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Document 62008CV0001

Parecer do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 30 de Novembro de 2009.
Avis au titre de l'article 300, paragraphe 6, CE.
Parecer proferido nos termos do artigo 300.º, n.º 6, CE - Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) - Listas de compromissos específicos - Celebração de acordos relativos à concessão de compensações tendo em conta a alteração e a retirada de certos compromissos na sequência da adesão de novos Estados-Membros à União Europeia - Competência partilhada - Bases jurídicas - Política comercial comum - Política comum dos transportes.
Parecer 1/08.

European Court Reports 2009 I-11129

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2009:739

PARECER 1/08 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

30 de Novembro de 2009

Índice

 

Exposição do contexto do pedido de parecer

 

GATS

 

A — Objecto e génese dos acordos cuja celebração está projectada

 

Forma e conteúdo dos acordos em causa

 

Pedido de parecer

 

Observações escritas dos Estados-Membros e das instituições

 

Quanto à articulação das duas questões colocadas no pedido de parecer e à ordem por que são examinadas

 

Quanto à primeira questão

 

Quanto à segunda questão

 

Quanto ao artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE

 

Quanto aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE

 

Posição do Tribunal de Justiça

 

Quanto ao objecto dos acordos em causa

 

Quanto ao objecto das questões dirigidas ao Tribunal de Justiça e à ordem por que são examinadas

 

Quanto à competência da Comunidade para celebrar os acordos em causa e quanto às bases jurídicas relativas a essa celebração

 

Quanto ao recurso ao artigo 133.o, n.os 1 e 5, CE, relativo à política comercial comum

 

Quanto ao recurso ao artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE e quanto à participação dos Estados-Membros na celebração dos acordos em causa

 

Quanto ao recurso aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, relativos à política comum de transportes

«Parecer proferido nos termos do artigo 300.o, n.o 6, CE — Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) — Listas de compromissos específicos — Celebração de acordos relativos à concessão de compensações tendo em conta a alteração e a retirada de certos compromissos na sequência da adesão de novos Estados-Membros à União Europeia — Competência partilhada — Bases jurídicas — Política comercial comum — Política comum dos transportes»

No processo de parecer 1/08,

que tem por objecto um pedido de parecer nos termos do artigo 300.o, n.o 6, CE, apresentado em 18 de Fevereiro de 2008 pela Comissão das Comunidades Europeias,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, J.-C. Bonichot, R. Silva de Lapuerta e C. Toader, presidentes de secção, C. W. A. Timmermans, K. Schiemann (relator), J. Malenovský, T. von Danwitz e A. Arabadjiev, juízes,

secretário: M.-A. Gaudissart, chefe de unidade,

vistos os autos e após a audiência de 10 de Fevereiro de 2009,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por E. White, M. Huttunen e L. Prete, na qualidade de agentes,

em representação do Governo checo, por M. Smolek, na qualidade de agente,

em representação do Governo dinamarquês, por C. Pilgaard Zinglersen, na qualidade de agente,

em representação do Governo alemão, por M. Lumma e N. Graf Vitzthum, na qualidade de agentes,

em representação do Governo helénico, por A. Samoni-Rantou, S. Chala e G. Karipsiadis, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por N. Díaz Abad, na qualidade de agente,

em representação da Irlanda, por D. J. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por A. Collins e M. Collins, SC,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por P. Gentili, avvocato dello Stato,

em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e E. Matulionytė, na qualidade de agentes,

em representação do Governo neerlandês, por C. Wissels e M. de Grave, na qualidade de agentes,

em representação do Governo polaco, por M. Dowgielewicz, C. Herma e M. Kamejsza, na qualidade de agentes,

em representação do Governo português, por L. Inez Fernandes e M. João Palma, na qualidade de agentes,

em representação do Governo romeno, por A. Ciobanu-Dordea, N. Mitu, E. Gane e C. Osman, na qualidade de agentes,

em representação do Governo finlandês, por J. Heliskoski, na qualidade de agente,

em representação do Governo sueco, por A. Falk, na qualidade de agente,

em representação do Governo do Reino Unido, por I. Rao, na qualidade de agente, assistida por A. Dashwood, barrister,

em representação do Parlamento Europeu, por R. Passos e D. Gauci, na qualidade de agentes,

em representação do Conselho da União Europeia, por J.-P. Hix e R. Liudvinaviciute-Cordeiro, na qualidade de agentes,

ouvidos em conferência, em 3 de Junho de 2009, E. Sharpston, primeiro-advogado-geral, D. Juiz-Jarabo Colomer, J. Kokott, M. Poiares Maduro, P. Mengozzi, Y. Bot, J. Mazák e V. Trstenjak, advogados-gerais,

profere o presente

Parecer

1

O pedido tem por objecto o carácter partilhado ou exclusivo da competência da Comunidade Europeia e a base jurídica adequada a que se deve recorrer para celebrar com certos membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) acordos tendo em vista alterar as listas de compromissos específicos da Comunidade e dos seus Estados-Membros ao abrigo do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS).

2

Nos termos do artigo 300.o, n.o 6, CE, «[o] Parlamento Europeu, o Conselho, a Comissão ou qualquer Estado-Membro podem obter previamente o parecer do Tribunal de Justiça sobre a compatibilidade de um projecto de acordo com as disposições do presente Tratado. Um acordo que tenha sido objecto de parecer negativo do Tribunal de Justiça só pode entrar em vigor nas condições previstas no artigo 48.o do Tratado da União Europeia».

Exposição do contexto do pedido de parecer

GATS

3

Através da Decisão 94/800/CE, de 22 de Dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994) (JO L 336, p. 1), o Conselho aprovou o Acordo que institui a OMC e os acordos que constam dos anexos 1 a 3 do referido acordo, entre os quais figura o GATS.

4

Nos termos do artigo I, n.o 2, do GATS:

«Para efeitos do disposto no presente acordo, o comércio de serviços é definido como a prestação de um serviço:

a)

Com origem no território de um membro e com destino ao território de qualquer outro membro [(a seguir ‘modo 1’)];

b)

No território de um membro a um consumidor de serviços de qualquer outro membro [(a seguir ‘modo 2’)];

c)

Por um prestador de serviços de um membro através da presença comercial no território de qualquer outro membro [(a seguir ‘modo 3’)];

d)

Por um prestador de serviços de um membro através da presença de pessoas singulares de um membro no território de qualquer outro membro [(a seguir ‘modo 4’)].»

5

Sob a epígrafe «Integração económica», o artigo V do GATS prevê:

«1.   O presente acordo não impedirá que qualquer dos seus membros seja parte ou subscreva um acordo de liberalização do comércio de serviços entre as partes nesse acordo, desde que o acordo em questão [preencha certos requisitos].

[…]

5.   Sempre que, aquando da conclusão, alargamento ou qualquer alteração significativa de qualquer acordo nos termos do n.o 1, um membro tencione retirar ou alterar um compromisso específico de forma incompatível com as condições estabelecidas na sua lista, deverá comunicar essa alteração ou retirada com uma antecedência de pelo menos 90 dias, sendo aplicável o procedimento estabelecido nos n.os 2, 3 e 4 do artigo XXI.

[…]»

6

Inserido na parte III do GATS, intitulada «Compromissos específicos», o artigo XVI estipula:

«1.   No que diz respeito ao acesso ao mercado através dos modos de prestação definidos no artigo I, cada membro concederá aos serviços e aos prestadores de serviços de qualquer outro membro um tratamento não menos favorável do que o concedido de acordo com as condições e limitações acordadas e especificadas na sua lista […]

2.   Nos sectores em que sejam assumidos compromissos de acesso ao mercado, as medidas que um membro não manterá nem adoptará em relação a uma subdivisão regional ou à totalidade do seu território, salvo especificação em contrário na sua lista, são definidas como:

a)

Limitações do número de prestadores de serviços, quer sob a forma de quotas numéricas, monopólios ou prestadores de serviços em regime de exclusividade quer com base numa avaliação das necessidades económicas;

b)

Limitações do valor total das transacções ou activos nos sectores de serviços, sob a forma de quotas numéricas ou com base numa avaliação das necessidades económicas;

c)

Limitações do número total de operações de serviços ou da [quantidade] total de serviços prestados expressas em termos de unidades numéricas específicas, sob a forma de quotas ou com base numa avaliação das necessidades económicas;

d)

Limitações do número total de pessoas singulares que podem ser empregadas num determinado sector de serviços ou que um prestador de serviços pode empregar e que são necessárias para a prestação de um serviço específico, estan[d]o directamente relacionadas como esse serviço, sob a forma de quotas numéricas ou com base numa avaliação das necessidades económicas;

e)

Medidas que restringem ou exigem tipos específicos de entidades jurídicas ou de empresas comuns através das quais um prestador de serviços pode prestar um serviço, e

f)

Limitações à participação de capital estrangeiro através da fixação de um limite máximo percentual para a participação de estrangeiros no capital social de empresas ou do valor total do investimento estrangeiro individual ou global.»

7

Nos termos do artigo XVII, n.o 1, do GATS:

«Nos sectores inscritos na sua lista, e tendo em conta as condições e qualificações aí estabelecidas, cada membro concederá aos serviços e aos prestadores de serviços de qualquer outro membro, relativamente a todas a medidas que afectem a prestação de serviços, um tratamento não menos favorável do que o que concede aos serviços e prestadores de serviços nacionais comparáveis […]»

8

O artigo XX do GATS estipula:

«1.   Cada membro estabelecerá uma lista incluindo os compromissos específicos que assume ao abrigo da parte III do presente acordo. No que diz respeito aos sectores em que esses compromissos são assumidos, cada lista deverá especificar:

a)

As condições e limitações referentes ao acesso ao mercado;

b)

As condições e qualificações referentes ao tratamento nacional;

[…]

3.   As listas de compromissos específicos serão anexas ao presente acordo, constituindo uma parte integrante do mesmo.»

9

Os compromissos específicos revestem ora um alcance horizontal, na medida em que respeitam, de modo indiferenciado, a todos os serviços mencionados na lista do membro em causa (a seguir «compromissos horizontais»), ora um alcance sectorial, quando respeitam a um sector de serviços particular (a seguir «compromissos sectoriais»).

10

Sob a epígrafe «Alteração das listas», o artigo XXI do GATS prevê:

a)

Um membro (designado por ‘membro que introduz uma alteração’ no presente artigo) poderá alterar ou retirar qualquer compromisso constante da sua lista a qualquer momento após decorridos três anos a contar da data em que esse compromisso entrou em vigor, de acordo com o disposto no presente artigo.

b)

Um membro que introduz uma alteração notificará o Conselho do Comércio de Serviços da sua intenção de alterar ou retirar um compromisso nos termos do presente artigo, o mais tardar três meses antes da data prevista para implementação da alteração ou da retirada.

a)

A pedido de qualquer membro cujos benefícios ao abrigo do presente acordo possam ser afectados (designado por ‘membro afectado’ no presente artigo) por uma alteração ou retirada prevista e notificada […], o membro que introduz uma alteração acederá a negociar com vista a chegar a acordo quanto a eventuais compensações necessárias. No decurso dessas negociações e a nível desse acordo, os membros envolvidos esforçar-se-ão por manter um nível geral de compromissos mutuamente vantajosos não menos favorável ao comércio do que o previsto nas listas de compromissos específicos antes dessas negociações.

b)

As compensações serão estabelecidas na base do princípio da nação mais favorecida.

a)

Caso o membro que introduz uma alteração e qualquer membro afectado não cheguem a acordo antes do termo do período previsto para as negociações, o membro afectado poderá submeter o assunto a arbitragem. Qualquer membro afectado que pretenda fazer valer um eventual direito a compensação deverá participar no processo de arbitragem.

b)

Se nenhum membro afectado tiver requerido um processo de arbitragem, o membro que introduz uma alteração será livre de implementar a alteração ou retirada prevista.

[…]

5.   O Conselho do Comércio de Serviços estabelecerá procedimentos para a rectificação ou alteração das listas. Qualquer membro que tenha alterado ou retirado compromissos inscritos nas listas ao abrigo do disposto no presente artigo procederá à alteração da sua lista de acordo com esses procedimentos.»

11

As regras processuais referentes à alteração das listas aprovadas pelo Conselho do Comércio de Serviços, em 19 de Julho de 1999, constam do documento S/L/80, de , intitulado «Procedimentos para a aplicação do artigo XXI do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (Alteração das Listas)» (a seguir «regras processuais»).

12

Os n.os 5 e 6 das regras processuais enunciam:

«5.   No termo de cada negociação conduzida em conformidade com o n.o 2 a) do artigo XXI, o Membro que introduz a alteração dirigirá ao Secretariado uma carta conjunta assinada pelos membros interessados, bem como um relatório sobre os resultados das negociações, que será rubricado pelos Membros interessados. O Secretariado distribuirá a carta e o relatório a todos os Membros, sob a forma de documento secreto.

6.   Um Membro que introduza uma alteração e que tenha chegado a um acordo com todos os Membros [afectados] que tenham apresentado uma declaração […] dirigirá ao Secretariado, dentro dos 15 dias seguintes à conclusão das negociações, um relatório final sobre as negociações realizadas em conformidade com o artigo XXI, que será distribuído a todos os Membros sob a forma de documento secreto. Após a conclusão do procedimento de certificação previsto nos n.os 20 a 22, esse Membro que introduz a alteração será livre de implementar as alterações acordadas durante as negociações e especificadas no relatório, e notificará a data dessa implementação ao Secretariado, para efeitos de distribuição aos Membros da OMC. Essas alterações não irão além da alteração ou da retirada inicialmente notificadas e incluirão qualquer compensação acordada durante as negociações.»

13

O n.o 8 das regras processuais, que é aplicável quando não se tenha chegado a um acordo sobre as compensações, dispõe:

«Se nenhum Membro [afectado] que tenha apresentado uma declaração […] apresentar em tempo útil um pedido de arbitragem […], o Membro que introduz a alteração será livre de implementar a alteração ou a retirada projectada, após a conclusão do procedimento de certificação previsto nos n.os 20 a 22. […] O Membro autor da alteração notificará a data de execução ao Secretariado, para distribuição aos Membros da OMC.»

14

O n.o 20 das regras processuais prevê:

«As alterações aos textos autênticos das Listas anexas [ao GATS] que resultem de medidas adoptadas ao abrigo do artigo XXI produzirão efeitos por via de certificação. O projecto de lista com indicação clara e detalhada das alterações será comunicado ao Secretariado para distribuição a todos os Membros. As alterações entrarão em vigor no termo de um período de 45 dias a contar da data da sua distribuição ou numa data ulterior a precisar pelo Membro que as introduz […]»

A — Objecto e génese dos acordos cuja celebração está projectada

15

A Comissão expõe que, após a elaboração, ao abrigo do GATS, da lista de compromissos específicos da Comunidade e dos seus Estados-Membros, que à época eram doze, os alargamentos ocorridos em 1995 e 2004 tornaram necessária a elaboração de uma nova lista que incluísse os treze novos Estados-Membros até então titulares de uma lista própria de compromissos.

16

Em 28 de Maio de 2004, a Comissão, em aplicação do artigo V, n.o 5, do GATS, notificou a lista das alterações e retiradas de compromissos que se pretendia efectuar em relação às listas dos treze novos Estados-Membros, tendo em vista a fusão destas últimas com a actual lista da Comunidade e dos seus Estados-Membros (a seguir documento «S/SECRET/8»). A esta notificação seguiu-se uma segunda notificação, em , relativa à retirada de determinados compromissos contidos, respectivamente, nas listas da República de Malta e da República de Chipre (a seguir «documento S/SECRET/9»).

17

Na sequência de declarações de interesse formuladas por diversos membros da OMC que se consideravam afectados pelas alterações e retiradas de compromissos assim projectadas, a Comissão, agindo por conta da Comunidade e dos seus 25 Estados-Membros, conduziu negociações com vista a chegar a um acordo sobre compensações, em conformidade com o artigo XXI, n.o 2, do GATS.

18

No termo das referidas negociações, as partes chegaram a acordo sobre as compensações a atribuir tendo em conta as alterações e retiradas de compromissos mencionadas no documento S/SECRET/8. Em contrapartida, não chegaram a um consenso acerca das compensações no que se refere às retiradas de compromissos enumeradas no documento S/SECRET/9. Não foi dado início a nenhum processo de arbitragem a este respeito pelos membros afectados da OMC.

19

Conforme resulta das conclusões do Conselho de 26 de Julho de 2006, a Comissão foi autorizada a assinar os acordos assim negociados e a transmitir a lista consolidada dos compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros ao Secretariado da OMC, com vista à sua certificação.

20

As referidas conclusões precisavam, nomeadamente, que, «[a]o transmitir a lista consolidada de compromissos específicos da Comunidade Europeia e dos seus Estados-Membros […], a Comissão indicará que a nova lista entrará em vigor uma vez concluídos os processos internos de decisão da Comunidade Europeia e dos seus Estados-Membros, se for caso disso. A este respeito, a Comissão apresentará uma proposta ao Conselho».

21

Dezassete acordos foram assim assinados, respectivamente, com a República da Argentina, a Commonwealth da Austrália, a República Federativa do Brasil, o Canadá, a República Popular da China, o território aduaneiro distinto de Taiwan, Penghu, Kinmen e Matsu (Taipé chinês), a República da Colômbia, a República de Cuba, a República do Equador, Hong Kong (China), a República da Índia, o Japão, a República da Coreia, a Nova Zelândia, a República das Filipinas, a Confederação Suíça e os Estados Unidos da América (a seguir «acordos em causa»).

22

O procedimento de certificação foi concluído com êxito em 15 de Dezembro de 2006.

23

Em 27 de Março de 2007, a Comissão apresentou ao Conselho uma proposta de decisão relativa à celebração dos acordos em causa, com base no artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE, lido em conjugação com o artigo 300.o, n.o 2, CE.

24

Na exposição de motivos da referida proposta, a Comissão precisa, nomeadamente, que negociou os acordos em causa em nome e por conta da Comunidade e dos seus Estados-Membros, partindo da hipótese de que não se podia, ab initio, excluir que esses acordos exigissem a aprovação dos Estados-Membros. Tendo em conta a natureza das compensações efectivamente negociadas, a Comissão considera, no entanto, que estas não excedem o âmbito da competência interna da Comunidade e não procedem a uma harmonização das legislações dos Estados-Membros num domínio em que o Tratado a exclui, pelo que o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE não é aplicável e a celebração dos referidos acordos é, portanto, da competência exclusiva da Comunidade.

25

Os Estados-Membros e o Conselho, reunidos no seio deste, consideram, pelo contrário, que a celebração dos acordos em causa se insere numa competência partilhada entre a Comunidade e os seus Estados-Membros.

26

Por conseguinte, os Estados-Membros deram início aos procedimentos internos específicos de cada um deles, tendo em vista a aprovação dos referidos acordos.

27

Em 13 de Julho de 2007, o Conselho, por seu lado, consultou o Parlamento a respeito da proposta acima referida da Comissão. Na mesma ocasião, o Conselho informou o Parlamento de que tencionava basear a decisão de celebração dos acordos em causa tanto no artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE, lido em conjugação com o artigo 300.o, n.o 2, CE, como nos artigos 71.o CE, 80.o, n.o 2, CE e 133.o, n.o 6, CE, lidos em conjugação com o artigo 300.o, n.o 3, CE.

28

Na sua resolução legislativa de 11 de Outubro de 2007, o Parlamento aprovou a proposta acima referida. Todavia, os considerandos da referida resolução mencionam apenas os artigos 133.o, n.os 1 e 5, CE e 300.o, n.os 2 e 3, CE.

Forma e conteúdo dos acordos em causa

29

Sublinhando que os acordos em causa são, no essencial, praticamente idênticos, a Comissão limita-se a apresentar o acordo assinado com o Japão. O Conselho confirma a identidade substancial que existe entre esses acordos.

30

Em conformidade com o n.o 5 das regras processuais, o acordo assinado com o Japão reveste a forma de uma carta conjunta assinada pela Comissão por conta da Comunidade e dos seus Estados-Membros, por um lado, e pelo Japão, por outro (a seguir «carta conjunta»).

31

Conforme previsto no referido n.o 5, encontra-se anexado à carta conjunta um relatório sobre o resultado das negociações. Este relatório contém dois anexos (a seguir «anexo I» e «anexo II»).

32

O anexo I enumera as alterações e retiradas projectadas em relação às listas de compromissos dos novos Estados-Membros. É composto por duas partes.

33

O anexo I, A, contém a lista das alterações e retiradas enumeradas no documento S/SECRET/8.

34

No que se refere aos compromissos horizontais, procede-se a um alargamento a diversos novos Estados-Membros de certas limitações constantes da actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros. É este o caso no que respeita à limitação horizontal relativa ao acesso ao mercado em modo 3 para os serviços considerados nos Estados-Membros como serviços públicos a nível nacional ou local, que podem ser objecto de monopólios públicos ou de direitos exclusivos reservados a fornecedores privados. O mesmo sucede com as restrições relativas ao benefício do tratamento nacional de que são objecto, respectivamente, as sucursais ou agências estabelecidas num Estado-Membro por uma sociedade de um Estado terceiro, ou certas sucursais de sociedades de Estados terceiros constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro (modo 3), e com as restrições relativas ao benefício do tratamento nacional no que respeita aos subsídios (modos 3 e 4). São igualmente alargadas a diversos novos Estados-Membros certas restrições horizontais relativas ao acesso ao mercado em modo 4, no que respeita à residência temporária, em primeiro lugar, das pessoas destacadas no interior da sua sociedade, em segundo lugar, dos representantes comerciais encarregados de negociar a venda de serviços ou de celebrar contratos de serviços, em terceiro lugar, das pessoas encarregadas de implantar num Estado-Membro uma presença comercial e, em quarto lugar, das pessoas singulares recrutadas para o fornecimento de um serviço a título temporário por uma pessoa colectiva sem presença comercial em nenhum Estado-Membro da Comunidade.

35

O anexo I, A, prevê, por outro lado, a retirada de certos compromissos horizontais em matéria de acesso ao mercado, anteriormente assumidos pela República de Chipre e pela República da Lituânia, e relativos ao modo 4.

36

No que se refere aos compromissos sectoriais, o anexo I, A, procede, por um lado, ao alargamento a diversos novos Estados-Membros de limitações constantes da actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros. Estas limitações referem-se ao acesso ao mercado no que respeita, em primeiro lugar, aos serviços de leasing ou de locação de aeronaves sem tripulação (modos 2 e 3), em segundo lugar, aos serviços de ensino na medida em que só são cobertos pela lista da Comunidade e dos seus Estados-Membros quando se trata de serviços de ensino privados e, em terceiro lugar, aos serviços bancários e outros serviços financeiros (modos 1 e 3). Além disso, as ditas limitações referem-se ao tratamento nacional no que respeita a certos serviços de transporte aéreo, a saber, a venda e a comercialização de transportes e os sistemas informáticos de reserva.

37

Por outro lado, o anexo I, A, procede à retirada de compromissos sectoriais anteriormente assumidos por alguns novos Estados-Membros, relativamente ao transporte espacial e aos sectores dos serviços anexos às indústrias transformadoras. Além disso, introduz, para alguns novos Estados-Membros, novas limitações sectoriais relativas ao acesso ao mercado no domínio do transporte aéreo (locação de aeronaves com tripulação) (modos 1 a 3) e dos serviços auxiliares de todos os modos de transporte (modo 3).

38

O anexo I, B, enumera a lista de retiradas de compromissos, tanto horizontais como sectoriais, da República de Chipre e da República de Malta, no que se refere ao tratamento nacional em modo 4, que comporta o documento S/SECRET/9. Os compromissos sectoriais em questão dizem respeito aos serviços informáticos e serviços conexos, aos serviços de investigação e de desenvolvimento no domínio das ciências sociais e das ciências humanas, aos serviços de seguro e serviços conexos, aos serviços bancários e outros serviços financeiros, aos serviços de hotelaria, de restauração e de catering, aos serviços de agências de viagens e de operadores turísticos, bem como aos serviços de transporte marítimo de passageiros e de mercadorias.

39

O anexo II menciona os compromissos assumidos a título de compensações, na sequência das alterações e retiradas de compromissos mencionadas no documento S/SECRET/8 e contidas no anexo I, A. No que toca aos compromissos horizontais, o anexo II menciona uma reorganização respeitante à limitação horizontal acima referida, relativa ao acesso ao mercado em modo 3 no domínio dos serviços considerados nos Estados-Membros como serviços públicos, bem como uma retirada de limitação horizontal relativa ao investimento respeitante à República da Áustria (modo 3) e compromissos horizontais assumidos pela República de Malta e a República de Chipre em matéria de destacamentos no interior de uma sociedade e dos representantes comerciais (modo 4). Além disso, no que respeita a diversos Estados-Membros, são enumerados compromissos sectoriais ou retiradas de limitações com eles relacionadas em termos de acesso ao mercado ou de tratamento nacional. Dizem respeito, respectivamente, aos serviços de engenharia (modos 2 e 3), aos serviços integrados de engenharia (modos 3 e 4), aos serviços de ordenamento urbano e de arquitectura paisagística (modos 2 e 3), aos serviços informáticos e serviços conexos (modos 1 a 4), à publicidade (modo 1), aos serviços de telecomunicações, aos serviços financeiros (banca e seguros) (modo 3), aos serviços de hotelaria, de restauração e de catering (modo 3), aos serviços de agências de viagens e de operadores turísticos (modo 3), bem como aos serviços de cabeleireiro (modos 2 e 3).

40

A carta conjunta enuncia que, juntamente com os anexos I e II, forma o acordo entre as partes. Prevê que a Comunidade e os Estados-Membros transmitirão ao Secretariado da OMC a lista consolidada dos seus compromissos, com vista à sua certificação, e que o resultado das negociações mantidas entre as partes entrará em vigor depois da conclusão do procedimento de certificação, em data a especificar pela Comunidade e pelos seus Estados-Membros após o termo dos procedimentos de aprovação internos. Essa carta precisa ainda que as alterações e as retiradas projectadas nos documentos S/SECRET/8 e S/SECRET/9 não entrarão em vigor antes da entrada em vigor das compensações negociadas.

Pedido de parecer

41

O pedido de parecer da Comissão tem a seguinte formulação:

«1)

A celebração de acordos com os membros afectados da [OMC], nos termos do artigo XXI do [GATS], como descritos no presente pedido de parecer, é abrangida pela esfera de competência exclusiva da Comunidade ou pela esfera de competência partilhada entre a Comunidade e os Estados-Membros?

2)

O artigo 133.o, n.os 1 e 5, [CE,] conjugado com o artigo 300.o, n.o 2, [CE,] constitui a base jurídica adequada para o acto de celebração, em nome da Comunidade Europeia, ou da Comunidade e dos seus Estados-Membros, dos acordos atrás referidos?»

Observações escritas dos Estados-Membros e das instituições

Quanto à articulação das duas questões colocadas no pedido de parecer e à ordem por que são examinadas

42

A Comissão sublinha que as duas questões do pedido de parecer estão estreitamente ligadas e que grande parte dos argumentos apresentados relativamente a uma delas são igualmente válidos para a outra. Considera que, se à primeira questão se responder que os acordos em causa são da competência exclusiva da Comunidade no âmbito da política comercial comum, as bases jurídicas adicionais a que o Conselho tenciona recorrer deverão ser oficiosamente rejeitadas.

43

O Conselho e os Governos checo, dinamarquês, português e do Reino Unido consideram que da resposta à segunda questão decorre automaticamente a resposta à primeira. Com efeito, a necessidade de recorrer, em particular, aos artigos 133.o, n.o 6, CE, 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, enquanto bases jurídicas, implica, ipso facto, que a celebração dos acordos em causa se inclua na competência partilhada entre a Comunidade e os seus Estados-Membros. Segundo os Governos português e do Reino Unido, a Comissão inverteu, assim, a ordem natural entre a premissa e a conclusão do seu pedido de parecer.

Quanto à primeira questão

44

Segundo a Comissão, os acordos em causa são abrangidos pela política comercial comum e, portanto, por uma competência comunitária, por natureza, exclusiva.

45

Com efeito, a referida política, que tem um carácter aberto e evolutivo, exige uma adaptação constante à mudança de concepções na sociedade internacional, não podendo ser objecto de uma interpretação restritiva, que a condenaria a tornar-se gradualmente insignificante. Ora, tal aconteceria se essa política se limitasse aos aspectos tradicionais do comércio, sem englobar os acordos que visam, como os do caso em apreço, modificar as modalidades segundo as quais a Comunidade se compromete a abrir o seu mercado aos serviços e aos prestadores provenientes de outros países membros da OMC. Na verdade, esses acordos têm por objecto directo e imediato promover e reger as trocas e o comércio dos referidos serviços.

46

A doutrina constante do parecer 1/94, de 15 de Novembro de 1994 (Colect., p. I-5267), segundo a qual só os serviços prestados em modo 1 são abrangidos pela competência exclusiva comunitária em matéria comercial, está ultrapassada sob este aspecto, tendo em conta as alterações introduzidas pelo Tratado de Nice no artigo 133.o CE. Com efeito, o n.o 5 desse artigo passou a estipular que o «comércio de serviços» — terminologia retirada do GATS e distinta da que caracteriza os artigos 49.o CE a 55.o CE, que se referem à «livre prestação de serviços» ou à «liberalização dos serviços» — faz parte, em geral, da política comercial comum, com a única reserva do previsto no n.o 6 do artigo 133.o CE.

47

O objectivo das referidas alterações foi simplificar a situação e reforçar o papel da Comunidade nas negociações a conduzir no seio da OMC, assegurando a coerência, a efectividade e a credibilidade da acção da Comunidade e permitindo-lhe cumprir as suas obrigações de boa fé e com celeridade. Com efeito, as negociações bilaterias ou multilaterais no seio da OMC têm carácter contínuo e os acordos delas resultantes, tais como os acordos em causa, que alteram simplesmente as listas de compromissos ao abrigo do GATS através de um processo de negociação flexível e rápido, necessitam de uma conclusão e uma implementação tão simples quanto possível. Assim, a interpretação do artigo 133.o CE preconizada pela Comissão é a mais conforme com a presunção de compatibilidade da ordem jurídica comunitária com as regras do direito internacional público.

48

No entender da Comissão, os acordos em causa não podem, por outro lado, ser abrangidos pelo artigo 133.o, n.o 6, CE, que, na medida em que estabelece uma excepção ao princípio formulado no artigo 133.o, n.o 5, CE, deve ser objecto de interpretação estrita.

49

Deste modo, designadamente, o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, que começa com as palavras «a este respeito», limita-se a explicitar as consequências que necessariamente decorrem do princípio consagrado no artigo 133.o, n.o 6, primeiro parágrafo, CE. Por conseguinte, a excepção enunciada no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE aplica-se unicamente quando a celebração de um acordo pela Comunidade implicar que ela exceda as suas competências pelo facto de esse acordo proceder a uma harmonização das regulamentações internas dos Estados-Membros nos sectores de serviços referidos nesse segundo parágrafo. Este último parágrafo é, assim, o corolário dos artigos 137.o, n.o 2, CE, 149.o, n.o 4, CE, 151.o, n.o 5, CE e 152.o, n.o 4, CE, que excluem precisamente uma competência de harmonização nos sectores em questão, a saber, os dos serviços sociais, de educação, culturais, audiovisuais e de saúde humana.

50

Na opinião da Comissão, o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE não pode, em todo o caso, ser interpretado no sentido de que qualquer acordo que tenha uma incidência, ainda que limitada, num dos referidos sectores é abrangido pela competência mista da Comunidade e dos seus Estados-Membros. O facto de essa disposição fazer referência a acordos «no domínio» dos referidos sectores leva, de resto, a excluir do seu campo de aplicação os acordos que não dizem especificamente respeito a esses sectores, mas que cobrem o comércio de serviços enquanto categoria geral. Um entendimento contrário privaria de sentido o artigo 133.o, n.o 5, terceiro parágrafo, CE, que prevê que o Conselho delibera por unanimidade no que diz respeito à celebração de acordos horizontais que abranjam esses mesmos sectores.

51

No caso em apreço, os acordos em causa não procedem a nenhuma harmonização nos sectores em questão. Além disso, nenhuma das medidas de compensação permitidas por esses acordos tem especificamente relação com esses sectores, e a única retirada de compromisso relativa a estes últimos, que diz respeito aos serviços de educação, ainda é menos susceptível de invadir uma eventual competência dos Estados-Membros, uma vez que lhes concede maior liberdade. Os compromissos horizontais regulados pelos referidos acordos incidem sobre o comércio de serviços em geral, não sendo compromissos específicos dos referidos sectores.

52

O Parlamento subscreve, no essencial, os argumentos apresentados pela Comissão. O carácter exclusivo da competência comunitária é justificado tanto pela necessidade de a Comunidade poder cumprir a sua missão na defesa do interesse comum como pela necessidade de impedir distorções de concorrência e desvios de fluxos comerciais no interior da mesma.

53

O artigo 133.o, n.o 5, CE traduz a vontade dos Estados-Membros de assegurarem a efectividade da política comercial no âmbito de uma União alargada, ao integrar, no domínio desta, os serviços que constituem um factor primordial na regulação das trocas económicas internacionais.

54

Interpretar o artigo 133.o, n.o 5, quarto parágrafo, CE no sentido de que a política comercial comum deixa de ter carácter exclusivo quando é posta em prática relativamente ao comércio de serviços teria como consequência privar de qualquer efeito útil o artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE e as alterações introduzidas pelo Tratado de Nice. O mesmo aconteceria se o artigo 133.o, n.o 6, segundo e terceiro parágrafos, CE devesse ser interpretado no sentido de que quaisquer acordos comerciais horizontais que possam ter incidência nos serviços regulados nessas disposições devem ser de carácter misto.

55

Todos os governos que apresentaram observações e o Conselho consideram, pelo contrário, que a celebração dos acordos em causa é abrangida por uma competência partilhada entre a Comunidade e os Estados-Membros. As suas posições e argumentos podem ser sintetizados nos termos que se seguem.

56

Em primeiro lugar, o Governo italiano sustenta que, tendo o GATS sido celebrado como um acordo misto, os princípios gerais do direito internacional e a segurança jurídica exigem que os acordos em causa, que o modificam, também o sejam.

57

Em segundo lugar, o Governo polaco alega que, uma vez que a Comunidade dispõe apenas de competências de atribuição, a competência partilhada entre esta e os Estados-Membros é a regra, ao passo que a competência comunitária exclusiva, que constitui a excepção, requer uma menção expressa no Tratado ou a verificação das condições estritas em que é reconhecida a existência de uma competência exclusiva implícita ao abrigo da jurisprudência.

58

Em terceiro lugar, o Conselho, os Governos checo, dinamarquês, helénico e espanhol, a Irlanda, bem como os Governos italiano, neerlandês, polaco, romeno, finlandês, sueco e do Reino Unido observam que considerações que se prendam com alegados atrasos ou dificuldades práticas encontradas na modificação das listas de compromissos ou com um alegado risco de perda de credibilidade e de eficácia da acção comunitária não podem influenciar a repartição de competências entre a Comunidade e os seus Estados-Membros. O Governo alemão acrescenta que a repartição de competências no seio da ordem jurídica comunitária não pode ser afectada por considerações relativas a acordos internacionais que não gozam de primado algum sobre o Tratado e cuja licitude está, pelo contrário, subordinada ao respeito deste último.

59

De resto, alguns governos têm fortes dúvidas de que os atrasos causados pelos processos de aprovação nacionais possam contribuir de forma determinante para atrasar o processo de alteração das listas de compromissos específicos. Com efeito, a prática dos acordos mistos é uma prática bem firmada, exercendo a Comunidade e os seus Estados-Membros a sua competência de modo coordenado, sob a direcção de facto da Comissão. A Irlanda e os Governos neerlandês e do Reino Unido recordam, além disso, o dever de cooperação entre os Estados-Membros e as instituições comunitárias existente nesta matéria.

60

Em quarto lugar, o Conselho sustenta que o artigo 133.o, n.o 6, primeiro parágrafo, CE, que prevê que o Conselho não pode celebrar um acordo que inclua disposições que excedam as competências internas da Comunidade, é aplicável no presente caso, pelo que os acordos em causa devem igualmente ser celebrados pelos Estados-Membros. Com efeito, diversos compromissos compensatórios incluídos nesses acordos, como o compromisso de retirar os testes de necessidade económica aplicados pelo Reino Unido aos serviços de engenharia ou o de alterar num sentido menos restritivo a condição da residência permanente para os serviços financeiros fornecidos em modo 3, no que respeita à República da Finlândia, têm por objecto matérias relativamente às quais não existe base jurídica no Tratado para justificar uma competência interna da Comunidade.

61

Em quinto lugar, a maioria dos governos que apresentaram observações a este respeito e o Conselho consideram, conforme explicam no âmbito do exame da segunda questão relativa à escolha da base jurídica, que os acordos em causa são abrangidos pelo campo de aplicação do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE. Ora, a própria redacção desta disposição confirma a natureza partilhada da competência, ao exigir a intervenção conjunta da Comunidade e dos Estados-Membros para a celebração dos acordos nos domínios nela referidos.

62

Em sexto lugar, no que se refere aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, que, conforme expõem no âmbito do exame da segunda questão, regem a celebração dos acordos em causa, em conformidade com o previsto no artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, os referidos governos e o Conselho salientam que a competência comunitária em matéria de transportes não tem carácter exclusivo por natureza. Além disso, a jurisprudência relativa à existência de uma competência externa implícita em razão do exercício de competências internas também não conduz, neste caso, a incluir os referidos acordos no âmbito de uma competência comunitária exclusiva, uma vez que não afectam as regras comunitárias internas em matéria de transportes.

63

Em sétimo lugar, os Estados-Membros que apresentaram observações e o Conselho indicam, mais genericamente, não partilhar da interpretação feita pela Comissão do artigo 133.o CE, considerado no seu todo.

64

O Governo checo, a Irlanda, os Governos italiano, lituano, neerlandês, polaco, romeno, finlandês, sueco e do Reino Unido e o Conselho consideram que, diferentemente das vertentes da política comercial comum abrangidas pelo artigo 133.o, n.o 1, CE, que englobam, designadamente, as trocas de mercadorias e a prestação de serviços em modo 1 e que se integram na competência exclusiva da Comunidade, os domínios cobertos pelo artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, entre os quais o dos serviços prestados em modos 2 a 4, que constituem o principal objecto dos acordos em causa, não são abrangidos por essa competência exclusiva.

65

Esta conclusão decorre de maneira particularmente clara e evidente da própria redacção do artigo 133.o, n.o 5, quarto parágrafo, CE, segundo o qual o disposto nesse número não prejudica o direito dos Estados-Membros de manter ou celebrar acordos.

66

Contrariamente ao que é sugerido pela Comissão, o facto de se interpretar o artigo 133.o, n.o 5, CE no sentido de que não confere à Comissão uma competência exclusiva não priva de efeito útil as alterações introduzidas pelo Tratado de Nice. Segundo os Governos espanhol e sueco, essa disposição apresenta, em particular, a vantagem de, doravante, afirmar claramente a existência de uma competência comunitária de natureza comercial em matéria de serviços e de precisar os limites dessa competência. Na opinião dos Governos sueco e do Reino Unido, o artigo 133.o, n.o 5, CE, em particular no seu segundo e terceiro parágrafos, tem ainda por objecto específico estabelecer diversas regras procedimentais na matéria.

67

Diferentemente dos outros governos que apresentaram observações e do Conselho, o Governo espanhol considera que o conceito de «comércio de serviços», na acepção do artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, não pode ser equiparado ao conceito correspondente utilizado no GATS e engloba apenas os serviços prestados em modos 1 e 2, que são os únicos que correspondem materialmente ao conceito de prestação de serviços na acepção do Tratado.

Quanto à segunda questão

68

Segundo a Comissão, independentemente de a celebração dos acordos em causa se incluir na competência exclusiva da Comunidade ou numa competência partilhada com os Estados-Membros, o acto comunitário adoptado para efeitos dessa celebração deve ter por base jurídica única o artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE, lido em conjugação com o artigo 300.o, n.o 2, primeiro parágrafo, CE.

69

Todos os governos que se pronunciaram a este respeito e o Conselho consideram, em contrapartida, que deve igualmente recorrer-se aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, por um lado, e ao artigo 133.o, n.o 6, CE, por outro, em conjugação com o artigo 300.o, n.o 3, primeiro parágrafo, CE.

Quanto ao artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE

70

A Comissão recorda que, pelas razões que expôs no âmbito do exame da primeira questão, o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE não pode, em seu entender, ser aplicado aos acordos em causa.

71

A Comissão acrescenta, a título subsidiário, que, mesmo que se considere aplicável, esta disposição não pode constituir uma base jurídica do acto comunitário de celebração dos referidos acordos. Com efeito, a referida disposição limita-se a prever uma excepção à competência exclusiva da Comunidade em matéria de política comercial, reservando uma competência concorrente para os Estados-Membros.

72

Os Governos alemão, neerlandês, polaco, romeno e do Reino Unido assim como o Conselho consideram, em contrapartida, que o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE pode efectivamente constituir uma base jurídica para a acção comunitária, dado que precisa as condições de aplicação do artigo 133.o CE, limita a competência da Comunidade ao abrigo do n.o 5 deste artigo e institui uma competência comunitária específica de natureza partilhada.

73

A maioria dos governos que apresentaram observações e o Conselho alegam ainda que o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE é efectivamente aplicável no presente caso.

74

Com efeito, os acordos em causa modificam compromissos que dizem especificamente respeito aos serviços referidos nessa disposição, mais precisamente, compromissos sectoriais relativos aos serviços de educação e compromissos horizontais relativos aos subsídios. Por outro lado, os compromissos horizontais alterados por esses acordos cobrem todos os sectores constantes da lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros, designadamente os dos serviços culturais, de educação, de saúde humana e sociais, em modos 3 e 4.

75

Por um lado, os Governos checo, dinamarquês, alemão, grego e espanhol, a Irlanda, os Governos lituano, português, romeno, finlandês e do Reino Unido e o Conselho contestam a distinção feita pela Comissão entre retiradas de compromissos e alargamentos dos mesmos. Qualquer alteração de compromissos, quer limite a liberdade dos Estados-Membros quer a restabeleça, constitui um compromisso que apenas pode ser assumido pelo titular da competência no domínio em questão.

76

Por outro lado, a interpretação a este respeito adoptada pela Comissão, no que toca ao artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, como exposta por esta instituição no âmbito do exame da primeira questão, é contestada por diversas razões.

77

Em primeiro lugar, os Governos neerlandês, polaco e sueco alegam que a referida disposição não deve ser interpretada restritivamente porque, em particular, não estabelece uma excepção a uma alegada competência exclusiva da Comunidade.

78

Em segundo lugar, os Governos checo, italiano, lituano, neerlandês, polaco, romeno, finlandês e do Reino Unido e o Conselho sustentam que o primeiro e segundo parágrafos do artigo 133.o, n.o 6, CE não podem ser fundidos, como é sugerido pela Comissão. Os seus argumentos a este respeito podem ser sintetizados nos termos que se seguem.

79

O primeiro parágrafo do artigo 133.o, n.o 6, CE de maneira nenhuma está limitado aos sectores de serviços a que se refere o segundo parágrafo dessa mesma disposição, antes respeitando a todos os casos em que não existe competência interna da Comunidade, de que a harmonização constitui, de resto, um mero exemplo, conforme resulta da utilização do termo «nomeadamente». Por conseguinte, esse segundo parágrafo não se limita de modo algum a explicitar o primeiro parágrafo do n.o 6 do artigo 133.o CE, ao enunciar supostamente os domínios de serviços em que não é possível a harmonização das legislações nacionais por via da actuação exclusiva da Comunidade. De resto, os domínios visados no referido segundo parágrafo não correspondem inteiramente àqueles em que a Comunidade não dispõe de competência interna para proceder a uma harmonização, dado que não é mencionado, nomeadamente, o domínio do emprego ou o domínio da formação profissional, a respeito dos quais os artigos 129.o CE e 150.o, n.o 4, CE excluem, no entanto, essa harmonização. Além disso, o Tratado não contém uma proibição de harmonização a propósito dos serviços audiovisuais, não obstante serem igualmente referidos no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE.

80

Em terceiro lugar, os Governos checo, alemão, grego, polaco, português e finlandês alegam que o artigo 133.o, n.o 5, terceiro parágrafo, CE constitui uma disposição estritamente processual que de modo nenhum regula a natureza exclusiva ou partilhada da competência comunitária.

81

Em quarto lugar, os acordos em causa integram-se efectivamente no «domínio» dos sectores de serviços referidos no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE.

82

De acordo com os Governos checo e alemão, a Irlanda, os Governos italiano e romeno, a expressão «no domínio», que é utilizada na referida disposição, não é nada unívoca, seja qual for a versão linguística considerada, nem leva a restringir a aplicação dessa disposição somente aos acordos que incidam «exclusivamente» ou «sobretudo» sobre esses sectores de serviços, conforme é sugerido pela Comissão na sequência de uma interpretação considerada puramente semântica ou literal.

83

No entender dos Governos lituano e do Reino Unido, os termos assim utilizados indicam, pelo contrário, que qualquer acordo que regule aspectos do comércio de serviços que sejam abrangidos por um dos sectores referidos entra no campo de aplicação dessa disposição. Os Governos checo, romeno e do Reino Unido consideram que esta interpretação é a única conforme com a intenção manifesta dos autores do Tratado de Nice, de fazer com que os sectores sensíveis mencionados no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, nos quais a Comunidade só dispõe, no plano interno, de competências de apoio, de coordenação ou de complemento, não possam escapar à competência dos Estados-Membros.

84

Na opinião do Governo neerlandês, a interpretação preconizada pela Comissão é, além disso, desmentida pelos próprios termos do artigo 133.o, n.o 5, terceiro parágrafo, CE, dado que esta disposição precisa as regras de voto aplicáveis em presença de «acordos de carácter horizontal»«na medida em que estejam também abrangidos pelo […] segundo parágrafo do n.o 6».

Quanto aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE

85

A Comissão sustenta que, embora resulte do artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE que os acordos no domínio dos transportes não são abrangidos pela política comercial comum, tal não é o caso dos acordos em causa, que são relativos ao comércio de serviços. Com efeito, estes acordos não têm nem por finalidade, nem por objecto, nem por efeito regular os serviços de transportes e, a este respeito, limitam-se, de resto, a proceder a certas retiradas de compromissos referentes a serviços de transporte marítimo ou aéreo.

86

Qualquer efeito sobre os serviços de transportes é apenas, de qualquer modo, acessório em relação ao objecto essencialmente comercial dos acordos em causa, pelo que há que privilegiar apenas o artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE como base jurídica, conforme resulta tanto da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à escolha da base jurídica idónea como da prática legislativa, que oferece diversos exemplos de actos internos ou convencionais que, acessoriamente, produzem efeitos directos nos serviços de transportes, mas que foram adoptados sem referência às disposições do Tratado relativas aos transportes.

87

O Parlamento partilha, no essencial, da posição da Comissão.

88

A maioria dos governos que apresentaram observações e o Conselho consideram, pelo contrário, que é necessário o recurso aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, dado que diversos compromissos sectoriais alterados e retirados pelos acordos em causa são relativos aos serviços de transportes e que os compromissos horizontais retirados, alterados ou ainda acordados a título compensatório também têm por objecto, entre outros, esses serviços. Contestam a interpretação defendida pela Comissão, segundo a qual só os acordos que respeitam exclusiva ou principalmente ao sector dos transportes, e não os acordos horizontais, estão cobertos pelo artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE.

89

Em primeiro lugar, os Governos checo e dinamarquês, a Irlanda, os Governos italiano, lituano, neerlandês, polaco, português, finlandês e do Reino Unido e o Conselho sublinham que resulta de jurisprudência assente que os transportes, inclusive no quadro de um acordo comercial como o GATS, não são abrangidos pela política comercial comum. Este dado adquirido está hoje expressamente consagrado no artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, que prevê a este respeito que a negociação e a celebração de acordos no domínio dos transportes «continuam a reger-se» pelas disposições relativas à política comum dos transportes.

90

Em segundo lugar, os Governos dinamarquês e do Reino Unido insistem na terminologia utilizada na referida disposição, a qual, em diversas versões linguísticas, se refere, em termos gerais, aos acordos «no domínio» dos transportes.

91

Em terceiro lugar, o Governo dinamarquês sustenta que a interpretação defendida pela Comissão contraria tanto o objectivo prosseguido pelo artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE como a necessidade de conferir um alcance útil a essa disposição. Com efeito, seria inútil precisar, no âmbito do artigo 133.o CE, que um acordo que apenas se integra no domínio dos transportes é abrangido pela política comum dos transportes. O objecto e o alcance útil das indicações textuais claras contidas nesse n.o 6, terceiro parágrafo, consistem precisamente em afastar qualquer possibilidade de aplicação da jurisprudência relativa à escolha da base jurídica em função do principal e do acessório.

92

Em quarto lugar, segundo os Governos checo e do Reino Unido, a referida jurisprudência só é, de resto, aplicável quando deva ser feita uma escolha entre disposições do Tratado que atribuem competências à Comunidade para finalidades diferentes, e não quando, para além do conflito de bases jurídicas, surja um conflito de competências entre a Comunidade e os Estados-Membros.

93

Em quinto lugar, os Governos checo, neerlandês, romeno, finlandês e do Reino Unido e o Conselho defendem que as disposições dos acordos em causa relativas ao sector dos transportes não têm carácter acessório algum. Antes de mais, segundo o Conselho, nenhum critério permite identificar sectores de serviços que sejam mais acessórios do que outros. Seguidamente, o Governo romeno sublinha que as diversas alterações introduzidas nas listas de compromissos pelos acordos em causa são igualmente necessárias para alcançar o objectivo por estes prosseguido, mais precisamente, para assegurar a consolidação das referidas listas, na sequência dos alargamentos realizados. Por último, os Governos neerlandês, romeno e finlandês alegam que os compromissos específicos próprios do domínio dos transportes constantes desses acordos tão-pouco constituem medidas acessórias necessárias para garantir a efectividade de uma medida principal contida nos referidos acordos.

94

No entender dos Governos dinamarquês e do Reino Unido, o sector dos transportes, ao qual se refere um número importante de alterações de compromissos específicos, reveste antes um carácter preponderante. O Governo dinamarquês acrescenta que essas alterações são, além disso, particularmente importantes na medida em que afectam, em especial, os modos 3 e 4, que são particularmente essenciais no domínio dos transportes marítimos internacionais de pessoas, caracterizados pela necessidade de exercer localmente certas actividades próprias do fornecimento de serviços nesse domínio.

95

No que respeita, em sexto lugar, à prática legislativa descrita pela Comissão, tanto os Governos checo e dinamarquês, a Irlanda, os Governos italiano, lituano, neerlandês, romeno, finlandês e do Reino Unido como o Conselho a consideram desprovida de qualquer pertinência.

Posição do Tribunal de Justiça

Quanto ao objecto dos acordos em causa

96

É ponto assente que, em conformidade com os termos do artigo XXI, n.o 2, alínea a), do GATS, as compensações contidas no anexo II dos acordos em causa foram objecto de um «acordo» negociado com os membros da OMC que se declararam afectados pelas retiradas e alterações de compromissos enunciadas no documento S/SECRET/8.

97

No que toca às retiradas e alterações de compromissos que figuram nos documentos S/SECRET/8 e S/SECRET/9 e que foram retomadas, respectivamente, nos anexos I, A, e I, B, dos acordos em causa, a Comissão, em resposta a uma pergunta do Tribunal de Justiça, defendeu na audiência que tais retiradas e alterações não são objecto de um acordo entre as partes e que, portanto, não devem ser tomadas em conta pelo Tribunal de Justiça no âmbito do processo iniciado com base no artigo 300.o, n.o 6, CE. Por um lado, os membros da OMC dispõem do direito de proceder a retiradas ou alterações de compromissos, mesmo que outros membros se oponham a isso. Por outro lado, nunca se celebraram acordos sobre compensações, no que respeita aos compromissos identificados no documento S/SECRET/9.

98

Esta tese, a que se opuseram os Governos dinamarquês, helénico e espanhol, a Irlanda, os Governos polaco, finlandês e sueco, bem como o Conselho, não pode prosperar.

99

Com efeito, como estes últimos alegaram, deve-se, antes de mais, recordar que a carta conjunta prevê expressamente que o anexo I forma, com essa carta e o anexo II, o acordo entre as partes e que estipula, além disso, que as alterações e retiradas propostas nos documentos S/SECRET/8 e S/SECRET/9 só entrarão em vigor com a entrada em vigor dos compromissos compensatórios que figuram no anexo II dos acordos em causa.

100

De seguida, no que toca, mais precisamente, às alterações e retiradas de compromissos que figuram no documento S/SECRET/8 e retomadas no anexo I, A, dos acordos em causa, há que recordar que resulta do artigo XXI, n.o 2, alínea a), do GATS que, na negociação de um acordo sobre as compensações, os diferentes membros implicados se devem esforçar por manter um nível geral de compromissos mutuamente vantajosos, não menos favorável ao comércio do que o previsto nas listas de compromissos específicos antes dessas negociações. As «compensações» negociadas estão, pois, directamente ligadas às retiradas e alterações projectadas e devem, como contrapartida, contribuir para restabelecer um equilíbrio potencialmente afectado por estas últimas.

101

Daqui resulta que, apesar de as alterações e retiradas de compromissos projectadas por um membro da OMC serem, na sua origem, unilateralmente fixadas por este, a partir do momento em que são negociadas compensações, estas assim como as alterações e retiradas tornam-se indissociavelmente ligadas. Isso é confirmado, em particular, pelo n.o 6 das regras processuais, que precisa que todas as alterações efectivas das listas, consecutivas a esse acordo, não irão além das alterações ou das retiradas inicialmente notificadas e incluirão qualquer compensação acordada durante as negociações.

102

Por último, no que respeita mais especificamente às alterações e retiradas de compromissos que constam do documento S/SECRET/9 e retomadas no anexo I, B, dos acordos em causa, resulta, é certo, da carta conjunta que não deram lugar nem a um acordo sobre as compensações nem a um pedido de arbitragem. Em tal caso, resulta do artigo XXI, n.o 3, alínea b), do GATS e do n.o 8 das regras processuais que o autor dessas alterações e retiradas é, em princípio, livre de proceder unilateralmente à sua aplicação após a conclusão do procedimento de certificação.

103

Todavia, no caso vertente, afigura-se que os documentos S/SECRET/8 e S/SECRET/9 prosseguem ambos o mesmo objectivo, a saber, a reorganização das listas de compromissos dos novos Estados-Membros e a sua fusão com a actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros na sequência da adesão dos primeiros à União, e formam, nesta perspectiva e como resulta designadamente das precisões que figuram no n.o 99 do presente parecer, um todo indissociável.

104

Além disso, é ponto assente que tanto as alterações e retiradas de compromissos constantes do anexo I como as compensações constantes do anexo II revestirão um carácter vinculativo para as partes nos acordos em causa e, de resto, para os outros membros da OMC.

105

Decorre de tudo o que precede que todas essas alterações, retiradas e compensações formam o conteúdo dos acordos em causa, que devem ser tidas em consideração para responder ao pedido de parecer.

Quanto ao objecto das questões dirigidas ao Tribunal de Justiça e à ordem por que são examinadas

106

O pedido de parecer apresentado pela Comissão tem por objecto, por um lado, a questão de saber se a Comunidade está habilitada a celebrar sozinha os acordos em causa e, por outro, a escolha da base jurídica adequada do acto mediante o qual a Comunidade celebrará esses acordos. Quanto a este último ponto, o parecer tem mais precisamente por objecto determinar se há que fundar o consentimento da Comunidade para se vincular apenas no artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE, lido em conjugação com o artigo 300.o, n.o 2, CE, como defende a Comissão, ou se, a este respeito, também há que ter em conta o artigo 133.o, n.o 6, CE e os artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, lidos em conjugação com o artigo 300.o, n.o 3, CE, como sustenta o Conselho.

107

Importa recordar que o procedimento previsto no artigo 300.o, n.o 6, CE visa resolver, antes da celebração de um acordo, a questão de saber se este é compatível com o Tratado. Essa disposição tem assim por objectivo evitar as complicações que resultariam de impugnações judiciais relativas à compatibilidade com o Tratado de acordos internacionais que vinculam a Comunidade (v., designadamente, parecer 1/75, de 11 de Novembro de 1975, Colect., pp. 457, 460).

108

Deste modo, devem ser admitidas ao processo previsto no artigo 300.o, n.o 6, CE quaisquer questões susceptíveis de ser sujeitas a apreciação judicial, desde que suscitem dúvidas quanto à validade material ou formal do acordo face ao Tratado (pareceres 1/75, já referido, p. 1361, e 2/92, de 24 de Março de 1995, Colect., p. I-521, n.o 14). A decisão sobre a compatibilidade de um acordo com o Tratado pode, a este respeito, depender não só das disposições do direito material mas também das disposições relativas à competência, ao procedimento ou à organização institucional da Comunidade (parecer 1/78, de , Recueil, p. 2871, n.o 30).

109

Segundo uma interpretação assente do Tribunal de Justiça, pode ser pedido o parecer deste, designadamente, sobre as questões relacionadas com a repartição das competências entre a Comunidade e os Estados-Membros para celebrar um acordo determinado com países terceiros. O artigo 107.o, n.o 2, do Regulamento de Processo corrobora esta interpretação (v., por último, parecer 1/03, de 7 de Fevereiro de 2006, Colect., p. I-1145, n.o 112).

110

Além disso, cumpre recordar que a escolha da base jurídica adequada reveste uma importância de natureza constitucional. Com efeito, dado que a Comunidade dispõe apenas de competências de atribuição, deve associar o acordo que pretende concluir a uma disposição do Tratado que a habilite a aprovar esse acto. O recurso a uma base jurídica errada é, assim, susceptível de invalidar o próprio acto de celebração e, portanto, de viciar o consentimento da Comunidade para se vincular pelo acordo que a mesma subscreveu. É esse o caso, nomeadamente, quando o Tratado não atribui à Comunidade uma competência suficiente para ratificar o acordo no seu todo, o que exige que se analise a repartição das competências entre a Comunidade e os Estados-Membros para celebrar o acordo projectado com países terceiros, ou ainda quando a base jurídica adequada para esse acto de celebração prevê um processo legislativo diferente daquele que foi efectivamente seguido pelas instituições comunitárias (parecer 2/00, de 6 de Dezembro de 2001, Colect., p. I-9713, n.o 5).

111

No que respeita à ordem por que são examinadas as duas questões submetidas ao Tribunal de Justiça, há que reconhecer, como foi salientado pela maioria dos intervenientes e como, de resto, é admitido pela própria Comissão, que o carácter, exclusivo ou não, da competência comunitária para efeitos da celebração dos acordos em causa e a base jurídica a que se deve recorrer para esse mesmo efeito constituem duas questões intimamente ligadas.

112

Com efeito, a questão de saber se a Comunidade dispõe sozinha da competência para celebrar um acordo ou se tal competência é partilhada com os Estados-Membros depende, designadamente, do alcance das disposições comunitárias susceptíveis de atribuir às instituições comunitárias o poder de participar em tal acordo (v., neste sentido, parecer 2/92, já referido, n.o 12).

113

Convém igualmente examinar em conjunto a questão da identificação das bases jurídicas nas quais assenta a competência da Comunidade para celebrar os acordos em causa e a questão de saber se essa competência comunitária reveste, se for caso disso, um carácter exclusivo ou se, pelo contrário, os Estados-Membros conservam uma parte de competência para celebrar os referidos acordos.

Quanto à competência da Comunidade para celebrar os acordos em causa e quanto às bases jurídicas relativas a essa celebração

114

A título preliminar, há que recordar que, no caso vertente, os acordos em causa alteram o GATS e, mais precisamente, o anexo deste, o qual inclui as listas de compromissos específicos dos membros da OMC. O GATS constitui um acordo misto celebrado tanto pela Comunidade como pelos seus Estados-Membros. A lista única de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros, cuja alteração constitui o objecto dos acordos em causa, enumera, à semelhança das listas de outros membros da OMC, um conjunto de compromissos específicos que contribuem para o estabelecimento de um equilíbrio multilateral entre os compromissos dos diferentes membros da OMC.

115

Nestas circunstâncias, importa desde logo sublinhar que a lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros não pode ser objecto de alterações mediante a intervenção unilateral dos Estados-Membros, independentemente de estes actuarem individual ou colectivamente. Em tal caso, é indispensável a participação da Comunidade.

116

Pelo contrário, essas mesmas circunstâncias não implicam necessariamente que o mesmo seja válido no que respeita à participação dos Estados-Membros nos acordos em causa. Com efeito, a necessidade eventual da participação desses Estados depende, neste caso, designadamente, da questão de saber se, graças às alterações introduzidas pelo Tratado de Nice no artigo 133.o CE, a competência comunitária externa não conheceu uma evolução susceptível de justificar que a Comunidade celebre sozinha os referidos acordos, questão que será examinada no presente parecer.

Quanto ao recurso ao artigo 133.o, n.os 1 e 5, CE, relativo à política comercial comum

117

É inquestionável a competência da Comunidade para participar na celebração dos acordos em causa ao abrigo do artigo 133.o, n.os 1 e 5, CE.

118

Por um lado, é ponto assente que os referidos acordos comportam disposições que dizem respeito, nomeadamente, a serviços fornecidos em modo 1. Ora, como o Tribunal de Justiça declarou no n.o 44 do parecer 1/94, já referido, esse modo, que abrange o fornecimento transfronteiriço de serviços, inclui-se no conceito de política comercial comum visado no artigo 133.o, n.o 1, CE. Esta última disposição, que, segundo jurisprudência assente, investe a Comunidade de uma competência exclusiva, não sofreu alterações.

119

Por outro lado, decorre do artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, disposição introduzida pelo Tratado de Nice, que a Comunidade se encontra actualmente investida da competência para celebrar, ao abrigo da referida política comercial comum, acordos internacionais relativos ao comércio de serviços fornecidos em modos 2 a 4. Tais modos de prestação de serviços, a que o GATS chama, respectivamente, «consumo no estrangeiro», «presença comercial» e «presença de pessoas singulares» e que anteriormente não faziam parte do domínio da política comercial comum (v. parecer 1/94, já referido, n.o 47), fazem actualmente parte das condições previstas no artigo 133.o, n.os 5 e 6, CE.

120

Contrariamente ao que defende o Reino de Espanha, nada permite considerar que apenas o comércio de serviços por meio de prestações efectuadas em modo 2, na acepção do GATS, é abrangido pela competência comunitária externa assim instituída pelo artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE.

121

Em primeiro lugar, pode salientar-se que, tendo em conta tanto o seu carácter geral como o facto de ter sido celebrado à escala mundial, o GATS reveste, no que respeita em particular ao conceito de «comércio de serviços», terminologia utilizada tanto por este último como pelo artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, uma importância especial na esfera de acção internacional relativa ao comércio de serviços.

122

Em segundo lugar, a precisão contida no artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, para indicar que a celebração de acordos no domínio do comércio de serviços faz actualmente parte do campo de aplicação da política comercial comum «na medida em que os referidos acordos não estejam abrangidos [pelos n.os 1 a 4 do referido artigo 133.o CE]», deve, designadamente, ser lida à luz do contexto que resulta do parecer 1/94, já referido, no qual o Tribunal de Justiça, como recordado nos n.os 118 e 119 do presente parecer, considerou que o comércio de serviços fornecidos em modo 1, na acepção do GATS, era abrangido pelo campo de aplicação do artigo 133.o, n.o 1, CE, com exclusão do comércio de serviços oferecidos em modos 2 a 4, na acepção desse acordo.

123

No caso vertente, como resulta dos n.os 34 a 39 do presente parecer, é aliás ponto assente que os acordos em causa, e em particular as alterações, retiradas e compensações que comportam relativamente aos compromissos tanto horizontais como sectoriais, dizem respeito, em larga medida, ao comércio de serviços fornecidos em modos 2 a 4.

124

Tendo em conta o que precede, é possível concluir, na perspectiva da resposta a dar à segunda questão colocada no pedido de parecer, que a Comunidade dispõe de competência para celebrar os acordos em causa, em parte, ao abrigo do artigo 133.o, n.o 1, CE e, em parte, ao abrigo do artigo 133.o, n.o 5, CE, pelo que o acto comunitário de celebração desses acordos se deve basear, em particular, nestas duas últimas disposições.

Quanto ao recurso ao artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE e quanto à participação dos Estados-Membros na celebração dos acordos em causa

125

Ao contrário da Comissão e do Parlamento, que consideram que a celebração dos acordos em causa faz parte da competência exclusiva da Comunidade, os Estados-Membros que apresentaram observações e o Conselho entendem que essa celebração exige uma intervenção conjunta da Comunidade e dos seus Estados-Membros. Para justificar tal participação conjunta, argumentam, como resulta do n.o 62 do presente parecer, com o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE.

126

Há que formular duas observações preliminares.

127

Em primeiro lugar, recorde-se que preocupações como as que foram expressas pela Comissão relativamente à necessidade de unidade e rapidez da acção externa assim como às dificuldades que podem surgir em caso de participação conjunta da Comunidade e dos Estados-Membros na celebração dos acordos em causa não são susceptíveis de modificar o sentido da resposta a dar à questão da competência. Em resposta a argumentos semelhantes avançados pela Comissão no âmbito do parecer 1/94 relativo à celebração dos acordos anexos ao acordo que institui a OMC, o Tribunal de Justiça já decidiu que o problema de repartição de competências não podia ser resolvido em função das dificuldades eventuais que possam surgir na gestão dos acordos em causa (parecer 1/94, já referido, n.o 107; v., igualmente, neste sentido, parecer 2/00, já referido, n.o 41). É evidente que o mesmo é válido no que respeita a eventuais dificuldades relativas à celebração de acordos.

128

Em segundo lugar, a circunstância, destacada pela Comissão, de as disposições dos acordos em causa que figuram no seu anexo I operarem retiradas ou alterações de compromissos e, como tal, implicarem uma menor abertura dos mercados de serviços dos Estados-Membros aos prestadores de serviços provenientes de Estados terceiros e, assim, uma redução dos compromissos exteriores que devem ser respeitados por esses Estados-Membros, tão-pouco pode afectar a determinação das regras que fixam a competência para realizar essas retiradas ou alterações.

129

Com efeito, a competência externa que permite assumir compromissos para determinar as condições em que os prestadores de serviços de países terceiros podem ter acesso a um mercado de serviços no interior da Comunidade compreende necessariamente a competência para desistir de tais compromissos ou para os reduzir.

130

Feitas estas precisões, importa agora proceder a um exame do alcance do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, para efeitos de determinar se esta disposição é susceptível de implicar, como sustentaram todos os Estados-Membros que se exprimiram a este respeito e o Conselho, uma celebração conjunta dos acordos em causa pela Comunidade e os seus Estados-Membros.

131

Para interpretar a disposição referida, cumpre recordar, como já foi salientado no n.o 110 do presente acórdão, que as competências da Comunidade são, como resulta do artigo 5.o CE, competências de atribuição.

132

Além disso, há que realçar que o artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, que institui a competência comunitária externa em matéria de comércio internacional de serviços em modos 2 a 4, precisa expressamente que essa competência «não prejudica» o referido n.o 6.

133

O artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, por seu lado, sublinha que, «em derrogação» do artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo CE, os acordos no domínio do comércio de serviços culturais e audiovisuais, de serviços de educação bem como de serviços sociais e de saúde humana são da competência partilhada entre a Comunidade e os seus Estados-Membros e são celebrados conjuntamente por estes e pela Comunidade.

134

Resulta, portanto, da própria redacção dessas disposições que, ao contrário dos acordos no domínio do comércio de serviços que não dizem respeito aos serviços identificados no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, a Comunidade não pode celebrar sozinha acordos relativos a estes últimos, exigindo tal celebração a participação conjunta da Comunidade e dos Estados-Membros.

135

O referido artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE reflecte a preocupação de impedir que o comércio de tais serviços possa ser regulado através de acordos internacionais celebrados apenas pela Comunidade ao abrigo da sua competência externa em matéria comercial. Sem excluir de modo algum uma competência da Comunidade a este respeito, o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE exige, em contrapartida, que essa competência que a Comunidade partilha no caso vertente com os seus Estados-Membros seja exercida conjuntamente por estes e pela Comunidade.

136

Caberá observar que, ao prever assim uma acção comum da Comunidade e dos seus Estados-Membros ao abrigo da competência partilhada que estes possuem, o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE permite simultaneamente a prossecução do interesse da Comunidade na execução de uma política comercial externa global, coerente e eficiente, e a consideração dos interesses particulares que os Estados-Membros pretendam invocar nos domínios sensíveis identificados nessa disposição. A exigência de uma unidade de representação internacional da Comunidade requer, além disso, uma cooperação estreita entre os Estados-Membros e as instituições comunitárias no processo de negociação e de celebração de tais acordos (v., neste sentido, designadamente, parecer 2/00, já referido, n.o 18 e jurisprudência referida).

137

Tendo em conta o que precede, as diferentes teses avançadas pela Comissão e pelo Parlamento no sentido de restringir o alcance do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE não podem ser acolhidas.

138

No que respeita à tese defendida pelas referidas instituições, segundo a qual essa disposição abrange apenas os acordos relativos exclusiva ou principalmente ao comércio de serviços nos sectores nela referidos, há que salientar o que se segue.

139

Para além do facto de não encontrar apoio no texto do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, tal interpretação não é conciliável com a finalidade prosseguida por esta disposição que, como foi sublinhado no n.o 135 do presente parecer, visa manter na esfera dos Estados-Membros uma competência externa efectiva nos domínios sensíveis cobertos pela referida disposição.

140

Com efeito, tal interpretação teria designadamente por consequência subtrair do campo de aplicação do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE todos os acordos ditos «horizontais» relativos ao comércio de serviços no seu conjunto. Além disso, teria como resultado que disposições internacionais de objecto rigorosamente idêntico, contidas num acordo e respeitantes aos domínios dos serviços sensíveis mencionados no referido artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, fariam ou não parte da competência partilhada entre a Comunidade e os seus Estados-Membros, a que essa disposição faz referência, em função da mera circunstância de as partes contratantes do acordo terem decidido apenas tratar do comércio desses serviços sensíveis, ou terem acordado tratar simultaneamente desse comércio e do comércio de outro tipo de serviços ou de todos eles.

141

Por estas mesmas razões, a circunstância, igualmente salientada pela Comissão, de o artigo 133.o, n.o 5, terceiro parágrafo, CE prever que o acto comunitário de celebração de um acordo de tipo horizontal requer a unanimidade no seio do Conselho na medida em que tal acordo respeite igualmente ao n.o 6, segundo parágrafo, desse artigo tão-pouco pode levar à conclusão de que a competência comunitária para celebrar tal acordo deve revestir um carácter exclusivo, contrariamente ao que ocorreria com acordos sectoriais tendo especificamente por objecto os domínios sensíveis mencionados no referido segundo parágrafo.

142

O artigo 133.o, n.o 5, terceiro parágrafo, CE enuncia, de resto, uma regra que tem por objecto indicar de que maneira a competência comunitária deve ser exercida, e não precisar a natureza dessa competência. Além disso, a exigência de unanimidade no seio do Conselho, para a adopção de um acto comunitário de celebração de um acordo, não é de modo nenhum incompatível com a circunstância de essa celebração fazer, aliás, parte de uma competência partilhada com os Estados-Membros.

143

No que toca à tese igualmente defendida pela Comissão, segundo a qual decorre do primeiro parágrafo do artigo 133.o, n.o 6, CE que o segundo parágrafo desta disposição só é aplicável em presença de disposições de um acordo que operem uma harmonização nos sectores dos serviços sensíveis mencionados nesse segundo parágrafo, cumpre salientar o seguinte.

144

Como alegam a maioria dos Estados-Membros que apresentaram observações e o Conselho, a premissa na base dessa tese, a saber, que o artigo 133.o, n.o 6, primeiro parágrafo, CE tem por único objectivo excluir a competência comunitária externa quando as disposições contidas no acordo projectado operam uma harmonização das disposições nacionais num domínio em que o Tratado exclui essa harmonização, não pode ser inferida dessa disposição. Com efeito, o caso da harmonização só é mencionado em tal disposição a título de exemplo, como atesta a utilização do advérbio «nomeadamente».

145

Esta conclusão permite, por si só, excluir a interpretação da Comissão que, nessa base, visa restringir o campo de aplicação do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE apenas aos casos em que as disposições contidas no acordo projectado operam uma harmonização num dos sectores de serviços identificados nesse segundo parágrafo.

146

Nestas condições e tendo em conta, designadamente, as considerações formuladas nos n.os 131 a 136 do presente parecer e, em particular, a própria letra do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, bem como a finalidade prosseguida por esta disposição, o conteúdo do artigo 133.o, n.o 6, primeiro parágrafo, CE não pode conduzir à interpretação preconizada pela Comissão a propósito do referido segundo parágrafo.

147

No caso vertente, resulta dos acordos em causa que estes comportam, designadamente, como resulta do exposto no n.o 36 do presente parecer, o alargamento a um certo número de novos Estados-Membros de uma limitação sectorial relativa aos serviços de educação que figuram na actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros e que pretende que esses serviços de educação só sejam abrangidos por essa lista na medida em que se trate de serviços de ensino privados.

148

Como resulta do n.o 34 do presente parecer, os referidos acordos também alargam a todos ou a parte dos novos Estados-Membros as diversas limitações horizontais relativas ao acesso ao mercado e ao tratamento nacional. Tais limitações horizontais são, regra geral, aplicáveis em todos os sectores de serviços cobertos pela lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros, entre os quais figuram, designadamente, os serviços referidos no artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE, como os serviços de educação privados ou determinados serviços de saúde ou serviços sociais.

149

É assim, por exemplo, que o alargamento aos novos Estados-Membros da limitação horizontal relativa ao acesso em modo 3 a serviços considerados como serviços públicos a nível nacional ou local, que podem ser objecto de monopólios públicos ou de direitos exclusivos reservados a fornecedores privados, é, designadamente, susceptível de se aplicar no domínio dos serviços de saúde, como resulta expressamente da nota explicativa relativa a essa limitação, que figura na actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros.

150

Nestas condições, há que constatar que resulta do artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE que a Comunidade e os Estados-Membros dispõem, no caso vertente, de uma competência partilhada para celebrar conjuntamente os acordos em causa. Tal constatação é suficiente para dar uma resposta à primeira questão colocada no pedido de parecer submetido à apreciação do Tribunal de Justiça.

151

Falta precisar, na perspectiva da resposta a dar à segunda questão colocada no referido pedido, que, tendo sido demonstrado que o artigo 133.o, n.o 6, segundo parágrafo, CE pretende regular a celebração dos acordos em causa, essa disposição, que sublinha a natureza partilhada da competência comunitária nesse âmbito e completa, deste modo, o disposto no artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, deve, à semelhança desta última disposição, servir de base jurídica ao acto comunitário de celebração dos referidos acordos.

Quanto ao recurso aos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, relativos à política comum de transportes

152

A Comissão e o Parlamento consideram que o artigo 133.o, n.os 1 e 5, CE constituem a única base jurídica a que se deve recorrer para a adopção do acto comunitário de celebração dos acordos em causa.

153

Ao invés, todos os Estados-Membros que intervieram no presente processo e que se pronunciaram sobre este ponto, bem como o Conselho, consideram que, dado que os referidos acordos cobrem, entre outros, os serviços de transportes, em particular marítimo e aéreo, o acto comunitário de celebração dos mesmos deve, para além do artigo 133.o, n.os 1, 5 e 6, CE, ter igualmente por base jurídica os artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE.

154

Para se pronunciar sobre estas posições divergentes, impõe-se, como concordam todos os governos e instituições que apresentaram observações, tomar em consideração o artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, que dispõe especificamente que a negociação e a celebração de acordos internacionais no domínio dos transportes continuam a reger-se pelo disposto no título V do Tratado e no artigo 300.o CE.

155

No entender da Comissão e do Parlamento, o artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE deve ser interpretado no sentido de que só é aplicável em presença de acordos que tenham por objecto exclusivamente, ou pelo menos principalmente, os transportes. Ora, não é o que se passa, segundo estas instituições, com os acordos em causa, cujo objecto consiste no comércio de serviços em geral, revestindo os serviços de transportes, pelo seu lado, apenas um aspecto acessório ou secundário dentro desses serviços.

156

Para clarificar o alcance do artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, importa, em primeiro lugar, recordar que o artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE, que, como anteriormente mencionado, investe a Comunidade de uma competência externa no âmbito da política comercial comum em matéria de comércio de serviços fornecidos em modos 2 a 4, precisa expressamente que essa competência existe «sem prejuízo do n.o 6».

157

Em segundo lugar, há que observar que é excepcional que uma disposição do Tratado que atribui uma competência comunitária externa num domínio específico resolva, como faz o artigo 133.o CE, no seu n.o 6, terceiro parágrafo, um conflito potencial de bases jurídicas comunitárias, indicando especificamente que a mesma disposição deve ser preterida em favor de outra disposição do Tratado, no que respeita à celebração de certos tipos de acordos internacionais, a priori, susceptíveis de entrar no âmbito de uma ou de outra base jurídica.

158

Em terceiro lugar, não há dúvida de que a expressão «acordos internacionais no domínio dos transportes» cobre, entre outros, o domínio das trocas comerciais em matéria de serviços de transportes. Com efeito, não teria sentido precisar no núcleo de uma disposição relativa à política comercial comum que os acordos no domínio dos transportes que não são relativos ao comércio de serviços de transportes são abrangidos pela política de transportes e não pela referida política comercial.

159

Em quarto lugar, a precisão de que a negociação e a celebração de acordos no domínio dos transportes «continuam» a reger-se pelas disposições do Tratado relativas à política de transportes traduz a vontade de manter uma forma de statu quo ante na matéria.

160

Ora, a este respeito, recorde-se que, no parecer 1/94, já referido, proferido precisamente a propósito da celebração do GATS, que os acordos em causa pretendem alterar, o Tribunal de Justiça declarou que os acordos internacionais em matéria de transportes não estão abrangidos pelo artigo 113.o do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 133.o CE), precisando que era esse o caso, independentemente do facto de tais acordos incidirem sobre regras de segurança como as que estavam em causa no processo que deu lugar ao acórdão de 31 de Março de 1971, Comissão/Conselho, dito «AETR» (22/70, Colect., p. 69), ou de constituírem, à semelhança do GATS, acordos de natureza comercial (v. parecer 1/94, já referido, n.os 48 a 53; v. igualmente, neste sentido, parecer 2/92, já referido, n.o 27).

161

Para chegar a essa conclusão, o Tribunal de Justiça salientou, em particular, no n.o 48 do parecer 1/94, já referido, que os transportes eram objecto, no Tratado, de um título especial, distinto do título dedicado à política comercial comum, e recordou, a este respeito, que resultava de jurisprudência assente que a Comunidade dispõe de competência externa implícita no domínio da política comum de transportes.

162

Decorre do que precede que, antes da entrada em vigor do Tratado de Nice, o comércio de serviços em matéria de transportes era totalmente alheio à política comercial comum. Mesmo fornecido em modo 1, o comércio de tais serviços continuava, assim, ao contrário dos outros tipos de serviços, abrangido pelo título do Tratado relativo à política comum de transportes (parecer 1/94, já referido, n.o 53).

163

Em quinto lugar, há que salientar que a interpretação sugerida pela Comissão, segundo a qual o artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE apenas contempla os acordos exclusiva ou principalmente relativos ao comércio de serviços de transportes, é susceptível de privar essa disposição de grande parte da sua efectividade. Com efeito, essa interpretação teria como consequência que disposições internacionais de objecto rigorosamente idêntico contidas num acordo fariam parte ora da política de transportes ora da política comercial, em função da mera circunstância de as partes contratantes no acordo terem decidido apenas tratar do comércio dos serviços de transportes, ou terem acordado tratar simultaneamente desse comércio e do comércio de outro tipo de serviços ou de todos eles.

164

Resulta, pelo contrário, de tudo quanto precede que o artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, no que toca ao comércio internacional dos serviços de transportes, visa manter um paralelismo de princípio entre a competência interna exercida pela adopção unilateral de regras comunitárias e a competência externa exercida mediante a celebração de acordos internacionais, radicando ambas, como anteriormente, no título do Tratado específico da política comum de transportes.

165

Além disso, pode observar-se que a particularidade da acção comunitária em matéria de política de transportes é realçada no artigo 71.o, n.o 1, CE, que precisa que é tendo em conta «os aspectos específicos dos transportes» que o Conselho elabora a política comum nesse domínio. Do mesmo modo, pode-se salientar que, tratando-se mais particularmente do domínio do comércio de serviços, o artigo 71.o, n.o 1, alínea b), CE investe expressamente a Comunidade da competência para estabelecer, para efeitos da execução da referida política, «as condições em que os transportadores não residentes podem efectuar serviços de transportes num Estado-Membro».

166

Quanto à jurisprudência relativa à escolha da base jurídica em função do critério do principal e do acessório, à qual a Comissão também fez referência para justificar o recurso apenas ao artigo 133.o, n.os 1 a 5, CE para celebrar os acordos em causa, basta, no caso vertente, salientar que não se pode considerar que as disposições dos acordos em causa relativas ao comércio de serviços de transportes constituam o acessório necessário ao carácter efectivo das disposições desses acordos sobre os outros sectores de serviços (v., a este respeito, parecer 1/94, já referido, n.o 51) ou ainda que revistam um alcance extremamente limitado (v., a este respeito, parecer 1/94, já referido, n.o 67, e acórdão de 3 de Dezembro de 1996, Portugal/Conselho, C-268/94, Colect., p. I-6177, n.o 75).

167

Por um lado, o comércio de serviços de transportes faz parte, à semelhança do comércio de outros tipos de serviços abrangidos pelo GATS ou pelos acordos em causa, do próprio objecto do GATS e desses acordos, que, de resto, produzem um efeito directo e imediato no comércio de cada um dos tipos de serviços em questão, sem que se possa, a este respeito, fazer uma distinção entre estes últimos.

168

Por outro lado, é ponto assente que os acordos em causa contêm, no caso vertente, um número relativamente significativo de disposições que têm por efeito alterar compromissos tanto horizontais como sectoriais assumidos pela Comunidade e pelos seus Estados-Membros em aplicação do GATS, no que respeita às modalidades, às condições e às limitações com base nas quais estes últimos concedem o acesso aos mercados de serviços de transportes, em particular aéreo ou marítimo, aos fornecedores de serviços de outros membros da OMC e o benefício do tratamento nacional.

169

Resulta, por exemplo, do n.o 34 do presente parecer que o anexo I, A, dos acordos em causa alarga a diversos novos Estados-Membros a limitação horizontal relativa ao acesso em modo 3 a serviços considerados como serviços públicos a nível nacional ou local, que podem ser objecto de monopólios públicos ou de direitos exclusivos reservados a fornecedores privados. Como resulta expressamente da nota explicativa relativa a essa limitação horizontal, que figura na actual lista de compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros, a referida limitação pode, designadamente, afectar os serviços de transportes assim como os serviços anexos e auxiliares de todos os modos de transporte. Da mesma maneira, as restrições horizontais relativas tanto ao benefício do tratamento nacional como ao acesso ao mercado, a que se faz referência no mesmo n.o 34 do presente parecer, são em princípio aplicáveis nos sectores de serviços cobertos pela referida lista da Comunidade e dos seus Estados-Membros, entre os quais figuram, por exemplo, determinados serviços de transporte aéreo como os serviços de reparação e manutenção de aeronaves, a venda e a comercialização de serviços de transportes ou ainda os serviços de sistemas informatizados de reserva, bem como os serviços rodoviários de transporte de passageiros ou de mercadorias.

170

Por outro lado, como resulta dos n.os 36 e 37 do presente parecer, o anexo I, A, dos acordos em causa contém igualmente um certo número de disposições relativas aos compromissos sectoriais em matéria de serviços de transportes que ora procedem ao alargamento de limitações sectoriais a determinados novos Estados-Membros ora introduzem tais limitações na sua esfera.

171

O anexo I, B, dos acordos em causa procede, como resulta do n.o 38 do presente parecer, a diversas retiradas de compromissos horizontais anteriormente consentidos pela República de Malta e pela República de Chipre, relativos ao tratamento nacional em modo 4, bem como à retirada de um compromisso sectorial assumido pela República de Malta em matéria de serviços de transportes marítimos de passageiros e de mercadorias.

172

No que toca, por último, à prática legislativa invocada pela Comissão, basta recordar que uma simples prática do Conselho não é susceptível de derrogar disposições do Tratado e que a mesma não pode, por conseguinte, criar um precedente vinculativo para as instituições da Comunidade quanto à escolha da base jurídica correcta (parecer 1/94, já referido, n.o 52). Segundo jurisprudência assente, a escolha da base jurídica de um acto comunitário deve assentar em elementos objectivos susceptíveis de fiscalização jurisdicional, e não na base jurídica em que assenta a adopção de outros actos comunitários que eventualmente apresentem características semelhantes (v., designadamente, acórdão de 6 de Novembro de 2008, Parlamento/Conselho, C-155/07, Colect., p. I-8103, n.o 34 e jurisprudência referida).

173

De tudo o que precede cumpre concluir, na perspectiva da resposta a dar à segunda questão submetida no pedido de parecer, que a componente «transportes» contida nos acordos em causa faz parte, em conformidade com o artigo 133.o, n.o 6, terceiro parágrafo, CE, do domínio da política de transportes, e não do domínio da política comercial comum.

 

Consequentemente, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) emite o seguinte parecer:

 

1)

A celebração de acordos com os membros afectados da Organização Mundial do Comércio, na acepção do artigo XXI do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS), visados no presente pedido de parecer, é abrangida pela esfera de competência partilhada entre a Comunidade Europeia e os Estados-Membros.

 

2)

O acto comunitário de celebração dos referidos acordos deve basear-se tanto no artigo 133.o, n.os 1, 5 e 6, segundo parágrafo, CE como nos artigos 71.o CE e 80.o, n.o 2, CE, lidos em conjugação com o artigo 300.o, n.os 2 e 3, primeiro parágrafo, CE.

 

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