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Document 62011CJ0179

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 27 de setembro de 2012.
Cimade e Groupe d'information et de soutien des immigrés (GISTI) contra Ministre de l'Intérieur, de l'Outre‑mer, des Collectivités territoriales et de l'Immigration.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Conseil d’État França.
Pedidos de asilo — Diretiva 2003/9/CE — Normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros — Regulamento (CE) n.° 343/2003 — Obrigação de assegurar aos requerentes de asilo o benefício das condições mínimas de acolhimento durante o procedimento de tomada ou retomada a cargo pelo Estado‑Membro responsável — Determinação do Estado‑Membro que tem a obrigação de assumir o encargo financeiro decorrente do benefício das condições mínimas.
Processo C‑179/11.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:594

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

27 de setembro de 2012 ( *1 )

«Pedidos de asilo — Diretiva 2003/9/CE — Normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros — Regulamento (CE) n.o 343/2003 — Obrigação de assegurar aos requerentes de asilo o benefício das condições mínimas de acolhimento durante o procedimento de tomada ou retomada a cargo pelo Estado-Membro responsável — Determinação do Estado-Membro que tem a obrigação de assumir o encargo financeiro decorrente do benefício das condições mínimas»

No processo C-179/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Conseil d’État (França), por decisão de 7 de abril de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 18 de abril de 2011, no processo

Cimade,

Groupe d’information et de soutien des immigrés (GISTI)

contra

Ministre de l’Intérieur, de l’Outre-mer, des Collectivités territoriales et de l’Immigration,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por J.-C. Bonichot, presidente de Secção, A. Prechal, K. Schiemann, L. Bay Larsen (relator) e E. Jarašiūnas,

advogado-geral: E. Sharpston,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 8 de março de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Cimade, por P. Peugeot, presidente desta, e P. Spinosi, avocat,

em representação do Groupe d’information e de soutien des immigrés (GISTI), por P. Peugeot e C. Pouly, avocat,

em representação do Governo francês, por G. de Bergues, J.-S. Pilczer e B. Beaupère-Manokha, na qualidade de agentes,

em representação do Governo checo, por M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação do Governo helénico, por M. Michelogiannaki e L. Kotroni, na qualidade de agentes,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por C. Gerardis, avvocato dello Stato,

em representação do Governo polaco, por M. Szpunar, na qualidade de agente,

em representação do Governo suíço, por J. de Watteville, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por M. Condou-Durande, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 15 de maio de 2012,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 2003/9/CE do Conselho, de 27 de janeiro de 2003, que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros (JO L 31, p. 18), e, nomeadamente, o âmbito de aplicação desta.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Cimade e o Groupe d’information et de soutien des immigrés (GISTI) ao ministre de l’Intérieur, de l’Outre-mer, des Collectivités territoriales et de l’Immigration a respeito da legalidade de uma Circular interministerial de 3 de novembro de 2009 relativa ao subsídio temporário de emergência (a seguir «Circular de 3 de novembro de 2009»).

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2003/9

3

Os considerandos 5, 7 e 8 da Diretiva 2003/9 têm a seguinte redação:

«(5)

A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos nomeadamente pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [a seguir ‘Carta’]. Em especial, a presente diretiva procura assegurar o respeito integral da dignidade humana e promover a aplicação dos artigos 1.° e 18.° da referida [Carta].

[…]

(7)

Devem ser estabelecidas normas mínimas relativas às condições de acolhimento dos requerentes de asilo que, em princípio, sejam suficientes para lhes garantir um nível de vida digno e condições de vida equiparáveis em todos os Estados-Membros.

(8)

A harmonização das condições de acolhimento dos requerentes de asilo deve contribuir para limitar os movimentos secundários dos requerentes de asilo influenciados pela diversidade das condições de acolhimento».

4

O artigo 1.o da referida diretiva dispõe que esta «tem por objetivo estabelecer normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros».

5

O artigo 2.o da mesma diretiva, intitulado «Definições», enuncia:

«Para efeitos da presente diretiva, entende-se por:

[…]

b)

‘Pedido de asilo’, o pedido apresentado por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida que possa ser considerado como um pedido de proteção internacional dirigido a um Estado-Membro, ao abrigo da Convenção de Genebra [de 28 de julho de 1951, relativa ao estatuto dos refugiados (a seguir ‘Convenção de Genebra’)]. Um pedido de proteção internacional deve ser considerado um pedido de asilo, salvo se o nacional de um país terceiro ou o apátrida solicitar expressamente outra forma de proteção suscetível de ser objeto de um pedido separado;

c)

‘Requerente’ ou ‘requerente de asilo’, um nacional de um país terceiro ou um apátrida que apresentou um pedido de asilo que ainda não foi objeto de decisão definitiva;

[…]

i)

‘Condições de acolhimento’, o conjunto de medidas tomadas pelos Estados-Membros a favor dos requerentes de asilo em conformidade com a presente diretiva;

j)

‘Condições materiais de acolhimento’, as condições de acolhimento que compreendem o alojamento, a alimentação e o vestuário, fornecidos em espécie ou sob a forma de subsídios ou de cupões ou de subsídios para despesas diárias;

[…]»

6

Sob o título «Âmbito de aplicação», o artigo 3.o da Diretiva 2003/9 prevê no seu n.o 1:

«A presente diretiva é aplicável a todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentem um pedido de asilo na fronteira ou no território de um Estado-Membro enquanto lhes for permitido permanecer nesse território na qualidade de requerentes de asilo, bem como aos membros das suas famílias, se estes estiverem abrangidos pelo referido pedido de asilo nos termos do direito nacional.»

7

Sob o título «Disposições gerais em matéria de condições materiais de acolhimento e de cuidados de saúde», o artigo 13.o da Diretiva 2003/9 prevê no seu n.o 1:

«Os Estados-Membros devem assegurar que os requerentes de asilo tenham acesso às condições materiais de acolhimento quando apresentam o seu pedido de asilo.»

8

O artigo 16.o da mesma diretiva, intitulado «Redução ou retirada do benefício das condições de acolhimento», tem a seguinte redação:

«1.   Os Estados-Membros podem reduzir ou retirar o benefício das condições de acolhimento nos seguintes casos:

a)

Se o requerente de asilo:

abandonar o local de residência estabelecido pela autoridade competente sem a informar ou sem a autorização que lhe é exigida, ou

não cumprir as obrigações de se apresentar ou não satisfizer pedidos no sentido de fornecer informações ou comparecer para entrevistas pessoais sobre o processo de asilo durante um período razoável estabelecido no direito nacional, ou

tiver já depositado um pedido no mesmo Estado-Membro.

Se o requerente for encontrado ou se apresentar voluntariamente às autoridades competentes, deve ser tomada, com base nas razões do seu desaparecimento, uma decisão devidamente fundamentada quanto ao restabelecimento do benefício de algumas ou de todas as condições de acolhimento;

b)

Se o requerente tiver dissimulado os seus recursos financeiros e, portanto, beneficiar indevidamente das condições materiais de acolhimento.

[…]

2.   Os Estados-Membros podem recusar o benefício das condições de acolhimento nos casos em que o requerente de asilo não tiver provado que o seu pedido de asilo foi apresentado logo que razoavelmente praticável após a sua chegada ao Estado-Membro.

[…]

5.   Os Estados-Membros devem assegurar que as condições materiais de acolhimento não sejam retiradas ou reduzidas antes de ser tomada uma decisão negativa.»

Regulamento (CE) n.o 343/2003

9

O artigo 1.o do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro (JO L 50, p. 1), enuncia:

«O presente regulamento estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro.»

10

O artigo 2.o do mesmo regulamento apresenta definições dos conceitos de «pedido de asilo» e de «requerente» ou «requerente de asilo», cujo conteúdo é, no essencial, idêntico ao dos mesmos conceitos constantes da Diretiva 2003/9. Além disso, o artigo 2.o define os termos seguintes:

«e)

‘Análise de um pedido de asilo’: o conjunto das medidas de análise, decisões ou sentenças relativas a um pedido de asilo determinadas pelas autoridades competentes em conformidade com a legislação nacional, com exceção dos procedimentos de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de asilo, nos termos do presente regulamento;

[…]

j)

‘Título de residência’: toda a autorização emitida pelas autoridades de um Estado-Membro que permita a estadia de um nacional de um país terceiro ou de um apátrida no seu território, incluindo os documentos que comprovam a autorização de se manter no território, no âmbito de um regime de proteção temporária ou até que deixem de se verificar as circunstâncias que obstavam à execução de uma medida de afastamento, com exceção dos vistos e das autorizações de residência emitidos durante o período necessário para determinar o Estado-Membro responsável, em conformidade com o presente regulamento, ou durante a análise de um pedido de asilo ou de um título de residência;

[…]»

11

O artigo 3.o do Regulamento n.o 343/2003, que figura no capítulo II deste, intitulado «Princípios gerais», prevê no seu n.o 1:

«Os Estados-Membros analisarão todo o pedido de asilo apresentado por um nacional de um país terceiro a qualquer dos Estados-Membros, quer na fronteira, quer no território do Estado-Membro em causa. O pedido de asilo é analisado por um único Estado, que será aquele que os critérios enunciados no capítulo III designarem como responsável.»

12

Nos termos do artigo 4.o do referido regulamento, que também faz parte do capítulo II deste:

«1.   O processo de determinação do Estado-Membro responsável nos termos do presente regulamento tem início a partir do momento em que um pedido de asilo é apresentado pela primeira vez a um Estado-Membro.

2.   Considera-se que um pedido de asilo foi apresentado a partir do momento em que as autoridades competentes do Estado-Membro em causa recebam um formulário apresentado pelo requerente de asilo ou um auto lavrado pela autoridade. No caso de um pedido não escrito, o período que medeia entre a declaração de intenção e a elaboração de um auto deve ser tão breve quanto possível.

[…]

4.   Sempre que um pedido de asilo for apresentado às autoridades competentes de um Estado-Membro por um requerente que se encontre no território de outro Estado-Membro, a determinação do Estado-Membro responsável incumbe ao Estado-Membro em cujo território se encontrar o requerente de asilo. Esse Estado-Membro é informado sem demora pelo Estado-Membro a quem tiver sido apresentado o pedido de asilo e, para efeitos do presente regulamento, é considerado como o Estado junto do qual foi introduzido o pedido.

O requerente será informado por escrito dessa transmissão e da data em que esta teve lugar.

5.   O Estado-Membro a que tiver sido apresentado o pedido de asilo é obrigado, nas condições previstas no artigo 20.o e a fim de concluir o processo de determinação do Estado responsável pela análise do pedido, a retomar a cargo o candidato que se encontre presente noutro Estado-Membro e aí tenha formulado um novo pedido de asilo, após ter retirado o seu pedido durante o processo de determinação do Estado responsável.

Esta obrigação cessa se o candidato a asilo tiver entretanto abandonado o território dos Estados-Membros durante um período de, pelo menos, três meses, ou for detentor de um título de residência emitido por um Estado-Membro.»

13

O capítulo V do Regulamento n.o 343/2003 prevê normas pormenorizadas relativas à tomada e retomada a cargo do requerente de asilo. O artigo 16.o deste regulamento dispõe:

«1.   O Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo por força do presente regulamento é obrigado a:

a)

tomar a cargo, nas condições previstas nos artigos 17.° a 19.°, o requerente de asilo que apresentou um pedido noutro Estado-Membro;

b)

finalizar a análise do pedido de asilo;

c)

retomar a cargo, nas condições previstas no artigo 20.o, o requerente de asilo cujo pedido esteja a ser analisado e que se encontre, sem para tal ter recebido autorização, no território de outro Estado-Membro;

d)

retomar a cargo, nas condições previstas no artigo 20.o, o requerente de asilo que tenha retirado o seu pedido durante o processo de análise e tenha formulado um pedido de asilo noutro Estado-Membro;

e)

retomar a cargo, nas condições previstas no artigo 20.o, o nacional de um país terceiro cujo pedido tenha rejeitado e que se encontre, sem para tal ter recebido autorização, no território de outro Estado-Membro.

2.   Se um Estado conceder um título de residência ao requerente de asilo, serão para ele transferidas as obrigações previstas no n.o 1.

3.   Cessam as obrigações previstas no n.o 1 se o nacional de um país terceiro tiver abandonado o território dos Estados-Membros durante um período mínimo de três meses, a menos que seja titular de um título de residência válido emitido pelo Estado-Membro responsável.

4.   Cessam igualmente as obrigações previstas nas alíneas d) e e) do n.o 1 se o Estado-Membro responsável pela análise do pedido de asilo tiver tomado e efetivamente aplicado, na sequência da retirada ou da rejeição do pedido de asilo, as disposições necessárias para que o nacional de um país terceiro regresse ao seu país de origem, ou se dirija para outro país em que possa entrar legalmente.»

14

O artigo 17.o do referido regulamento enuncia os procedimentos aplicáveis para requerer a outro Estado-Membro que proceda à tomada a cargo do requerente de asilo. Os n.os 1 e 2 deste artigo têm a seguinte redação:

«1.   O Estado-Membro ao qual tenha sido apresentado um pedido de asilo e que considere que a responsabilidade pela análise desse pedido cabe a outro Estado-Membro pode requerer a este último que proceda à tomada a cargo o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de três meses a contar da apresentação do pedido de asilo, na aceção do n.o 2 do artigo 4.o

Se o pedido de tomada a cargo de um requerente não for formulado no prazo de três meses, a responsabilidade pela análise do pedido de asilo cabe ao Estado-Membro ao qual o pedido tiver sido apresentado.

2.   O Estado-Membro requerente pode solicitar uma resposta com urgência nos casos em que o pedido de asilo tenha sido introduzido na sequência de uma recusa de entrada ou de estadia, de uma detenção por estadia irregular, de notificação ou execução, de uma medida de afastamento e/ou quando o candidato a asilo estiver detido.

O pedido indicará as razões que justificam uma resposta urgente e o prazo em que a resposta é aguardada. Este prazo não poderá ser inferior a uma semana.»

15

Nos termos do artigo 18.o do mesmo regulamento:

«1.   O Estado-Membro requerido procederá às verificações necessárias e deliberará sobre o pedido, para efeitos de tomada a cargo dum requerente, no prazo de dois meses a contar da data de apresentação desse pedido.

[…]

6.   Se o Estado-Membro requerente tiver invocado urgência, em conformidade com o n.o 2 do artigo 17.o, o Estado requerido fará todos os esforços necessários para cumprir o prazo solicitado. Em casos excecionais, sendo comprovável a especial complexidade da análise do pedido de tomada a cargo do requerente, o Estado-Membro requerido pode responder depois do prazo solicitado, mas sempre no prazo de um mês. Nestes casos, o Estado-Membro requerido deve, dentro do prazo solicitado inicialmente, comunicar ao Estado-Membro requerente a sua decisão de protelar a resposta.

7.   A ausência de resposta no termo do prazo de dois meses mencionado no n.o 1 e de um mês, previsto no n.o 6, equivale à aceitação do pedido e tem como consequência a obrigação de tomada a carga da pessoa, incluindo as providências adequadas para a sua chegada.»

16

O artigo 19.o do Regulamento n.o 343/2003, que prevê prazos para a execução da transferência do requerente de asilo, tem a seguinte redação:

«1.   Caso o Estado requerido aceite a tomada a cargo dum requerente, o Estado-Membro em que o pedido de asilo foi apresentado notificará o requerente da sua decisão de não analisar o pedido e da obrigação de transferência do requerente para o Estado-Membro responsável.

2.   A decisão a que se refere o n.o 1 deverá ser fundamentada e acompanhada das indicações de prazo relativas à execução da transferência, incluindo se necessário informações relativas ao local e à data em que o requerente deve apresentar-se no caso de se dirigir para o Estado-Membro responsável pelos seus próprios meios. A decisão é suscetível de recurso ou revisão. O recurso ou a revisão da decisão não têm efeito suspensivo sobre a execução da transferência, a não ser que os tribunais ou as autoridades competentes assim o decidam, especificamente, e a legislação nacional o permita.

3.   A transferência do requerente do Estado-Membro em que o pedido de asilo foi apresentado para o Estado-Membro responsável efetuar-se-á em conformidade com o direito nacional do Estado-Membro, após concertação entre os Estados-Membros envolvidos, logo que seja materialmente possível e, o mais tardar, no prazo de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada a cargo ou da decisão sobre o recurso ou revisão, nos casos em que exista efeito suspensivo.

[…]

4.   Se a transferência não for efetuada no prazo de seis meses, a responsabilidade incumbirá ao Estado-Membro em que o pedido de asilo tiver sido apresentado. Este prazo poderá ser alargado até, no máximo, um ano se a transferência não tiver sido efetuada devido a detenção do candidato a asilo, ou 18 meses, em caso de ausência deste.

[…]»

17

As modalidades relativas à retomada a cargo do requerente de asilo estão previstas no artigo 20.o do referido regulamento, que fixa as indicações que o pedido de retomada a cargo do requerente de asilo deve conter, as condições a que deve obedecer a resposta a este pedido, o prazo de resposta e as modalidades segundo as quais deve ter lugar a transferência do requerente de asilo.

Diretiva 2005/85/CE

18

O considerando 29 da Diretiva 2005/85/CE do Conselho, de 1 de dezembro de 2005, relativa a normas mínimas aplicáveis ao procedimento de concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados-Membros (JO L 326, p. 13), tem a seguinte redação:

«A presente diretiva não abrange os procedimentos regidos pelo Regulamento [...] n.o 343/2003 [...].»

19

O artigo 2.o da referida diretiva define os conceitos de «pedido de asilo» e «requerente» ou «requerente de asilo», cujo conteúdo corresponde, no essencial, ao dos mesmos conceitos que figuram na Diretiva 2003/9 e no Regulamento n.o 343/2003. Este artigo 2.o, alínea k), define, além disso, os seguintes termos:

«‘Permanência no Estado-Membro’, a permanência no território do Estado-Membro em que o pedido de asilo foi apresentado ou esteja a ser examinado, incluindo a fronteira e as zonas de trânsito desse território.»

20

Sob o capítulo II da Diretiva 2005/85, intitulado «Princípios e garantias fundamentais», o seu artigo 7.o, intitulado «Direito de permanência no Estado-Membro durante a apreciação do pedido», enuncia no seu n.o 1:

«Os requerentes de asilo são autorizados a permanecer no Estado-Membro, unicamente para efeitos do procedimento, até à pronúncia de uma decisão pelo órgão de decisão nos termos dos procedimentos em primeira instância contemplados no Capítulo III. Este direito de permanência não habilita o requerente de asilo à autorização de residência.»

21

O artigo 35.o da mesma diretiva prevê:

«1.   Os Estados-Membros podem estabelecer, de acordo com os princípios e garantias fundamentais enunciados no capítulo II, procedimentos para aprovar decisões na fronteira ou em zonas de trânsito do Estado-Membro, sobre os pedidos de asilo apresentados nesses locais.

2.   Todavia, na ausência dos procedimentos referidos no n.o 1 e sob reserva do disposto no presente artigo, os Estados-Membros podem manter, de acordo com as disposições legislativas ou regulamentares em vigor a partir de 1 de dezembro de 2005, procedimentos que derroguem aos princípios e às garantias fundamentais enunciadas no capítulo II a fim de proferirem decisões, na fronteira ou nas zonas de trânsito, sobre a autorização de entrada no seu território de requerentes de asilo que aí tenham chegado e apresentado um pedido de asilo.

3.   Os procedimentos referidos no n.o 2 devem assegurar, em especial, que as pessoas em causa:

a)

Sejam autorizadas a permanecer na fronteira ou nas zonas de trânsito do Estado-Membro, sem prejuízo do artigo 7.o;

[…]»

Regulamento (CE) n.o 1560/2003

22

O Regulamento (CE) n.o 1560/2003 da Comissão, de 2 de setembro de 2003, relativo às modalidades de aplicação do Regulamento n.o 343/2003 (JO L 222, p. 3), dispõe no seu artigo 8.o, intitulado «Cooperação com vista à transferência»:

«1.   O Estado-Membro responsável é obrigado a permitir a transferência do requerente o mais rapidamente possível e deve garantir que não sejam criados obstáculos à sua entrada. Incumbe-lhe determinar, se for caso disso, o local do seu território em que o requerente será transferido ou entregue às autoridades competentes, tendo em conta os condicionalismos geográficos e os meios de transporte disponíveis para o Estado-Membro que procede à transferência. Não pode ser exigido, em caso algum, que a escolta acompanhe o requerente para além do ponto de chegada do meio de transporte internacional utilizado ou que o Estado-Membro que procede à transferência suporte as despesas de transporte para além desse ponto.

2.   Incumbe ao Estado-Membro que procede à transferência organizar o transporte do requerente e da respetiva escolta e fixar, em concertação com o Estado-Membro responsável, a hora de chegada e, se for caso disso, as modalidades de entrega do requerente às autoridades competentes. O Estado-Membro responsável pode exigir um pré-aviso de três dias úteis.»

Decisão n.o 573/2007/CE

23

O considerando 13 da Decisão n.o 573/2007/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de maio de 2007, que cria o Fundo Europeu para os Refugiados para o período de 2008 a 2013 no âmbito do programa geral «Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios» e que revoga a Decisão 2004/904/CE do Conselho (JO L 144, p. 1), tem a seguinte redação:

«A presente decisão é concebida para se inscrever num quadro coerente, que inclui igualmente a Decisão n.o 574/2007/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de maio de 2007, que cria o Fundo para as Fronteiras Externas para o período de 2007 a 2013 no âmbito do programa geral ‘Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios’, a Decisão n.o 575/2007/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de maio de 2007, que cria o Fundo Europeu de Regresso para o período de 2008 a 2013 no âmbito do programa geral ‘Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios’, e a Decisão 2007/[…]/CE do Conselho, de..., que cria o Fundo Europeu para a Integração de Nacionais de Países Terceiros para o período de 2007 a 2013 no âmbito do programa geral ‘Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios’, e cujo objetivo é tratar a questão da partilha equitativa das responsabilidades entre os Estados-Membros no que diz respeito aos encargos financeiros resultantes da introdução de uma gestão integrada das fronteiras externas da União Europeia e da aplicação de políticas comuns relativas ao asilo e à imigração, desenvolvidas em conformidade com o Título IV da Parte III do Tratado [CE].»

24

O artigo 2.o da Decisão n.o 573/2007, intitulado «Objetivo geral do Fundo», prevê:

«1.   O Fundo tem por objetivo geral apoiar e encorajar os esforços realizados pelos Estados-Membros para acolher refugiados e pessoas deslocadas e suportar as consequências desse acolhimento, através do cofinanciamento das ações previstas na presente decisão, tendo em conta a legislação comunitária nestes domínios.

2.   O Fundo contribui para financiar a assistência técnica por iniciativa dos Estados-Membros ou da Comissão.»

25

O artigo 3.o da referida decisão, intitulado «Ações elegíveis nos Estados-Membros», enuncia no seu n.o 1:

«O Fundo apoia as ações executadas nos Estados-Membros relativas a um ou mais dos seguintes aspetos:

a)

Condições de acolhimento e procedimentos de asilo;

[…]»

Direito francês

Código da entrada e residência dos estrangeiros e do direito de asilo

26

Nos termos do artigo L.723-1 do code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile (Código da entrada e residência dos estrangeiros e do direito de asilo, a seguir «Ceseda»):

«O Instituto [francês de proteção dos refugiados e apátridas, a seguir ‘OFPRA’] conhece dos pedidos de asilo que lhe são submetidos. Este Instituto não é, todavia, competente para apreciar o pedido apresentado por uma pessoa cuja permanência tenha sido recusada com fundamento previsto no n.o 1 do artigo L.741-4.

[…]»

27

O artigo L.741-4 do referido código dispõe:

«Sem prejuízo do respeito do disposto no artigo 33.o da [Convenção de Genebra], a admissão em França de um estrangeiro requerente de asilo só pode ser recusada caso:

a análise do pedido de asilo for da competência de outro Estado por força das disposições do [Regulamento n.o 343/2003] ou de compromissos idênticos aos previstos no referido regulamento assumidos com outros Estados;

[…]»

28

O artigo L.742.1 do Ceseda enuncia:

«Quando um estrangeiro que requer o benefício do asilo é autorizado a permanecer em França em aplicação das disposições do capítulo I do presente título, será emitido um documento de residência provisório que lhe permita apresentar um pedido de asilo ao [OFPRA]. O requerente só poderá apresentar o pedido ao [OFPRA] quando lhe tiver sido entregue este documento. Após ter apresentado o seu pedido de asilo, é entregue ao requerente um novo documento de residência provisório. Este documento é renovado até à data da tomada de decisão do Instituto e, caso seja interposto recurso na Cour nationale du droit d’asile, até à data da prolação da decisão por parte da cour».

Código da ação social e das famílias

29

O artigo L.348-1 do Código da ação social e das famílias prevê que «os estrangeiros que disponham de um dos documentos de residência referidos no artigo L.742 1 do [Ceseda] têm direito, a pedido destes, a ser alojados num centro de acolhimento para requerentes de asilo».

Código do Trabalho

30

O artigo L.5423-8 do Código do Trabalho dispõe:

«Sem prejuízo das disposições do artigo L.5423-9, podem beneficiar do subsídio temporário de emergência [a seguir ‘STE’]:

Os nacionais estrangeiros cujo título de permanência ou confirmativo do pedido de título de permanência mencione que solicitaram asilo em França e que apresentaram um pedido a requerer o estatuto de refugiado, caso cumpram os requisitos relativos à idade e aos recursos;

[…]»

31

Nos termos do artigo L.5423-9 do referido código:

Não podem beneficiar do [STE]:

Os requerentes de asilo que, na sequência de uma decisão de indeferimento definitiva, apresentem um pedido de reexame ao [OFPRA], com exceção dos casos humanitários assinalados pelo [OFPRA] nas condições previstas por via regulamentar;

[…]»

32

O artigo L.5423-11 do mesmo código tem a seguinte redação:

«O [STE] é pago mensalmente, no final de cada mês, às pessoas cujo pedido de asilo não foi objeto de decisão definitiva.

O pagamento do subsídio cessa no fim do mês seguinte ao da notificação da decisão definitiva relativa a este pedido.»

Circular de 3 de novembro de 2009

33

A Circular de 3 de novembro de 2009, relativa aos beneficiários do STE, enuncia, nomeadamente, na sua primeira parte:

«I.

Os requerentes de asilo

Em conformidade com a [Diretiva 2003/9], o STE é um rendimento de subsistência pago aos requerentes de asilo durante o processo de instrução do pedido destes, quando estes preencham os seguintes requisitos.

I.1.

Requisitos de concessão do STE

Sem prejuízo das exclusões referidas no ponto I.2 e do preenchimento do requisito relativo aos recursos, pode beneficiar do STE o nacional estrangeiro:

que tenha atingido a idade de dezoito anos;

que tenha apresentado um pedido de asilo no OFPRA e disponha de uma carta do Instituto, informando-o do registo do seu pedido;

cujo pedido de asilo ainda não foi objeto de decisão definitiva do OFPRA ou da CNDA [Cour nationale du droit d’asile];

que possua um título de residência ou um comprovativo do pedido do título de residência com a menção de que solicitou asilo em França; este requisito não é aplicável aos nacionais de países considerados países de origem seguros [...] e de países a que o artigo 1 C 5 da Convenção de Genebra diz respeito, para os quais é suficiente a carta de registo do OFPRA.

[…]

I.2.

Causas de exclusão do benefício do STE

[…]

I.2.2.

Outras causas de exclusão [...]

[…]

Os requerentes de asilo não podem beneficiar do STE quando lhes tiver sido recusada a permanência em conformidade com as disposições previstas nos pontos 1°, 3° e 4° do artigo L.741-4 do Ceseda. Trata-se das:

1)

pessoas cujo pedido de asilo é da competência de outro Estado europeu em aplicação das disposições do [Regulamento n.o 343/2003], denominado ‘Dublim II’;

[…]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

34

Em 26 de janeiro de 2010, a Cimade e o GISTI interpuseram no Conseil d’État recurso de anulação da Circular de 3 de novembro de 2009. Sustentam que esta circular é contrária aos objetivos da Diretiva 2003/9 na medida em que exclui os requerentes de asilo do benefício do STE nos casos em que, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, a República Francesa requer a outro Estado-Membro, que considera responsável pelo pedido dos interessados, que os tome ou retome a cargo.

35

Considerando que a resposta a este fundamento exige uma interpretação das disposições pertinentes do direito da União, o Conseil d’État decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A Diretiva 2003/9[…] garante o benefício das condições mínimas de acolhimento por ela previstas aos requerentes de asilo num Estado-Membro que decide, em aplicação do [Regulamento n.o 343/2003], remeter o pedido a outro Estado-Membro que considera responsável pelo exame desse pedido, durante todo o procedimento de tomada ou retomada a cargo por esse outro Estado-Membro?

2)

Em caso de resposta afirmativa a esta questão:

a)

A obrigação, que incumbe ao primeiro Estado-Membro, de garantir o benefício das condições mínimas de acolhimento termina no momento da decisão de aceitação pelo Estado requerido, no momento da tomada ou retomada a cargo efetivas do requerente de asilo ou noutra data?

b)

A que Estado-Membro incumbe o encargo financeiro da prestação das condições mínimas de acolhimento durante esse período?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

36

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se um Estado-Membro, ao qual foi apresentado um pedido de asilo na sua fronteira ou no seu território, é obrigado a conceder as condições mínimas de acolhimento aos requerentes de asilo previstas na Diretiva 2003/9, mesmo ao requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro que tome ou retome a cargo o interessado, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo.

37

A este respeito, importa desde já salientar que o âmbito de aplicação da Diretiva 2003/9 é definido no seu artigo 3.o, segundo o qual esta diretiva é aplicável a todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentem um pedido de asilo na fronteira ou no território de um Estado-Membro enquanto lhes for permitido permanecer nesse território na qualidade de requerentes de asilo.

38

Assim, a primeira condição exigível para efeitos da aplicação da Diretiva 2003/9 é a de que deve ter sido apresentado um pedido de asilo na fronteira ou no território de um Estado-Membro. A este respeito, o artigo 2.o, alínea b), desta diretiva dispõe que se deve entender por «pedido de asilo»«o pedido apresentado por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida que possa ser considerado como um pedido de proteção internacional dirigido a um Estado-Membro, ao abrigo da Convenção de Genebra» e que «[u]m pedido de proteção internacional deve ser considerado um pedido de asilo, salvo se o nacional de um país terceiro ou o apátrida solicitar expressamente outra forma de proteção suscetível de ser objeto de um pedido separado». A definição de pedido de asilo enunciada no artigo 2.o, alínea c), do Regulamento n.o 343/2003 é, no essencial, idêntica à definição acima mencionada.

39

No que se refere ao período durante o qual as condições materiais de acolhimento, incluindo o alojamento, a alimentação, o vestuário e um subsídio para despesas diárias, devem ser concedidas aos requerentes, o artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2003/9 prevê que este período tem início quando os requerentes de asilo apresentam o seu pedido de asilo.

40

Além disso, decorre dos artigos 2.° e 3.° da Diretiva 2003/9 que esta prevê apenas uma categoria de requerentes de asilo que abrange todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentem um pedido de asilo. Esta diretiva não contém nenhuma disposição suscetível de ser interpretada no sentido de que um pedido de asilo só pode ser considerado apresentado caso tenha sido apresentado às autoridades do Estado-Membro responsável pela análise deste pedido.

41

Esta interpretação também é corroborada pelo artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 343/2003, segundo o qual o procedimento de determinação do Estado-Membro responsável por força do mesmo regulamento é desencadeado quando um pedido de asilo é apresentado pela primeira vez a um Estado-Membro. Esta disposição implica necessariamente que um pedido de asilo seja apresentado antes de ser desencadeado o procedimento de determinação do Estado-Membro responsável.

42

A interpretação das disposições da Diretiva 2003/9 também deve ser efetuada à luz da economia geral e da finalidade desta, bem como, em conformidade com o considerando 5 desta diretiva, no respeito dos direitos fundamentais e dos princípios reconhecidos nomeadamente pela Carta. Segundo este considerando, a diretiva visa, em particular, assegurar o respeito integral da dignidade humana e promover a aplicação dos artigos 1.° e 18.° da Carta.

43

Assim, estas exigências são impostas não apenas aos requerentes de asilo que se encontrem no território do Estado-Membro responsável a aguardar a decisão deste último relativa ao seu pedido de asilo como também aos requerentes de asilo que aguardam a determinação do Estado-Membro responsável por este pedido.

44

A este respeito, não se pode sustentar validamente que as normas mínimas de acolhimento dos requerentes de asilo não são aplicáveis aos requerentes de asilo aos quais diga respeito o procedimento de determinação do Estado responsável pelo facto de este procedimento ser rápido. Com efeito, resulta dos artigos 17.° e 18.° do Regulamento n.o 343/2003 que, no caso de um procedimento normal, pode decorrer um período de cinco meses entre a data da apresentação do pedido de asilo e a data em que o Estado-Membro requerido se pronuncie sobre o pedido de tomada a cargo do requerente de asilo. A este período é acrescido o tempo necessário para proceder à transferência, cujo prazo é, normalmente, nos termos do artigo 19.o do referido regulamento, de seis meses a contar da aceitação do pedido de tomada a cargo.

45

Além disso, o procedimento previsto no Regulamento n.o 343/2003 pode, em determinados casos, conduzir a que o requerente de asilo nunca chegue a ser transferido para o Estado-Membro requerido, mas permaneça no Estado-Membro em que apresentou o seu pedido de asilo. Os prazos previstos nos artigos 17.° a 20.° deste regulamento só dizem respeito à situação em que o Estado-Membro requerido aceita a tomada ou retomada a cargo ou não responde ao pedido do Estado-Membro requerente. Em caso de resposta negativa do Estado-Membro requerido, a regulamentação em causa prevê apenas um procedimento de conciliação voluntária. Nestas situações, a permanência temporária do requerente de asilo no território do Estado-Membro requerente pode estender-se por um período de tempo bastante longo. Por conseguinte, a exclusão dos requerentes de asilo aos quais diga respeito o procedimento de determinação do Estado responsável do benefício das normas mínimas de acolhimento dos requerentes de asilo não se pode de modo nenhum justificar pela duração desse procedimento.

46

A segunda condição de aplicação da Diretiva 2003/9 é a de que os requerentes de asilo devem ser autorizados a permanecer no território do Estado-Membro em causa na qualidade de requerentes de asilo. A este respeito, o Governo francês não pode utilmente sustentar que, uma vez que o considerando 29 da Diretiva 2005/85 prevê claramente que os pedidos regidos pelo Regulamento n.o 343/2003 são excluídos do âmbito de aplicação desta última diretiva, o direito conferido a um requerente de asilo pelo artigo 7.o, n.o 1, desta de permanecer no Estado-Membro para efeitos do procedimento de análise não pode ser aplicável a esse requerente quando lhe disser respeito o procedimento de determinação do Estado responsável previsto nesse regulamento.

47

Com efeito, em conformidade com o artigo 2.o, alínea k), da Diretiva 2005/85, os termos «permanência no Estado-Membro» devem ser entendidos como o facto de permanecer no território, incluindo na fronteira ou numa zona de trânsito, não só do Estado-Membro em que o pedido de asilo é analisado mas também daquele onde o pedido de asilo foi apresentado.

48

Assim, cumpre concluir que os requerentes de asilo estão autorizados a permanecer não só no território do Estado-Membro em que o pedido de asilo é examinado mas também no território do Estado-Membro em que o pedido foi apresentado, como exige o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2003/9.

49

Tal interpretação não pode ser infirmada pelo considerando 29 da Diretiva 2005/85, que se refere apenas ao facto de os procedimentos previstos nesta diretiva para a concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados-Membros se distinguem dos procedimentos instituídos pelo Regulamento n.o 343/2003 para a determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo.

50

Consequentemente, há que responder à primeira questão que a Diretiva 2003/9 deve ser interpretada no sentido de que um Estado-Membro ao qual foi apresentado um pedido de asilo deve conceder as condições mínimas de acolhimento dos requerentes de asilo previstas na Diretiva 2003/9, mesmo a um requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo, que tome ou retome a cargo este requerente.

Quanto à segunda questão

51

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, por um lado, em que momento cessa a obrigação do Estado-Membro ao qual foi apresentado um pedido de asilo de conceder as condições mínimas de acolhimento previstas na Diretiva 2003/9 a um requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro que tome ou retome a cargo este requerente, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo, e, por outro, a qual Estado-Membro incumbe o encargo financeiro da concessão destas condições mínimas.

52

No que diz respeito à duração da obrigação de concessão das condições mínimas de acolhimento, importa recordar, em primeiro lugar, que, como foi referido nos n.os 37 e 38 do presente acórdão, o âmbito de aplicação pessoal da Diretiva 2003/9 abrange qualquer requerente de asilo que tenha apresentado um pedido de asilo pela primeira vez num Estado-Membro.

53

Em segundo lugar, importa salientar que, em conformidade com os artigos 2.°, alínea c), da Diretiva 2003/9 e 2.°, alínea d), do Regulamento n.o 343/2003, um requerente ou um requerente de asilo é um nacional de um país terceiro ou um apátrida que apresentou um pedido de asilo que ainda não foi objeto de decisão definitiva. Assim, o requerente mantém o seu estatuto de requerente de asilo na aceção dessa diretiva até à data da adoção de uma decisão definitiva.

54

Em terceiro lugar, resulta dos artigos 17.° a 19.° do Regulamento n.o 343/2003 que o simples pedido de um Estado-Membro, ao qual foi apresentado um pedido de asilo a fim de obter a tomada a cargo desse requerente de asilo por outro Estado-Membro, não põe termo à análise do pedido de asilo no Estado requerente. Com efeito, mesmo nos casos em que o Estado-Membro requerido aceita esta tomada a cargo, não é menos certo que, em conformidade com esse artigo 19.o, n.o 4, se a transferência não for efetuada no prazo de seis meses, a responsabilidade pela análise do pedido de asilo incumbirá ao Estado-Membro em que este pedido tiver sido apresentado. Além disso, como foi referido no n.o 45 do presente acórdão, em caso de resposta negativa do Estado-Membro requerido, a regulamentação em causa prevê apenas um procedimento de conciliação voluntária e, nesse caso, não está excluído que o requerente de asilo permaneça no território do Estado-Membro requerente.

55

Há que concluir do exposto que nem a decisão do Estado-Membro de requerer a outro Estado-Membro que considera responsável pela análise do pedido de asilo que tome a cargo o requerente de asilo nem a aceitação deste pedido pelo Estado-Membro requerido constituem uma decisão definitiva na aceção da Diretiva 2003/9. Daqui decorre que só a transferência efetiva do requerente de asilo pelo Estado-Membro requerente põe termo à análise do pedido de asilo por este Estado e à sua responsabilidade relativa à concessão das condições mínimas de acolhimento.

56

Além disso, a economia geral e a finalidade da Diretiva 2003/9, bem como o respeito dos direitos fundamentais, nomeadamente as exigências do artigo 1.o da Carta, segundo o qual a dignidade humana deve ser respeitada e protegida, opõem-se, como foi referido nos n.os 42 a 45 do presente acórdão, a que um requerente de asilo seja privado, nem que seja por um período temporário após a apresentação do pedido de asilo e antes de ser efetivamente transferido para o Estado-Membro responsável, da proteção das normas mínimas previstas nessa diretiva.

57

As condições de acolhimento previstas na Diretiva 2003/9 só podem ser limitadas ou retiradas nos casos enumerados no artigo 16.o desta diretiva quando o requerente de asilo não respeite o regime de acolhimento estabelecido pelo Estado-Membro em causa.

58

Resulta do exposto que a obrigação do Estado-Membro, ao qual foi apresentado um pedido de asilo na sua fronteira ou no seu território, de conceder as condições mínimas previstas na Diretiva 2003/9 a um requerente de asilo, relativamente ao qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro que tome ou retome a cargo este requerente de asilo, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise deste pedido de asilo, cessa apenas após a transferência efetiva do referido requerente de asilo pelo Estado-Membro requerente.

59

No que respeita à questão de saber a que Estado-Membro incumbe o encargo financeiro da concessão destas condições mínimas, importa salientar que o encargo financeiro ligado às exigências decorrentes da necessidade de um Estado-Membro de se conformar com o direito da União incumbe normalmente ao Estado-Membro sobre o qual impende a obrigação de responder a estas exigências, a saber, num processo como o processo principal, o Estado-Membro que é obrigado a garantir as condições mínimas de acolhimento previstas na Diretiva 2003/9, em conformidade com o que foi referido no número anterior, salvo disposição em contrário na regulamentação da União. Não existindo disposições contrárias a este respeito, tanto na Diretiva 2003/9 como no Regulamento n.o 343/2003, há que declarar que o encargo financeiro da concessão destas condições mínimas incumbe ao Estado-Membro sobre o qual impende a referida obrigação.

60

Além disso, importa salientar que, tendo presente a preocupação de responder à necessidade de uma repartição equitativa das responsabilidades entre os Estados-Membros no que se refere ao encargo financeiro decorrente da implementação das políticas comuns de asilo e de imigração, necessidade que poderia surgir nomeadamente quando de fluxos migratórios importantes, o Fundo Europeu para os Refugiados, criado pela Decisão n.o 573/2007 no âmbito do Programa geral «Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios», prevê a possibilidade de apresentação de uma proposta de assistência financeira aos Estados-Membros relativa, nomeadamente, às condições de acolhimento e aos procedimentos de asilo.

61

Por conseguinte, há que responder à segunda questão que a obrigação do Estado-Membro ao qual foi apresentado um pedido de asilo de conceder as condições mínimas previstas na Diretiva 2003/9 a um requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo, que tome ou retome a cargo este requerente cessa com a transferência efetiva do mesmo requerente pelo Estado-Membro requerente e o encargo financeiro da concessão destas condições mínimas incumbe a este último Estado-Membro, sobre o qual impende a referida obrigação.

Quanto às despesas

62

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

A Diretiva 2003/9/CE do Conselho, de 27 de janeiro de 2003, que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados-Membros, deve ser interpretada no sentido de que um Estado-Membro ao qual foi apresentado um pedido de asilo deve conceder as condições mínimas de acolhimento dos requerentes de asilo previstas na Diretiva 2003/9, mesmo a um requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro, requerer a outro Estado-Membro, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo, que tome ou retome a cargo este requerente.

 

2)

A obrigação do Estado-Membro ao qual foi apresentado um pedido de asilo de conceder as condições mínimas previstas na Diretiva 2003/9 a um requerente de asilo a respeito do qual decide, em aplicação do Regulamento n.o 343/2003, requerer a outro Estado-Membro, na qualidade de Estado-Membro responsável pela análise do seu pedido de asilo, que tome ou retome a cargo este requerente cessa com a transferência efetiva do mesmo requerente pelo Estado-Membro requerente e o encargo financeiro da concessão destas condições mínimas incumbe a este último Estado-Membro, sobre o qual impende a referida obrigação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.

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