ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

14 de julho de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Contratos públicos de serviços — Diretiva 2004/18/CE — Artigo 53.o, n.o 2 — Critérios de adjudicação — Proposta economicamente mais vantajosa — Método de avaliação — Regras de ponderação — Obrigação da entidade adjudicante de especificar no anúncio do concurso a ponderação dos critérios de adjudicação — Alcance da obrigação»

No processo C‑6/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica), por decisão de 6 de janeiro de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 12 de janeiro de 2015, no processo

TNS Dimarso NV

contra

Vlaams Gewest,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, C. Lycourgos, E. Juhász (relator), C. Vajda e K. Jürimäe, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: I. Illéssy, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 13 de janeiro de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação da TNS Dimarso NV, por P. Flamey, G. Verhelst e A. Lippens, advocaaten,

em representação do Governo belga, por J.‑C. Halleux, N. Zimmer e C. Pochet, na qualidade de agentes, assistidos por R. Vander Hulst, D. D’Hooghe e N. Kiekens, advocaten,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por S. Varone, avvocato dello Stato,

em representação da Comissão Europeia, por E. Manhaeve e A. Tokár, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de março de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114; retificação no JO 2004, L 351, p. 44), lido à luz do princípio da igualdade de tratamento dos proponentes e do dever de transparência que dele decorre.

2

O presente pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a TNS Dimarso NV (a seguir «Dimarso») à Vlaams Gewest (Região da Flandres), a respeito da regularidade do método de avaliação das propostas apresentadas pelos proponentes no âmbito de um concurso público de serviços organizado por esta última entidade.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O considerando 46 da Diretiva 2004/18 enuncia:

«A adjudicação de um contrato deve realizar‑se com base em critérios objetivos que assegurem o respeito dos princípios da transparência, da não discriminação e da igualdade de tratamento e que garantam a apreciação das propostas em condições de concorrência efetiva. Por conseguinte, importa admitir unicamente a aplicação de dois critérios de adjudicação: o ‘preço mais baixo’ e a ‘proposta economicamente mais vantajosa’.

Para garantir a observância do princípio da igualdade de tratamento na adjudicação, importa prever a obrigação — consagrada na jurisprudência — de garantir a necessária transparência para permitir que todos os proponentes sejam razoavelmente informados dos critérios e das modalidades que serão aplicados para identificar a proposta economicamente mais vantajosa. Cabe, portanto, às entidades adjudicantes indicar os critérios de adjudicação e a ponderação relativa atribuída a cada critério, a tempo de os proponentes deles tomarem conhecimento para elaborarem as suas propostas. As entidades adjudicantes poderão derrogar a indicação da ponderação dos critérios de adjudicação em casos devidamente justificados. Essa justificação deve ser apresentada, quando tal ponderação não puder ser previamente elaborada, nomeadamente devido à complexidade do contrato. Nesses casos, deverão indicar os critérios por ordem decrescente de importância.

Sempre que as entidades adjudicantes decidirem adjudicar o contrato à proposta economicamente mais vantajosa, deverão avaliar as propostas para determinar qual delas apresenta a melhor relação qualidade/preço. Para tanto, determinarão os critérios económicos e qualitativos que, no seu conjunto, devem permitir determinar a proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante. A determinação dos critérios depende do objeto do contrato, na medida em que tais critérios devem permitir avaliar o nível de desempenho de cada proposta em relação ao objeto do contrato, tal como definido nas especificações técnicas, bem como calcular a relação qualidade/preço de cada proposta.

[...]»

4

O artigo 2.o da Diretiva 2004/18 prevê:

«As entidades adjudicantes tratam os operadores económicos de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação e agem de forma transparente.»

5

O artigo 53.o desta diretiva, sob a epígrafe «Princípios de adjudicação dos contratos», dispõe:

«1.   Sem prejuízo das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais relativas à remuneração de determinados serviços, os critérios em que as entidades adjudicantes se devem basear para a adjudicação são os seguintes:

a)

Quando a adjudicação for feita à proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante, diversos critérios ligados ao objeto do contrato público em questão, como sejam qualidade, preço, valor técnico, características estéticas e funcionais, características ambientais, custo de utilização, rendibilidade, assistência técnica e serviço pós‑venda, data de entrega e prazo de entrega ou de execução;

b)

Ou, unicamente o preço mais baixo.

2.   Sem prejuízo do disposto no terceiro parágrafo, no caso previsto na alínea a) do n.o 1, a entidade adjudicante especificará, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos ou, no caso do diálogo concorrencial, na memória descritiva, a ponderação relativa que atribui a cada um dos critérios escolhidos para determinar a proposta economicamente mais vantajosa.

Essas ponderações podem ser expressas por um intervalo de variação com uma abertura máxima adequada.

Sempre que, no entender da entidade adjudicante, a ponderação não for possível por razões demonstráveis, a entidade adjudicante indicará, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos ou, no caso do diálogo concorrencial, na memória descritiva a ordem decrescente de importância dos critérios.»

Direito belga

6

O artigo 16.o da Lei de 24 de dezembro de 1993, relativa aos contratos públicos e a determinados contratos de empreitadas de obras públicas, de fornecimento de bens e de prestações de serviços, dispõe:

«No procedimento de concurso público geral ou limitado, o contrato deve ser adjudicado ao proponente que apresentou a proposta regular mais interessante, tendo em conta os critérios de adjudicação que devem constar do caderno de encargos especial ou, se for caso disso, do anúncio de concurso. O contrato deve ser adjudicado ao proponente que tiver apresentado a proposta regular mais vantajosa, tendo em conta os critérios de adjudicação constantes do caderno de encargos ou, se for caso disso, do anúncio de concurso. Os critérios de adjudicação devem ser relativos ao objeto do contrato, por exemplo, a qualidade dos produtos ou serviços, o preço, o valor técnico, as características estéticas e funcionais, as características ambientais, considerações de ordem social e ética, o custo de utilização, a rendibilidade, a assistência técnica e o serviço pós‑venda, a data de entrega e o prazo de entrega ou de execução. [...]»

7

Nos termos do artigo 115.o do Decreto Real de 8 de janeiro de 1996, relativo aos contratos de empreitada de obras públicas, de fornecimento de bens e de prestação de serviços e às concessões de obras públicas, na versão aplicável ao litígio no processo principal:

«A entidade adjudicante escolhe a proposta regular que considere mais interessante em função de critérios variáveis consoante o contrato. [...]

Sem prejuízo das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas relativas à remuneração de certos serviços, a entidade adjudicante mencionará no caderno de encargos especial e, eventualmente, no anúncio de concurso todos os critérios de adjudicação, se possível por ordem decrescente de importância, o que será indicado, nesse caso, no caderno de encargos especial. Na falta dessa indicação, os critérios de adjudicação terão o mesmo valor.

[…]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

8

Por anúncio publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 31 de janeiro de 2012, a Região da Flandres lançou um concurso com vista à celebração de um contrato público de serviços, intitulado «Woonsurvey 2012: survey naar de woning en de woonconsument in Vlaanderen», cujo objetivo consistia na realização de uma sondagem de opinião em grande escala sobre a habitação e os habitantes da Flandres (Bélgica). O montante estimado do contrato ascendia a 1400000 euros, incluindo o imposto sobre o valor acrescentado (IVA).

9

O anúncio desse concurso mencionava os dois critérios de adjudicação seguintes:

«1 Qualidade da proposta (50/100)

Qualidade da preparação, da organização e da execução do trabalho no terreno, da encriptação e do primeiro tratamento dos dados. As prestações propostas devem ser descritas da forma mais pormenorizada possível. Deve resultar claramente da proposta que o proponente tem condições para assumir a totalidade do contrato (mínimo de 7000 unidades de amostragem/máximo de 10000 unidades de amostragem) no prazo de execução previsto de 12 meses.

2 Preço (50/100)

Custo da execução do contrato para a amostra de base (7000 unidades de amostragem) e custo por cada conjunto de 500 endereços adicionais disponibilizados (montantes incluindo IVA).»

10

Quatro proponentes apresentaram propostas que, de acordo com o relatório sobre a seleção qualitativa, satisfaziam os requisitos mínimos em matéria de competência técnica. O método de avaliação das propostas estava descrito no relatório de adjudicação de 23 de março de 2012 da seguinte forma:

«Em seguida, a comissão procedeu à avaliação das propostas.

As quatro propostas foram avaliadas e comparadas com base nos critérios já referidos. Em primeiro lugar, as propostas foram examinadas e avaliadas com base no critério da ‘qualidade’. Neste contexto, foi atribuída a cada proposta uma determinada nota por unanimidade (elevado — suficiente — baixo). Em seguida, foi aplicado o critério do preço.

Por último, com base nestas pontuações, foi estabelecida a classificação final.»

11

Decorre do relatório de adjudicação que, no que respeita ao primeiro critério, ou seja, a qualidade das propostas, a Dimarso e dois outros proponentes obtiveram a nota de «elevado», ao passo que o quarto proponente obteve a nota de «baixo». No que respeita ao segundo critério, ou seja, o preço, o relatório de adjudicação contém as seguintes indicações:

«Síntese:

A síntese infra reproduz o preço, por um lado, da execução do contrato (7000 unidades de amostragem) e, por outro, da execução das entrevistas realizadas por conjuntos de 500 (preços incluindo IVA):

PropostaCritério 2(a) — Preço (incluindo IVA) para a amostra de base (N=7 000)Critério 2(b) — Preço (incluindo IVA) por cada conjunto adicional de 500 amostras[Dimarso]987360,00 [euros]69575,00 [euros]Ipsos Belgium NV913570,00 [euros]55457,00 [euros]New Information & Data NV842607,70 [euros]53240,00 [euros]Significant GfK NV975520,15 [euros]57765,40 [euros]»

12

Por aplicação destes dois critérios, a classificação final dos proponentes no relatório de adjudicação foi a seguinte:

«Classificação

Proposta

Critério 1

Critério 2(a)

Critério 2(b)

1

Ipsos Belgium

elevado

913 570,00 [euros]

55 457,00 [euros]

2

Significant GfK

elevado

975 520,15 [euros]

57 765,40 [euros]

3

[Dimarso]

elevado

987 360,00 [euros]

69 575,00 [euros]

4

New Information & Data NV

baixo

842 607,70 [euros]

53 240,00 [euros]

13

Por decisão da Região da Flandres de 11 de abril de 2012, o contrato foi adjudicado à Ipsos Belgium, pelo Ministro flamengo da Energia, da Habitação, das Cidades e da Economia Social. O recurso da Dimarso, interposto em 14 de junho de 2012, visa a anulação desta decisão. Segundo a recorrente, a decisão impugnada parece ter analisado as propostas com base na ponderação «elevado — suficiente — baixo», não referida no anúncio do concurso, no que respeita ao critério da qualidade das propostas, e com base nos componentes «preço» indicados, no que respeita ao critério do preço, sem proceder a uma análise, a uma comparação e a uma apreciação final adequadas das propostas com base nos critérios de adjudicação conforme figuravam no caderno de encargos, incluindo a ponderação de «50/100» para cada um dos critérios de adjudicação, conforme especificada no caderno de encargos.

14

O Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica) salienta que tanto no considerando 46 como no artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18 apenas se alude aos «critérios» e à «ponderação relativa» desses critérios, não existindo referência expressa ao método de avaliação e às regras de ponderação. O órgão jurisdicional de reenvio sublinha que a escolha do método de avaliação não é neutra, podendo, pelo contrário, ser determinante para o resultado da avaliação das propostas com base nos critérios de adjudicação. A este respeito, refere o critério de adjudicação do preço, no âmbito do qual a entidade adjudicante pode optar, por exemplo, por aplicar a regra da proporcionalidade, por atribuir a nota máxima à proposta mais baixa ou a nota zero à proposta mais elevada e por aplicar uma interpolação linear às propostas intermédias, ou por favorecer ao máximo a proposta de preço médio.

15

No acórdão de 24 de janeiro de 2008, Lianakis e o. (C‑532/06, EU:C:2008:40, n.os 38, 44 e 45), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 36.o, n.o 2, da Diretiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO 1992, L 209, p. 1), disposição substancialmente análoga ao artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, se opõe a que a entidade adjudicante fixe, posteriormente à publicação do caderno de encargos ou do anúncio de concurso, coeficientes e regras de ponderação, bem como subcritérios relativos aos critérios de adjudicação mencionados num e noutro desses documentos, quando essas regras e esses coeficientes de ponderação, bem como esses subcritérios não tenham sido previamente levados ao conhecimento dos proponentes. O Tribunal de Justiça considerou assim que é a fixação ex post não só dos «coeficientes de ponderação» mas também dos «subcritérios» que é incompatível com as disposições do direito da União.

16

O órgão jurisdicional de reenvio observa que a questão que se coloca no caso em apreço é a de saber se, com esta menção adicional aos «subcritérios», o Tribunal de Justiça se referia também à forma como decorreu a classificação dos critérios de adjudicação, o que se assemelharia a regras de ponderação. Por conseguinte, não se pode afastar facilmente a argumentação segundo a qual o Tribunal de Justiça, com a utilização do conceito de «subcritérios», se referia também ao método de avaliação. No entanto, também não é evidente que decorra do acórdão de 24 de janeiro de 2008, Lianakis e o. (C‑532/06, EU:C:2008:40) que o próprio método de avaliação também deva ser comunicado aos proponentes, e menos ainda que esse método deva ser sempre previamente fixado. Em todo o caso, é possível concluir que a questão submetida no processo que deu origem a esse acórdão não dizia expressamente respeito à fixação a posteriori de um método de avaliação e que, por conseguinte, não tinha o mesmo alcance que a questão que se coloca no caso em apreço.

17

Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça também não abordou expressamente esta questão no seu acórdão de 21 de julho de 2011, Evropaïki Dynamiki/EMSA (C‑252/10 P, não publicado, EU:C:2011:512), no qual, ao referir‑se ao acórdão de 24 de janeiro de 2008, Lianakis e o. (C‑532/06, EU:C:2008:40), insiste no facto de a legalidade da utilização de subcritérios e a respetiva ponderação deverem ser sempre examinadas à luz do princípio da igualdade de tratamento e do dever de transparência que dele decorre. Portanto, no entender do órgão jurisdicional de reenvio, estes acórdãos não dão resposta, ou pelo menos uma resposta decisiva, à questão que se coloca no processo principal, que é a de saber se o método de avaliação das propostas, a saber, o método concreto que a entidade adjudicante utilizará para classificar as propostas, também deve ser previamente comunicado aos proponentes.

18

Tendo em conta estas considerações, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«1)

Deve o artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18[…], considerado em si e em conjugação com o alcance dos princípios de direito da União da igualdade e da transparência em relação a contratos públicos, ser interpretado no sentido de que a entidade adjudicante, caso adjudique o contrato ao concorrente que apresentou a proposta que, do seu ponto de vista, é a economicamente mais vantajosa, está sempre obrigada a estabelecer previamente e a indicar no anúncio de concurso ou no caderno de encargos, o método de apreciação ou as regras de ponderação, independentemente da sua previsibilidade, habitualidade ou alcance, com base no qual ou nas quais as propostas serão apreciadas segundo os critérios ou subcritérios de adjudicação[,]

2)

ou, no sentido de que, caso não exista uma obrigação geral desta natureza, há circunstâncias, como o alcance, a falta de previsibilidade ou a inabitualidade destas regras de ponderação, em que existe essa obrigação?»

Quanto à questão prejudicial

19

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, lido à luz do princípio da igualdade de tratamento e do dever de transparência que dele decorre, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de um contrato público de serviços que deva ser adjudicado nos termos do critério da proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante, esta última tem sempre de levar ao conhecimento dos potenciais proponentes, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos relativos ao contrato em causa, o método de avaliação ou as regras de ponderação com base nas quais as propostas serão apreciadas segundo os critérios de adjudicação publicados nestes documentos ou se, na falta de uma obrigação geral desta natureza, as circunstâncias específicas do contrato em causa podem impor essa obrigação.

20

Para responder a esta questão, há que salientar que, quando a entidade adjudicante escolhe adjudicar o contrato à proposta economicamente mais vantajosa, em conformidade com o artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, tem de especificar, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos, a ponderação relativa que atribui a cada um dos critérios de adjudicação escolhidos para determinar a proposta economicamente mais vantajosa. Essas ponderações podem ser expressas por um intervalo de variação com uma abertura máxima adequada. Sempre que, no entender da entidade adjudicante, a ponderação não for possível por razões demonstráveis, a entidade adjudicante indicará, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos ou, no caso do diálogo concorrencial, na memória descritiva, a ordem decrescente de importância dos critérios.

21

Tais exigências visam, como esclarece o considerando 46 da Diretiva 2004/18, permitir que todos os proponentes sejam razoavelmente informados dos critérios e das modalidades que serão aplicados para identificar a proposta economicamente mais vantajosa. Além disso, traduzem o dever das entidades adjudicantes previsto no artigo 2.o desta diretiva, segundo o qual estas devem tratar os operadores económicos de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação e agir de forma transparente.

22

De acordo com jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento e o dever de transparência significam, designadamente, que os proponentes devem estar em pé de igualdade tanto no momento em que preparam as suas propostas como no momento em que estas são avaliadas pela entidade adjudicante (v. neste sentido, acórdãos de 24 de novembro de 2005, ATI EAC e Viaggi di maio e o., C‑331/04, EU:C:2005:718, n.o 22, e de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin, C‑396/14, EU:C:2016:347, n.o 37 e jurisprudência referida).

23

Assim, o Tribunal de Justiça declarou que o objeto e os critérios de adjudicação dos contratos públicos devem ser claramente determinados desde o início do processo da sua adjudicação (acórdão de 10 de maio de 2012, Comissão/Países Baixos, C‑368/10, EU:C:2012:284, n.o 56) e que uma entidade adjudicante não pode aplicar aos critérios de adjudicação subcritérios que não tenha levado previamente ao conhecimento dos proponentes (acórdão de 21 de julho, Evropaïki Dynamiki/EMSA, C‑252/10 P, não publicado, EU:C:2011:512, n.o 31). De igual modo, a entidade adjudicante deve cingir‑se à mesma interpretação dos critérios de adjudicação durante todo o processo (acórdão de 18 de outubro de 2001, SIAC Construction, C‑19/00, EU:C:2001:553, n.o 43 e jurisprudência referida).

24

Estas exigências também se aplicam, em princípio, mutatis mutandis, à obrigação de as entidades adjudicantes indicarem, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos, a «ponderação relativa» de cada um dos critérios de adjudicação. O Tribunal de Justiça declarou, assim, que uma entidade adjudicante não pode, em princípio, aplicar regras de ponderação que não tenha levado previamente ao conhecimento dos proponentes (v., neste sentido, acórdão de 24 de janeiro de 2008, Lianakis e o., C‑532/06, EU:C:2008:40, n.os 38 e 42).

25

Em particular, a ponderação relativa de cada um dos critérios de adjudicação deve, sem prejuízo das disposições do artigo 53.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da Diretiva 2004/18, ser claramente fixada desde o início do processo de adjudicação do contrato, permitindo assim aos proponentes determinar objetivamente a importância efetiva de um critério de adjudicação relativamente a um outro quando da sua avaliação posterior pela entidade adjudicante. Do mesmo modo, a ponderação relativa de cada um dos critérios de adjudicação não pode ser alterada durante o processo.

26

Contudo, o Tribunal de Justiça reconheceu que é possível a uma entidade adjudicante determinar, após o termo do prazo para a apresentação das propostas, coeficientes de ponderação para os subcritérios que correspondam, em substância, aos critérios previamente levados ao conhecimento dos proponentes, sob três condições, a saber, que essa determinação ex post, em primeiro lugar, não altere os critérios de adjudicação do contrato definidos no caderno de encargos ou no anúncio de concurso, em segundo lugar, não contenha elementos que, se tivessem sido conhecidos no momento da preparação das propostas, poderiam ter influenciado essa preparação e, em terceiro lugar, não tenha sido adotada tomando em consideração elementos suscetíveis de produzir efeitos discriminatórios relativamente a um dos proponentes (v. acórdão de 21 de julho de 2011, Evropaïki Dynamiki/EMSA, C‑252/10 P, não publicado, EU:C:2011:512, n.o 33 e jurisprudência referida).

27

No entanto, nem o artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18 nem outra disposição da mesma diretiva estabelecem a obrigação de a entidade adjudicante levar ao conhecimento dos potenciais proponentes, através de publicação no anúncio de concurso ou no caderno de encargos, o método de avaliação aplicado pela entidade adjudicante para avaliar e classificar concretamente as propostas à luz dos critérios de adjudicação do contrato e da sua ponderação relativa previamente estabelecidos na documentação relativa ao contrato em causa.

28

Essa obrigação geral também não resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

29

Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que uma comissão de avaliação deve poder dispor de uma certa liberdade para realizar a sua tarefa e pode, assim, sem alterar os critérios de adjudicação do contrato estabelecidos no caderno de encargos ou no anúncio de concurso, estruturar o seu próprio trabalho de exame e análise das propostas apresentadas (v. acórdão de 21 de julho de 2011, Evropaïki Dynamiki/EMSA, C‑252/10 P, não publicado, EU:C:2011:512, n.o 35).

30

Essa liberdade também é justificada por considerações de ordem prática. A entidade adjudicante deve poder adaptar o método de avaliação que irá aplicar para avaliar e classificar as propostas atendendo às circunstâncias do caso concreto.

31

Em conformidade com os princípios que regem a adjudicação dos contratos previstos no artigo 2.o da Diretiva 2004/18 e para evitar qualquer risco de favoritismo, o método de avaliação aplicado pela entidade adjudicante para avaliar e classificar concretamente as propostas não deve, em princípio, ser determinado após a abertura das propostas pela entidade adjudicante. Todavia, no caso de a determinação deste método não ser possível, por razões demonstráveis, antes dessa abertura, não se pode, como salientou o Governo belga, censurar a entidade adjudicante por só o ter fixado depois de esta, ou a sua comissão de avaliação, ter tomado conhecimento do conteúdo das propostas.

32

Em todo o caso, de acordo com os referidos princípios que regem a adjudicação dos contratos e com o constatado nos n.os 24 e 25 do presente acórdão, o estabelecimento, pela entidade adjudicante, do método de avaliação após a publicação do anúncio de concurso ou do caderno de encargos não pode ter por efeito alterar os critérios de adjudicação nem a sua ponderação relativa.

33

No caso em apreço, coloca‑se a questão de saber se o processo de adjudicação em causa no processo principal respeitou as obrigações que decorrem do artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, partindo do princípio de que, por um lado, a entidade adjudicante só indicou, no anúncio de concurso, dois critérios de adjudicação, a saber, a qualidade e o preço, cada um com a menção «(50/100») e que, por outro, a comissão de avaliação utilizou uma escala de «elevado» a «baixo» passando por «suficiente» para a avaliação do critério da qualidade das propostas, sem que tenha sido utilizada uma escala para o critério de adjudicação relativo ao preço.

34

A este respeito, importa salientar que as duas menções «(50/100)» significam, segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio no pedido de decisão prejudicial, que os dois critérios de adjudicação têm a mesma importância.

35

Ora, afigura‑se que este procedimento não permitia refletir, quando da classificação dos proponentes destinada a identificar a proposta economicamente mais vantajosa, as diferenças de qualidade das suas propostas em relação aos respetivos preços respeitando simultaneamente a ponderação relativa dos critérios de adjudicação prevista na menção «(50/100)». Tudo indica, nomeadamente, que este procedimento era suscetível de afetar o critério do preço, conferindo‑lhe um peso decisivo relativamente às propostas classificadas na escala de qualidade mencionada no n.o 33 do presente acórdão. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se a ponderação relativa de cada um dos critérios de adjudicação publicada no anúncio de concurso foi efetivamente respeitada pela entidade adjudicante na avaliação das propostas.

36

Embora a entidade adjudicante possa utilizar uma escala para a avaliação de um dos critérios de adjudicação sem que a mesma seja publicada no anúncio de concurso ou no caderno de encargos, esta não pode, contudo, como observado no n.o 32 do presente acórdão, ter por efeito alterar a ponderação relativa dos critérios de adjudicação publicada nessa documentação.

37

Por conseguinte, decorre de todas as considerações precedentes que há que responder à questão prejudicial que o artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18, lido à luz do princípio da igualdade de tratamento e do dever de transparência que dele decorre, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de um contrato de serviços que deva ser adjudicado nos termos do critério da proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante, esta última não tem sempre de levar ao conhecimento dos potenciais proponentes, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos relativos ao contrato em causa, o método de avaliação aplicado pela entidade adjudicante para avaliar e classificar concretamente as propostas. Em contrapartida, o referido método não pode ter por efeito alterar os critérios de adjudicação e a sua ponderação relativa.

Quanto às despesas

38

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

O artigo 53.o, n.o 2, da Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços, lido à luz do princípio da igualdade de tratamento e do dever de transparência que dele decorre, deve ser interpretado no sentido de que, no caso de um contrato de serviços que deva ser adjudicado nos termos do critério da proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante, esta última não tem sempre de levar ao conhecimento dos potenciais proponentes, no anúncio de concurso ou no caderno de encargos relativos ao contrato em causa, o método de avaliação aplicado pela entidade adjudicante para avaliar e classificar concretamente as propostas. Em contrapartida, o referido método não pode ter por efeito alterar os critérios de adjudicação e a sua ponderação relativa.

 

Assinaturas


( *1 ) * Língua do processo: neerlandês.