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Document 62016CJ0567

Acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 7 de dezembro de 2017.
Merck Sharp & Dohme Corporation contra Comptroller-General of Patents, Designs and Trade Marks.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, Patents Court.
Reenvio prejudicial — Propriedade industrial e comercial — Direito das patentes — Medicamentos para uso humano — Regulamento (CE) n.o 469/2009 — Artigo 3.o, alínea b) — Certificado complementar de proteção — Condições de obtenção — Artigo 10.o, n.o 3 — Concessão do certificado ou indeferimento do pedido de certificado — Diretiva 2001/83/CE — Artigo 28.o, n.o 4 — Procedimento descentralizado.
Processo C-567/16.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:948

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

7 de dezembro de 2017 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Propriedade industrial e comercial — Direito das patentes — Medicamentos para uso humano — Regulamento (CE) n.o 469/2009 — Artigo 3.o, alínea b) — Certificado complementar de proteção — Condições de obtenção — Artigo 10.o, n.o 3 — Concessão do certificado ou indeferimento do pedido de certificado — Diretiva 2001/83/CE — Artigo 28.o, n.o 4 — Procedimento descentralizado»

No processo C‑567/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, Patents Court [Supremo Tribunal de Justiça (Inglaterra e País de Gales), Divisão Queen’s Bench (Secção Administrativa), Reino Unido], por decisão de 4 de outubro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 10 de novembro de 2016, no processo

Merck Sharp & Dohme Corporation

contra

Comptroller General of Patents, Designs and Trade Marks,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: C. Toader (relatora), exercendo funções de presidente de secção, A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 7 de setembro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Merck Sharp & Dohme Corporation, por K. Bacon, QC, T. Hinchliffe, QC, S. Bennett, advocate, e L. Whiting, solicitor,

em representação do Governo checo, por M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por A. Sipos e J. Samnadda, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.o, alínea b), e do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos (JO 2009, L 152, p. 1, a seguir «Regulamento CCP»), bem como do artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2001, L 311, p. 67), conforme alterada, no que diz respeito à farmacovigilância, pela Diretiva 2010/84/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 2010 (JO 2010, L 348, p. 74) (a seguir «Diretiva 2001/83»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Merck Sharp & Dohme Corporation (a seguir «MSD») ao Comptroller General of Patents, Designs and Trademarks (Auditor geral das patentes, desenhos e modelos, Reino Unido) (a seguir «auditor»), a propósito do indeferimento por este último de um pedido de certificado complementar de proteção apresentado pela MSD, alegando que a mesma não preenchia, na ausência de uma autorização de introdução no mercado no Reino Unido de um medicamento denominado «Atozet», as exigências constantes do artigo 3.o alínea b), do Regulamento CCP, irregularidade que o auditor considerou que não podia ser corrigida nos termos do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2001/83

3

Os considerandos 2, 3 e 6 da Diretiva 2001/83 têm a seguinte redação:

«(2)

Toda a regulamentação em matéria de produção, de distribuição ou de utilização de medicamentos deve ter por objetivo essencial garantir a proteção da saúde pública.

(3)

Todavia, este objetivo deve ser atingido por meios que não possam travar o desenvolvimento da indústria farmacêutica e o comércio de medicamentos na Comunidade.

[…]

(6)

Para reduzir as disparidades que subsistem, importa, por um lado, determinar as regras relativas ao controlo de medicamentos e, por outro lado, definir as tarefas que incumbem às autoridades competentes dos Estados‑Membros para assegurar o respeito das disposições legais.»

4

Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, dessa diretiva, «[n]ão pode ser introduzido um medicamento no mercado de um Estado‑Membro sem que para tal tenha sido emitida pela autoridade competente desse Estado‑Membro uma autorização de introdução no mercado, em conformidade com a presente diretiva […]».

5

O artigo 17.o, n.o 1, da referida diretiva prevê:

«Os Estados‑Membros tomam as medidas adequadas para assegurar que o procedimento de concessão de autorizações de introdução no mercado de medicamentos fique concluído no prazo máximo de 210 dias a contar da apresentação de um pedido válido.

Os pedidos de autorização de introdução no mercado em dois ou mais Estados‑Membros relativamente ao mesmo medicamento devem ser apresentados em conformidade com os artigos 28.o a 39.o»

6

O artigo 28.o da mesma diretiva dispõe:

«1.   Com vista à concessão de uma autorização de introdução no mercado de um medicamento em mais do que um Estado‑Membro, o requerente deve apresentar um pedido baseado num processo idêntico nesses Estados‑Membros. O processo deve incluir as informações e os documentos referidos nos artigos 8.o, 10.o, 10.o‑A, 10.o‑B, 10.o‑C e 11.o Os documentos apresentados devem incluir uma lista dos Estados‑Membros envolvidos pelo pedido.

O requerente deve solicitar a um dos Estados‑Membros que aja na qualidade de “Estado‑Membro de referência” e que prepare um relatório de avaliação sobre o medicamento, nos termos do n.o 2 ou do n.o 3.

2.   Se o medicamento tiver já recebido uma autorização de introdução no mercado no momento do pedido, os Estados‑Membros envolvidos reconhecerão a autorização de introdução no mercado concedida pelo Estado‑Membro de referência. Para tal, o titular da autorização de introdução no mercado solicita ao Estado‑Membro de referência que prepare um relatório de avaliação sobre o medicamento ou, se necessário, que atualize um relatório de avaliação existente. O Estado‑Membro de referência prepara ou atualiza o relatório de avaliação no prazo de 90 dias a contar da receção de um pedido válido. O relatório de avaliação, bem como o resumo das características do medicamento, a rotulagem e o folheto informativo aprovados, são enviados aos Estados‑Membros envolvidos e ao requerente.

3.   Se o medicamento não tiver recebido uma autorização de introdução no mercado no momento do pedido, o requerente solicitará ao Estado‑Membro de referência que prepare um projeto de relatório de avaliação, um projeto de resumo das características do medicamento e um projeto de rotulagem e de folheto informativo. O Estado‑Membro de referência prepara estes projetos no prazo de 120 dias a contar da receção de um pedido válido e transmite‑os aos Estados‑Membros envolvidos e ao requerente.

4.   No prazo de 90 dias após a receção dos documentos referidos nos n.os 2 e 3, os Estados‑Membros envolvidos aprovam o relatório de avaliação e o resumo das características do medicamento, bem como a rotulagem e o folheto informativo, e dão conhecimento deste facto ao Estado‑Membro de referência. Este constata o acordo geral, encerra o procedimento e dá conhecimento deste facto ao requerente.

5.   Cada Estado‑Membro em que tenha sido apresentado um pedido nos termos do n.o 1 toma uma decisão em conformidade com o relatório de avaliação, o resumo das características do medicamento, a rotulagem e o folheto informativo aprovados, no prazo de 30 dias a contar da constatação do acordo.»

7

O artigo 29.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83 enuncia:

«Se, no prazo referido no n.o 4 do artigo 28.o, um Estado‑Membro não puder aprovar o relatório de avaliação, o resumo das características do medicamento, a rotulagem e o folheto informativo devido a um potencial risco grave para a saúde pública, deverá enviar uma fundamentação pormenorizada dos motivos da sua posição ao Estado‑Membro de referência, aos outros Estados‑Membros envolvidos e ao requerente. Os elementos do desacordo são comunicados sem demora ao grupo de coordenação.»

Regulamento CCP

8

Os considerandos 4, 5, 8 e 10 do regulamento impugnado têm a seguinte redação:

«(4)

Atualmente, o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de introdução no mercado do referido medicamento reduz a proteção efetiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efetuados na investigação.

(5)

Destas circunstâncias resulta uma proteção insuficiente que penaliza a investigação farmacêutica.

[…]

(8)

É pois necessário prever um certificado complementar de proteção para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada autorização de introdução no mercado e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado‑Membro. Consequentemente, o regulamento é o instrumento mais adequado.

[…]

(10)

No entanto, todos os interesses em causa num setor tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, deverão ser tomados em consideração. Para este efeito, o certificado não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos. Além disso, a proteção que o certificado confere deverá ser estritamente limitada ao produto abrangido pela autorização da sua introdução no mercado como medicamento.»

9

O artigo 1.o deste regulamento, sob a epígrafe «Definições», prevê:

«Para efeitos do presente regulamento entende‑se por:

a)

“Medicamento”: qualquer substância ou associação de substâncias com propriedades curativas ou preventivas em relação a doenças humanas […];

b)

“Produto”: o princípio ativo ou associação de princípios ativos contidos num medicamento;

c)

“Patente de base”: a patente que protege um produto como tal, um processo de obtenção de um produto ou uma aplicação de um produto e que tenha sido designado pelo seu titular para efeitos do processo de obtenção de um certificado;

d)

“Certificado”: o certificado complementar de proteção;

[…]»

10

O artigo 3.o do referido regulamento, intitulado «Condições de obtenção do certificado», prevê:

«O certificado é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.o e à data de tal pedido:

a)

O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;

b)

O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma autorização válida de colocação no mercado, nos termos do disposto na Diretiva [2001/83] […];

c)

O produto não tiver sido já objeto de um certificado;

d)

A autorização referida na alínea b) for a primeira autorização de introdução do produto no mercado, como medicamento.»

11

O artigo 7.o do Regulamento CCP, intitulado «Pedido de certificado», enuncia:

«1.   O pedido de certificado deve ser apresentado no prazo de seis meses a contar da data em que o produto obteve a autorização de introdução no mercado, como medicamento, referida na alínea b) do artigo 3.o

[…]

3.   O pedido de prorrogação da validade pode ser apresentado no momento da apresentação ou na pendência de um pedido de certificado, se estiverem preenchidos os requisitos adequados da alínea d) do n.o 1 do artigo 8.o ou do n.o 2 do artigo 8.o, respetivamente.

4.   O pedido de prorrogação da validade de um certificado já concedido deve ser apresentado, o mais tardar, dois anos antes do termo de validade do certificado.

5.   Não obstante o disposto no n.o 4, durante um período de cinco anos após a entrada em vigor do Regulamento (CE) n.o 1901/2006 [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativo a medicamentos para uso pediátrico e que altera o Regulamento (CEE) n.o 1768/92, a Diretiva 2001/20/CE, a Diretiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004 (JO 2006, L 378, p. 1)], os pedidos de prorrogação de certificados já concedidos são apresentados até seis meses antes do termo do referido certificado.»

12

O artigo 8.o deste regulamento determina:

«1.   O pedido de certificado deve incluir:

a)

Um requerimento de emissão do certificado mencionando designadamente:

[…]

iv)

O número e a data da primeira autorização de introdução do produto no mercado, de acordo com a alínea b) do artigo 3.o, bem como o número e a data desta última autorização caso esta não seja a primeira autorização de colocação no mercado na Comunidade;

b)

Uma cópia da autorização de introdução no mercado referida na alínea b) do artigo 3.o que permita identificar o produto, compreendendo, nomeadamente, o número e a data da autorização bem como o resumo das características do produto, tal como previsto no artigo 11.o da Diretiva [2001/83] […];

c)

Se a autorização prevista na alínea b) não for a primeira autorização de introdução do produto no mercado na Comunidade, como medicamento, a indicação da denominação do produto então autorizado e da disposição legal ao abrigo da qual correu o processo de autorização, bem como uma cópia da publicação dessa autorização no boletim oficial.

[…]»

13

Nos termos do artigo 9.o, n.o 1, do referido regulamento:

«O pedido de certificado deve ser apresentado à autoridade competente em matéria de propriedade industrial do Estado‑Membro que concedeu ou para o qual foi concedida a patente de base e no qual foi obtida a autorização de introdução no mercado prevista na alínea b) do artigo 3.o, salvo se o Estado‑Membro designar outro serviço para o efeito.

O pedido de prorrogação da validade de um certificado deve ser apresentado à autoridade competente do Estado‑Membro em causa.»

14

O artigo 10.o do mesmo regulamento dispõe:

«[…]

2.   Sem prejuízo do disposto no n.o 3, o pedido de certificado será recusado pela autoridade prevista no n.o 1 do artigo 9.o, se esse pedido ou o produto que dele é objeto não satisfizerem as condições previstas no presente regulamento.

3.   Se o pedido de certificado não preencher as condições previstas no prazo fixado para o efeito no artigo 8.o, a autoridade prevista no n.o 1 do artigo 9.o notificará o requerente para corrigir as irregularidades verificadas ou para proceder ao pagamento da taxa.

4.   Se, dentro do prazo concedido, não se proceder à correção das irregularidades ou ao pagamento da taxa, feita a notificação prevista no n.o 3, o pedido será recusado.

[…]»

15

O artigo 13.o do Regulamento CCP, que tem por epígrafe «Período de validade do certificado», prevê, no seu n.o 1:

«O certificado produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de introdução no mercado na Comunidade, reduzido [de] um período de cinco anos.»

Direito do Reino Unido

16

No Reino Unido, o Human Medicines Regulations 2012 (Regulamento relativo aos medicamentos para uso humano de 2012), que transpôs a Diretiva 2001/83, regula a concessão das autorizações de introdução no mercado pela Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency (Agência de regulamentação dos medicamentos e produtos de saúde, Reino Unido).

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17

A MSD, sociedade constituída segundo o direito do Estado de Nova Jérsia (Estados Unidos), faz parte de um grupo de sociedades farmacêuticas cuja empresa mãe é a Merck & Co., Incorporated.

18

Esta última sociedade era titular da patente europeia (UK) n.o EP 0 720599, relativamente à qual foi apresentado um pedido em 14 de setembro de 1994, acompanhado de uma reivindicação de prioridade a contar de 21 de setembro de 1993, e que foi concedida em 19 de maio de 1999. Esta patente protegia tanto o princípio ativo, a ezetimiba, como combinações deste com outros princípios ativos.

19

Em setembro de 2006, a MSD começou a desenvolver uma associação medicamentosa fixa de dois princípios ativos, sob a forma de comprimidos. Deparou‑se com dificuldades para criar uma fórmula satisfatória, pelo que este trabalho prosseguiu até 2013.

20

Em setembro de 2013, a MSD apresentou, em vários Estados‑Membros, nos termos do procedimento descentralizado previsto no artigo 28.o da Diretiva 2011/83, pedidos assentes num processo idêntico com vista à concessão de uma autorização de introdução no mercado (a seguir «AIM») em cada um desses Estados‑Membros, convidando a República Federal da Alemanha a agir na qualidade de Estado‑Membro de referência, para o medicamento Atozet, destinado ao adulto e a diminuir a taxa de colesterol total.

21

Como resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, a validade desses pedidos só foi reconhecida em 13 de fevereiro de 2014.

22

Em 10 de setembro de 2014, ou seja, 209 dias após a apresentação dos pedidos válidos de AIM e, logo, no prazo fixado no artigo 17.o da Diretiva 2001/83, o Bundesinstitut für Arzneimittel und Medizinprodukte (Instituto federal dos medicamentos e dos produtos médicos, Alemanha) emitiu uma notificação de termo de procedimento, nos termos do artigo 28.o, n.o 4, dessa diretiva.

23

Em 12 de setembro de 2014, a primeira AIM do Atozet na União Europeia foi concedida pela autoridade nacional competente francesa.

24

Na mesma data, a MSD apresentou um pedido de certificado complementar de proteção (a seguir «CCP») ao United Kingdom Intellectual Property Office (Instituto da Propriedade Intelectual do Reino Unido, a seguir «UKIPO») com base na patente mencionada no n.o 18 do presente acórdão.

25

Esse pedido respeitava aos dois princípios ativos que compõem o Atozet, isto é, a ezetimiba e a atorvastatina, ou os seus sais admissíveis no plano farmacêutico.

26

No pedido de CCP no Reino Unido, a MSD comunicou a notificação de termo de procedimento emitida em 10 de setembro de 2014 pelo Instituto federal dos medicamentos e dos produtos médicos. Na carta que acompanhou esse pedido, a MSD alegou que a referida notificação continha o consentimento de todos os Estados‑Membros em causa, incluindo o do Reino Unido, para a concessão de uma AIM para o Atozet, e pediu autorização para completar o referido pedido de CCP quando a AIM fosse concedida no Reino Unido.

27

Em 13 de setembro de 2014, a patente detida pela MSD, referida no n.o 18 do presente acórdão, caducou.

28

Por carta de 17 de setembro de 2014, o examinador do UKIPO suscitou uma objeção ao pedido de CCP no Reino Unido, referindo, nomeadamente, que esse pedido não respeitava os requisitos do artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP, uma vez que a MSD não era titular de uma AIM válida no Reino Unido.

29

Em 10 de outubro de 2014, a Agência de regulamentação dos medicamentos e produtos de saúde concedeu à filial britânica da MSD, a Merck Sharp & Dohme Ltd, uma AIM do Atozet no Reino Unido.

30

Em 17 de novembro de 2014, a MSD enviou uma carta ao UKIPO, à qual juntou uma cópia da AIM concedida no Reino Unido, bem como da concedida em França em 12 de setembro de 2014. Nessa carta pedia que estes documentos fossem tidos em conta para corrigir as irregularidades que pudessem constar do pedido de CCP no Reino Unido.

31

Este último pedido foi indeferido pelo examinador do UKIPO porque a não concessão de uma AIM não constitui uma irregularidade que possa ser corrigida, na aceção do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP. Na sequência de uma audição que teve lugar em 3 de setembro de 2015, a posição do referido examinador foi confirmada, em nome do auditor, pelo auditor de justiça do UKIPO.

32

A MSD interpôs recurso da decisão do auditor no órgão jurisdicional de reenvio, a High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, Patents Court [Supremo Tribunal de Justiça (Inglaterra e País de Gales), Divisão Queen’s Bench (Secção Administrativa), Reino Unido].

33

Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a decisão do auditor é fundada. Considera, com efeito, que a concessão de uma AIM na sequência de uma notificação de termo de procedimento não constitui uma simples formalidade administrativa. Assim, a referida notificação não equivale a uma AIM para efeitos do artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP.

34

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a irregularidade que viciava o pedido de CCP apresentado pela MSD no Reino Unido não podia ser corrigida, nos termos do artigo 10.o, n.o 3, alínea b), do Regulamento CCP.

35

O referido órgão jurisdicional salienta, todavia, que os pedidos de CCP apresentados pela MSD em Portugal e na Suécia foram indeferidos pela mesma razão em que se baseava o indeferimento do pedido de CCP no Reino Unido. Em contrapartida, tais pedidos foram deferidos na Dinamarca, na Grécia, em Itália e no Luxemburgo. Nos Países Baixos, o único motivo de indeferimento invocado era o desrespeito do artigo 3.o, alínea c), do Regulamento CCP, que exige que, à data do pedido de CCP, o produto não tenha sido já objeto de um certificado no Estado‑Membro em que esse pedido é apresentado.

36

Nestas condições, a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) [Supremo Tribunal de Justiça (Inglaterra e País de Gales), Divisão Queen’s Bench (Secção Administrativa), Reino Unido] decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve uma notificação de termo do procedimento, emitida pelo Estado‑Membro de referência, ao abrigo do artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva [2001/83], antes da data de caducidade do período de validade da patente de base, ser considerada equivalente a uma [AIM] para efeitos do artigo 3.o, alínea b), do Regulamento [CCP], de forma que um requerente de um [CCP] no Estado‑Membro em causa tem o direito de pedir e de obter um [CCP] ao abrigo da notificação de termo do procedimento?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão: nas circunstâncias referidas na questão 1), a inexistência de uma [AIM] concedida no Estado‑Membro em causa na data da apresentação do pedido de [CCP] nesse Estado‑Membro constitui uma irregularidade suscetível de ser corrigida nos termos do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento [CCP], depois de ser concedida a autorização de introdução no mercado?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

37

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP deve ser interpretado no sentido de que pode ser equiparada a uma AIM, na aceção da referida disposição, uma notificação de termo de procedimento emitida pelo Estado‑Membro de referência, em conformidade com o artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva 2001/83, antes da caducidade da patente de base referida no artigo 1.o, alínea c), do Regulamento CCP, de modo que pode ser obtido um CCP com base nessa notificação.

38

Antes de mais, importa observar que o artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP exige, para efeitos da emissão de um CCP para um produto, enquanto medicamento, a existência de uma AIM válida, obtida de acordo com a Diretiva 2001/83.

39

A este respeito, há que salientar que, segundo o sentido comum das palavras, o termo «obtido», que consta desse artigo, só se pode referir a uma ação já terminada.

40

Além disso, quanto ao contexto em que se inscreve essa disposição, há que constatar que o legislador criou uma ligação entre o Regulamento CCP e a Diretiva 2001/83, associando a concessão de um CCP à de uma AIM nos termos dessa diretiva.

41

De onde resulta que, na aceção do artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP, uma «AIM válida» deve ter a forma de um documento que satisfaz as exigências da Diretiva 2001/83, no âmbito do procedimento descentralizado, com base no princípio do reconhecimento mútuo e aplicável quando o medicamento em causa não tiver sido já objeto de uma AIM num Estado‑Membro, como acontecia no processo principal.

42

O procedimento descentralizado, previsto no artigo 28.o da Diretiva 2001/83, contém várias etapas e inicia‑se com a introdução, pelo requerente, de um pedido de AIM em todos os Estados‑Membros em causa e com o pedido, dirigido a um Estado‑Membro, de que aja na qualidade de Estado‑Membro de referência. O n.o 4 desse artigo prevê que o Estado‑Membro de referência constate o acordo de todas as partes, encerre o procedimento e dê conhecimento deste facto ao requerente. Segundo o n.o 5 do referido artigo, é tomada uma decisão de AIM por cada Estado‑Membro, em conformidade com o relatório de avaliação e os documentos correspondentes, no prazo de 30 dias a contar da constatação do acordo de todas as partes.

43

De onde resulta que a adoção da notificação de termo de procedimento, no âmbito do artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva 2001/83, representa uma etapa intermédia no procedimento descentralizado e que essa notificação é desprovida dos efeitos jurídicos de que beneficia uma AIM «válida», uma vez que esta notificação não autoriza o requerente a introduzir um medicamento num determinado mercado.

44

A este respeito, embora, na audiência no Tribunal de Justiça, a MSD tenha invocado o facto de certas funções de uma AIM — nomeadamente a garantia da segurança do produto, a identificação do produto que é objeto do CCP e o cálculo do período de validade do CPP — poderem ser desempenhadas pela notificação de termo de procedimento, admitiu, no entanto, que tal notificação não permite, o que é, em contrapartida, próprio de uma AIM, a introdução no mercado do medicamento em causa no processo principal.

45

Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, se não tiver obtido uma AIM para um medicamento, um produto patenteado não pode dar origem à concessão de um CCP (acórdão de 15 de janeiro de 2015, Forsgren, C‑631/13, EU:C:2015:13, n.o 34).

46

Tendo em conta as considerações expostas, há que responder à primeira questão que o artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP deve ser interpretado no sentido de que não pode ser equiparada a uma AIM, na aceção da referida disposição, uma notificação de termo de procedimento emitida em conformidade com o artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva 2001/83, pelo Estado‑Membro de referência, antes da caducidade da patente de base referida no artigo 1.o, alínea c), do Regulamento CCP, de modo que não pode ser obtido um CCP com base nessa notificação.

Quanto à segunda questão

47

Com a segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP deve ser interpretado no sentido de que a não concessão de uma AIM, pelo Estado‑Membro em causa, na data da apresentação do pedido de CCP nesse Estado‑Membro constitui uma irregularidade suscetível de ser corrigida nos termos da referida disposição.

48

Segundo o artigo 3.o, alínea b), do Regulamento CCP, que enumera as «condições de obtenção» do CCP, este é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.o desse regulamento e à data de tal pedido o produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma [AIM] válida, nos termos do disposto na Diretiva 2001/83.

49

Resulta da redação dessa disposição, nomeadamente da fórmula «se […] o produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma [AIM]», que a obtenção de uma AIM no Estado‑Membro em causa é uma condição ligada ao produto.

50

Assim, em conformidade com o artigo 10.o, n.o 2, do Regulamento CCP, o pedido de CCP será recusado pela autoridade prevista no n.o 1 do artigo 9.o desse regulamento se esse pedido ou o produto que dele é objeto não satisfizerem as condições previstas no referido regulamento.

51

Quanto ao artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP, este prevê que, se o pedido de CCP não preencher as condições previstas no prazo fixado para o efeito no artigo 8.o, a autoridade prevista no n.o 1 do artigo 9.o do referido regulamento notificará o requerente para corrigir as irregularidades verificadas.

52

Assim, resulta da redação do mesmo artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP, nomeadamente da expressão «[s]e o pedido de [CCP] não preencher as condições», que só uma irregularidade que afete o pedido de CCP pode ser corrigida nos termos desta disposição.

53

De onde resulta que a inexistência de AIM não constitui uma irregularidade que o requerente possa corrigir ex post nos termos do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP, uma vez que constitui uma irregularidade ligada ao produto, enquanto medicamento, e não uma irregularidade ligada ao pedido de CCP. Além disso, quanto à AIM, as condições previstas no artigo 8.o do Regulamento CCP para as quais remete o artigo 10.o, n.o 3, do mesmo dizem respeito, não à existência em si da AIM, que é, pelo seu lado, exigida por força do artigo 3.o, alínea b), do referido regulamento, mas apenas a várias informações e documentos a apresentar a fim de demonstrar essa existência e a identificar a referida AIM no momento da apresentação do pedido de CCP.

54

Tendo em conta as considerações expostas, há que responder à segunda questão que o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento CCP deve ser interpretado no sentido de que a não concessão de uma AIM, pelo Estado‑Membro em causa, na data da apresentação do pedido de CCP nesse Estado‑Membro não constitui uma irregularidade suscetível de ser corrigida nos termos da referida disposição.

Quanto às despesas

55

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

 

1)

O artigo 3.o, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, deve ser interpretado no sentido de que não pode ser equiparada a uma autorização de introdução no mercado, na aceção da referida disposição, uma notificação de termo de procedimento emitida em conformidade com o artigo 28.o, n.o 4, da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano, conforme alterada, no que diz respeito à farmacovigilância, pela Diretiva 2010/84/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 2010, pelo Estado‑Membro de referência, antes da caducidade da patente de base referida no artigo 1.o, alínea c), do Regulamento n.o 469/2009, de modo que não pode ser obtido um certificado complementar de proteção com base nessa notificação.

 

2)

O artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que a não concessão de uma autorização de introdução no mercado, pelo Estado‑Membro em causa, na data da apresentação do pedido de certificado complementar de proteção nesse Estado‑Membro não constitui uma irregularidade suscetível de ser corrigida nos termos da referida disposição.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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