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Parecer do Comité Económico e Social sobre "Malta na via da adesão"

Jornal Oficial nº C 260 de 17/09/2001 p. 0093 - 0097


Parecer do Comité Económico e Social sobre "Malta na via da adesão"

(2001/C 260/17)

Em 13 de Julho de 2001, o Comité Económico e Social decidiu elaborar parecer de iniciativa sobre "Malta na via da adesão".

A Secção de Relações Externas incumbida de preparar os respectivos trabalhos, aprovou o parecer em 28 de Junho de 2001 (relator: Kenneth Walker).

Na 383.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2001 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social adoptou por 66 votos a favor, 28 votos contra e 22 abstenções, o seguinte parecer.

N.B.:

Evolui com celeridade a situação de Malta no caminho para a adesão, tanto quanto ao processo de conclusão de capítulos, como quanto à introdução de medidas legislativas em Malta. A informação constante deste parecer foi actualizada em 28 de Junho de 2001, data da reunião da Secção. Eventos ulteriores podem não constar do presente documento.

1. Introdução

1.1. A República de Malta é uma democracia parlamentar com uma história antiga e rica. A sua posição estratégica no Mediterrâneo conferiu ao povo de Malta um papel de charneira no desenvolvimento da civilização europeia. Desde os tempos pré-históricos, Malta sempre atraiu os visitantes, embora nem todos tenham sido bem recebidos. Malta foi governada sucessivamente pelos fenícios, romanos, cavaleiros da Ordem de S. João, franceses e britânicos. Por duas vezes teve um papel importante no curso da história da Europa Ocidental: no século dezasseis, quando os cavaleiros de Malta expulsaram os invasores turcos e na segunda guerra mundial, quando se bateu contra o Eixo. Pelo segundo feito, Malta recebeu a George Cross, a mais alta condecoração civil britânica para feitos de coragem.

1.2. O Conselho Europeu de Helsínquia, de 10 e 11 de Dezembro de 1999, aprovou a abertura das negociações de adesão com Malta e outros cinco países candidatos. Estes Estados passaram a ser designados como o Grupo de Helsínquia.

1.3. Malta está em boa posição económica e política para figurar entre os primeiros candidatos a aderir. Cumpre os critérios de Copenhaga, tem uma efectiva economia de mercado e deverá conseguir fazer face à concorrência na União desde que crie as condições necessárias para a restruturação industrial que terá de efectuar com vista à adesão à UE.

1.3.1. Contudo, há um grande obstáculo a ser superado. De todos os países candidatos, Malta é o único em que não existe um claro consenso político sobre a adesão à UE. A menos, e até, que esse consenso seja alcançado com firmeza, permanecerá a dúvida sobre a disposição do país para aderir.

1.4. Este relatório versará o actual estado de preparação da economia e da população de Malta para cumprirem o acervo comunitário e preencherem as outras condições de adesão. Procurará avaliar o que já foi conseguido e o que falta fazer. Abordará também, inevitavelmente, questões políticas que irão determinar, em última análise, se Malta pretende avançar com o processo de adesão.

1.5. O relator contou com a colaboração do Dr. Lenard Mizzi do Malta Business Bureau, a quem muito agradece. Uma delegação do Grupo de Estudo visitou Malta de 21 a 23 de Março de 2001(1).

2. Malta a caminho da adesão

2.1. De documento separado constam a história das relações de Malta com a UE, os antecedentes políticos económicos e sociais, o processo de negociação, a evolução das negociações, uma apreciação das áreas potencialmente difíceis, a situação do diálogo civil e social em Malta, o impacto da adesão sobre sectores específicos, a atitude de Malta quanto à adesão e as questões de financiamento.

3. Síntese

3.1. Em Malta não existe um claro consenso político sobre a adesão à UE. O partido Nacionalista no governo é a favor da adesão imediata, convicto de que é desejável do ponto de vista histórico e político. Porém, é necessário proporcionar incentivos e apoio financeiro para resolver os reconhecidos problemas estruturais de Malta.

3.2. O Partido Trabalhista, por outro lado, preferiria diferir a adesão até que os mais graves destes problemas estivessem resolvidos e, entretanto, manter relações estreitas com a UE e negociar uma zona de comércio livre ("Suíça no Mediterrâneo").

3.3. O Partido Nacionalista projecta realizar um referendo sobre a adesão quando as negociações estiverem concluídas e, de qualquer modo, antes das próximas eleições legislativas que se realizarão, o mais tardar, em Janeiro de 2004. O Partido Trabalhista anunciou que, se voltasse ao poder nas próximas eleições, retiraria a candidatura de Malta à UE, independentemente do resultado do referendo.

3.3.1. A última sondagem revela que as opiniões a favor e contra a adesão imediata à UE estão praticamente empatadas, com um grande percentagem de indecisos.

3.4. Malta cumpre os critérios de Maastricht excepto o do défice orçamental anual. Contudo a dívida pública acumulada ronda os 59 % do PIB, a qual, embora cumpra o critério de Maastricht de 60 % e seja inferior ao de vários Estados-Membros, tende a aumentar o que, a manter-se, o levará a ultrapassar o nível de referência antes da adesão.

3.4.1. O PIB de Malta, em paridade do poder de compra, equivale a 52 % da média da UE.

3.4.2. A economia está muito voltada para a exportação, tendo, em 1999, a exportação de bens e serviços atingido 89 % do PIB. A UE é o maior parceiro comercial de Malta, origem de 65,4 % das suas importações, sendo-lhe a balança comercial substancialmente favorável.

3.4.3. Os principais sectores económicos são, a electrónica, o transporte marítimo, a construção naval e o turismo. A agricultura representa apenas 2,5 % do PIB, sendo muito fragmentada.

3.4.4. Malta é muito densamente povoada, com cerca de 1200 habitantes por quilómetro quadrado. 21 % da superfície total está urbanizada.

3.4.5. A economia de Malta é dominada por micro-empresas, 95 % das quais empregam menos de 10 pessoas.

3.5. O Comité Executivo e de Acção de Malta (MEUSAC) foi criado para melhorar a transparência do processo de negociação com a participação de todos os sectores interessados.

3.5.1. Alguns dos organismos consultados pelo MEUSAC queixam-se de que o tempo para debate não é suficiente para lhes permitir consultar os seus membros.

3.6. O Primeiro Programa Nacional para a Adopção do Acervo (PNAA) foi publicado em 18 de Setembro de 2000.

3.6.1. No capítulo da energia, Malta recebeu um período transitório de 4 anos para lhe permitir constituir a reserva estratégica de petróleo.

3.6.1.1. A UE assinalou que, muito provavelmente, Malta beneficiará de uma derrogação pós-adesão quanto à classificação do seu sistema de fornecimento de electricidade como "um sistema isolado pequeno".

3.6.1.2. No capítulo da livre circulação de mercadorias, Malta terá um período transitório de 4 anos para renovação de autorizações de comercialização de produtos farmacêuticos.

3.6.1.3. No capítulo da livre circulação de trabalhadores, Malta tem um período transitório de 7 anos, durante o qual pode aplicar salvaguardas quanto ao direito dos trabalhadores de outros Estados-Membros da UE poderem trabalhar em Malta. Malta difere dos outros países candidatos na circunstância de o fluxo pós-adesão dos trabalhadores ser no sentido dos outros Estados-Membros para Malta, ao passo que nos outros países candidatos espera-se movimento inverso.

3.6.2. Até hoje, Malta abriu 28 capítulos do acervo e encerrou provisoriamente 17. Espera abrir o capítulo da agricultura, em último caso, na presidência belga.

3.7. Algumas matérias com previsíveis dificuldades terão de ser resolvidas no processo de negociação.

3.7.1. Existem ainda algumas restrições à compra de imóveis por estrangeiros.

3.7.2. É necessário reforçar a capacidade administrativa para aplicar os direitos de propriedade intelectual (ou seja, polícia, alfândegas e resolução extrajudicial de conflitos).

3.7.3. Para se conformar à política da concorrência da UE, Malta vai ter pela frente dois anos de intenso trabalho de harmonização legislativa, restruturação rigorosa, liberalização e privatização acrescidas. Os actuais subsídios aos estaleiros navais terão de ser suprimidos.

3.7.4. Na área das pescas, o PNAA identificou como problemáticos a tarifa aduaneira de 15 % aplicada às exportações de peixe e a necessidade de manter a zona protegida de pesca até às 25 milhas náuticas para preservar os recursos pesqueiros.

3.7.5. Existe alguma preocupação na UE com a taxa de retenção nos portos da UE de navios arvorando pavilhão de Malta e a taxa de inspecções em Malta. Malta tem a quarta maior frota comercial do mundo, muitos do seus navios são petroleiros. A administração marítima de Malta está longe de poder assegurar o controlo dos navios nela registados, que são, na sua esmagadora maioria, propriedade de armadores de países terceiros.

3.7.6. O custo da adaptação ao acervo em matéria ambiental é de cerca de 5 % do PIB de Malta. Nas áreas com problemas inclui-se a gestão de resíduos e o fornecimento, qualidade e custo da água.

3.7.7. O acervo em matéria de agricultura poderá criar problemas. A questão da protecção pautal aos produtos agrícolas será uma das questões. Outra será a concorrência da UE para a agricultura fragmentada e relativamente ineficiente de Malta.

3.7.8. Malta requereu períodos transitórios para aplicação das directivas sobre organização do tempo de trabalho, ruído no local de trabalho, estaleiros temporários e móveis, utilização de equipamento de trabalho. Alguns industriais de Malta consideram estes períodos transitórios insuficientes.

3.7.9. O projecto de legislação para alinhar a política de Malta para a defesa do consumidor com a Directiva da UE sobre a responsabilidade decorrente de produtos defeituosos será apresentado este ano mas não se sabe se será possível aplicar, a curto prazo, a Directiva 90/314/CEE relativa às viagens organizadas, dado que as entidades competentes para a executar apenas serão criadas em 2002.

3.7.10. As empresas de Malta gostariam que fosse fixado um limiar de isenção do IVA elevado e de beneficiar das disposições sobre a taxa zero que se aplicam no Reino Unido e na Irlanda. Receia-se também que a pressão exercida para harmonizar a fiscalidade na União Europeia conduza a um aumento do peso fiscal global sobre os empresários malteses.

3.8. A consulta entre o governo e os parceiros sociais em Malta processa-se formalmente no Conselho de Malta para o Desenvolvimento Económico (CMDE), que é um organismo auto-regulador, tripartido, constituído por representantes dos empregadores, sindicatos e governo. As suas funções são a consulta com o governo e emitir parecer a requerimento do governo ou por sua iniciativa.

3.8.1. Actualmente, os outros elementos da sociedade civil estão à margem deste processo em vez de dele participarem, mas considera-se que este é o primeiro passo num processo evolutivo.

3.8.2. O governo de Malta propõe a criação de um Comité Consultivo Misto EU-Malta, tendo cada delegação seis membros.

3.9. A adesão à UE terá consequências acentuadas nalguns sectores da economia de Malta.

3.9.1. O turismo é um dos principais sectores económicos de Malta, mas o seu crescimento está condicionado pela escassez de espaço, equipamentos e recursos. O sector está também preocupado com alguns aspectos da legislação comunitária do trabalho.

3.9.2. A indústria de construção e reparação naval é um sector importante, mas deficitário, da economia de Malta. É necessário adoptar um programa de restruturação e encetar negociações sobre a forma de suprimir os subsídios.

3.9.3. O sector da indústria transformadora está preocupado com o impacto de diversas directivas comunitárias em matéria de direito do trabalho, sindical e saúde e segurança. A maioria das empresas são micro-empresas que não têm organização sindical, por isso, não poderão celebrar determinados acordos específicos.

3.9.4. A caça de aves é um desporto popular em Malta que atrai mais de 15000 participantes. Os caçadores estão preocupados com o facto de que a adesão à UE implique restrições ou a proibição do seu desporto e a maioria opõe-se à adesão se não for conseguido um acordo satisfatório.

3.9.5. A ilha de Gozo tem o problema da "dupla insularidade". Os seus habitantes consideram que é necessário apoio da UE nas melhores condições possíveis.

3.9.6. A conformidade com o acervo da UEM depende da conclusão do processo de liberalização dos movimentos de capitais.

3.9.7. O número de processos no Tribunal Cível de Malta é sério motivo de preocupação. Embora as autoridades maltesas tenham procurado resolver o problema, o aumento de litígios, que provavelmente se seguirá à entrada na UE, agravará a situação.

3.10. Ao contrário dos PECO, Malta não está em posição de beneficiar dos programas ISPA e Sapard. O Comité Económico e Social entende que seria de alargar o programa ISPA a Malta.

4. Conclusões

4.1. Em Malta reconhece-se em geral que, independentemente da adesão à UE, é necessário proceder a importantes reformas estruturais para permitir à sociedade de Malta adaptar-se a um mundo em mudança de modo a poder competir numa economia cada vez mais globalizada. Alguns pensam que o actual ritmo de mudança, causado pela necessidade de cumprir os requisitos do acervo dentro do prazo para a adesão fixado pelo governo é demasiado rápido e seria preferível proceder com mais vagar, mas não há dúvida de que a perspectiva da adesão à UE está a ser um catalizador da mudança e não é certo que, sem estímulo, se fizessem as reformas necessárias.

4.1.1. Sem dúvida que o governo conseguiu transpor uma apreciável parte do acervo e está também claramente determinado a completar o processo de transposição do acervo no prazo fixado.

4.2. É necessário criar capacidade nas infra-estruturas do sector público. Levará tempo a criar a organização necessária para aprovar a grande quantidade de nova legislação necessária para transpor o acervo e assegurar a sua adequada aplicação. É também necessário aumentar a capacidade do poder judicial para resolver os litígios dela decorrentes.

4.3. Aqueles que se opõem à adesão à UE tendem a qualificar os programas lançados pelo governo com o apoio da UE como "propaganda". Contudo, muitos interlocutores afirmaram haver uma generalizada falta de conhecimento por parte da população de Malta sobre as questões envolvidas. Dada as importantes consequências da decisão a tomar é evidentemente desejável que no momento de votar no referendo o povo esteja plenamente informado sobre as questões.

4.4. Até hoje, Malta requereu algumas derrogações e períodos transitórios. Alguns industriais entendem que os períodos de transição são poucos ou curtos. Por outro lado, o número de períodos transitórios pedidos até agora é dos mais elevados de entre todos os países candidatos, o que, em parte, reflecte os problemas colocados pelo estatuto da ilha de Malta e a necessidade de apresentar condições atractivas ao povo de Malta.

4.5. O diálogo social em Malta está bem desenvolvido e em vias de ainda ser melhorado. Actualmente, as ONG e outras organizações da sociedade civil estão à margem deste processo em vez de dele participarem.

4.6. O governo de Malta lançou um vasto processo de consulta sobre a adesão à UE através do MEUSAC. Foram expressas algumas queixas sobre o volume de informação e o curto prazo de resposta que dificultam que as organizações, e especialmente as organizações de voluntariado, dêem resposta fundamentada. Foram também manifestados à delegação receios pelo facto de o governo não ter publicado os resultados da avaliação de impacto.

4.6.1. No seguimento da visita da delegação a Malta, o governo anunciou que os resultados da avaliação de impacto seriam publicados em Abril de 2001.

4.7. Malta tem um sistema de segurança social abrangente comparável com os existentes na maioria dos Estados-Membros.

4.8. O Comité acolhe favoravelmente a proposta de instituir um Comité Misto UE/Malta, mas assinala que as delegações do Comité Misto de ambos os lados são, habitualmente, compostas por representantes dos parceiros sociais e de outros elementos da sociedade civil. Atento o facto de os CCM terem um papel consultivo dos governos, não pareceria curial ter uma representação governamental directa nas delegações.

4.9. O Comité entende que deveria ponderar-se o alargamento da elegibilidade do programa ISPA a Malta, para antes e depois da adesão.

Para que sejam apresentadas condições aceitáveis ao povo maltês, o processo de negociação terá de ter um resultado satisfatório, pelo menos, numa série de questões que são examinadas em documento separado. Os negociadores de Malta terão de identificar, de preferência numa fase inicial, a posição de recuo a adoptar se a base de negociação de elementos essenciais não for aceite pela UE.

4.10. Embora em Malta se reconheça generalizadamente que a candidatura à adesão à UE implica a adopção do acervo comunitário e que não é aceitável uma "Europa à la carte", considera-se que não é razoável recusar aos países candidatos derrogações e períodos transitórios de que determinados Estados-Membros ainda beneficiam ou esperar que o grau de aplicação nos países candidatos seja mais elevado do que na União actual.

4.11. Em termos de desenvolvimento económico, político e social e dos progressos feitos na adopção do acervo, Malta está bem colocada para ser dos primeiros candidatos a aderirem à União. Resta saber se existe vontade política para o fazer.

Bruxelas, 11 de Julho de 2001.

O Presidente

do Comité Económico e Social

Göke Frerichs

(1) Relatório da visita a Malta no quadro da preparação de um parecer sobre "Malta na via da adesão" (R CES 460/2001).