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COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES Conferência Rio+20: Rumo a uma economia ecológica e a uma melhor governação /* COM/2011/0363 final */


COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES

Conferência Rio+20: Rumo a uma economia ecológica e a uma melhor governação

1. Conferência Rio+20: uma oportunidade que o mundo não se pode dar ao luxo de perder

Em Junho de 2012, todos os olhos estarão postos no Rio de Janeiro, onde vinte anos após a primeira «Cimeira da Terra», os Chefes de Estado e de Governo irão participar na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável[1] (CNUDS ou «Conferência Rio+20»). A Conferência Rio+20 basear-se-á nas cimeiras mundiais anteriores: a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano realizada em Estocolmo (1972), a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento («Cimeira da Terra») realizada no Rio de Janeiro (1992) e a Cimeira Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável que teve lugar em Joanesburgo (2002). Dá também seguimento à Cimeira do Milénio das Nações Unidas, realizada em 2000, e aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM).

A Conferência Rio+20 constitui uma oportunidade única para o nosso mundo mutuamente interdependente assegurar um compromisso político renovado para com o desenvolvimento sustentável. A conferência avaliará os progressos alcançados, as lacunas na aplicação e como enfrentar os novos desafios, no contexto de dois temas estreitamente interligados: «a economia ecológica no âmbito do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza» e «o quadro institucional para o desenvolvimento sustentável».

A Conferência Rio+20 pode assinalar o início de uma transição acelerada e profunda, a nível mundial, para uma economia ecológica – uma economia que gere crescimento, crie emprego e erradique a pobreza através do investimento e da preservação das ofertas de capital natural de que depende a sobrevivência do nosso planeta a longo prazo. Poderá também lançar a necessária reforma da governação internacional em matéria de desenvolvimento sustentável.

A Comissão Europeia está empenhada em que a Conferência Rio+20 seja um êxito. A presente comunicação, que servirá de base para a prossecução do diálogo com as instituições da UE, a sociedade civil, as empresas e os países a nível mundial, apresenta as opiniões preliminares da Comissão sobre os possíveis resultados concretos da conferência. Assenta nas várias políticas de desenvolvimento sustentável da União e na Estratégia Europa 2020, tendo também em conta a consulta pública lançada em Fevereiro de 2011[2].

2. Balanço desde 1992: lacunas na aplicação e novos desafios 2.1. O desenvolvimento sustentável a nível internacional

Nas últimas décadas, observaram-se várias tendências positivas a nível mundial, em especial no que respeita ao aumento dos rendimentos, graças ao qual mais de 120 milhões de pessoas conseguiram transpor o limiar de «1 dólar por dia» entre 2000 e 2005. O acesso ao ensino, aos cuidados de saúde e à água potável também registou melhorias.

A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (CQNUAC) e a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB), lançadas na Cimeira do Rio em 1992, demonstraram as potencialidades de acção a nível mundial. As negociações sobre o clima realizadas em 2010, em Cancún, constituíram um progresso na via de uma nova governação mundial em matéria de alterações climáticas e do objectivo de limitar a 2°C o aumento do aquecimento global. Do mesmo modo, a reunião da CDB realizada em 2010 em Nagoya obteve progressos significativos. Registou-se igualmente um importante aumento da informação científica e da sensibilização do público para as questões ambientais, em especial para as alterações climáticas, bem como da participação da sociedade civil nas decisões políticas globais, nomeadamente graças à melhoria comunicação via Internet.

No decurso dos últimos vinte anos, vários países em desenvolvimento adquiriram grande importância económica e política. Em consequência, assistiu-se ao aparecimento de um novo equilíbrio de poderes e influências que implica a assunção de novos papéis e irá exigir também a aceitação de novas responsabilidades.

Não obstante os progressos registados, subsistem consideráveis desafios e lacunas em termos de aplicação, que terão de ser abordados no âmbito da agenda da Conferência Rio+20. Cerca de 1,4 mil milhões de pessoas continuam a viver em situação de pobreza extrema (a maioria na África Subsariana e no Sul da Ásia) e um sexto da população mundial sofre de subnutrição. A consecução de vários Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) encontra-se muito atrasada. Por exemplo, no caso do ODM relativo ao saneamento, apenas metade da população do mundo em desenvolvimento tem acesso a um saneamento de boa qualidade. Os progressos no cumprimento dos ODM é muito desigual em termos geográficos, havendo regiões mais atrasadas do que outras, sendo que nenhum dos ODM foi alcançado nos Estados mais frágeis. Os esforços para resolver estes problemas foram dificultados pela recente crise económica e pela subida dos preços dos bens alimentares, que aumentaram o número de pessoas a viver em situação de pobreza.

Muitos dos desafios ambientais não foram solucionados e agudizaram-se. A crescente procura de recursos (como as terras, a água, as florestas e os ecossistemas) agravou o seu empobrecimento e a degradação do ambiente, enquanto a perda de biodiversidade e a desflorestação prosseguem a um ritmo alarmante. A escassez de recursos materiais, bem como o acesso aos mesmos, também estão a tornar-se motivo de preocupação a nível global. As emissões mundiais de gases com efeito de estufa continuam a aumentar, fomentadas pelas reafectações dos solos e pela procura crescente de combustíveis sólidos. Além disso, os impactos das alterações climáticas (como a alteração dos padrões de precipitação e a subida do nível do mar) podem multiplicar os problemas ambientais existentes. O esgotamento e a poluição dos recursos hídricos e do ambiente marinho colocam problemas cada vez mais graves, podendo a escassez de água afectar um terço da população mundial em 2025. A desertificação e a degradação dos solos afectam vários países em desenvolvimento cujas economias dependem em grande medida da agricultura, nomeadamente da agricultura de subsistência. A exposição a substâncias perigosas (como os resíduos de pesticidas perigosos) subsiste nos países em desenvolvimento e nas economias emergentes, apesar dos progressos na aplicação das convenções internacionais. Longe de constituírem fenómenos isolados, estes problemas ambientais estão relacionados entre si e são interdependentes.

É provável que o crescimento económico futuro seja mais rápido nas economias emergentes e, se for bem gerido, poderá ajudar a retirar as populações da pobreza. Contudo, a manutenção dos actuais padrões de produção e de consumo em muitos países do mundo aumentará a utilização dos recursos naturais, acelerará a degradação do ambiente e agravará as alterações climáticas. As pressões e os impactos ambientais serão exacerbados pelo crescimento da população (que, segundo as previsões, deverá atingir, pelo menos, 9 mil milhões de pessoas em 2050), a urbanização e a evolução social (com cerca de 1,2 mil milhões de pessoas das economias emergentes a aceder à «classe média», ).

2.2. Desenvolvimento sustentável na UE

Nas últimas décadas, o desenvolvimento sustentável tem sido promovido por várias políticas da UE. Por exemplo, a União adoptou objectivos climáticos vinculativos, juntamente com o seu regime de comércio de licenças de emissão, bem como uma série de instrumentos legislativos nos domínios da biodiversidade, gestão dos resíduos, qualidade do ar e da água, o que incentivou o crescimento das eco-indústrias da UE, que já correspondem a mais de 2,5% do PIB da União Europeia e empregam mais de 3,4 milhões de pessoas. Em 2001, a UE adoptou uma Estratégia de Desenvolvimento Sustentável que foi renovada em 2006.

Desde o relatório mais recente sobre esta estratégia, publicado em 2009, os progressos da UE na senda da sustentabilidade foram avaliados de várias formas, designadamente através de indicadores de sustentabilidade e do Relatório da Agência Europeia do Ambiente sobre o Estado do Ambiente. Estas publicações mostram que, embora tenha havido progressos, ainda subsistem muitos desafios, sobretudo no que respeita a tornar o crescimento mais sustentável.

A adopção, em 2010, da Estratégia Europa 2020 representou um importante avanço político e o seu objectivo é transformar a UE numa economia baseada no conhecimento, na utilização eficiente de recursos e emissões reduzidas de CO2, bem como dar uma resposta sustentável aos desafios com que está confrontada até 2050. A estratégia pretende integrar e reforçar o papel da sustentabilidade na formulação de todas as políticas mediante o estabelecimento de prioridades, que se reforçam mutuamente (isto é, o de crescimento inteligente, sustentável e inclusivo), determinadas por cinco grandes objectivos e sete iniciativas emblemáticas (ver anexo).

Muitas dessas iniciativas emblemáticas têm uma relevância directa para a presente comunicação. Por exemplo, a iniciativa emblemática relativa à eficiência na utilização dos recursos pretende dissociar utilização dos recursos naturais e crescimento económico, prevendo a adopção de um conjunto de novas medidas políticas, nomeadamente no que respeita às matérias-primas, eficiência energética e biodiversidade, bem como roteiros para diminuir o peso do carbono na economia, energia e transportes. A iniciativa em causa preconiza também um maior recurso a instrumentos baseados no mercado, o abandono gradual das subvenções prejudiciais para o ambiente e a adopção sistemas fiscais mais ecológicos.

Os progressos obtidos na utilização mais eficiente dos recursos e nos outros objectivos e iniciativas emblemáticas serão acompanhados no quadro de governação da Estratégia Europa 2020 e do «Semestre Europeu». Trata-se de reunir os contributos dos Conselhos sectoriais, os programas nacionais de reforma dos Estados‑Membros, os pareceres da Comissão e as conclusões do Conselho Europeu para estabelecer um mecanismo reforçado que assegure uma maior integração e coerência política em prol do ambiente e do desenvolvimento sustentável.

Para avaliar os progressos realizados na aplicação da Estratégia de Desenvolvimento Sustentável da UE, a Comissão Europeia, através do seu serviço de estatística (Eurostat), da Agência Europeia do Ambiente e de outras instituições, continuará a fornecer dados estatísticos e indicadores que permitem medir e elaborar relatórios sobre a sustentabilidade, nomeadamente no contexto da Estratégia Europa 2020.

A Conferência Rio+20 será um momento decisivo para o desenvolvimento sustentável, tanto na União Europeia como a nível mundial. Os seus resultados irão inspirar a estratégia e as acções da UE em matéria de desenvolvimento sustentável e darão um especial contributo para aperfeiçoar a Estratégia Europa 2020 da UE, tornando-o um instrumento eficaz ao serviço do desenvolvimento sustentável.

3. Rumo à Economia Ecológica e a uma melhor governação 3.1. Possibilitar a transição

Vinte anos após a Conferência do Rio, o mundo continua confrontado com dois grandes desafios interligados: satisfazer as aspirações a uma vida melhor de uma população mundial que deverá aumentar mais de um terço até 2050, aliviar as pressões ambientais que, se não forem tomadas medidas, comprometerão a capacidade do planeta para responder a essas aspirações.

A resposta a estes desafios não passa por um abrandamento do crescimento, mas sim pela promoção do modelo adequado de crescimento. Há razões imperiosas para repensar completamente o modelo convencional de progresso económico: limitarmo-nos a operar nas margens de um sistema económico que promove uma utilização ineficiente do capital e dos recursos naturais não será suficiente para produzir a mudança. Necessitamos de uma economia capaz de assegurar o crescimento e o desenvolvimento, melhorando, simultaneamente, o bem-estar humano, criando empregos dignos, reduzindo as desigualdades, combatendo a pobreza e preservando o capital natural de que todos dependemos. Uma tal economia – uma economia ecológica – constitui uma forma eficaz de promover o desenvolvimento sustentável, erradicar a pobreza e enfrentar os novos desafios e as lacunas de aplicação que subsistem.

A transição para uma economia ecológica exige que os principais recursos naturais sejam preservados e que neles se invista. Isso é essencial para todas as economias, mas aplica-se, em particular, aos países em desenvolvimento, que têm a oportunidade de fazer crescer as suas economias com base na gestão sustentável do seu capital natural. Essa transição pressupõe a utilização de soluções hipocarbónicas e eficientes em termos de recursos, e a intensificação dos esforços para promover padrões sustentáveis de produção e de consumo. Para o efeito, há que estabelecer quadros regulamentares adequados, criar incentivos fortes para os mercados e a inovação, mobilizar recursos financeiros, promover o espírito empresarial e um maior envolvimento do sector privado. Pressupõe, ainda, uma valorização adequada do capital natural e, em termos mais gerais, uma revisão do método de medição do crescimento e dos progressos.

Numa economia ecológica, muitos desafios podem ser transformados em oportunidades económicas, não só invertendo as tendências ambientais negativas, mas também estimulando o crescimento e o emprego futuros. Por exemplo, a experiência mostra que as abordagens baseadas no mercado, como o comércio de licenças de emissão, não só são instrumentos economicamente eficazes para resolver problemas ambientais, como constituem uma fonte de investimento.

A economia ecológica oferece oportunidades a todos os países, independentemente do seu nível de desenvolvimento e da estrutura das suas economias. Se, em muitos casos, os investimentos na mudança para uma economia ecológica oferecem soluções vantajosas para todos a curto prazo, noutros será necessário adoptar uma perspectiva a médio prazo e os custos da transição terão de ser previstos, nomeadamente através de políticas a «favor dos mais pobres». Embora não exista um modelo único, há desafios e soluções comuns, e os países beneficiarão do intercâmbio de experiências e de uma melhor cooperação internacional.

Simultaneamente, a mudança para uma economia ecológica não parte do zero. Existem estratégias nas quais os países se podem apoiar, como as relativas às alterações climáticas, à biodiversidade, à produção e ao consumo sustentáveis, à investigação e à inovação, e que são susceptíveis de contribuir para uma economia ecológica. As futuras estratégias nacionais e internacionais nesta matéria devem tirar partido das actuais e reforçá-las, à semelhança do que sucede com a Estratégia Europa 2020 e, recentemente, com o Roteiro de transição para uma economia hipocarbónica competitiva em 2050.

As organizações internacionais, incluindo o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) e a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE) estão a elaborar estratégias de economia ecológica e de crescimento ecológico. A Organização Internacional do Trabalho desenvolve programas de criação de empregos ecológicos e dignos. O G8 e o G20 também estão cada vez mais empenhados na agenda da economia ecológica. Em Cancún, as Partes na CQNUAC acordaram que todos os países devem elaborar estratégias de desenvolvimento hipocarbónico compatíveis com um desenvolvimento sustentável.

No seguimento das iniciativas acima mencionadas, a transição para uma economia ecológica tem de ter em conta três vertentes políticas interligadas:

1) Investir na gestão sustentável dos principais recursos e do capital natural («o quê»)

2) Criar as condições de mercado e regulamentares adequadas («como»)

3) Melhorar a governação e a participação do sector privado («quem»)

As secções seguintes analisam em pormenor estas três vertentes enquanto quadro para acções e investimentos específicos.

3.2. Investir na gestão sustentável dos principais recursos e do capital natural

Recursos como a água, a energia, os solos, as florestas e as matérias-primas constituem os alicerces de qualquer economia, nomeadamente da economia ecológica. Deles depende a subsistência de muitas pessoas em todo o mundo e sobretudo nos países em desenvolvimento, onde a falta de acesso a recursos de qualidade e o conhecimento insuficiente sobre a forma de os gerir sustentavelmente são importantes causas de pobreza. Há muitos exemplos elucidativos de como o acesso a recursos geridos de forma sustentável pode retirar as pessoas da pobreza. Por conseguinte, os sectores de recursos a seguir descritos podem tornar-se nos principais mercados de crescimento da economia ecológica, sustentando o futuro desenvolvimento económico, a criação de emprego e a erradicação da pobreza, em particular nos países em desenvolvimento.

A água é um dos recursos mais preciosos, sendo fundamental para a vida e a saúde, mas também para o crescimento de muitos sectores económicos, como a agricultura, a indústria transformadora e a produção de energia. A gestão sustentável da água é essencial nos esforços para erradicar a pobreza, uma vez que a vida das populações mais pobres está estreitamente ligada ao acesso à água e às suas múltiplas utilizações e funções. A água também tem fortes implicações a nível das relações regionais, da paz e da segurança. Por conseguinte, há uma necessidade imperiosa de reforçar as políticas que melhorem o acesso à água, a sua qualidade e a eficiência da sua utilização.

O acesso aos serviços energéticos é uma condição indispensável para o desenvolvimento económico e social. O acesso à energia também é um dos principais ingredientes da erradicação da pobreza. Actualmente, nos países em desenvolvimento, mais de 1,4 mil milhões de pessoas não têm acesso à electricidade e 2,7 mil milhões dependem da utilização tradicional da biomassa para cozinhar. Muitas regiões do mundo em desenvolvimento têm um enorme potencial em matéria de energias renováveis, sobretudo nas zonas onde a extensão da rede eléctrica não é economicamente viável. O desenvolvimento das energias renováveis deve ser acompanhado de medidas destinadas a aumentar a eficiência energética e a reduzir a dependência dos combustíveis fósseis.

Os recursos marinhos são uma fonte de alimento e de prosperidade económica. O sector das pescas é essencial para o desenvolvimento económico e a subsistência de milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente nos países em desenvolvimento. Os mares e os oceanos são um elemento fulcral essencial do ecossistema do planeta e desempenham um papel preponderante na moderação das alterações climáticas. Os recifes de corais e os mangais não só são um reservatório de carbono e uma fonte de biodiversidade como protegem as zonas costeiras contra as inundações, reduzindo, assim, os riscos de catástrofe. Contudo, o ambiente marinho está confrontado com diversas ameaças: a depauperação dos recursos haliêuticos, a perda de biodiversidade, o lixo marinho, os resíduos e a poluição, incluindo a acidificação. Muitos destes problemas são transnacionais e têm de ser tratados a nível internacional.

Um grande desafio que se coloca à agricultura é conseguir alimentar 9 mil milhões de pessoas em 2050 sem degradar e aumentar a poluição dos soloa. A sustentabilidade da agricultura e da utilização das terras constituirão uma pedra angular da economia ecológica. As actuais práticas agrícolas consomem mais de 70% dos recursos mundiais de água doce e contribuem para mais de 13% das emissões de gases com efeito de estufa. A agricultura sustentável pode aumentar substancialmente a produção, sobretudo nas pequenas explorações agrícolas. Apesar da existência de numerosas técnicas sustentáveis de gestão dos solos, o investimento nas mesmas é insuficiente. A degradação dos solos está directamente ligada à agricultura e afecta directamente cerca de 1,5 mil milhões de pessoas, incluindo 42% das populações mais pobres. Essa degradação cosntitui um problema global que não afecta apenas as regiões áridas e semi-áridas e que exige uma resposta a nível mundial. É essencial uma boa governação para resolver estes problemas através do respeito pelos direitos fundiários e a propriedade das terras, nomeadamente os das comunidades e dos povos indígenas. Todos estes aspectos devem ser ser tidos em conta para garantir um abastecimento alimentar sustentável.

As florestas são a base da subsistência de milhões de pessoas, muitas das quais vivem nas regiões tropicais e pertencem aos segmentos mais pobres da sociedade. Além disso, constituem uma parte essencial do ecossistema terrestre, assegurando funções como a protecção dos solos, da água e da biodiversidade. No entanto, o ritmo da desflorestação em todo o planeta continua a ser alarmante e tem impactos significativos nas alterações climáticas e na biodiversidade a nível mundial. Segundo as estimativas, as emissões originadas pela desflorestação tropical e a degradação das florestas e turfeiras correspondem a 15% das emissões mundiais de CO2. É provável que as florestas se tornem cada vez mais importantes numa economia ecológica como fontes de novos materiais, por exemplo os bioplásticos, e nas estratégias em matéria de energias renováveis. Neste contexto, a conservação e a gestão sustentável das florestas são essenciais.

O uso sustentável dos solos, a agricultura, as florestas, os recursos hídricos e os oceanos são sustentados pelos ecossistemas e a biodiversidade, que determinam a resiliência e a saúde do ambiente a longo prazo. Há uma compreensão crescente dos benefícios dos serviços ecossistémicos para as empresas e a sociedade em geral[3], bem como das potencialidades para a economia ecológica resultantes do investimento no capital natural.

Os resíduos podem constituir um recurso valioso e, se não forem adequadamente geridos, representam um risco para o ambiente a saúde. Uma boa gestão dos resíduos minimiza os impactos ambientais, como as emissões de gases com efeito de estufa, promove uma utilização eficiente dos recursos e constitui uma nova fonte de materiais reciclados. O potencial económico da gestão dos resíduos está a aumentar em muitas regiões do mundo, oferecendo importantes oportunidades de negócio e de emprego. É essencial assegurar que esses postos de trabalho sejam dignos, sobretudo em termos de condições de trabalho. À medida que a economia dos países em desenvolvimento vai crescendo, aumentam as necessidades e as oportunidades económicas de uma melhor gestão dos resíduos. Os resíduos e as substâncias químicas perigosos também continuam a suscitar especial preocupação, tanto a nível nacional como mundial.

A transição para uma economia ecológica global exigirá o reforço das políticas mundiais nestes sectores e a Conferência Rio+20 deverá constituir uma plataforma para que tal aconteça.

3.3. Criar as condições de mercado e regulamentares adequadas

É necessário criar várias condições de mercado e regulamentares para possibilitar e direccionar o crescimento nos sectors atrás mencionados. Essas condições são fundamentais não só para promover os objectivos ambientais, mas também para garantir a previsibilidade e condições de concorrência leal para as empresas. Além disso, proporcionam uma base sólida para promover os investimentos e a promoção da inovação no domínio da ecologia graças a novas tecnologias e novos métodos de trabalho.

Os instrumentos de regulamentação terão um papel importante a desempenhar para tornar a economia mais ecológica tanto a nível nacional como a nível internacional. Devem ser combinados com instrumentos baseados no mercado (como os impostos, as licenças negociáveis e as subvenções ambientais), que são instrumentos flexíveis e economicamente eficazes para ajudar a atingir, simultaneamente, tanto os objectivos económicos, como os sociais e ambientais. As reformas fiscais que transferem o peso da fiscalidade do trabalho para as actividades com impactos ambientais e para a energia também podem produzir resultados vantajosos para o emprego e o ambiente. Os sistemas de limitação e comércio de emissões, como o regime da UE de comércio de licenças de emissão, demonstraram ser instrumentos de mercado eficazes, tal como os incentivos fiscais às PME, as taxas aplicáveis à água, as eco-taxas e as tarifas de aquisição. O pagamento dos serviços ecossistémicos já é aplicado em alguns países e reflecte-se nas negociações em curso sobre a redução de emissões resultantes da desflorestação e da degradação das florestas (REDD).

As subvenções prejudiciais para o ambiente representam um grande obstáculo para uma economia mais ecológica, perpetuando práticas insustentáveis e desviando recursos financeiros dos investimentos ecológicos necessários. Os esforços para resolver este problema estão a intensificar-se. Em 2009, o G20 comprometeu-se a racionalizar e a eliminar gradualmente as subvenções ineficientes aos combustíveis fósseis, que incentivam o desperdício no consumo de energia. Este compromisso será reexaminado em 2011. Em 2010, as Partes na Convenção sobre a Diversidade Biológica comprometeram-se a proceder à reforma ou à eliminação gradual das subvenções que prejudicam a biodiversidade até 2020.

Para que a transição para uma economia ecológica global seja possível, haverá que mobilizar recursos financeiros em grande escala, o que exige uma acção concertada de todos os países, organizações internacionais e bancos. O PNUA estima em cerca de 2% do PIB mundial, por ano, o volume dos investimentos mundiais necessários até 2050. Isto exigirá uma mudança de paradigma nas abordagens ao financiamento, que permita aos países utilizarem soluções públicas e privadas inovadoras. O recurso exclusivo aos fundos públicos não será suficiente – em vez disso, o financiamento público terá de catalisar e mobilizar um maior volume de investimento privado. Há que criar incentivos para encorajar os investimentos ecológicos privados e as modalidades de canalização dos fundos de acções, seguros e pensões para o desenvolvimento sustentável poderão ser aplicadas em muito maior escala. Simultaneamente, tanto o financiamento do sector público nacional como o financiamento público internacional assumirão um papel importantes na criação de condições com vista a reduzir os riscos para o investimento privado e garantir modalidades de investimento justas e equitativas. Além disso, o acesso ao financiamento e ao capital de risco, juntamente com um ambiente regulamentar favorável, são aspectos fundamentais para estimular a eco-inovação, as tecnologias ambientais e as PME ecológicas.

Sem as competências e os conhecimentos necessários, a transição para uma economia ecológica não será possível. Ao mesmo tempo, importa assegurar que os novos postos de trabalho sejam dignos, com garantias de direitos no trabalho, protecção social e diálogo social. É necessário que as políticas económicas se façam acompanhar de políticas laborais com vista a dotar os trabalhadores de novas competências e a contribuir para a criação de novas oportunidades de emprego. Dos 211 milhões de desempregados que se estimava existirem no mundo em 2009, quase 40% têm idades compreendidas entre 15 e 24 anos, sendo necessário tomar várias medidas para proporcionar oportunidades aos jovens. Além disso, muitos dos obstáculos que entravam a transição para uma economia ecológica e um futuro mais sustentável só podem ser eliminados através de uma maior cooperação no domínio da ciência e da investigação.

Os padrões sustentáveis de oferta e de procura a nível internacional podem ser apoiados por um aumento da complementaridade entre o comércio e o desenvolvimento sustentável. Para isso, há que manter um sistema comercial multilateral não discriminatório e garantir que nenhum país será impedido de tomar medidas de promoção do desenvolvimento sustentável, desde que essas medidas não constituam uma discriminação arbitrária ou injustificada, nem uma restrição dissimulada ao comércio internacional. A complementaridade também pode ser promovida através da redução ou da eliminação dos obstáculos pautais e não pautais aos bens, tecnologias e serviços ambientais, bem como aos produtos favoráveis ao ambiente ou do comércio justo. Além disso, à medida que os programas de garantia da sustentabilidade e as práticas de responsabilidade social das empresas se expandem, o desenvolvimento de orientações e normas, bem como de regimes de certificação e rotulagem a nível internacional, podem proporcionar benefícios económicos, ambientais e sociais. É necessário reforçar as medidas internacionais de combate ao comércio ilegal de bens sensíveis do ponto de vista ambiental (como a fauna selvagem, substâncias perigosas e recursos naturais). Um bom exemplo de eventuais medidas a tomar são os acordos de parceria voluntários que a UE está a negociar no contexto da sua iniciativa relativa à aplicação da legislação, à governação e ao comércio no sector florestal (FLEGT). Importa igualmente promover a inclusão de disposições de sustentabilidade nos acordos comerciais multilaterais e bilaterais.

Para garantir e avaliar os progressos realizados devem ser criados métodos de medição e indicadores comparáveis. Várias organizações, como a OCDE, têm estado a trabalhar na elaboração de vários tipos de indicadores susceptíveis de reflectir o estado do ambiente e dos recursos naturais, o bem-estar e a qualidade de vida. Estes indicadores deverão ser utilizados em paralelo com o produto interno bruto (PIB). No entanto, só alguns deles foram, até agora, amplamente utilizados na comunicação das necessidades políticas, por exemplo a intensidade de CO2 e o índice de desenvolvimento humano. A Agenda 21 já solicitava aos governos que elaborassem indicadores de desenvolvimento sustentável e uma contabilidade ambiental. Contudo, os progressos neste domínio têm sido lentos e desiguais. A Conferência Rio+20 deve promover a transparência dos sistemas de informação nacionais e chegar a acordo sobre a utilização da contabilidade ambiental e de indicadores sólidos a nível nacional e mundial para medir o progresso nesta acepção mais lata, complementarmente ao PIB

3.4. Melhorar a governação e a participação do sector privado

As estruturas de governação são essenciais para promover um desenvolvimento sustentável, tornar as nossas economias mais ecológicas e erradicar a pobreza. Contudo, é amplamente reconhecido que as actuais estruturas de governação têm de ser alvo de uma reforma profunda, baseada em quatro vertentes.

É necessário reforçar e racionalizar a governação em matéria de desenvolvimento sustentável no âmbito das Nações Unidas, nomeadamente através do reforço da coerência e da integração das políticas nas actividades empreendidas ao abrigo dos pilares económico, social e ambiental. As Nações Unidas estão a desenvolver esforços para melhorar os mecanismos de funcionamento interagências e, como parte da iniciativa «Unidos na acção» , para assegurar uma acção coerente da ONU em matéria de desenvolvimento, ajuda humanitária e ambiente. Outras questões transversais, como as alterações climáticas, também exigem uma maior integração, pelo que estes processos têm de ser consolidados. Embora seja essencial reforçar a governação internacional em matéria de desenvolvimento sustentável, é igualmente necessário prestar atenção às estruturas regionais, nacionais e locais correspondentes.

Comparativamente às estruturas económicas mundiais, a governação internacional em matéria de ambiente é frágil, o que se deve à fragmentação institucional, à não prestação de contas sobre a aplicação das políticas acordadas, à ausência de uma voz forte e com autoridade no sistema de governação global e à falta de recursos humanos e financeiros. Além disso, os novos papéis e responsabilidades das economias emergentes não estão suficientemente definidos. Na última década, houve várias tentativas para melhorar a governação internacional no domínio do ambiente – a mais recente das quais no âmbito do grupo consultivo de alto nível sob a égide do PNUA (processo Nairobi-Helsínquia) – mas até agora tem sido difícil obter progressos claros.

As questões realtivas à governação económica e social internacional são abordadas por várias instituições. As instituições financeiras internacionais (como o Grupo do Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional), bem como os bancos de desenvolvimento regional (como o Banco Asiático de Desenvolvimento, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Banco Africano de Desenvolvimento, o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento e o Banco Europeu de Investimento) desempenham um papel fundamental nas políticas e acções económicas no plano mundial. A Organização Mundial do Comércio tem um papel essencial na regulação do comércio mundial. Além disso, instituições como a Organização Internacional do Trabalho e outros organismos das Nações Unidas intervêm nas questões laborais e sociais. Cada uma delas dará o seu contributo para tornar a economia mundial mais ecológica.

A Agenda 21 e o Plano de Execução de Joanesburgo salientam o importante papel dos intervenientes não estatais (os «grandes grupos») onde se incluem os povos indígenas, as mulheres, os jovens, os trabalhadores, os agricultores, os governos locais, a comunidade científica, as empresas e a indústria, e as ONG. Contudo, o seu papel e impacto têm tido um âmbito limitado e devem ser reforçados. Haverá, sobretudo, que estimular a participação das empresas e, em vários casos, algumas delas já estão implicadas em tornar as suas actividades mais ecológicas, como por exemplo a indústria alimentar e de bebidas e a indústria química. Este compromisso tem de ser levado mais longe, através de parcerias mais dinâmicas entre o sector público e o privado, de novas redes e alianças empresariais e de mecanismos de financiamento para acelerar as actividades e as inovações ecológicas.

4. Linhas de acção propostas para a Conferência Rio+20 4.1. Um quadro com vista à obtenção de resultados

A fim de imprimir uma nova dinâmica ao desenvolvimento sustentável, a Conferência Rio+20 têm de gerar uma visão comum de mudança, apoiada por um quadro de decisão que permita a adopção de medidas específicas. Os principais «ingredientes» para um resultado global poderão ser os seguintes :

1. Uma ampla mobilização política, com uma visão e objectivos comuns e ambiciosos.

2. Um conjunto de acções específicas a nível internacional, regional e nacional – organizadas sob a forma de um «Roteiro para a economia ecológica».

3. Um conjunto de abordagens políticas e exemplos de boas práticas a utilizar na consecução dos objectivos acordados.

4. Um mecanismo para promover e acompanhar os progressos a nível global.

O Roteiro para a Economia Ecológica pode garantir um empenhamento permanente para além da Conferência Rio+20, assegurando que a visão e os objectivos acordados serão prosseguidos de forma sistemática. Poderá definir uma série de acções internacionais, regionais e nacionais, com marcos, indicatores e metas a atingir, bem como mecanismos para acompanhar o progresso global.

Esse roteiro poderá ajudar todos os países a acelerarem a progressão para a economia ecológica, com base nas iniciativas existentes e respeitando as diferenças nacionais. Será essencial elaborar que tornem a economia mais ecológica, no âmbito das políticas e dos planos económicos e de desenvolvimento globais dos diversos países. Nessas estratégias – a conceber «da base para o topo» – devem figurar os objectivos e prazos das medidas tomadas a nível nacional e, se for caso disso, a nível regional. As medidas devem assentar nas iniciativas existentes e podem ser incorporadas nas estratégias económicas e de desenvolvimento nacionais, onde também se incluem as estratégias hipocarbónicas e os planos de consumo e produção sustentáveis. Sempre que necessário, os países doadores e as organizações internacionais poderão prestar assistência, em consonância com as estratégias de desenvolvimento nacionais. Na concepção das medidas específicas, os países poderão utilizar um conjunto de abordagens políticas das melhores práticas.

Contudo, os esforços nacionais não serão, só por si, suficientes para tornar a economia mundial mais ecológica. Uma vez que muitos desafios exigem uma resposta a nível mundial e regional, o Roteiro para a Economia Ecológica também deve incluir acções a este nível.

Para acompanhar a progressão para uma economia ecológica, é fundamental definir e desenvolver indicadores-chave, bem como um sistema acordado a nível mundial de contabilidade ambiental e social para complementar a actual contabilidade económica que se inspirarão nas iniciativas existentes, como o sistema de contas económicas do ambiente integradas (SCEA), o índice de desenvolvimento humano(PNUD) e a aferição do progresso das sociedades (OCDE). O quadro regulamentar previsto pela UE para as contas ambientais também poderá servir de exemplo.

Com base nas dimensões mencionadas na secção 3 («o quê», «como» e «quem») as secções seguintes propõem um conjunto preliminar de acções específicas, a integrar no Roteiro para a Economia Ecológica.

4.2. Acção no domínio dos recursos, dos materiais e do capital natural

É necessário que a Conferência Rio+20 renove o compromisso de promover uma gestão sustentável dos recursos hídricos, que poderá ser obtida através do estabelecimento de parcerias internacionais no sector da água. Estas parcerias poderiam explorar e alargar a Iniciativa Água da UE, que contribuiu para melhorar a gestão e a governação dos recursos hídricos, conferindo, porém, maior ênfase aos aspectos económicos e a um maior envolvimento das empresas. A gestão das bacias hidrográficas internacionais também deve ser analisada, nomeadamente no âmbito das comissões fluviais internacionais .

Poderão igaulmente criar-se parcerias para aumentar o acesso à energia e a segurança energética, bem como para promover as energias renováveis e a eficiência energética. Essas parcerias basear-se-iam em iniciativas existentes, como a Parceria UE-África no domínio da energia, os mecanismos de investimento regionais da UE, o Fundo Fiduciário UE-África para as Infra-Estruturas, a Facilidade UE-ACP para a Energia e o Fundo Mundial para a Eficiência Energética e as Energias Renováveis (GEEREF), as quais poderão facultar experiências em termos de mobilização do investimento privado.

Para reforçar a protecção do ambiente marinho e dos oceanos, os Estados que ainda não ratificaram a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) devem ser incentivados a fazê-lo. São necessárias novas iniciativas de protecção e conservação das zonas fora das jurisdições nacionais (o «alto mar e o fundo marinho»), por exemplo através de um acordo de aplicação ao abrigo da CNUDM. Para ajudar a conservar a biodiversidade marinha nessas zonas, há que estabelecer, através de um acordo, as zonas marinhas protegidas para diversos fins e garantir o acesso à partilha justa e equitativa dos benefícios decorrentes da utilização dos seus recursos, nomeadamente dos recursos genéticos. O acordo também deverá criar mecanismos de vigilância e aplicação e prestar especial atenção ao desenvolvimento de um programa de acção global para combater o lixo e a poluição marinhos.

É necessário lançar acções para promover a agricultura sustentável, o uso sustentável dos solos e a segurança alimentar. Nessas acções devem figurar o reforço das actuais iniciativas no domínio da agricultura sustentável, através do desenvolvimento das acções multilaterais (como a FAO), das actividades regionais (como a agricultura biológica) e das iniciativas empresariais. Além disso, podem criar-se parcerias internacionais para os bens alimentares com o intuito de tornar o seu consumo e produção mais sustentáveis. Dado que a agricultura depende da qualidade dos solos, há que intensificar esforços para melhorar esta última e combater a desertificação. Isto poderá implicar uma avaliação económica global dos custos e benefícios da melhoria da qualidade dos solos. As iniciativas poderiam prever também um novo impulso para a «Parceria Global para o Solo», bem como a implementação de serviços de acompanhamento do uso dos solos a nível mundial, no âmbito da Rede Mundial de Sistemas de Observação da Terra (GEOSS).

As parcerias com os governos, a sociedade civil e o sector privado também podem ajudar a promover a gestão sustentável das florestas e a combater a desflorestação. Essas parcerias poderão basear-se na abordagem eficaz da FLEGT (aplicação da legislação à governação e ao comércio no sector florestal) e nas experiências iniciais do REDD+.

Chegou o momento de estabelecer um regime internacional relativo aos produtos químicos e às substâncias perigosas mais robusto e coerente e a Conferência Rio+20 poderá lançar esse processo que assentaria em compromissos anteriores, como a Abordagem Estratégica para a Gestão Internacional dos Produtos Químicos (SAICM), e na experiência adquirida com a gestão das substâncias químicas promovida pela UE. O referido regime (eventualmente sob a forma de uma convenção-quadro) deverá ter em conta o objectivo de Joanesburgo, que prevê que em 2020 as substâncias químicas sejam produzidas e utilizadas de forma a não terem efeitos nocivos significativos na saúde humana e no ambiente. O regime deve ter em conta o Global Chemicals Outlook que está a ser elaborado pelo PNUA e os trabalhos em curso sobre opções de financiamento para ajudar os países em desenvolvimento a enfrentar o desafio de uma indústria química e dos resíduos globalizada. Deve também incluir critérios para identificar os produtos e substâncias químicos que suscitam preocupação a nível global, bem como um quadro para os avaliar.

Todos estes desafios exigirão um nível sem precedentes de cooperação científica e tecnológica a nível mundial, devendo ser instituído um mecanismo de cooperação mundial no domínio da ciência e da investigação sobre os desafios sociais de importância mundial (por exemplo, limitação dos recursos, alterações climáticas, oceanos).

4.3. Fornecer instrumentos económicos e financiar e investir no capital humano

A Conferência Rio+20 deve incentivar os países, em especial as economias industrializadas e emergentes, a desenvolver regimes de comércio de licenças de emissão nacionais e regionais, com vista a reduzir as emissões ao menor custo e como componentes de base de um futuro mercado internacional do carbono. Esses instrumentos também podem desempenhar um papel importante na definição de modalidades de financiamento inovadoras.

Além disso, a Conferência Rio+20 deve lançar um conjunto de acções coordenadas a desenvolver pelos países, a fim de identificar e eliminar gradualmente as subvenções prejudiciais para o ambiente, acompanhadas de metas a atingir e dos respectivos prazos. O compromisso assumido pelo G20 de solucionar o problema das subvenções aos combustíveis fósseis pode ser disso um exemplo. A iniciativa basera-se-ia nas orientações e os exemplos de boas práticas que no passado conseguiram eliminar subvenções prejudiciais.

A fim de canalizar e mobilizar fundos para a economia ecológica, a Conferência Rio+20 deverá recomendar que se consolidem e reforcem as estratégias e mecanismos de financiamento existentes, ou que se criem novos regimes de financiamento público-privado na medida do necessário. As organizações de desenvolvimento (como o PNUD) e as instituições financeiras internacionais (como o Banco Mundial e outros bancos de desenvolvimento multilaterais, o Banco Europeu de Investimento e o Fundo para o Ambiente Mundial), devem desempenhar um papel importante, comprometendo-se a definir estratégias de financiamento da economia ecológica capazes de produzir resultados demonstráveis. Os bancos privados, as companhias de seguros e os fundos de pensões também devem participar neste processo. Estes mecanismos e regimes de financiamento devem concentrar-se, designadamente, na assistência aos países menos desenvolvidos e às PME.

Nos países em desenvolvimento, a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) continuará a constituir uma fonte de investimento significativa. A União Europeia mantém o seu compromisso de aumentar o volume da ajuda para 0,7% do produto nacional bruto (PNB) até 2015, assumindo actualmente cerca de 58% da ajuda mundial. A APD continuará a estar disponível e poderá contribuir para a execução das estratégias nacionais e regionais no domínio da economia ecológica, no contexto dos planos de desenvolvimento nacional dos países parceiros. Neste contexto, podem adoptar-se programas como o programa SWITCH da UE, que tem vindo a promover práticas sustentáveis de produção e consumo na Ásia, no âmbito de uma acção global em matéria de produção e consumo sustentáveis.

A Conferência Rio+20 deve estabelecer programas de formação em competências ecológicas em domínios prioritários como a energia, a agricultura, a construção, a gestão dos recursos naturais, os resíduos e a reciclagem. Uma vez que a transição para uma economia ecológica irá criar novos postos de trabalho e substituir outros, será necessário proceder à requalificação da mão-de-obra existente. Essa requalificação poderá incluir regimes destinados a proteger os interesses dos trabalhadores, assegurar a protecção social e oficializar o trabalho informal, com base, por exemplo, no trabalho de «transição justa» desenvolvido pela OIT. São igualmente necessários programas de formação para jovens, que apoiem a transição da escola para o trabalho com formação específica e incentivem a integração de competências ecológicas nos programas de estudos do ensino secundário.

4.4. Melhorar a governação

Para acelerar os esforços globais no sentido de uma economia mais ecológica e sustentável, e erradicar a pobreza, é necessário dispor de uma governação mundial melhor e mais eficiente, que crie oportunidades para que todos os interessados participem e dêem o seu contributo.

Há várias opções para reforçar a governação em matéria de desenvolvimento sustentável no âmbito da ONU. Uma é consolidar o papel do seu Conselho Económico e Social (ECOSOC) no domínio do desenvolvimento sustentável, conferindo igual peso aos pilares económico, social e ambiental. Uma abordagem alternativa consistiria em transformar a Comissão das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (CDS) num organismo mais permanente e alargar as suas funções. Estas medidas devem procurar garantir que todos os organismos relevantes das Nações Unidas confiram maior importância ao desenvolvimento sustentável. Em vários casos, é possível introduzir melhorias nos mandatos actuais.

É necessário consolidar o PNUA com base nas recomendações formuladas pelo seu processo Nairobi‑Helsínquia no sentido de reforçar a governação internacional no domínio do ambiente. Essa consolidação pode ser obtida de várias formas: i) fortalecendo a posição do PNUA no âmbito do seu actual mandato; ii) reforçando o PNUA com novas funções e responsabilidades; iii) criando uma organização global multilateral no domínio do ambiente, por exemplo transformando o PNUA numa Agência Especializada da ONU (como a OIT). Esta última opção, que implicaria a adopção de um tratado juridicamente vinculativo, seria a forma mais promissora de melhorar a governação internacional no domínio do ambiente e progredir para o desenvolvimento sustentável a nível global. Porém, é evidente que todas as opções têm vantagens e desvantagens e deverão ser analisadas aprofundadamente.

No âmbito do reforço da governação internacional no domínio do ambiente, é necessário acelerar o trabalho de racionalização e reforço do sistema de acordos ambientais multilaterais. Sem deixar de respeitar a autonomia dos diversos acordos, a sua administração pode ser substancialmente racionalizada e as duplicações reduzidas, criando, assim, uma melhor base para assegurar uma supervisão e uma liderança políticas coerentes e bem orientadas, assim como condições favoráveis a um crescimento ecológico.

É necessário reforçar as capacidades no domínio do ambiente actualmente existentes na ONU. Isso exige que se aumentem as competências ambientais e a sensibilização para a economia ecológica das equipas destacadas pelas Nações Unidas para actuarem em cada país, a fim de promover a integração desta dimensão nos programas nacionais, aumentar a gama de competências disponíveis nos gabinetes regionais da ONU/PNUA, e desenvolver um quadro a nível de todo o sistema que reforce a capacidade de aplicação dos acordos ambientais multilaterais. Importa igualmente intensificar a capacidade de monitorizar o ambiente a nível global.

Dado que as empresas são os motores da economia, a Conferência Rio+20 deve reforçar o envolvimento do sector privado. As empresas e a sociedade civil devem desempenhar um papel importante nas várias parcerias e regimes propostos na presente comunicação, nomeadamente nos sectores da água, da energia, dos produtos alimentares, das florestas e do financiamento.

5. Avançar

Embora, desde a Conferência do Rio de 1992, alguns domínios tenham registado progressos no sentido de um desenvolvimento sustentável, continuamos confrontados com grandes desafios ambientais, económicos e sociais a nível mundial. A presente comunicação apresenta as opiniões preliminares da Comissão no âmbito do processo de preparação da Conferência Rio+20.

A Conferência Rio+20 constitui uma oportunidade única para fazer avançar o desenvolvimento sustentável em todo o mundo. Não se deve limitar, todavia, a produzir declarações de boas intenções: são necessárias acções concretas para garantir que será um marco importante na transição para a economia ecológica e uma melhor governação. A União Europeia está aberta ao debate com todos os países e intervenientes sobre a forma de definir mais claramente esta agenda no período que medeia até à Conferência. Todos os países e intervenientes devem unir esforços para assegurar que os resultados da Conferência Rio+20 estão à altura dos desafios globais que nos esperam. É necessário promovermos, em conjunto, medidas concretas e eficazes que possam ter verdadeiro impacto em todo o mundo.

Anexo

Estratégia Europa 2020: Objectivos e Iniciativas Emblemáticas

Grandes objectivos

1) 75% da população de idade compreendida entre 20 e 64 anos deve estar empregada;

2) 3% do PIB da UE deve ser investido em I&D;

3) Assegurar que os objectivos «20/20/20» em matéria de clima e energia, ou seja, reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em 20%, aumentar para 20% a quota de energias renováveis e aumentar em 20% a eficiência energética são cumpridos (incluindo uma subida para 30% do objectivo no que respeita à redução das emissões de gases com efeito de estufa, se as condições o permitirem);

4) Assegurar que a taxa de abandono escolar precoce é inferior a 10% e que, pelo menos, 40% da geração mais jovem possui um diploma de ensino superior;

5) Reduzir em 20 milhões o número de pessoas ameaçadas pelo risco de pobreza.

Iniciativas emblemáticas

1) «Uma União da inovação» para melhorar as condições gerais e o acesso ao financiamento para a investigação e inovação, a fim de assegurar que as ideias inovadoras são transformadas em produtos e serviços que criam crescimento e postos de trabalho;

2) «Juventude em movimento» para melhorar os resultados dos sistemas de ensino e facilitar a entrada dos jovens no mercado de trabalho;

3) «Agenda digital para a Europa» com vista a acelerar a implantação da Internet de alta velocidade e para que as famílias e as empresas possam tirar partido de um mercado único digital;

4) «Uma Europa eficiente em termos de recursos» destinada a contribuir para dissociar o crescimento económico da utilização dos recursos, assegurar a transição para uma economia hipocarbónica, aumentar a utilização das fontes de energia renováveis, modernizar o nosso sector dos transportes e promover a eficiência energética;

5) «Uma política industrial para a era da globalização» com vista a melhorar o ambiente empresarial, especialmente para as PME, e apoiar o desenvolvimento de uma base industrial sólida e sustentável, susceptível de enfrentar a concorrência mundial;

6) «Agenda para novas qualificações e novos empregos» destinada a modernizar os mercados de trabalho e a permitir que as pessoas desenvolvem as suas qualificações ao longo da vida, com vista a aumentar a participação no mercado de trabalho e a estabelecer uma melhor correspondência entre a oferta e a procura de mão-de-obra, nomeadamente através de uma maior mobilidade dos trabalhadores;

7) «Plataforma europeia contra a pobreza» com vista a assegurar uma coesão social e territorial de molde a permitir uma ampla distribuição dos benefícios do crescimento e do emprego e para que as pessoas em situação de pobreza e de exclusão social possam viver dignamente e participar activamente na sociedade.

[1]               www.uncsd2012.org

[2]               http://ec.europa.eu/environment/consultations/un_2012.htm.

[3]               The Economics of Ecosystems and Biodiversity for Business (Economia dos Ecossistemas e a Biodiversidade para as Empresas) – «TEEB for Business»