61993J0400

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 31 DE MAIO DE 1995. - SPECIALARBEJDERFORBUNDET I DANMARK CONTRA DANSK INDUSTRI, ANTERIORMENTE INDUSTRIENS ARBEJDSGIVERE, AGINDO EM REPRESENTACAO DA ROYAL COPENHAGEN A/S. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: FAGLIGE VOLDGIFTSRET - DINAMARCA. - IGUALDADE DE REMUNERACOES ENTRE TRABALHADORES MASCULINOS E FEMININOS. - PROCESSO C-400/93.

Colectânea da Jurisprudência 1995 página I-01275


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


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1. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remuneração ° Artigo 119. do Tratado e Directiva 75/117 ° Âmbito de aplicação ° Sistema de remuneração à peça

(Tratado CEE, artigo 119. ; Directiva 75/117 do Conselho)

2. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remuneração ° Sistema de remuneração à peça ° Verificação de diferença entre as remunerações médias de dois grupos de trabalhadores, um composto principalmente por mulheres e o outro por homens, que efectuam um trabalho de valor igual ° Constatação insuficiente para determinar a existência de uma discriminação ° Falta de clareza na definição dos elementos variáveis da remuneração ° Ónus da prova da inexistência de discriminação

(Tratado CEE, artigo 119. ; Directiva 75/117 do Conselho, artigo 1. )

3. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remuneração ° Sistema de remuneração à peça ° Verificação de uma eventual discriminação ° Formas de comparação das remunerações médias de dois grupos de trabalhadores

(Tratado CEE, artigo 119. ; Directiva 75/117 do Conselho)

4. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remuneração ° Sistema de remuneração à peça ° Verificação de uma eventual discriminação ° Elementos a ter em conta para poder considerar trabalhos diferentes como de valor igual ° Factores susceptíveis de justificar eventuais diferenças de remuneração

(Tratado CEE, artigo 119. ; Directiva 75/117 do Conselho)

5. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remuneração ° Aplicabilidade à fixação das remunerações por via de negociação colectiva ° Tomada em conta da existência de uma negociação colectiva quando da verificação de uma eventual discriminação

(Tratado CEE, artigo 119. ; Directiva 75/117 do Conselho)

Sumário


1. O artigo 119. do Tratado e a Directiva 75/117, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros no que se refere à aplicação do princípio da igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos, aplicam-se aos sistemas de remuneração à peça nos quais a remuneração é, na totalidade ou no essencial, função do resultado individual do trabalho de cada trabalhador.

2. O princípio da igualdade de remuneração dos trabalhadores masculinos e femininos, enunciado nos artigos 119. do Tratado e 1. da Directiva 75/117, deve ser interpretado no sentido de que, num sistema de remuneração à peça, a simples constatação de que a remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por mulheres que efectuam um certo trabalho é sensivelmente inferior à remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por homens que efectuam outro tipo de trabalho ao qual é atribuído um valor igual, não basta para concluir pela existência de uma discriminação em matéria de remuneração. Todavia, quando num sistema de remuneração à peça no qual as remunerações individuais são compostas por uma parte variável que é função do resultado individual do trabalho de cada trabalhador e por uma parte fixa diferente conforme os grupos de trabalhadores em questão, não é possível deduzir quais os factores determinantes na fixação das taxas ou unidades de medida consideradas para o cálculo da parte variável da remuneração, a entidade patronal pode ver ser-lhe imposto o ónus da prova de que as diferenças verificadas não são devidas a uma discriminação em razão do sexo.

3. Com vista à comparação a efectuar, à luz do princípio da igualdade de remuneração dos trabalhadores masculinos e femininos, entre as remunerações médias de dois grupos de trabalhadores remunerados à peça, o órgão jurisdicional nacional deve certificar-se de que os dois grupos abrangem cada um a totalidade dos trabalhadores que, tendo em conta um conjunto de factores, tais como a natureza do trabalho, as condições de formação e as condições de trabalho, podem ser considerados numa situação comparável, e que abrangem um número relativamente importante de trabalhadores que exclui que as diferenças verificadas sejam a expressão de fenómenos puramente fortuitos ou conjunturais, ou sejam devidas a diferenças nos resultados individuais do trabalho dos trabalhadores em questão.

4. Quando da verificação do respeito do princípio da igualdade de remuneração dos trabalhadores masculinos e femininos, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se, tendo em conta elementos como, por um lado, o facto de o trabalho efectuado por um dos grupos de trabalhadores em causa ser um trabalho à máquina e apelar mais especificamente à força muscular, enquanto o efectuado pelo outro grupo é um trabalho manual que exige mais particularmente destreza e, por outro, o facto de existirem diferenças entre o trabalho dos dois grupos no que se refere às pausas remuneradas e à liberdade de organização no trabalho, assim como aos incómodos ligados ao trabalho, os dois tipos de trabalho têm um valor igual ou se estes elementos podem ser considerados como constituindo factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo susceptíveis de justificar eventuais diferenças de remuneração.

5. O princípio da igualdade de remuneração entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos é igualmente aplicável quando os elementos da remuneração são fixados por negociações colectivas ou negociações de âmbito local. Todavia, o órgão jurisdicional nacional pode tomar em consideração este facto para apreciar se as diferenças entre as remunerações médias dos dois grupos de trabalhadores são devidas a factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo.

Partes


No processo C-400/93,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo faglige voldgiftsret (Dinamarca), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Specialarbejderforbundet i Danmark

e

Dansk Industri, anteriormente Industriens Arbejdsgivere, agindo em representação da Royal Copenhagen A/S,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 119. do Tratado CEE e da Directiva 75/117/CEE do Conselho, de 10 de Fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros no que se refere à aplicação do princípio da igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos (JO L 45, p. 19; EE 05 F2 p. 52),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, F. A. Schockweiler (relator) e C. Gulmann, presidentes de secção, G. F. Mancini, C. N. Kakouris, J. C. Moitinho de Almeida, J. L. Murray, D. A. O. Edward, J-P. Puissochet, G. Hirsch e L. Sevón, juízes,

advogado-geral: P. Léger

secretário: H. von Holstein, secretário-adjunto

vistas as observações escritas apresentadas:

° em representação de Specialarbejderforbundet i Danmark, por Ulrik Joergensen, consultor jurídico da Landsorganisationen i Danmark,

° em representação de Dansk Industri, agindo em representação da Royal Copenhagen A/S, por Niels Overgaard, director na Dansk Industri,

° em representação do Governo alemão, por Ernst Roeder, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, e Bernd Kloke, Regierungsrat zur Anstellung no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

° em representação do Governo português, por Luís Fernandes, director do Serviço Jurídico da Direcção-Geral das Comunidades Europeias do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Fernando Ribeiro Lopes, Director-geral da Regulamentação das Condições de Trabalho do Ministério do Emprego e da Segurança Social, na qualidade de agentes,

° em representação do Governo do Reino Unido, por John E. Collins, assistant treasury solicitor, na qualidade de agente, assistido por David Pannick, QC,

° em representação das Comunidades Europeias, por Hans Peter Hartvig, consultor jurídico, e Marie Wolfcarius, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações do Specialarbejderforbundet i Danmark, representado por Ulrik Joergensen, da Dansk Industri, agindo em representação da Royal Copenhagen A/S, representada por Allan K. Larsen, consultor principal do Governo alemão, representado por Ernst Roeder, do Governo do Reino Unido, representado por John E. Collins e David Pannick, e da Comissão, representada por Hans Peter Hartvig e Marie Wolcarius, na audiência de 31 de Janeiro de 1995,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 21 de Fevereiro de 1995,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 27 de Agosto de 1993, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 31 de Agosto seguinte, o faglige voldgiftsret (tribunal arbitral laboral) colocou, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, quatro questões prejudiciais, relativas à interpretação do artigo 119. do Tratado CEE e da Directiva 75/117/CEE do Conselho, de 10 de Fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros no que se refere à aplicação do princípio da igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos (JO L 45, p. 19, a seguir "directiva").

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe o Specialarbejderforbundet i Danmark (sindicato dos trabalhadores semi-qualificados da Dinamarca, a seguir "Specialarbejderforbundet") à Dansk Industri (confederação da indústria dinamarquesa), agindo em representação de Royal Copenhagen A/S (a seguir "Royal Copenhagen").

3 A Royal Copenhagen é uma empresa que fabrica produtos de cerâmica. Ocupa cerca de 1 150 trabalhadores, 40% dos quais são homens e 60% mulheres, no fabrico destes produtos. Estes trabalhadores podem ser repartidos em três grupos: o dos oleiros, que modelam a pasta de porcelana recorrendo a diversas técnicas; o dos pintores, que decoram estes produtos; finalmente o dos operários não qualificados empregados nos serviços de manutenção dos fornos, na escolha, no polimento, transporte interno, etc.

4 O grupo dos oleiros é composto por cerca de 200 pessoas e o dos pintores por 453. Por seu turno, estes grupos podem ser subdivididos em vários subgrupos, como, dentro do primeiro, o dos operadores de máquinas automáticas, que modelam automaticamente os produtos cerâmicos, e, dentro do segundo, o dos pintores de porcelana azul, que decoram os produtos com pincel, e o dos pintores de pratos decorativos, que pintam à pistola pratos decorativos que já possuem uma decoração e depois retiram a pintura de certas partes da decoração com auxílio de uma esponja.

5 Todos estes trabalhadores são abrangidos pela mesma convenção colectiva. Nos termos desta, são em princípio remunerados à peça, isto é, recebem um salário cujo montante depende total ou parcialmente do resultado do seu trabalho. Podem todavia optar por um salário horário fixo, idêntico para todos os grupos. De facto, cerca de 70% dos oleiros e 70% dos pintores são remunerados à peça: o seu salário é composto por uma parte fixa correspondente a um salário de base pago à hora e de uma parte variável em função do número de objectos fabricados.

6 O grupo dos operadores de máquinas automáticas pagos à peça é composto por 26 pessoas, todos homens, e representa cerca de 18% da totalidade dos oleiros remunerados à peça. O grupo dos pintores de porcelana azul remunerados à peça é composto por 156 pessoas, 155 mulheres e 1 homem, e representa cerca de 49% do grupo dos pintores remunerados à peça. O dos pintores de pratos decorativos remunerados à peça é composto por 51 pessoas, todas mulheres, e representa cerca de 16% do grupo dos pintores remunerados à peça.

7 No mês de Abril de 1990, o salário horário médio dos operadores de máquinas automáticas remunerados à peça era de 103,93 DKR, sendo a parte fixa de 71,69 DKR, e tendo o operador melhor remunerado ganho 118 DKR por hora e o menos bem remunerado 86 DKR. Durante o mesmo período, o salário horário médio dos pintores de porcelana azul remunerados à peça era de 91 DKR, sendo a parte fixa de 57 DKR e tendo o trabalhador melhor pago recebido 125 DKR por hora e o menos bem pago 72 DKR, e o salário horário médio dos pintores de pratos decorativos remunerados à peça era de 116,20 DKR, sendo a parte fixa 35,85 DKR e tendo o trabalhador melhor pago ganho 159 DKR e o menos bem pago 86 DKR por hora.

8 Considerando que a Royal Copenhagen violava o imperativo de igualdade de remunerações por o salário horário médio por peça do grupo dos pintores de porcelana azul, composto, à excepção de uma pessoa, exclusivamente por mulheres, ser inferior ao do grupo dos operadores de máquinas automáticas, composto exclusivamente por homens, o Specialarbejderforbundet recorreu ao faglige voldgiftsret de Copenhague, pedindo que a Royal Copenhagen seja obrigada, por um lado, a admitir que os pintores de porcelana azul efectuam um trabalho de valor igual ao dos operadores de máquinas automáticas e, por outro, a alinhar a remuneração horária média à peça dos primeiros pela dos segundos.

9 Considerando que a solução do litígio dependia da interpretação do artigo 119. do Tratado e da directiva, o faglige voldgiftsret decidiu interrogar o Tribunal de Justiça através do reenvio prejudicial. No seu despacho, precisa que o reenvio ao Tribunal de Justiça não é extensivo à questão do valor do trabalho efectuado pelos diferentes grupos de trabalhadores, mas comporta diversas questões que decorrem do facto de o processo principal incidir sobre remunerações à peça e coloca, além disso, a questão da escolha dos grupos de trabalhadores a comparar tal como foi efectuada pelo Specialarbejderforbundet.

10 Em consequência, colocou as seguintes questões ao Tribunal de Justiça:

"1) O artigo 119. do Tratado CEE e a Directiva 75/117/CEE, de 10 de Fevereiro de 1975, relativa à igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos, é aplicável a um sistema remuneratório em que a remuneração total depende, na totalidade ou em grau importante, do resultado do trabalho individual do trabalhador (sistema de remuneração à peça)?

No caso de resposta afirmativa à questão 1, solicita-se ainda que sejam respondidas as seguintes questões:

2) As regras sobre a igualdade de remuneração previstas no artigo 119. do Tratado CEE e na Directiva 75/117 de 10 de Fevereiro de 1975, já citada, são aplicáveis, no caso de comparação entre dois grupos de assalariados, quando a remuneração horária média de um grupo de trabalhadores remunerados à peça, constituído predominantemente por mulheres que executam um certo tipo de trabalho, é nitidamente inferior à remuneração horária média de um outro grupo de trabalhadores remunerados à peça, constituído predominantemente por homens, que executam um outro tipo de trabalho, se for de presumir que ao trabalho das mulheres e dos homens deve ser atribuído o mesmo valor?

3) Pressupondo que o primeiro grupo é constituído predominantemente por mulheres e o segundo predominantemente por homens, podem ser estabelecidos requisitos quanto à constituição dos grupos, por exemplo, relativos ao número de pessoas em cada grupo ou à quota-parte da totalidade dos trabalhadores da empresa?

Neste caso, pode a directiva ser aplicada para obter a mesma remuneração para dois grupos, por exemplo, através da comparação das empregadas do sexo feminino com um grupo de empregados do sexo masculino?

O problema pode, designadamente, ser esclarecido da seguinte forma:

Um grupo de trabalhadores predominantemente masculinos denominado A e dois de trabalhadores predominantemente femininos denominados, respectivamente, B e C executam trabalho do mesmo valor e a remuneração média à peça é a mais elevada para o grupo C, a segunda para o grupo A e a menor para o grupo B. Pode o grupo B estabelecer uma comparação com o grupo A e exigir um aumento da remuneração até ao nível do grupo A, e pode o grupo A, na sequência, exigir um aumento de remuneração até ao nível do grupo C e, finalmente, pode o grupo B exigir um aumento de remuneração até ao novo nível do grupo A - igual ao grupo C?

4) Tem importância para apreciar se foi violado o princípio da igualdade de remuneração

a) o facto de um dos grupos trabalhar predominantemente à máquina, enquanto o outro faz um trabalho puramente manual?

b) o facto de a remuneração à peça ser estabelecida através de negociações entre as respectivas organizações ou através de negociações de âmbito local?

c) que se verifiquem diferenças na escolha, pelo trabalhador, do seu ritmo de trabalho? Em caso afirmativo, a quem incumbe o ónus da prova da existência de tais diferenças?

d) que se verifiquem significativas diferenças de remuneração dentro de um ou de dois grupos objecto de comparação?

e) que a quota-parte fixa da remuneração à peça seja diferente nos dois grupos objecto da comparação?

f) que existam diferenças entre os dois grupos no que se refere às pausas remuneradas e à liberdade na organização do trabalho?

g) que não seja possível verificar quais os factores que tiverem importância para a determinação das tabelas de remuneração à peça?

h) que num dos grupos objecto de comparação se exige mais especiailmente força física, enquanto no segundo o trabalho exige mais especialmente habilidade manual?

i) que se possam verificar diferenças relativamente à incomodidade do trabalho (ruído, temperatura, trabalho simplista, repetitivo, monótono?)"

Quanto à primeira questão

11 Através da primeira questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta se o artigo 119. do Tratado e a directiva se aplicam a sistemas de remuneração à peça nos quais a remuneração é, na totalidade ou no essencial, função do resultado individual de cada trabalhador.

12 Quanto a este aspecto verifica-se que, ao dispor expressamente no seu terceiro parágrafo, alínea a), que a igualdade de remuneração, sem discriminação em razão do sexo, implica que a remuneração do mesmo trabalho pago à tarefa seja estabelecida na base de uma mesma unidade de medida, o artigo 119. prevê que o princípio da igualdade das remunerações se aplica a sistemas de remuneração "à tarefa" ou à peça.

13 Além disso, o Tribunal de Justiça já fez notar que o artigo 119. proíbe qualquer discriminação em matéria de remuneração entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos, seja qual for o mecanismo que determine esta desigualdade (acórdão de 17 de Maio de 1990, Barber, C-262/88, Colect., p. I-1889, n. 32).

14 Esta conclusão é corroborada pelo artigo 1. , primeiro parágrafo, da directiva, nos termos do qual o princípio da igualdade das remunerações entre os trabalhadores masculinos e os trabalhadores femininos implica a eliminação "no conjunto dos elementos e condições de remuneração" de qualquer discriminação em razão do sexo.

15 Deve assim responder-se à primeira questão que o artigo 119. do Tratado e a directiva se aplicam aos sistemas de remuneração à peça nos quais a remuneração é, na totalidade ou no essencial, função do resultado individual do trabalho de cada trabalhador.

Observações preliminares sobre as outras questões

16 Antes de abordar a análise das outras questões, deve sublinhar-se que as remunerações em causa no processo principal não são exclusivamente função do trabalho individual de cada trabalhador, pois comportam uma parte fixa correspondente a um salário de base pago à hora, que não é o mesmo para os diferentes grupos de trabalhadores em questão.

17 Compete ao órgão jurisdicional nacional apreciar em que medida é necessário tomar em consideração este elemento para a solução do litígio na causa principal.

18 Convém também recordar que a apreciação que o órgão jurisdicional nacional terá que fazer, com vista à solução do litígio na causa principal, quanto à existência de uma discriminação em razão do sexo, contrária aos artigos 119. do Tratado e 1. da directiva, deverá necessariamente ser feita globalmente, à luz do conjunto das considerações emitidas no contexto das respostas às segunda, terceira e quarta questões.

Quanto à segunda questão e à quarta questão, alíneas c), d), e) e g)

19 Através da segunda questão e da quarta, alíneas c), d), e) e g), que convém analisar conjuntamente, o órgão jurisdicional nacional pretende saber, por um lado, se o princípio da igualdade das remunerações, enunciado nos artigos 119. do Tratado e 1. da directiva, é aplicável quando num sistema de remuneração à peça a remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por mulheres que efectuam certo tipo de trabalho é sensivelmente inferior à remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por homens que efectuam outro tipo de trabalho ao qual é atribuído um valor igual e, por outro lado, qual é, neste contexto, a importância de factores como os mencionados na quarta questão alíneas c), d), e) e g).

20 Como resulta já do n. 12 do presente acórdão, num sistema de remuneração à tarefa ou à peça, o princípio da igualdade das remunerações exige que a remuneração atribuída a dois grupos de trabalhadores, composto um essencialmente por homens e o outro essencialmente por mulheres, seja estabelecido com base numa mesma unidade de medida.

21 Na hipótese da unidade de medida ser a mesma para os dois grupos de trabalhadores que efectuam o mesmo trabalho ou ser objectivamente susceptível de garantir aos trabalhadores dos dois grupos remunerações totais individuais idênticas para trabalhos que, embora diferentes, são considerados de valor igual, o princípio da igualdade das remunerações não proíbe que trabalhadores pertencentes a um ou a outro grupo recebam remunerações totais diferentes, desde que sejam a consequência dos resultados diferentes do trabalho individual de uns e de outros.

22 Daqui resulta que num sistema de remuneração à peça, a simples constatação de uma diferença das remunerações médias de dois grupos de trabalhadores, calculadas a partir das remunerações totais individuais do conjunto dos trabalhadores que pertencem a um ou a outro grupo, não basta para concluir pela existência de uma discriminação em matéria de remuneração.

23 Incumbe ao órgão jurisdicional nacional, o único competente para apreciar os factos, determinar se a unidade de medida aplicável aos trabalhos efectuados pelos dois grupos de trabalhadores é idêntica ou se, no caso de os dois grupos efectuarem trabalhos diferentes mas considerados de valor igual, a unidade de medida é objectivamente susceptível de lhes garantir remunerações totais idênticas. Incumbe-lhe igualmente verificar se uma diferença de remuneração invocada por um trabalhador que pertence a um grupo composto essencialmente por mulheres a fim de demonstrar a existência, em seu detrimento, duma discriminação em razão do sexo relativamente a uma trabalhador pertencente a um grupo composto essencialmente por homens, é devida a uma diferença entre as unidades de medidas aplicáveis a um e a outro grupo ou a uma diferença dos resultados individuais do trabalho.

24 Resulta todavia da jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdão de 27 de Outubro de 1993, Enderby, C-127/92, Colect., p. I-5535, n.os 13 e 14) que o ónus da prova, que incumbe normalmente ao trabalhador que propõe uma acção judicial contra a sua entidade patronal com vista a obter a supressão da discriminação de que se considera vítima, pode ser invertido quando tal se afigure necessário para não privar os trabalhadores vítimas de uma discriminação aparente de qualquer meio eficaz para fazer respeitar o princípio da igualdade das remunerações. Assim, nomeadamente, quando uma empresa aplica um sistema de remuneração caracterizado por uma total ausência de transparência, a entidade patronal tem o ónus da prova de que a sua prática salarial não é discriminatória, desde que o trabalhador feminino prove, relativamente a um número importante de assalariados, que a remuneração média dos trabalhadores femininos é inferior à dos trabalhadores masculinos (acórdão de 17 de Outubro de 1989, dito "Danfoss", Handels- of Kontorfunktionaerernes Forbund i Danmark, 109/88, Colect., p. 3199, n. 16). Da mesma forma, quando estatísticas significativas revelam uma diferença sensível da remuneração entre duas funções de valor igual, uma das quais é exercida quase exclusivamente por mulheres e a outra principalmente por homens, situação que se insere numa aparência de discriminação em razão do sexo, o artigo 119. do Tratado impõe que a entidade patronal justifique esta diferença através de factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo (acórdão Enderby, já referido, n.os 16 e 19).

25 É certo que num sistema de remuneração à peça, tal situação de discriminação aparente não existe só pelo facto de estatísticas significativas revelarem diferenças sensíveis entre as remunerações médias de dois grupos de trabalhadores, uma vez que podem ser devidas à diversidade dos resultados individuais do trabalho dos componentes dos dois grupos.

26 Todavia, quando num sistema como o do processo principal, em que as remunerações individuais tomadas em conta para o cálculo das médias dos dois grupos de trabalhadores são compostas por uma parte variável função do resultado individual do trabalho de cada um e por uma fixa, diferente conforme os grupos em questão [quarta questão, alínea e)], não seja possível deduzir quais os factores determinantes na fixação das taxas ou unidades de medida consideradas para o cálculo da parte variável da remuneração [quarta questão, alínea g)], o objectivo de não privar os trabalhadores de qualquer meio eficaz de fazerem respeitar o princípio da igualdade das remunerações pode tornar necessário impor à entidade patronal a prova de que as diferenças verificadas não são devidas a uma discriminação em razão do sexo.

27 Compete ao órgão jurisdicional nacional verificar se, tendo em conta nomeadamente estes factores e a importância das diferenças entre as remunerações médias dos dois grupos de trabalhadores, as condições de uma tal inversão do ónus da prova estão reunidas no processo principal. Em caso afirmativo, a entidade patronal poderá, por exemplo, demonstrar que as diferenças de remuneração são devidas a diferenças de escolha, pelos trabalhadores em questão, do seu ritmo de trabalho [quarta questão, alínea c)], e revelar diferenças acentuadas entre as remunerações totais individuais dentro de cada um dos dois grupos [quarta questão, alínea d)].

28 Deve, assim, responder-se à segunda questão, conjugada com a quarta questão, alíneas c), d), e) e g), que o princípio da igualdade das remunerações, enunciado no artigo 119. do Tratado e 1. da directiva, deve ser interpretado no sentido de que, num sistema de remuneração à peça, a simples constatação de que a remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por mulheres que efectuam um certo trabalho é sensivelmente inferior à de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por homens que efectuam outro tipo de trabalho ao qual é atribuído um valor igual, não basta para concluir pela existência de uma discriminação em matéria de remuneração. Todavia, quando num sistema de remuneração à peça no qual as remunerações individuais são compostas por uma parte variável, que é função do resultado do trabalho individual e por uma parte fixa diferente conforme os grupos de trabalhadores em questão, não é possível deduzir quais os factores determinantes na fixação das taxas ou unidades de medidas consideradas para o cálculo da parte variável da remuneração, a entidade patronal pode ver ser-lhe imposto o ónus da prova de que as diferenças verificadas não são devidas a uma discriminação em razão do sexo.

Quanto à terceira questão

29 Pelo que se vê do despacho de reenvio, a terceira questão, composta de duas partes, tem origem no facto de a discriminação de remuneração de que se queixa o autor no processo principal dizer respeito ao grupo dos operadores de máquinas automáticas e ao dos pintores de porcelana azul, que na realidade apenas são subgrupos dos dois grupos mais amplos, o dos oleiros e o dos pintores. O demandante justifica a sua escolha de dois grupos relativamente restritos pela necessidade de constituir, com vista à comparação a efectuar em matéria de remuneração, grupos homogéneos, nomeadamente do ponto de vista da formação dos trabalhadores que deles fazem parte. Assim, a demandante considera legítimo distinguir, dentro do grupo dos pintores, o dos pintores de porcelana azul, formados num ano e meio, do dos pintores de pratos decorativos, formados em três meses. Constatando além disso que as exigências de formação dos pintores de porcelana azul são mais elevadas do que a dos operadores de máquinas automáticas que, contrariamente aos outros oleiros, apenas seguem uma aprendizagem de um a quatro meses, em função dos objectos que serão chamados a produzir, a demandante alega que uma vez admitido o valor igual do seu trabalho, a remuneração dos primeiros devia mesmo ser superior à dos segundos. A demandante considera finalmente que o facto de as condições de trabalho dos pintores de porcelana azul serem diferentes das dos operadores de máquinas automáticas não é susceptível de retirar à diferença de remuneração constatada o seu carácter discriminatório dado que o esforça físico que sobrecarrega os operadores de máquinas automáticas é contrabalançado pelas qualidades de destreza exigidas dos pintores de porcelana azul e os incómodos em matéria de ruído e de temperatura que afectam os primeiros encontram a sua contrapartida nos problemas ergonómicos que derivam do trabalho sedentário e monótono dos segundos.

30 Ainda segundo o despacho de reenvio, se, por um lado, o grupo dos operadores de máquinas automáticas remunerados à peça, composto por 26 pessoas apenas, é constituído exclusivamente por homens, o dos oleiros remunerados à peça, que abrange 143, é composto por 70% de homens e 30% de mulheres. Além disso, enquanto o grupo dos pintores de porcelana azul remunerados à peça é composto por 155 mulheres e 1 homem e o dos pintores de pratos decorativos remunerados à peça por 51 mulheres, o dos pintores remunerados à peça, composto por 317 pessoas, é constituído por 95% de mulheres e 5% de homens. Finalmente, embora a remuneração média do grupo dos operadores de máquinas automáticas remunerados à peça, composto exclusivamente por homens, seja superior à do grupo dos pintores de porcelana azul remunerados à peça, composto, com uma única excepção, exclusivamente por mulheres, aquela remuneração é inferior à do grupo dos pintores de pratos decorativos remunerados à peça, composto exclusivamente por mulheres.

31 Nestas condições, com a terceira questão lida no seu conjunto o órgão jurisdicional nacional pretende saber se, num sistema de remuneração à peça, os grupos de trabalhadores cujas remunerações médias devem ser comparadas para verificar a existência de discriminação em razão do sexo devem ser compostos em função de critérios determinados, relativos, nomeadamente, ao número de trabalhadores que dele fazem parte e à sua proporção relativamente à totalidade dos trabalhadores, ou se, por meio de critérios escolhidos arbitrariamente, podem ser compostos de forma a abranger exclusivamente homens ou mulheres e permitirem, eventualmente, atingir, através de uma comparação entre dois grupos de trabalhadores compostos respectivamente por homens e por mulheres, a igualdade das remunerações entre dois grupos de trabalhadores compostos por mulheres, cuja remuneração média de um é inferior e a de outro superior à do grupo composto por homens.

32 Neste contexto, é de constatar que a apreciação do respeito do princípio da igualdade das remunerações implica uma comparação entre remunerações pagas a trabalhadores de sexo diferente por um mesmo trabalho ou por trabalhos aos quais é atribuído um valor igual.

33 Quando tal comparação incide sobre as remunerações médias dos dois grupos de trabalhadores remunerados à peça deve, para ser pertinente, incidir sobre grupos abrangendo cada um a totalidade dos trabalhadores que, tendo em conta um conjunto de factores, como a natureza do trabalho, as condições de formação e as condições de trabalho, podem ser considerados como encontrando-se numa situação comparável.

34 A comparação deve além disso incidir sobre um número relativamente importante de trabalhadores para excluir que as diferenças constatadas sejam a expressão de fenómenos puramente fortuitos ou conjunturais, ou a diferenças nos resultados individuais do trabalho dos trabalhadores em questão.

35 Compete ao órgão jurisdicional nacional proceder às apreciações necessárias dos factos da causa principal à luz dos critérios acima referidos.

36 Decorre, todavia, do que antecede que uma comparação não é pertinente quando incide sobre grupos compostos arbitrariamente de forma a abranger um essencialmente mulheres e o outro essencialmente homens, isto com vista a atingir, através de comparações sucessivas, o alinhamento das remunerações do grupo composto essencialmente por mulheres com as de outro grupo também ele composto arbitrariamente de forma a abranger essencialmente mulheres.

37 Pode constituir um indício de tal composição arbitrária dos grupos a comparar o facto de no interior de um grupo mais amplo composto essencialmente por mulheres, ser feita uma distinção entre dois subgrupos em função das diferenças nas condições de formação e de depois não ser tomado em consideração, para a comparação em matéria de remuneração a efectuar com um grupo composto essencialmente por homens, o facto de dois subgrupos compostos essencialmente por mulheres que apresenta mais similitude, no domínio das condições de formação, com o grupo essencialmente composto por homens.

38 Deve, pois, responder-se à terceira questão que, com vista à comparação das remunerações médias de dois grupos de trabalhadores remunerados à peça, o órgão jurisdicional nacional deve certificar-se de que os dois grupos abrangem, cada um, a totalidade dos trabalhadores que, tendo em conta um conjunto de factores, tais como a natureza do trabalho, as condições de formação e de trabalho, podem ser considerados numa situação comparável e que abrangem um número relativamente importante de trabalhadores que exclui que as diferenças verificadas sejam a expressão de fenómenos puramente fortuitos ou conjunturais, ou sejam devidas a diferenças nos resultados individuais do trabalho dos trabalhadores em questão.

Quanto à quarta questão, alíneas a), f), h) e i)

39 Quanto à quarta questão, alíneas a), f), h) e i), o órgão jurisdicional nacional pergunta qual a importância que se deve atribuir, quando da verificação do respeito do princípio da igualdade das remunerações, a elementos como, por um lado, o facto de o trabalho efectuado por um dos grupos de trabalhadores em causa ser um trabalho à máquina e apelar mais especificamente à força muscular, ao passo que o efectuado pelo outro grupo é um trabalho manual que exige mais especificamente destreza, e, por outro lado, o facto de existirem diferenças entre o trabalho dos dois grupos no que se refere às pausas remuneradas e à liberdade na organização no trabalho, assim como aos incómodos a ele ligados.

40 Deve, antes de mais, sublinhar-se que só pode haver discriminação em razão do sexo entre dois grupos de trabalhadores se efectuarem senão o mesmo trabalho pelo menos um trabalho ao qual é atribuído um valor igual.

41 Deve depois recordar-se que uma diferença em matéria de remuneração entre dois tipos de trabalhadores não constitui uma discriminação contrária ao artigo 119. do Tratado e à directiva se puder ser explicada por factores objectivamente justificados e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo (v. nomeadamente acórdão de 13 de Maio de 1986, Bilka, 170/84, Colect., p. 1607, n. 30).

42 O órgão jurisdicional nacional, o único competente para apreciar os factos, deve em consequência determinar se, tendo em conta elementos de facto relativos à natureza dos trabalhos efectuados e às condições em que são efectuados, lhes pode ser atribuído valor igual ou se estes elementos podem ser considerados factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo susceptíveis de justificar eventuais diferenças de remuneração.

43 Assim, deve responder-se à quarta questão, alíneas a), f), h) e i), que, quando da verificação do respeito do princípio da igualdade das remunerações, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se, tendo em conta elementos como, por um lado, o facto de o trabalho efectuado por um dos grupos de trabalhadores em causa ser um trabalho à máquina e apelar mais especificamente à força muscular, enquanto que o efectuado pelo outro grupo é um trabalho manual que exige mais particularmente destreza e, por outro, o facto de existirem diferenças entre o trabalho dos dois grupos no que se refere às pausas remuneradas e à liberdade de organização no trabalho, assim como aos incómodos ligados ao trabalho, os dois tipos de trabalho têm um valor igual ou se estes elementos podem ser considerados factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo susceptíveis de justificar eventuais diferenças de remuneração.

Quanto à quarta questão alínea b)

44 Através da quarta questão, alínea b), o órgão jurisdicional nacional pergunta qual a importância a atribuir, em matéria de igualdade das remunerações entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos, ao facto de os elementos de remuneração serem fixados por negociações colectivas ou por negociações de âmbito local.

45 A este propósito importa recordar que, uma vez que o artigo 119. do Tratado tem carácter imperativo, a proibição das discriminações entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos impõe-se não apenas à acção das autoridades públicas, mas é igualmente extensiva a todas as convenções que visam regular de forma colectiva o trabalho assalariado, assim como aos contratos entre particulares (v. nomeadamente acórdão de 8 de Abril de 1976, Defrenne, 43/75, Colect., p. 455, n. 39).

46 Também não deixa de ser de considerar o facto de os elementos de remuneração terem sido fixados por negociações colectivas ou por negociações de âmbito local pode ser tomado em consideração pelo órgão jurisdicional nacional enquanto elemento que lhe permita apreciar se as diferenças entre as remunerações médias de dois grupos de trabalhadores são devidas a factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo.

47 Assim, deve responder-se à quarta questão, alínea b), que o princípio da igualdade das remunerações entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos é igualmente aplicável quando os elementos da remuneração são fixados por negociações colectivas ou por negociações de âmbito local, mas o órgão jurisdicional nacional pode tomar em consideração este facto para apreciar se as diferenças entre as remunerações médias dos dois grupos de trabalhadores são devidas a factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

48 As despesas efectuadas pelos Governos alemão, português e do Reino Unido, assim como pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo faglige voldgiftsret, por despacho de 27 de Agosto de 1993, declara:

1) O artigo 119. do Tratado e a Directiva 75/117/CEE do Conselho, de 10 de Fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros no que se refere à aplicação do princípio da igualdade de remuneração entre os trabalhadores masculinos e femininos aplicam-se aos sistemas de remuneração à peça nos quais a remuneração é, na totalidade ou no essencial, função do resultado individual do trabalho de cada trabalhador.

2) O princípio da igualdade das remunerações, enunciado no artigo 119. do Tratado e 1. da Directiva 75/117, deve ser interpretado no sentido de que, num sistema de remuneração à peça, a simples constatação de que a remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por mulheres que efectuam um certo trabalho é sensivelmente inferior à remuneração média de um grupo de trabalhadores composto essencialmente por homens que efectuam outro tipo de trabalho ao qual é atribuído um valor igual, não basta para concluir pela existência de uma discriminação em matéria de remuneração. Todavia, quando num sistema de remuneração à peça no qual as remunerações individuais são compostas por uma parte variável que é função do resultado individual do trabalho de cada trabalhador e por uma parte fixa diferente conforme os grupos de trabalhadores em questão, não é possível deduzir quais os factores determinantes na fixação das taxas ou unidades de medidas consideradas para o cálculo da parte variável da remuneração, a entidade patronal pode ver ser-lhe imposto o ónus da prova de que as diferenças verificadas não são devidas a uma discriminação em razão do sexo.

3) Com vista à comparação entre as remunerações médias de dois grupos de trabalhadores remunerados à peça, o órgão jurisdicional nacional deve certificar-se de que os dois grupos abrangem cada um a totalidade dos trabalhadores que, tendo em conta um conjunto de factores, tais como a natureza do trabalho, as condições de formação e as condições de trabalho, podem ser considerados numa situação comparável e que abrangem um número relativamente importante de trabalhadores que exclui que as diferenças verificadas sejam a expressão de fenómenos puramente fortuitos ou conjunturais ou sejam devidas a diferenças nos resultados individuais do trabalho dos trabalhadores em questão.

4) Quando da verificação do respeito do princípio da igualdade das remunerações, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se, tendo em conta elementos como, por um lado, o facto de o trabalho efectuado por um dos grupos de trabalhadores em causa ser um trabalho à máquina e apelar mais especificamente à força muscular, enquanto o efectuado pelo outro grupo é um trabalho manual que exige mais particularmente destreza e, por outro, o facto de existirem diferenças entre o trabalho dos dois grupos no que se refere às pausas remuneradas e à liberdade de organização no trabalho, assim como aos incómodos ligados ao trabalho, os dois tipos de trabalho têm um valor igual ou se estes elementos podem ser considerados como constituindo factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo susceptíveis de justificar eventuais diferenças de remuneração.

5) O princípio da igualdade das remunerações entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos é igualmente aplicável quando os elementos da remuneração são fixados por negociações colectivas ou negociações de âmbito local, mas o órgão jurisdicional nacional pode tomar em consideração este facto para apreciar se as diferenças entre as remunerações médias dos dois grupos de trabalhadores são devidas a factores objectivos e alheios a qualquer discriminação em razão do sexo.