de exclusão mas também, enquanto essa impugnação não tiver sido decidida, as decisões posteriores que os prejudiquem no caso de a sua exclusão ser anulada.

35

Nestas condições, o artigo 1.o, n.o 3, desta diretiva não pode ser interpretado no sentido de que se opõe a que a um proponente como o consórcio seja recusado o acesso ao recurso da decisão de adjudicação do contrato, visto que deve ser considerado um proponente definitivamente excluído na aceção do artigo 2.o‑A, n.o 2, segundo parágrafo, desta diretiva.

36

Atendendo ao conjunto das considerações expostas, há que responder à questão submetida que o artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a um proponente que tenha sido excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público por uma decisão da entidade adjudicante que se tornou definitiva seja recusado o acesso a um recurso da decisão de adjudicação do contrato público em causa e da celebração do contrato, quando só esse proponente excluído e o adjudicatário desse contrato apresentaram propostas e o referido proponente sustenta que a proposta desse adjudicatário também devia ter sido afastada.

Quanto à segunda questão

37

Em face da resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

Quanto às despesas

38

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

 

O artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos procedimentos de recurso em matéria de celebração dos contratos de direito público de fornecimentos e de obras, conforme alterada pela Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2007, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a um proponente que tenha sido excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público por uma decisão da entidade adjudicante que se tornou definitiva seja recusado o acesso a um recurso da decisão de adjudicação do contrato público em causa e da celebração do contrato, quando só esse proponente excluído e o adjudicatário desse contrato apresentaram propostas e o referido proponente sustenta que a proposta desse adjudicatário também devia ter sido afastada.

 

Assinaturas


( *1 ) * Língua do processo: alemão.