Bruxelas, 20.5.2016

COM(2016) 269 final

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

sobre os potenciais riscos para a saúde pública relacionados com o uso de cigarros eletrónicos recarregáveis


Antecedentes e contexto

O artigo 20.º, n.º 10, da Diretiva 2014/40/UE 1 («Diretiva relativa aos produtos do tabaco» ou «DPT») estabelece que a Comissão Europeia deve apresentar um relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os potenciais riscos para a saúde pública relacionados com o uso de cigarros eletrónicos recarregáveis («cigarros eletrónicos»). Aquando da adoção da DPT, existiam dúvidas quanto aos riscos dos cigarros eletrónicos recarregáveis para os utilizadores e consumidores, devido às suas características específicas, que permitem aos utilizadores entrar em contacto direto com os líquidos de enchimento que contêm nicotina e outros ingredientes que podem ter efeitos adversos para a saúde.

Importa salientar que o presente relatório identifica os riscos específicos que podem estar associados aos cigarros eletrónicos e suas recargas, conforme solicitado pelos colegisladores. O relatório não tem por objetivo estabelecer comparações entre os cigarros recarregáveis e outros tipos de cigarros eletrónicos, e não considera o potencial impacto na saúde pública dos cigarros eletrónicos em geral (tais como a iniciação, a cessação, a dupla utilização e os efeitos a longo prazo para a saúde).

Os cigarros eletrónicos são produtos relativamente novos no mercado da UE e só agora começam a surgir provas dos seus potenciais riscos e benefícios. Nesta fase, a Comissão e os Estados-Membros estão a monitorizar as provas científicas, os perfis de utilização e a evolução do mercado no que respeita a todos os tipos de cigarros eletrónicos. Estes elementos de prova serão também tidos em conta para a elaboração do relatório sobre a aplicação da Diretiva relativa aos produtos do tabaco, a apresentar pela Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões nos termos do artigo 28.º da DPT 2 .

O presente relatório foi elaborado com elementos originários do estudo PRECISE elaborado por um contratante externo 3 . Este estudo analisou a literatura científica disponível sobre os riscos para a saúde decorrentes dos cigarros eletrónicos recarregáveis, dados provenientes de centros antivenenos da UE em oito Estados-Membros, e as análises químicas efetuadas sobre amostras de cigarros eletrónicos. Além disso, o contratante realizou um inquérito junto das empresas de cigarros eletrónicos para determinar quais eram, para essas empresas, os principais riscos associados aos cigarros eletrónicos recarregáveis. A Comissão considerou cuidadosamente os riscos dos cigarros eletrónicos recarregáveis identificados pelos Estados-Membros e debateu o relatório com o grupo de peritos sobre política do tabaco e o subgrupo sobre cigarros eletrónicos 4 . O presente relatório contém também informações baseadas em debates com autoridades reguladoras internacionais.

Regulamentação dos cigarros eletrónicos ao abrigo da Diretiva relativa aos produtos do tabaco

O artigo 20.º da DPT estabelece uma série de requisitos de segurança e qualidade aplicáveis aos cigarros eletrónicos que contêm nicotina destinados ao mercado de consumo. Estes cigarros eletrónicos de consumo podem ser descartáveis, recarregáveis com um cartucho ou recarregáveis por meio de recargas que contêm um líquido de enchimento.

Os fabricantes e os importadores devem notificar os seus produtos às autoridades competentes dos Estados-Membros (artigo 20.º, n.º 2). Esta notificação deve ser acompanhada de informações relativas a ingredientes e emissões, dados toxicológicos, informações sobre as doses e a absorção de nicotina, bem como uma descrição do produto e do processo de produção. Os fabricantes devem também apresentar anualmente aos Estados-Membros dados sobre as vendas e informações sobre as preferências dos consumidores (artigo 20.º, n.º 7). Os fabricantes e os importadores devem recolher informações sobre as suspeitas de efeitos adversos para a saúde humana e tomar medidas corretivas imediatas caso considerem que os seus produtos não são seguros (artigo 20.º, n.º 9).

A DPT estabelece limites para o teor de nicotina dos cigarros eletrónicos e suas recargas. Os líquidos de enchimento não podem conter mais de 20 mg/ml de nicotina (artigo 20.º, n.º 3, alínea b)), os reservatórios e os cartuchos não devem ter volume superior a 2 ml, e as recargas não devem ter volume superior a 10 ml (artigo 20.º, n.º 3, alínea a)). Os cigarros eletrónicos e as recargas devem ser também seguros para as crianças e invioláveis e devem ser vendidos com instruções de utilização e advertências relativas à saúde (artigo 20.º, n.º 3, alínea g), n.º 4, alíneas a) e b)).

Potenciais riscos para a saúde pública

A Comissão identificou quatro grandes riscos relacionados com o uso de cigarros eletrónicos recarregáveis. Esses riscos são os seguintes: 1) envenenamento pela ingestão dos líquidos de enchimento que contêm nicotina (especialmente para as crianças pequenas), 2) reações da pele relacionadas com o contacto por via cutânea com os líquidos de enchimento com nicotina e outros produtos irritantes para a pele, 3) riscos associados às misturas caseiras, e 4) riscos devidos à utilização de combinações não testadas de líquidos de enchimento e dispositivos ou da personalização dos dispositivos.

1. Ingestão acidental de líquido de enchimento

Os cigarros eletrónicos recarregáveis e as suas recargas são, na maior parte dos casos, sistemas abertos que permitem o acesso direto aos líquidos que contêm nicotina. A nicotina é um alcaloide que está presente na planta do tabaco. É um estimulante que atua sobre o sistema nervoso parassimpático e é a principal causa da dependência dos produtos do tabaco. Tratando-se de uma droga que provoca uma forte dependência, a nicotina é também altamente tóxica (letal) por todas as vias de exposição em doses suficientemente elevadas.

No seu parecer sobre a reclassificação da nicotina, o Comité de Avaliação dos Riscos (RAC) da Agência Europeia dos Produtos Químicos considerou que 5 mg por kg de peso corporal constituía uma estimativa fundamentada para a toxicidade aguda da nicotina através de uma exposição oral 5 . Este valor para a estimativa da toxicidade aguda (ATE) é da mesma ordem de grandeza que o apontado por Mayer (2014) que estimou o limite inferior que provocava desenlaces fatais entre 0,5-1 g de nicotina ingerida, correspondente a uma DL50 por via oral de 6,5-13 mg por kg de peso corporal para o ser humano 6 , 7 . Isto traduz-se em 390-780 mg de nicotina para um adulto com 60 kg e em 65-130 mg para uma criança com 10 kg.

Com base nos limites estabelecidos na DPT, os cigarros eletrónicos recarregáveis podem conter até 40 mg de nicotina e as suas recargas podem conter até 200 mg de nicotina. Existe, por conseguinte, um risco especial para as crianças de tenra idade se, por lapso, ingerirem o líquido de enchimento, sobretudo a partir de uma recarga. Os meios de comunicação relataram envenenamentos letais de crianças pequenas com esses líquidos de enchimento nos EUA e em Israel 8 .

O estudo PRECISE encomendado pela DG Saúde e Segurança dos Alimentos analisou 277 casos de envenenamento com nicotina comunicados aos centros antivenenos em oito Estados-Membros (Áustria, Hungria, Irlanda, Lituânia, Países Baixos, Portugal, Suécia e Eslovénia), de janeiro de 2012 a março de 2015 9 . Revelou-se que 87,3 % dos casos estavam relacionados com líquidos de enchimento, 0,7 % com cigarros eletrónicos não recarregáveis e 12 % com tipos desconhecidos de produtos (o que pode, em parte, ser explicado pela sua elevada quota de mercado). Dos casos estudados, 71,3 % diziam respeito a um envenenamento acidental. Globalmente, 67,5 % dos casos seguiram-se à ingestão de líquidos de enchimento. Em termos demográficos, 33,2 % dos casos relacionavam-se com crianças com cinco anos ou menos, 9,7 % com crianças e jovens entre os 6 e os 18 anos e 57 % com adultos com mais de 18 anos de idade. No que diz respeito às consequências, em 23,7 % dos casos foi necessária uma hospitalização e em 6,8 % os efeitos foram moderados ou graves. Estes resultados são semelhantes aos dados provenientes de centros antivenenos nos EUA 10 .

Por último, convém igualmente referir que nos líquidos de enchimento são utilizados muitos aromas diferentes, alguns dos quais estão classificados como perigosos para a saúde no âmbito do Regulamento CRE 11 e justificam uma investigação mais aprofundada.

Como reduzir os riscos?

A fim de reduzir o risco de ingestão acidental dos líquidos de enchimento com nicotina, as recargas e os próprios cigarros eletrónicos devem ser seguros para as crianças, tal como se estabelece no artigo 20.º, n.º 3, alínea g). Os cigarros eletrónicos recarregáveis e as suas recargas devem também ser vendidos com instruções adequadas para a utilização e o armazenamento, a fim de evitar a ingestão acidental do líquido de enchimento por crianças ou adultos, e com advertências para grupos de risco específicos (artigo 20.º, n.º 4, alínea a), subalíneas i) e iii)). Devem também conter uma lista dos ingredientes e ser rotulados com advertências de saúde adequadas a fim de comunicar os potenciais riscos para a saúde dos consumidores (DPT artigo 20.º, n.º 4, alínea b), e Regulamento CRE). A percentagem relativamente elevada de envenenamentos que envolvem adultos com mais de 18 anos (57 %) sugere igualmente a necessidade de aumentar a sensibilização dos cidadãos para a toxicidade dos líquidos de enchimento que contêm nicotina, eventualmente através de campanhas nacionais de sensibilização.

Para além destes requisitos de precaução, é também importante estabelecer outros requisitos para os cigarros eletrónicos, tais como os que constam do artigo 20.º, n.º 3, alíneas a) e b), que asseguram que as recargas com líquido de enchimento não contenham níveis excessivos de nicotina (que podem ser letais para crianças e adultos).

2. Contacto cutâneo

Os cigarros eletrónicos recarregáveis implicam que os utilizadores recarreguem o dispositivo diretamente com líquido de enchimento, geralmente por meio de um pequeno frasco ou de uma recarga. Há o risco de que, ao abrir ou reencher os cigarros eletrónicos recarregáveis, o líquido de enchimento se derrame e entre em contacto com a pele. Os líquidos de enchimento contêm substâncias que são tóxicas por exposição cutânea (nicotina) ou podem ser irritantes para a pele (propilenoglicol e aromas) 12 .

No seu parecer sobre a reclassificação da nicotina, o Comité de Avaliação dos Riscos (RAC) da Agência Europeia dos Produtos Químicos 13 considerou que 70 mg por kg de peso corporal constituía uma estimativa fundamentada para a toxicidade aguda da nicotina através de uma exposição cutânea 14 . Este valor para a ATE é idêntico ao valor da DL50 derivado de dados obtidos em animais, uma vez que a dose letal de nicotina por via cutânea em humanos é, em grande medida, desconhecida. Isto significa que, nas concentrações permitidas pela DPT, a quantidade de líquido de enchimento necessária para produzir um efeito tóxico agudo por exposição cutânea em humanos é de 35 ml para uma criança pequena e 210 ml para um adulto com 60 kg. Estas quantidades são superiores à dimensão máxima de uma recarga autorizada pela DPT. Na sua análise dos dados dos centros antivenenos, o estudo PRECISE verificou igualmente que 10 % dos casos comunicados estavam relacionados com uma exposição cutânea.

O propilenoglicol, um importante componente de muitos líquidos de enchimento, também parece ter efeitos ligeiramente irritantes e sensibilizantes na pele humana 15 . Alguns componentes aromatizantes foram igualmente declarados voluntariamente como sensibilizantes ou irritantes cutâneos no inventário de classificação e rotulagem da Agência Europeia dos Produtos Químicos 16 .

Como reduzir os riscos?

A fim de reduzir o risco de contacto cutâneo com líquidos de enchimento com nicotina, as recargas e os próprios cigarros eletrónicos devem ser seguros para as crianças e à prova de derrame (artigo 20.º, n.º 3, alínea g)). Devem igualmente ser concebidos de forma que possam ser recarregados sem derrames, tal como se estabelece no artigo 20.º, n.º 3, alínea g), e novamente se especifica na Decisão de Execução (UE) 2016/586 da Comissão 17 . Os cigarros eletrónicos recarregáveis e as suas recargas também têm de ser vendidos com instruções adequadas de utilização e armazenamento, a fim de assegurar que os utilizadores e outras pessoas não entram em contacto acidentalmente com o líquido de enchimento ao manusearem os cigarros eletrónicos, e com informações sobre os possíveis efeitos adversos (artigo 20.º, n.º 4, alínea a), subalíneas i) e iv)). Os cigarros eletrónicos devem ser rotulados em conformidade com os requisitos estabelecidos na DPT (artigo 20.º, n.º 4, alínea b)) e com requisitos constantes de outros diplomas legislativos pertinentes da UE (tal como o Regulamento CRE).

3. Mistura ou personalização de líquidos

Ao contrário dos cigarros eletrónicos descartáveis ou recarregáveis com cartuchos, os cigarros eletrónicos recarregáveis com líquido proporcionam aos utilizadores uma maior flexibilidade para escolher o líquido que utilizam nos seus dispositivos. Embora a maioria dos utilizadores adquira líquidos de enchimento pré-misturados, alguns utilizadores preferem misturar os seus próprios líquidos em casa, comprando os ingredientes separadamente (mistura caseira ou mistura para consumo próprio) 18 . Os cigarros eletrónicos recarregáveis podem ainda permitir que os utilizadores «personalizem» o seu líquido de enchimento de acordo com as suas preferências pessoais, por exemplo a mistura de aromas. Há vários riscos associados a estas práticas.

Em primeiro lugar, a mistura caseira requer que os utilizadores comprem nicotina em concentrações elevadas. Os líquidos de enchimento, por exemplo, são vendidos em frascos de 50 ml com 72 mg/ml de nicotina (3,6 g de nicotina por frasco) 19 . Como referido anteriormente, existem riscos para os utilizadores e outras pessoas se se conservar em casa líquidos com nicotina em concentrações elevadas e se os mesmos forem manipulados de forma inadequada. Existe igualmente o risco de os consumidores não diluírem a solução corretamente, o que pode resultar numa concentração de nicotina muito mais elevada do que o previsto no líquido de enchimento final. Embora a DPT introduza níveis máximos para a concentração de nicotina nos cigarros eletrónicos (os líquidos de enchimento não podem conter mais de 20 mg/ml de nicotina) e limite o volume das recargas (não pode ser superior a 10 ml), existe o risco de que a mistura caseira possa igualmente permitir que os utilizadores contornem os limites fixados para os cigarros eletrónicos na DPT (através da compra de nicotina a concentrações elevadas ou de nicotina em pó, se os Estados-Membros não exercerem um controlo adequado).

A DPT exige que os fabricantes ou os importadores apresentem dados sobre estudos toxicológicos (artigo 20.º, n.º 2, alínea c)) e garantam que nos líquidos de enchimento só são utilizados ingredientes de elevada pureza (artigo 20.º, n.º 3, alínea d)). A mistura caseira poderia implicar a utilização pelos consumidores de líquidos de enchimento não testados, com ingredientes inadequados.

Em segundo lugar, muitos dos aromas atualmente utilizados nos líquidos de enchimento não foram testados para utilização nesses líquidos e não se sabe se são seguros para serem inalados. Estão a surgir provas de que alguns aromas não são seguros quando utilizados nos cigarros eletrónicos 20 . Um motivo de preocupação é o facto de os cigarros eletrónicos recarregáveis permitirem que os utilizadores continuem a utilizar aromas não testados ou não seguros. Os utilizadores também podem vir a misturar aromas com efeitos desconhecidos (quer mediante as misturas caseiras quer acrescentando aromas aos líquidos de enchimento comprados («personalização»)). Desconhecem-se também os riscos para a saúde da exposição secundária aos vapores desses líquidos de enchimento de mistura para uso próprio 21 .

Uma preocupação adicional é a de que os cigarros eletrónicos recarregáveis possam ser utilizados com substâncias ilegais, como o tetra-hidrocanabinol (THC). Num estudo de 3 847 estudantes nos Estados Unidos, 5,4 % tinham utilizado os cigarros eletrónicos para vaporizar canábis. Dos que já tinham usado cigarros eletrónicos, 18 % tinham-se servido deles para vaporizar canábis 22 .

Como reduzir os riscos?

A fim de diminuir os riscos associados à mistura caseira ou à personalização dos líquidos de enchimento, os Estados-Membros devem assegurar que os fabricantes e os importadores respeitam os limites de concentração da nicotina estabelecidos na DPT. A DPT não permite os líquidos de enchimento com concentrações superiores a 20 mg/ml nem em recipientes de volume superior a 10 ml. Do mesmo modo, a nicotina em líquidos de elevada concentração ou a nicotina em pó destinadas a outros fins, como por exemplo as utilizações industriais, não devem estar facilmente acessíveis para venda aos consumidores. Se tal não for já o caso, os Estados-Membros devem igualmente considerar a possibilidade de regulamentar ou limitar a venda dessas soluções ou desses pós. As autoridades devem também assegurar que os óleos ou líquidos com THC ou outras substâncias ilícitas não são vendidos aos consumidores nos Estados-Membros em que não estejam autorizados.

Os Estados-Membros devem igualmente monitorizar as notificações e conduzir investigações sobre o perfil toxicológico dos líquidos de enchimento e das emissões no que se refere aos aromas e às misturas de aromas em produtos notificados. Os Estados-Membros devem monitorizar atentamente os elementos de prova sobre os riscos para a saúde decorrentes dos aromas. À medida que surgirem elementos de prova adicionais, pode justificar-se que os Estados-Membros proíbam certos aromas para utilização nos líquidos de enchimento (tal como referido no considerando 47 da DPT, a responsabilidade da adoção das regras relativas aos aromas continua a pertencer aos Estados-Membros).

4. Utilização de líquidos de enchimento com dispositivos não testados e personalização dos dispositivos

Os cigarros eletrónicos recarregáveis permitem que os utilizadores combinem os líquidos de enchimento e os dispositivos e personalizem os seus dispositivos através da aquisição de componentes separadamente e da «construção» do seu próprio dispositivo (também conhecido como personalização dos dispositivos) 23 .

Estudos demonstraram igualmente que se o líquido de enchimento for aquecido a temperaturas mais elevadas, observa-se um aumento das emissões tóxicas 24 .

Por conseguinte, existe um risco de que a combinação do dispositivo com o líquido de enchimento escolhida pelo utilizador não tenha sido adequadamente testada, em particular no que se refere à segurança das emissões produzidas. A personalização do dispositivo pode ainda significar que os utilizadores podem reforçar os cigarros eletrónicos com baterias potentes, aumentando a quantidade de emissões tóxicas, embora se deva referir que o vapor aquecido a uma temperatura muito elevada pode não ter um sabor agradável para os utilizadores.

Existem também riscos para os utilizadores decorrentes da utilização de componentes não testados ou inadequados, como a lixiviação de metais para o líquido de enchimento ou explosões das baterias 25 . De acordo com o artigo 20.º, n.º 2, alíneas e) a g), da DPT, os fabricantes e os importadores devem incluir uma descrição dos componentes utilizados, do processo de produção e uma declaração de que assumem plena responsabilidade pela segurança e qualidade dos produtos que colocam no mercado.

Como reduzir os riscos?

Os Estados-Membros devem assegurar, aquando da aplicação da DPT, que os fabricantes e importadores de cigarros eletrónicos não vendem componentes não testados e que todos os componentes notificados foram submetidos a ensaios adequados para garantir a sua segurança. Os Estados-Membros devem também garantir que os fabricantes e os importadores, ao notificarem informações sobre os líquidos de enchimento, atendem às condições em que pode razoavelmente esperar-se que venham a ser utilizados pelos consumidores.

Os Estados-Membros devem igualmente assegurar que as notificações recebidas ao abrigo da DPT refletem rigorosamente se determinados componentes ou dispositivos têm um potencial para afetar significativamente a qualidade das emissões produzidas ou aumentar a sua toxicidade, consoante o modo como são utilizados. Os Estados-Membros deverão também assegurar que, quando são tomadas medidas sobre produtos perigosos que representem um risco para a saúde e a segurança dos consumidores, as mesmas são notificadas através do sistema de alerta rápido para produtos não alimentares perigosos («RAPEX») 26 , permitindo que outros países, em cujos mercados nacionais se possa encontrar o mesmo produto, tomem as medidas necessárias para impedir que esse produto perigoso continue a ser vendido.

Conclusões

A utilização de cigarros eletrónicos recarregáveis e a potencial exposição a líquidos de enchimento com nicotina em concentrações elevadas podem constituir um risco para a saúde pública. No contexto dos atuais conhecimentos científicos, as medidas relativas aos cigarros eletrónicos recarregáveis estabelecidas na DPT bem como na legislação secundária 27 , combinadas com a regulamentação nacional, fornecem um quadro adequado e proporcionado para a redução dos riscos. Tal não exclui, no entanto, a necessidade de um estudo mais aprofundado destes produtos e da sua segurança para os consumidores (nomeadamente no que se refere ao envenenamento por ingestão acidental de líquido de enchimento e ao perfil de risco dos aromas). É igualmente necessário aumentar a sensibilização entre os cidadãos para a toxicidade dos líquidos de enchimento que contêm nicotina, o que poderia ser alcançado através de campanhas nacionais de sensibilização.

Os Estados-Membros e a Comissão devem monitorizar atentamente o mercado dos cigarros eletrónicos recarregáveis, bem como as notificações recebidas ao abrigo do artigo 20.º, n.º 2, da DPT. Deve igualmente continuar a investigar-se certos aspetos dos cigarros eletrónicos relevantes para os cigarros recarregáveis, tais como o ensaio das emissões e a segurança dos aromas ou misturas de aromas. A realização de investigações complementares sobre estes temas seria benéfica para todos os utilizadores de cigarros eletrónicos (descartáveis, recarregáveis com cartuchos e recarregáveis com líquido).

(1)

Diretiva 2014/40/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de abril de 2014, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros no que respeita ao fabrico, apresentação e venda de produtos do tabaco e produtos afins e que revoga a Diretiva 2001/37/CE (JO L 127 de 29.4.2014, p. 1).

(2)

O artigo 28.º, n.º 1, da DPT determina que «No prazo de cinco anos a contar de 20 de maio de 2016 e, posteriormente, sempre que necessário, a Comissão apresenta um relatório sobre a aplicação da presente diretiva ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões.».

(3)

EAHC/2013/Health/17: Potential Risks from Electronic Cigarettes and their Technical Specifications in Europe (PRECISE) (Potenciais riscos dos cigarros eletrónicos e suas especificações técnicas na Europa).

(4)

Decisão da Comissão de 4 de junho de 2014 que cria o grupo de peritos sobre política do tabaco, C(2014) 3509 final.

(5)

Parecer do Comité de Avaliação dos Riscos (RAC) da Agência Europeia dos Produtos Químicos que propõe uma classificação e uma rotulagem harmonizadas da nicotina a nível da UE (ISO). Adotado em 10 de setembro de 2015. http://echa.europa.eu/documents/10162/f9510930-4e5e-45ff-bb3a-888cefaf6592 .

(6)

 O valor da DL50 é uma dose que, quando administrada a animais num ensaio de toxicidade aguda, se espera que provoque a morte de 50 % dos animais expostos durante um período determinado.

(7)

Mayer B. How much nicotine kills a human? Tracing back the generally accepted lethal dose to dubious self-experiments in the nineteenth century (Quanta nicotina mata um ser humano? Identificação da dose letal geralmente aceite em experiências duvidosas no século XIX). Arch Toxicol 2014;88:5-7.

(8)

  http://www.nydailynews.com/news/national/1-year-old-n-y-boy-dies-ingesting-liquid-nicotine-article-1.2045532 e http://www.timesofisrael.com/police-investigating-toddler-death-from-nicotine-overdose/ .

(9)

EAHC/2013/Health/17: Potential Risks from Electronic Cigarettes and their Technical Specifications in Europe (PRECISE) (Potenciais riscos dos cigarros eletrónicos e suas especificações técnicas na Europa).

(10)

Vakkalanka, J.P et al. Epidemiological trends in electronic cigarette exposures reported to U.S. Poison Centers (Tendências epidemiológicas nas exposições a cigarros eletrónicos comunicadas a centros antivenenos nos EUA). Clinical Toxicology, 2014;52(5): p. 542-548.

(11)

 Regulamento (CE) n.º 1272/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas, que altera e revoga as Diretivas 67/548/CEE e 1999/45/CE, e altera o Regulamento (CE) n.º 1907/2006 (JO L 353 de 31.12.2008, p. 1).

(12)

Apresentação da Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) ao subgrupo sobre cigarros eletrónicos, em 14 de março de 2016.

(13)

  http://echa.europa.eu/about-us/who-we-are/committee-for-risk-assessment .

(14)

Parecer do Comité de Avaliação dos Riscos (RAC) da Agência Europeia dos Produtos Químicos que propõe uma classificação e uma rotulagem harmonizadas da nicotina a nível da UE (ISO). Adotado em 10 de setembro de 2015. http://echa.europa.eu/documents/10162/f9510930-4e5e-45ff-bb3a-888cefaf6592 .

(15)

Conselho da Saúde dos Países Baixos. Propilenoglicol (1,2-propanodiol); Valor-limite de exposição profissional recomendado com base em dados de saúde. Haia: Conselho da Saúde dos Países Baixos, 2007; Publicação n.º 2007/02OSH.

(16)

  http://echa.europa.eu/eu/information-on-chemicals/cl-inventory-database .

(17)

 Decisão de Execução (UE) 2016/586 da Comissão, de 14 de abril de 2016, sobre as normas técnicas para o mecanismo de enchimento de cigarros eletrónicos (JO L 101 de 16.4.2016, p. 15).

(18)

 De acordo com a organização industrial ECITA, a mistura caseira está limitada a menos de 5 % do mercado,  http://ec.europa.eu/health/tobacco/docs/ev_20131122_mi_en.pdf .

(19)

  https://www.totallywicked-eliquid.com/50 ml-titanium-ice-72 mg-unflavoured-3-bottle-multipack.html .

(20)

Barrington-Trimis, J.L et al. Flavourings in electronic cigarettes: an unrecognised respiratory health hazard? (Aromas em cigarros eletrónicos: um perigo para a saúde respiratória não reconhecido?) Jama, 2014. 312(23): p. 2493-4.

(21)

US CDC Letter of Evidence on e-cigarettes to N.C. Department of Health and Human Services (Carta do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças dos Estados Unidos sobre elementos de prova relativos aos cigarros eletrónicos para o Departamento de Saúde e Serviços Humanos da Carolina do Norte). http://www.tobaccopreventionandcontrol.ncdhhs.gov/Documents/CDC-LetterofEvidenceonElectronicNicotineDeliverySystemsNorthCarolina-April2015.pdf .

(22)

Morean et al. High School Students’ Use of Electronic Cigarettes to Vaporize Cannabis (Utilização de cigarros eletrónicos para vaporizar canábis por estudantes do ensino secundário). Pediatrics 2015;136:4.

(23)

 Os componentes individuais dos cigarros eletrónicos podem ser facilmente adquiridos e reunidos a fim de construir dispositivos personalizados (por exemplo, http://www.amazon.co.uk/ecigarette-eshisha/b?ie=UTF8&node=3787506031 ). 

(24)

Geiss, O., et al., Correlation of volatile carbonyl yields emitted by e-cigarettes with the temperature of the heating coil and the perceived sensorial quality of the generated vapours (Correlação entre a produção de carbonilo volátil emitido por cigarros eletrónicos e a temperatura da serpentina de aquecimento e a perceção sensorial dos vapores produzidos). Int. J. Hyg. Environ. Health. 2016. 219(3): p.268-277, http://dx.doi.org/10.1016/j.ijheh.2016.01.004.

(25)

Brown CJ, et al. Electronic cigarettes: product characterization and design considerations (Cigarros eletrónicos: caracterização do produto e considerações sobre a conceção). Tob Control 2014;23:ii4–ii10. doi:10.1136/tobaccocontrol-2013-051476.

(26)

http://ec.europa.eu/consumers/consumers_safety/safety_products/rapex/index_en.htm.

(27)

 Decisão de Execução (UE) 2016/586 da Comissão, de 14 de abril de 2016, sobre as normas técnicas para o mecanismo de enchimento de cigarros eletrónicos (JO L 101 de 16.4.2016, p. 15).