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Document 52016IP0300

Resolução do Parlamento Europeu, de 5 de julho de 2016, sobre a luta contra o tráfico de seres humanos no contexto das relações externas da UE (2015/2340(INI))

OJ C 101, 16.3.2018, p. 47–63 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

16.3.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 101/47


P8_TA(2016)0300

Luta contra o tráfico de seres humanos no contexto das relações externas da UE

Resolução do Parlamento Europeu, de 5 de julho de 2016, sobre a luta contra o tráfico de seres humanos no contexto das relações externas da UE (2015/2340(INI))

(2018/C 101/04)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem e todos os tratados internacionais pertinentes nesta matéria,

Tendo em conta a Convenção sobre os Direitos da Criança,

Tendo em conta o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo à Venda de Crianças, Prostituição Infantil e Pornografia Infantil,

Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional (2000) e os seus protocolos, nomeadamente o Protocolo relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças (2000) e o Protocolo contra o Tráfico Ilícito de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea (2000),

Tendo em conta a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias (1990),

Tendo em conta o trabalho dos mecanismos internacionais de direitos humanos, nomeadamente do Relator Especial das Nações Unidas para o tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças e de outros relatores especiais da ONU pertinentes, o Exame Periódico Universal e o trabalho dos órgãos instituídos pelos tratados da ONU no domínio dos direitos humanos,

Tendo em conta o relatório do Relator Especial do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas para o tráfico de pessoas, em especial mulheres e crianças (2014),

Tendo em conta o relatório mundial sobre o tráfico de pessoas (2014), do Gabinete das Nações Unidas para a Droga e a Criminalidade,

Tendo em conta a lei-modelo da ONU contra o tráfico de pessoas, que visa ajudar os países a rever e alterar a legislação em vigor e a adotar nova legislação para combater o tráfico de seres humanos (2009),

Tendo em conta as diretrizes e os princípios recomendados sobre direitos humanos e tráfico de pessoas, anexos ao relatório da Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos (E/2002/68/Add. 1)

Tendo em conta os princípios orientadores das Nações Unidas sobre empresas e direitos humanos, que aplicam o quadro da ONU «Proteger, Respeitar e Remediar»,

Tendo em conta os princípios fundamentais das Nações Unidas sobre o direito das pessoas vítimas de tráfico de seres humanos a uma efetiva compensação,

Tendo em conta as diretrizes da UNICEF sobre a proteção das crianças vítimas de tráfico de seres humanos,

Tendo em conta a Convenção da OIT sobre o Trabalho Forçado (n.o 29), de 1930, o Protocolo de 2014 relativo à Convenção sobre o Trabalho Forçado de 1930, a Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado (n.o 105), de 1957, e a Recomendação sobre o Trabalho Forçado — medidas complementares (n.o 203), de 2014,

Tendo em conta a Convenção sobre a Idade Mínima de Admissão ao Emprego (n.o 138), de 1973, e a Convenção relativa à Interdição das Piores Formas de Trabalho das Crianças (n.o 182), de 1999,

Tendo em conta a Convenção da OIT sobre o Trabalho Doméstico, de 2011 (n.o 189), relativa ao trabalho digno para as trabalhadoras e trabalhadores do serviço doméstico,

Tendo em conta o relatório da OIT «Profits and Poverty: The Economics of Forced Labour» («Lucros e Pobreza: Aspetos Económicos do Trabalho Forçado»), de 2014,

Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a Carta Social Europeia e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, nomeadamente o seu artigo 5.o,

Tendo em conta a Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-quadro 2002/629/JAI do Conselho,

Tendo em conta a Diretiva 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade,

Tendo em conta a Diretiva 2004/23/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa ao estabelecimento de normas de qualidade e segurança em relação à dádiva, colheita, análise, processamento, preservação, armazenamento e distribuição de tecidos e células de origem humana,

Tendo em conta o documento orientado para a ação com vista a reforçar a dimensão externa da UE em matéria de luta contra o tráfico de seres humanos (2009) e os seus dois relatórios de execução (2011 e 2012),

Tendo em conta a Estratégia da UE para a erradicação do tráfico de seres humanos (2012-2016),

Tendo em conta o relatório intercalar sobre a execução da Estratégia da UE para a erradicação do tráfico de seres humanos (COM(2014)0635),

Tendo em conta o trabalho desenvolvido pela Coordenadora da Luta Antitráfico da UE,

Tendo em conta o Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia (2015-2019),

Tendo em conta a sua Resolução, de 17 de dezembro de 2015, sobre o Relatório Anual sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo (2014) e a política da União nesta matéria (1),

Tendo em conta o quadro de atividades da UE em matéria de igualdade de género e capacitação das mulheres no quadro das relações externas da UE (2016-2020),

Tendo em conta o relatório de situação da Europol, de fevereiro de 2016, intitulado «Tráfico de seres humanos na UE»,

Tendo em conta a Abordagem Global para a Migração e a Mobilidade (AGMM),

Tendo em conta a Agenda Europeia da Migração, de 13 de maio de 2015,

Tendo em conta o Plano de Ação da Cimeira de La Valetta, de novembro de 2015,

Tendo em conta a Convenção do Conselho da Europa relativa à Luta contra o Tráfico de Seres Humanos, de 2005,

Tendo em conta o mais recente relatório geral de atividades do Grupo de Peritos sobre o Tráfico de Seres Humanos (GRETA), que descreve a aplicação da Convenção do Conselho da Europa relativa à Luta contra o Tráfico de Seres Humanos, de 2014,

Tendo em conta a Convenção do Conselho da Europa contra o Tráfico de Órgãos Humanos, aberta à assinatura desde março de 2015,

Tendo em conta a Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina: Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina,

Tendo em conta a Declaração de Istambul sobre o Tráfico de Órgãos e o Turismo de Transplantação (2008),

Tendo em conta os princípios orientadores da OSCE em matéria de direitos humanos, relativos ao regresso de pessoas vítimas de tráfico de seres humanos (2014),

Tendo em conta o relatório do Grupo de Ação Financeira (GAFI) intergovernamental (2011),

Tendo em conta a Convenção da Haia sobre a Proteção das Crianças e a Cooperação em matéria de Adoção Internacional,

Tendo em conta o relatório de atividades da Organização Internacional para as Migrações (OIM) sobre o combate ao tráfico de seres humanos e a assistência a migrantes vulneráveis (2012),

Tendo em conta o relatório da OIM sobre o combate ao tráfico e à exploração de seres humanos em tempos de crise (2015),

Tendo em conta a Convenção da ASEAN contra o Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças, de 2015,

Tendo em conta o artigo 52.o do seu Regimento,

Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Externos e os pareceres da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos, da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros e da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar (A8-0205/2016),

A.

Considerando que o tráfico de seres humanos (TSH), que se insere na criminalidade organizada, constitui uma das formas mais graves de violação dos direitos humanos, uma vez que converte seres humanos em mercadorias, viola de forma flagrante e duradoura a dignidade, a integridade e os direitos das vítimas e afeta famílias e comunidades inteiras, abusando deliberadamente de situações de vulnerabilidade, como a pobreza ou o isolamento;

B.

Considerando que o tráfico de seres humanos é definido pelas Nações Unidas (Protocolo de Palermo) como o ato de recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração; que a exploração inclui, pelo menos, a prostituição forçada de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, a escravatura, ou práticas similares à escravatura, incluindo a escravatura infantil para fins de exploração como crianças-soldados, a servidão ou a extração de órgãos; que estas práticas são hediondas, sobretudo quando as crianças são objeto das piores formas de exploração por seres humanos;

C.

Considerando que o artigo 2.o, alínea a), do Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança relativo à venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil, define o termo «venda de crianças» como «qualquer ato ou transação pelo qual uma criança é transferida por qualquer pessoa ou grupo de pessoas para outra pessoa ou grupo contra remuneração ou qualquer outra retribuição»;

D.

Considerando que, de acordo com o Relatório Mundial sobre o Tráfico de Seres Humanos, de 2014, do Gabinete das Nações Unidas para a Droga e a Criminalidade (UNODC) 70 % das vítimas detetadas são mulheres e raparigas; que as mulheres constituem 79 % das vítimas detetadas de exploração sexual, o que representa 53 % das formas detetadas de exploração sexual a nível mundial e que os homens constituem 83 % das vítimas detetadas de trabalho forçado, o que representa 40 % das formas de exploração detetadas a nível internacional;

E.

Considerando que fatores complexos e inter-relacionados, tais como a discriminação sistemática e estrutural, as violações dos direitos humanos, a pobreza, a desigualdade, a corrupção, os conflitos violentos, o confisco de terras, a falta de educação, o desemprego e os regimes de migração laboral disfuncionais aumentam a vulnerabilidade das pessoas à exploração e aos abusos, pois são deixadas com opções e recursos limitados; que a Estratégia da UE para a erradicação do tráfico de seres humanos (2012-2016) identifica a violência contra as mulheres como uma das causas fundamentais do tráfico de seres humanos;

F.

Considerando que o tráfico de seres humanos constitui um crime de género; que as mulheres e as raparigas representam igualmente uma percentagem importante das vítimas de outras formas de tráfico de seres humanos, nomeadamente a exploração forçada no trabalho doméstico e na prestação de cuidados, na indústria transformadora, na alimentação, na limpeza e noutros setores;

G.

Considerando que o tráfico de seres humanos é uma das atividades de criminalidade organizada mais rentáveis a nível mundial, juntamente com o comércio de drogas ilegais e de armas; que, de acordo com as mais recentes estimativas da OIT, o lucro anual ilegal gerado pelo trabalho forçado, designadamente por meio do branqueamento de capitais, é de cerca de 150 mil milhões de dólares, calculando-se que 90 % das vítimas sejam exploradas na economia privada e dois terços dos lucros derivem da exploração sexual com fins comerciais, o que a torna a forma mais lucrativa de exploração;

H.

Considerando que o tráfico de seres humanos deve ser entendido na perspetiva da procura e do lucro, dado que a exploração de mulheres sobretudo para serviços sexuais é alimentada pela procura de tais serviços e pelo lucro obtido;

I.

Considerando que um dos maiores obstáculos à luta contra o tráfico de seres humanos é a inadequada aplicação do quadro jurídico relativo ao tráfico de seres humanos a nível nacional e a ausência de um quadro jurídico correspondente em países terceiros;

J.

Considerando que o acesso à justiça por parte das vítimas do tráfico de seres humanos varia entre o ser simplesmente problemático e a negação absoluta; que a corrupção e a falta de capacidades continuam, em muitos países, a ser um problema de monta para as organizações policiais e judiciárias;

K.

Considerando que, segundo a Europol, a generalização do acesso à Internet em todo o mundo permite que o tráfico se desenvolva cada vez mais no ambiente em linha; que este facto incentiva novas formas de recrutamento e exploração das vítimas;

L.

Considerando que existe uma ligação entre o tráfico de migrantes e o tráfico de seres humanos; que as redes de passadores recorrem, nomeadamente, à Internet para publicitarem os seus serviços junto dos potenciais migrantes;

M.

Considerando que, lamentavelmente, o tráfico de seres humanos e a introdução clandestina de pessoas não são fenómenos temporários e que a sua magnitude irá porventura aumentar nos próximos anos, uma vez que as zonas de conflito, os regimes repressivos ou as situações económicas no mundo propiciam as atividades criminosas dos traficantes de seres humanos e dos passadores;

N.

Considerando que os fluxos migratórios ilegais aumentam o risco de tráfico, porquanto os migrantes irregulares — devido à sua vulnerabilidade e situação irregular — correm um risco particularmente elevado de serem vítimas de tráfico de seres humanos; que, entre essas pessoas, os menores não acompanhados, que representam uma parte considerável dos migrantes que chegam à Europa, são um grupo alvo das redes de tráfico;

O.

Considerando que o tráfico de seres humanos é um problema regional e global, que nem sempre pode ser resolvido exclusivamente a nível nacional;

P.

Considerando que, de acordo com o último índice global de escravatura, 35,8 milhões de pessoas terão sido apanhadas em redes de escravatura moderna à escala mundial, o que significa que o tráfico de seres humanos é endémico por natureza e afeta todas as partes do mundo;

Q.

Considerando que as tendências passadas e emergentes do tráfico de seres humanos assumem diversas formas e variam consideravelmente de região para região, assim como no interior das sub-regiões;

R.

Considerando que o tráfico de seres humanos não é um fenómeno apenas dos países considerados menos desenvolvidos, mas também um fenómeno que, com uma expressão mais clandestina, tem lugar em países desenvolvidos;

S.

Considerando que, de acordo com a OIT, a região da Ásia-Pacífico compreende 56 % do total estimado de vítimas de trabalho forçado em todo o mundo, inclusive para exploração sexual, o que corresponde, de longe, à maior proporção a nível mundial;

T.

Considerando que, segundo as estimativas, 300 000 crianças participam em conflitos armados em todo o mundo; que o nível de tráfico de crianças em África, para fins de exploração como crianças-soldados, é o mais elevado do mundo;

U.

Considerando que, no Norte de África e no Médio Oriente, 95 % das vítimas identificadas são adultos; que os países do Médio Oriente são o principal destino dos trabalhadores migrantes e que, nestes países, o chamado sistema de patrocínio «Kafala» vincula os trabalhadores a um empregador específico, criando condições para o abuso e a exploração laboral, por vezes equivalentes a trabalho forçado;

V.

Considerando que, nos países da vizinhança oriental da UE, a exploração sexual é a principal causa dos casos registados de tráfico de pessoas; que a discriminação e o racismo sistemáticos levam a que comunidades inteiras de ciganos — tanto homens, como mulheres — sejam particularmente vulneráveis ao tráfico para diversos fins;

W.

Considerando que a cooperação entre os Estados-Membros, a Europol e os países de origem e de trânsito das vítimas de tráfico é uma ferramenta essencial na luta contra as redes de tráfico;

X.

Considerando que a UE identificou vários países e regiões com prioridade, com o objetivo de continuar a reforçar e a racionalizar a cooperação no âmbito da luta contra o tráfico de seres humanos;

Y.

Considerando que a Comissão nomeou uma Coordenadora da Luta Antitráfico em 2010 para melhorar a coordenação e coerência entre as instituições, as agências e os Estados-Membros da UE, bem como com países terceiros e intervenientes internacionais;

Tendências mundiais em matéria de tráfico de seres humanos

1.

Denuncia e rejeita expressamente o tráfico de seres humanos, que representa uma indústria do sofrimento humano em crescimento, afetando todas as sociedades e economias de forma profunda e permanente;

2.

Sublinha que o tráfico de seres humanos é uma forma moderna de escravatura e um crime grave, que constitui uma das piores formas de violação dos Direitos Humanos, algo que não pode ser tolerado em sociedades baseadas no respeito pelos Direitos Humanos, incluindo a igualdade entre homens e mulheres; considera que o tráfico de seres humanos deve ser entendido de forma holística, centrando-se, não apenas na exploração sexual, mas também no trabalho forçado, no tráfico de órgãos, na mendicidade forçada, nos casamentos forçados, nas crianças soldados e no tráfico de bebés;

3.

Recorda que o tráfico de seres humanos é um crime transnacional de natureza global e que quaisquer medidas destinadas a combatê-lo devem ter em conta as causas profundas e as tendências mundiais; salienta, neste contexto, a importância de uma abordagem coerente das dimensões interna e externa das políticas da UE com vista a combater o tráfico de seres humanos;

4.

Reconhece que o tráfico de seres humanos, como parte do crime organizado, ocorre quer através das fronteiras externas quer dentro das fronteiras internas, o que exige uma legislação nacional sólida contra esse fenómeno, bem como a cooperação entre países;

5.

Lamenta a persistente falta de legislação adequada para criminalizar e combater eficazmente o tráfico de seres humanos em muitos países do mundo;

6.

Lamenta também o fosso considerável existente entre a legislação em vigor e a sua execução, incluindo, por um lado, o acesso limitado ou inexistente à justiça por parte das vítimas e, por outro, a ausência de acusação dos criminosos;

7.

Lamenta, em particular, o facto de a identificação de vítimas continuar a ser muito inferior às estimativas do número de pessoas em situação de tráfico de seres humanos e de as taxas de ação judicial continuarem a ser extremamente reduzidas; manifesta a sua profunda preocupação pelo facto de um grande número de vítimas do tráfico de seres humanos não ter acesso a proteção e apoio adequados, nem a medidas destinadas a reparar as violações dos seus direitos fundamentais;

8.

Lembra que as vítimas de tráfico são frequentemente «pessoas invisíveis» no país onde são exploradas, que enfrentam dificuldades decorrentes da diversidade cultural e linguística e que essas circunstâncias tornam ainda mais difícil a denúncia dos crimes de que são alvo; salienta que estas dificuldades são ainda mais acentuadas para categorias de vítimas particularmente vulneráveis, como as mulheres e as crianças;

9.

Salienta que a procura de serviços sexuais nos países desenvolvidos impulsiona o tráfico de seres humanos proveniente dos países em desenvolvimento, colocando as pessoas em situação de vulnerabilidade, nomeadamente as mulheres e as raparigas; exorta os Estados-Membros a criminalizarem a utilização consciente dos serviços das vítimas de tráfico de seres humanos;

10.

Recorda que os grupos organizados a nível internacional transportam as vítimas — clandestinamente ou com o respetivo consentimento, sendo as vítimas enganadas por promessas fraudulentas — para zonas mais ricas, designadamente para fins de tráfico sexual, figurando no topo da lista os países europeus, onde há clientes com maior capacidade monetária;

11.

Denuncia o facto de mais de 10 000 crianças migrantes e refugiadas não acompanhadas terem desaparecido na Europa, de acordo com um comunicado de imprensa do chefe de gabinete da Europol; chama a atenção dos Estados-Membros da UE para o facto de muitas dessas crianças terem sido inseridas pela força nas redes de tráfico sexual, na mendicidade, no mercado ilícito e lucrativo dos transplantes de órgãos, ou no tráfico de escravos;

12.

Sublinha a necessidade de distinguir os conceitos de tráfico de seres humanos e de introdução clandestina de migrantes; salienta, registando embora que a introdução clandestina de pessoas se inscreve igualmente na esfera de atuação das redes criminosas e do crime organizado, podendo conduzir a uma situação de tráfico, que os dois conceitos necessitam de respostas jurídicas e práticas diferentes e implicam obrigações diferentes por parte dos Estados; insta a UE e os seus Estados-Membros a formarem o pessoal encarregado da receção e identificação dos migrantes/requerentes de asilo mediante programas específicos de sensibilização dedicados à distinção correta entre introdução clandestina e tráfico de seres humanos, nomeadamente no que diz respeito à identificação e proteção precoce das crianças vítimas de tráfico e das crianças não acompanhadas em risco de tráfico;

13.

Recorda que os migrantes aceitaram a introdução clandestina, que termina na sua chegada ao destino, ao contrário das vítimas de tráfico, que são exploradas através da coação, do dolo e do abuso, sem possibilidade de darem o seu consentimento; sublinha que também se pode passar de um fenómeno para o outro, devido ao risco de os grupos criminosos sujeitarem os refugiados e outros migrantes que entram na UE a formas de exploração como vítimas de tráfico de seres humanos, nomeadamente os menores não acompanhados e as mulheres que viajam sozinhas; insta as autoridades competentes dos Estados-Membros a prestarem atenção a esta sobreposição no decurso das suas atividades nos domínios policial, da cooperação judiciária e da aplicação da lei;

14.

Observa que a Internet e as redes sociais são cada vez mais utilizadas por redes criminosas para o recrutamento e a exploração de vítimas; apela à UE e aos Estados-Membros para que, no âmbito da sua luta contra o tráfico de seres humanos, invistam significativamente em tecnologia e conhecimento especializado, a fim de identificar, detetar e combater o uso indevido da Internet por parte de redes criminosas, tanto para o recrutamento de vítimas, como para a oferta de serviços que visem a sua exploração;

15.

Reconhece a importância e o papel das tecnologias da informação e da comunicação no contexto do tráfico de seres humanos, sabendo-se que a tecnologia, não obstante ser utilizada para facilitar o recrutamento e a exploração das vítimas, também pode ser usada como um instrumento para prevenir o tráfico de seres humanos; considera que se deve investigar mais aprofundadamente o papel das tecnologias da informação e da comunicação no tráfico de seres humanos;

16.

Solicita à Comissão que avalie a utilização da Internet no quadro do tráfico de seres humanos e, em especial, no que se refere à exploração sexual em linha; solicita o reforço da luta contra o tráfico em linha levada a cabo pela Europol no quadro da Unidade de Sinalização de Conteúdos na Internet (EU IRU, ou «Internet Referral Unit»), a fim de detetar, denunciar e remover o material em linha relativo ao tráfico de seres humanos;

17.

Solicita à Comissão que adapte a sua cooperação com países terceiros ao novo quadro do desenvolvimento do tráfico de seres humanos através da Internet; insta a Comissão e a Europol a preverem possibilidades de cooperação entre os órgãos europeus de luta contra a cibercriminalidade (em particular, no âmbito da Europol) e os órgãos de países terceiros; exorta a Comissão a ter igualmente em conta todas as formas de cooperação útil com os fornecedores de serviços de acesso à Internet, com o objetivo de detetar e combater os conteúdos ligados ao tráfico em linha; solicita à Comissão que mantenha o Parlamento devidamente informado;

A economia do tráfico de seres humanos

18.

Denuncia o facto de o tráfico de seres humanos ser um negócio extremamente lucrativo e de as receitas dessa atividade criminosa serem em grande medida reinjetadas na economia mundial e no sistema financeiro; denuncia o facto de as organizações criminosas internacionais mais estruturadas e poderosas participarem no tráfico de seres humanos, tendo criado uma verdadeira rede criminosa internacional e ramificada; exorta todos os Estados e intervenientes pertinentes neste domínio a envidarem esforços com vista a transformar o tráfico de uma atividade de «baixo risco/elevada recompensa» numa atividade de «alto risco/baixa recompensa»;

19.

Entende que as investigações financeiras que detetam, confiscam e recuperam ativos de origem criminosa e as medidas contra o branqueamento de capitais desempenham um papel crucial na luta contra o tráfico; recorda a necessidade de dispor de mais dados e de se colocar maior ênfase nas atividades de branqueamento de capitais; lamenta o facto de a utilização de medidas para recolher, analisar e partilhar informações financeiras em prol da investigação criminal do tráfico de seres humanos permanecer limitada e, muitas vezes, criar dificuldades para a plena integração das investigações financeiras em casos de tráfico de seres humanos; exorta a UE e os Estados-Membros a reforçarem a cooperação, a coordenação e a partilha de informações com os países terceiros, a fim de localizar e confiscar as receitas dessas atividades criminosas; exige que os ativos confiscados sejam utilizados para apoiar e compensar as vítimas do tráfico;

20.

Insta os governos a exercerem a diligência devida com vista a combater a corrupção, que contribui para o tráfico de seres humanos, e a identificarem e erradicarem a participação ou a cumplicidade do setor público no tráfico de seres humanos, inclusive assegurando que aqueles que trabalham no setor público obtenham formação que lhes permita identificar esses casos e disponham de orientações internas para fazer face a casos suspeitos;

21.

Recorda que os abusos relacionados com o recrutamento ocorrem em muitos países e regiões do mundo e, independente do país onde se verificam, regista que esses abusos estão estreitamente associados ao tráfico de seres humanos, quer por agências de recrutamento diretamente envolvidas no tráfico de seres humanos através de práticas de recrutamento enganosas ou coercivas, quer pela criação de vulnerabilidades que aproveitam ao trabalho em situação de exploração, com a cobrança de elevadas taxas pelo recrutamento, tornando, em especial, os migrantes e os trabalhadores pouco qualificados financeiramente vulneráveis ou dependentes;

22.

Exorta a UE e os seus Estados-Membros a aumentarem a cooperação com os países terceiros, a fim de investigar todas as fases do tráfico de seres humanos, nomeadamente a fase de recrutamento, de melhorar o intercâmbio de informações e de lançar operações pró-ativas, investigações (financeiras) e ações penais; insta todos os Estados-Membros a melhorarem a supervisão e regulamentação no que toca às agências de recrutamento;

23.

Entende que não pode existir consentimento válido numa situação em que um cidadão de um país terceiro é retirado do seu país para ir para a UE (ou quando um cidadão europeu é levado para outro Estado-Membro) para fins de prostituição, ou qualquer outra forma de exploração sexual ou trabalho forçado;

24.

Considera que os governos devem incentivar o diálogo e as parcerias multilaterais com vista a reunir empresas, especialistas no combate ao tráfico e ONG, desenvolver ações comuns de combate ao tráfico de seres humanos e assegurar que sejam defendidos os direitos dos trabalhadores, nomeadamente os direitos laborais fundamentais; apela aos governos para que estabeleçam medidas jurídicas que garantam a transparência e a rastreabilidade dos produtos ao longo da cadeia de abastecimento e às empresas para que comuniquem mais eficazmente as ações empreendidas com vista a erradicar o tráfico de seres humanos das suas cadeias de abastecimento; exorta a UE e os seus Estados-Membros a dialogarem ativamente com empresas nacionais e internacionais, por forma a garantir que não haja exploração em nenhum ponto da cadeia de abastecimento dos seus produtos e que sejam responsáveis pelos casos de tráfico de seres humanos existentes em qualquer ponto da sua cadeia de abastecimento, inclusive no que respeita a filiais e subcontratantes;

25.

Exorta a UE e os seus Estados-Membros a participarem de forma construtiva nas negociações do Grupo de Trabalho Intergovernamental Aberto, encarregado de elaborar um instrumento internacional juridicamente vinculativo para regulamentar as atividades de empresas transnacionais e de outro tipo de empresas no que diz respeito aos direitos humanos, e a aplicarem os princípios orientadores das Nações Unidas sobre empresas e direitos humanos;

As diferentes formas de exploração

26.

Exorta a UE e os seus Estados-Membros a realizarem os esforços necessários para combater o trabalho forçado nas indústrias da UE localizadas no estrangeiro, e em relação a países terceiros, através da aplicação e da execução das normas de trabalho, bem como da concessão de apoio aos governos para adotar legislação laboral que preveja normas mínimas de proteção dos trabalhadores, nomeadamente trabalhadores estrangeiros, assegurando que as empresas europeias que operam em países terceiros respeitem essas normas; insta os governos a aplicar as leis laborais, tratar todos os trabalhadores de forma justa, garantir os mesmos direitos para todos os trabalhadores, independentemente da sua nacionalidade ou origem e erradicar a corrupção; reivindica uma cooperação internacional com vista a fortalecer as políticas de migração para fins laborais e a elaborar e aplicar uma melhor regulamentação atinente aos recrutadores de mão de obra;

27.

Apela a uma maior observância global, em todas as fases, das normas fundamentais da OIT em matéria de trabalho e ambiente, inclusive através do reforço da segurança social e das inspeções do trabalho; apela, além disso, à ratificação e à aplicação da Convenção da OIT sobre o Trabalho Doméstico, de 2011 (n.o 189), e à transposição das suas disposições para a legislação nacional, mormente no que se refere aos trabalhadores domésticos em casas de diplomatas;

28.

Salienta que a ligação clara entre o tráfico de seres humanos para fins sexuais e a prostituição torna necessária a adoção de medidas destinadas a pôr termo à procura no domínio da prostituição;

29.

Salienta que, na maioria dos Estados-Membros, as vítimas de prostituição forçada têm dificuldade em obter acesso a cuidados psicológicos, pelo que têm de confiar quase exclusivamente no apoio das organizações de caridade; solicita, por conseguinte, um apoio reforçado a essas organizações e insta os Estados-Membros a eliminarem as barreiras ao acesso aos cuidados psicológicos;

30.

Salienta que o casamento forçado pode ser entendido como uma forma de tráfico de seres humanos se contiver uma vertente de exploração da vítima, pelo que exorta os Estados-Membros a incluírem esta dimensão na sua definição do tráfico de seres humanos; salienta que a exploração pode ser sexual (violação conjugal, prostituição forçada e pornografia) ou económica (trabalho doméstico e mendicidade forçada) e que o casamento forçado pode ser o objetivo final do tráfico (venda de uma vítima como esposa ou contração forçada de casamento); recorda o carácter transnacional que o casamento forçado pode ter; insta os Estados-Membros a garantirem que as autoridades nacionais responsáveis pela migração tenham formação adequada em matéria de casamentos forçados no contexto do tráfico de seres humanos; solicita à Comissão que reforce igualmente o intercâmbio de boas práticas neste domínio;

31.

Condena a prática do tráfico de seres humanos para a maternidade de substituição como uma violação dos direitos da mulher e dos direitos da criança; assinala que a procura é induzida pelos países desenvolvidos à custa de pessoas pobres e vulneráveis, muitas vezes dos países em desenvolvimento, e exorta os Estados-Membros a ponderarem as implicações das suas próprias políticas de reprodução restritivas;

32.

Insiste em que as crianças vítimas de tráfico de seres humanos sejam identificadas como tal, que os seus interesses, direitos e necessidades sejam considerados de importância capital em todas as circunstâncias; solicita a prestação de apoio e proteção a nível jurídico, físico, psicológico e de outra índole, tanto a curto como a longo prazo, e a adoção de medidas que visem facilitar o reagrupamento familiar, se aplicável, no superior interesse da criança e no respeito da sua dignidade e dos seus direitos, ou a criação de sistemas de acolhimento adequados;

33.

Recorda que o tráfico de crianças conduz muitas vezes a casos de abuso sexual, prostituição, trabalhos forçados ou colheita e tráfico de órgãos e salienta que nunca deve ser considerado válido o consentimento dado por uma criança traficada para efetuar trabalhos ou prestar serviços; lamenta que as crianças em risco sejam frequentemente tratadas como criminosos ou migrantes irregulares pelos responsáveis pela aplicação da lei, que não procuraram de forma sistemática indicadores de tráfico de seres humanos com vista a identificar as vítimas;

34.

Entende que é essencial, no que diz respeito aos menores não acompanhados, uma melhor identificação proativa das crianças vítimas de tráfico, nomeadamente nos pontos de passagem das fronteiras e nos centros de acolhimento, bem como uma cooperação multidisciplinar reforçada, a fim de assegurar a defesa eficaz do superior interesse da criança; considera necessário reforçar os sistemas de tutela nos Estados-Membros da UE, de forma a impedir que menores não acompanhados ou separados da família caiam nas mãos das organizações de traficantes;

35.

Apela ao reforço dos sistemas nacionais de tutela das crianças na Europa, como parte da estratégia da UE de combate ao tráfico, na qual se reconhece o papel fundamental desempenhado pelos tutores na proteção das crianças contra os abusos;

36.

Exorta a UE a prosseguir os seus esforços para combater o fenómeno das crianças-soldados, nomeadamente apoiando os governos que procuram resolver o problema, bem como os grupos locais da sociedade civil ativos no terreno, a adotar medidas destinadas a prevenir o recrutamento e a utilização futuros de crianças-soldados, a apoiar o desenvolvimento de legislação de proteção da criança, incluindo a criminalização do recrutamento de crianças, e a mobilizar recursos com vista a reforçar a resiliência e a fortalecer os ambientes de proteção das crianças; insta a UE a exortar os países terceiros a ratificarem e aplicarem as normas internacionais relevantes, incluindo o Protocolo Facultativo à Convenção dos Direitos da Criança sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados da ONU;

37.

Sublinha que as crianças e as pessoas com deficiência devem ser consideradas vítimas vulneráveis de tráfico de seres humanos; frisa que as vítimas de tráfico de seres humanos podem tornar-se deficientes em consequência dos abusos a que são sujeitas pelos traficantes, ao passo que, inversamente, uma pessoa com deficiência pode ser alvo de um traficante por ter essa vulnerabilidade;

38.

Congratula-se com o reconhecimento da mendicidade forçada como uma forma de tráfico de seres humanos no âmbito da Diretiva 2011/36/UE; insta os Estados-Membros a harmonizarem as legislações nacionais e a solicitarem aos governos de países terceiros que adotem e apliquem disposições legais nesse domínio; condena a criminalização das vítimas da mendicidade forçada e solicita acesso a oportunidades de emprego e alojamento; insiste na necessidade de proporcionar formação à polícia e outras autoridades que permita a identificação e o encaminhamento corretos, a fim de garantir uma assistência adequada às vítimas da mendicidade forçada; salienta que muitas das vítimas provêm de um ambiente de pobreza e marginalidade; apela a que as medidas de prevenção incidam na redução da vulnerabilidade dos grupos de risco, começando pelas estruturas básicas, como a integração ao nível da educação ou do trabalho, bem como no aumento do número de alojamentos e locais para prestação e assistência às pessoas vulneráveis;

39.

Salienta que o Protocolo de Palermo das Nações Unidas exige a criminalização do trabalho forçado como uma forma de tráfico; insta os governos a aplicarem a lei e a garantirem que aqueles que lucram com o trabalho forçado sejam punidos;

40.

Regista o desenvolvimento de uma nova forma de tráfico de seres humanos, em que as pessoas são objeto de tráfico para efeitos de resgate com graves práticas de tortura; observa que esta nova forma de mercantilização dos seres humanos é caracterizada por extorsão, espancamentos e violações como meio de garantir o pagamento de dívidas pela família e por parentes que residam dentro ou fora da UE;

41.

Condena o tráfico de órgãos, tecidos e células humanos, incluindo a comercialização ilegal de células reprodutivas (óvulos, espermatozoides), tecidos e células fetais e células estaminais embrionárias e adultas;

42.

Salienta que, segundo um relatório da Global Financial Integrity, o comércio de órgãos humanos é uma das dez atividades ilegais mais lucrativas, gerando lucros entre 600 milhões e 1,2 mil milhões de dólares por ano e abrangendo vários países; salienta ainda que, de acordo com as Nações Unidas, pessoas de todas as idades podem ser alvos, mas os migrantes, os sem-abrigo e os analfabetos são particularmente vulneráveis;

43.

Salienta que a estagnação económica, as lacunas na legislação e as deficiências na aplicação da lei nos países em desenvolvimento — em combinação com a crescente globalização e a melhoria das tecnologias das comunicações — criam um espaço ideal para a atividade criminosa do tráfico de órgãos; salienta que a falta de oportunidades económicas obriga as pessoas a ponderar opções que noutra situação poderiam considerar perigosas ou repreensíveis, ao passo que uma aplicação inadequada da legislação permite que os traficantes operem sem medo de serem alvo de ação judicial;

44.

Salienta que a aquisição de órgãos, tecidos e células de origem humana é ilegal; constata que as vítimas de tráfico para efeitos de remoção de órgãos enfrentam grandes desafios e que, muitas vezes, desconhecem as consequências médicas a longo prazo e incapacitantes decorrentes da remoção de órgãos e da falta de cuidados pós-operatórios, bem como o impacto psicológico da operação; solicita campanhas de sensibilização melhor orientadas para aumentar a visibilidade dos danos associados à venda de órgãos, especialmente entre as pessoas mais pobres e vulneráveis, que podem considerar a venda de um órgão como um preço que estão dispostos a pagar para terem uma melhor situação económica;

45.

Insta a Comissão a condenar todos os tipos de tráfico de seres humanos para fins de extração de órgãos e a adotar uma atitude clara face ao comércio ilegal de órgãos, tecidos e células; exorta a UE a encorajar as associações médicas e as sociedades de transplantes a desenvolverem um código de conduta ética para os profissionais de saúde e os centros de transplante sobre a consecução de transplantes de órgãos no exterior e o procedimento a seguir nos cuidados após o transplante; salienta que os cidadãos oriundos das comunidades mais pobres do mundo são particularmente vulneráveis ao risco de se tornarem vítimas de tráfico ilegal de órgãos;

46.

Apela à ratificação e à aplicação da Convenção do Conselho da Europa contra o Tráfico de Órgãos Humanos; solicita à União Europeia que apele aos governos dos países terceiros para que intentem ações judiciais contra os profissionais de saúde, hospitais e clínicas privadas que operem no mercado ilegal e lucrativo do transplante de órgãos;

47.

Insta os Estados-Membros a incentivarem esforços adicionais em prol da participação da comunidade médica na intensificação dos esforços com vista a combater esta forma de tráfico, através da sensibilização para as questões relacionadas com o tráfico de seres humanos e da prestação de formação obrigatória;

48.

Salienta a importância da prevenção e de uma abordagem multicultural e multidisciplinar da luta contra a recolha ilícita de órgãos humanos, incluindo o tráfico de seres humanos para remoção de órgãos, que se tornou um problema global; apela a campanhas de sensibilização mais orientadas para aumentar a visibilidade dos danos associados à venda de órgãos, a fim de informar melhor as vítimas e as potenciais vítimas dos riscos físicos e psicológicos, especialmente junto das pessoas mais pobres e vulneráveis em termos de desigualdade e de pobreza, que podem considerar a venda de um órgão como um preço que estão dispostos a pagar para terem uma melhor situação económica; salienta que as campanhas de sensibilização devem ser um elemento obrigatório da política europeia de vizinhança e da cooperação para o desenvolvimento da UE;

49.

Salienta a importância do papel desempenhado pelos médicos, pelas enfermeiras, pelos assistentes sociais e por outros profissionais da saúde, que são inigualáveis no seu contacto profissional com as vítimas que quando ainda estão detidas e desempenham um papel fundamental na prevenção do tráfico de pessoas; manifesta a sua preocupação por atualmente esta ser uma oportunidade perdida para intervir; assinala a necessidade de dar formação à comunidade médica no que respeita à deteção dos sinais de alerta do tráfico de seres humanos e aos procedimentos de informação, a fim de prestar um melhor apoio às vítimas, e de estabelecer sanções rigorosas para todas as formas de participação no tráfico ilegal de órgãos;

50.

Incentiva a criação, nos diferentes países, de programas de presunção de consentimento ou de sistemas nos quais os cidadãos disponham da opção de aderir diretamente a um registo de doadores de órgãos ao completarem determinados procedimentos administrativos, de modo a reduzir a dependência dos doentes relativamente ao mercado negro e, ao mesmo tempo, aumentar a quantidade de órgãos disponíveis, a fim de reduzir o custo de um transplante e diminuir a atratividade do turismo médico;

51.

Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que tomem medidas para impedir o «turismo de transplantação», através da adoção de medidas que reforcem a disponibilidade de órgãos recolhidos legalmente, com vista a reforçar a prevenção da recolha ilícita de órgãos e a criar um sistema transparente de rastreabilidade dos órgãos transplantados, assegurando simultaneamente o anonimato dos dadores; insta a Comissão a elaborar orientações para incentivar a participação de Estados-Membros em parcerias de colaboração, como a Eurotransplant e a Scandiatransplant;

52.

Sublinha que, segundo a Organização Mundial da Saúde, os dados científicos sobre o tráfico e a saúde são limitados, em particular, no que respeita à saúde mental e psicológica; salienta também que as necessidades das vítimas e dos sobreviventes são frequentemente subestimadas; consequentemente, insta a Comissão e as autoridades competentes dos Estados-Membros a procederem a um acompanhamento e a promoverem a informação sobre as consequências do tráfico e as necessidades das vítimas em termos de saúde física e psicológica;

Direitos das vítimas, incluindo o direito à compensação

53.

Exorta a UE e os Estados-Membros a seguirem uma abordagem baseada nos direitos humanos e centrada nas vítimas e a colocarem as vítimas e as populações vulneráveis no centro de todos os esforços envidados no sentido de combater e prevenir o tráfico de seres humanos, bem como de proteger as suas vítimas;

54.

Denuncia a existência de uma discrepância preocupante entre as obrigações do Estado e o seu grau de cumprimento no que respeita aos direitos das vítimas; congratula-se com a Diretiva 2012/29/UE que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade; espera que os Estados-Membros transponham devidamente a referida diretiva, atendendo a que a sua data de entrada em vigor estava prevista para 16 de novembro de 2015; exorta os Estados-Membros, incluindo os países de origem, trânsito e destino, a fornecer ou facilitar o acesso a uma compensação justa, adequada e apropriada a todas as pessoas traficadas nos seus territórios e que estejam sujeitas à sua jurisdição, incluindo os que não sejam cidadãos desses Estados;

55.

Recorda que a rápida e correta identificação das vítimas é fundamental para que possam exercer os seus direitos; insiste na adoção de medidas de reforço das capacidades relativas à identificação das vítimas de tráfico de seres humanos, em particular dos serviços de migração, segurança e controlo de fronteiras;

56.

Insta o Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) a proceder ao intercâmbio de boas práticas com países terceiros, em primeiro lugar, sobre a formação das autoridades policiais e os trabalhadores humanitários relativamente à melhor maneira de abordar as vítimas e, em segundo lugar, sobre a aplicação do princípio da avaliação individual das vítimas, a fim de determinar as suas necessidades específicas em termos de apoio e proteção;

57.

Salienta a importância do princípio do reconhecimento mútuo consagrado no artigo 82.o, n.o 1, do TFUE; insta a Comissão, os Estados-Membros e as agências da UE a reforçar o estatuto das vítimas do tráfico de seres humanos através do reconhecimento mútuo das decisões judiciais e administrativas, incluindo as que se relacionam com as medidas de proteção das vítimas de tráfico de seres humanos, o que significa que o estatuto de uma vítima, uma vez preceituado num Estado-Membro, tem de ser aplicável em toda a União Europeia, razão por que as vítimas (ou as associações que as representem) devem ser ajudadas e assistidas — em caso de não-reconhecimento do seu estatuto — quando viajam pela União;

58.

Insiste em que a resposta da justiça penal garanta o acesso equitativo e efetivo das vítimas à justiça e à informação sobre os seus direitos legais; apela a todos os Estados para que honrem a sua obrigação internacional de defender os direitos das vítimas sob sua jurisdição e para que garantam pleno apoio às vítimas, designadamente através de apoio psicológico, independentemente de estarem ou não dispostas a cooperar em processos penais;

59.

Afirma que as vítimas de tráfico de seres humanos têm direito a uma efetiva compensação, nomeadamente a acesso à justiça, ao reconhecimento da identidade jurídica e da cidadania, à restituição de bens, a uma reparação adequada, assim como a cuidados médicos e psicológicos, serviços sociais e jurídicos, e, a longo prazo, a apoio à (re)integração, incluindo apoio económico;

60.

Salienta a importância do acesso universal a cuidados de saúde e à saúde sexual e reprodutiva, em especial no caso das vítimas de tráfico de seres humanos, que poderão debater-se com múltiplos problemas físicos e psicológicos como consequência direta da sua exploração; exorta os Estados-Membros a criarem serviços de saúde e de acompanhamento de acesso fácil para as vítimas de tráfico de seres humanos;

61.

Exorta os Estados-Membros onde tenha ocorrido a exploração de vítimas do tráfico de seres humanos a proporcionarem um tratamento médico adequado e necessário, sensível às questões de género e baseado nas necessidades individuais, com especial atenção para as vítimas do tráfico de seres humanos para fins de exploração sexual;

62.

Regista que as pessoas portadoras de deficiência ou que sofram de incapacidades enquanto são objeto de tráfico precisam de proteção adicional contra a exploração e exorta a UE e os Estados-Membros a garantirem que a assistência prestada às vítimas identificadas responda de forma adequada às suas necessidades específicas;

63.

Salienta a necessidade de reintegrar as vítimas de tráfico e de defender o seu direito a proteção; exorta os Estados-Membros a criar e a reforçar redes públicas de centros de apoio e abrigo, a assegurar a prestação de serviços numa língua compreendida pelas vítimas e a proporcionar-lhes acesso à educação; solicita um esforço de colaboração com vista à integração social e a prestação de assistência entre ONG, organismos internacionais, organismos governamentais e agências dos países de destino e origem, especialmente em situações em que as vítimas regressam aos respetivos países de origem;

64.

Salienta a importância de garantir a segurança das vítimas do tráfico de seres humanos que testemunhem em tribunal contra os traficantes de seres humanos;

65.

Solicita que seja votada mais atenção às vítimas no âmbito dos processos penais; insta as autoridades competentes a não deter vítimas de tráfico e a não as colocar em risco de ser punidas por infrações cometidas enquanto vítimas de tráfico de seres humanos, nomeadamente no caso da prostituição e de qualquer outra forma de exploração sexual ou trabalho forçado; insta os Estados-Membros a respeitar o princípio de não-criminalização;

66.

Insta os Estados-Membros a aplicarem instrumentos jurídicos que facilitem as possibilidades de as vítimas do tráfico de seres humanos contactarem as entidades sem por em perigo a sua própria segurança e os seus direitos enquanto vítimas;

67.

Exorta os Estados-Membros a porem em prática, sem demora, a Diretiva 2011/36/UE, nomeadamente o seu artigo 8.o, para além de todos os outros quadros jurídicos pertinentes em matéria de tráfico de seres humanos; insta a Comissão a mover processos aos Estados-Membros que ainda não aplicaram a referida diretiva e a publicar o respetivo relatório de aplicação, que deveria ter sido apresentado em abril de 2015;

68.

Exorta os governos a separarem as autoridades de imigração das inspeções do trabalho, a fim de encorajar as vítimas a apresentar queixas e garantir que, se forem detetados casos de tráfico de seres humanos, não exista o receio da tomada de medidas das autoridades de imigração contra as vítimas;

69.

Exorta os Estados-Membros a criminalizarem a utilização de serviços das vítimas do tráfico de seres humanos pelos seus cidadãos se tal ato for cometido fora do território desse Estado-Membro e/ou fora da UE, incluindo a prostituição ou outras formas de exploração sexual, o trabalho forçado ou a prestação de serviços forçados, como a mendicidade, a escravatura ou práticas afins, a servidão, a exploração de atividades criminosas ou a remoção de órgãos;

70.

Considera que os refugiados, os requerentes de asilo, os detentores de visto humanitário ou as pessoas que precisam de proteção internacional devem ser consideradas como vulneráveis ao tráfico de seres humanos; solicita aos Estados-Membros que assegurem que as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e as autoridades competentes em matéria de asilo cooperem, com o objetivo de ajudar as vítimas de tráfico de seres humanos que precisam de proteção internacional a apresentar um pedido de proteção; reitera que as medidas adotadas contra o tráfico de seres humanos não devem prejudicar os direitos das vítimas de tráfico, os migrantes, os refugiados e as pessoas que carecem de proteção internacional;

71.

Insta os Estados-Membros a aplicarem medidas especificamente vocacionadas para as questões de género para melhorar a identificação de vítimas de tráfico de seres humanos nos procedimentos de asilo e retorno, a manterem registos mais pormenorizados e discriminados por género e a certificarem-se de que as vítimas sejam também encaminhadas para as opções de apoio mais adequadas;

72.

Recorda aos Estados-Membros que a Diretiva 2011/36/UE em nada prejudica o princípio da não repulsão, nos termos da Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados;

73.

Encoraja os Estados-Membros a garantir aos requerentes de asilo que são vítimas de tráfico os mesmos direitos de que gozam as restantes vítimas de tráfico;

74.

Observa que, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), o retorno de migrantes e refugiados implica riscos de segurança inerentes a um novo tráfico, que têm de ser identificados, avaliados e mitigados, uma vez que é frequente assistir-se ao aumento do risco corrido pelos migrantes vítimas de tráfico às mãos dos exploradores depois de terem conseguido fugir, terem interagido com responsáveis pela aplicação da lei ou testemunhado em tribunal (2);

75.

Apela à UE e aos Estados-Membros para que tornem mais visível junto das populações o combate ao tráfico de seres humanos, centrando-se nomeadamente nos aeroportos, estações de comboios, autocarros, escolas, universidades e locais de trabalho pertinentes; insta a UE e os Estados-Membros a sensibilizar os seus funcionários para as Orientações da UE sobre a identificação das vítimas de tráfico de seres humanos, e para a publicação da Comissão sobre os direitos das vítimas de tráfico de seres humanos na UE, pugnando pela utilização efetiva destes documentos;

76.

Incentiva a concessão de financiamento específico da UE às ONG locais, a fim de identificar e apoiar as vítimas de tráfico de seres humanos, bem como o reforço da sensibilização das populações vulneráveis à exploração e ao tráfico de seres humanos; congratula-se, nesse contexto, com o papel dos meios de comunicação, que podem contribuir para a sensibilização e podem divulgar informação sobre os riscos;

A cooperação em matéria de combate ao tráfico de seres humanos a nível regional e internacional

77.

Manifesta a sua preocupação com o insuficiente nível de cooperação internacional nos casos de tráfico de seres humanos, especialmente quando envolvem países de origem e países de trânsito, e considera que essa situação constitui um obstáculo significativo à luta contra o tráfico de seres humanos; apela a uma cooperação internacional reforçada e a um intercâmbio sistemático de informações para investigar e combater o tráfico de seres humanos transnacional, através da intensificação da assistência técnica e financeira e do reforço da comunicação, da cooperação e do desenvolvimento de capacidades transfronteiriças ao nível do governo e dos serviços de aplicação da lei — incluindo os guardas de fronteira, os funcionários dos serviços de imigração e de asilo, os investigadores criminais e as agências de apoio às vítimas, a sociedade civil e as agências da ONU –, designadamente no que se refere aos procedimentos de identificação e proteção das vítimas e às atitudes para com países de origem, de trânsito e de destino que não tenham ratificado o Protocolo de Palermo da ONU; insta a UE a desenvolver uma abordagem regional, centrada nas «rotas do tráfico», a fim de oferecer respostas adaptadas ao tipo de exploração nas diferentes regiões; sublinha, além disso, a utilidade de programas de intercâmbio internacional para profissionais do combate ao tráfico;

78.

Exorta a Comissão, as agências competentes da UE e os Estados-Membros a desenvolverem a formação específica em matéria de género para o pessoal que trabalha em serviços de aplicação da lei e de controlo das fronteiras, a fim de melhor identificar e ajudar as potenciais vítimas de tráfico, nomeadamente nos casos de tráfico para fins de exploração sexual;

79.

Insiste na necessidade de a UE melhorar a cooperação policial e judiciária entre os Estados-Membros e com países terceiros — nomeadamente os países de origem e de trânsito das vítimas de tráfico de seres humanos –, bem como na prevenção, investigação e repressão do tráfico de seres humanos, em particular através da Europol e da Eurojust, incluindo a partilha de informação, nomeadamente no que se refere às rotas de tráfico conhecidas, a participação em equipas de investigação conjuntas e a luta contra o recrutamento de pessoas para o tráfico de seres humanos através da Internet e de outros meios digitais; salienta a importância do intercâmbio sistemático de dados e da alimentação, pelos Estados-Membros, das bases de dados «Focal Point Phoenix» e «Focal Point Twins» da Europol; apela a uma maior cooperação entre a Europol e a Interpol na luta contra o tráfico de seres humanos e relembra que o intercâmbio de dados entre os Estados-Membros e com países terceiros deve respeitar escrupulosamente as normas da UE em matéria de proteção de dados; solicita aos Estados-Membros que recolham mais dados comparáveis sobre a luta contra o tráfico de seres humanos e melhorem o intercâmbio desses dados entre si e com países terceiros;

80.

Solicita à União Europeia e aos Estados-Membros que forneçam o pessoal e os recursos necessários às suas agências policiais e responsáveis pela aplicação da lei, para que também possam receber informações das famílias ou de outras fontes, tratar e analisar devidamente essas informações e partilhá-las com as autoridades europeias e nacionais relevantes;

81.

Salienta que os países de trânsito têm um papel decisivo na luta contra o tráfico de seres humanos, devido ao facto de a exploração da vítima ainda não ter sido iniciada nessa fase; salienta a importância de se ministrar formação adicional aos agentes das polícias de fronteiras para melhorar a eficiência dos procedimentos de identificação;

82.

Destaca os inúmeros desafios relacionados com a migração laboral transfronteiriça, em particular, o risco de os migrantes serem deixados em situação de ilegalidade e privados dos seus direitos mais fundamentais; solicita a criação de mecanismos em matéria de migração laboral transfronteiriça na UE e a nível internacional, a fim de aumentar e formalizar a migração laboral regular;

83.

Reconhece o esforço da UE na criação de canais de migração laboral transfronteiriça formalizada, a qual deveria ser alvo de maior atenção, e apela a um esforço mais coerente e aprofundado a este respeito; sublinha o potencial da migração laboral formalizada, como meio de prevenir o tráfico de seres humanos e salvar vidas;

84.

Insta a UE a reforçar a sua cooperação com as ONG e outras organizações internacionais pertinentes, inclusivamente através de financiamento adequado e assistência coordenada, a fim de aumentar o intercâmbio de boas práticas, o desenvolvimento de políticas e a aplicação, e de intensificar a investigação, inclusive com os intervenientes locais, conferindo especial atenção ao acesso à justiça por parte das vítimas e à condenação efetiva dos autores destes crimes;

85.

Recorda que, em conformidade com a Diretiva 2011/36/UE, os Estados-Membros devem incentivar e agir em estreita colaboração com organizações da sociedade civil, em especial no quadro do desenvolvimento de iniciativas políticas, campanhas de informação e sensibilização, programas de investigação, ensino e formação, bem como no acompanhamento e na avaliação do impacto das medidas de combate ao tráfico; considera ainda que as ONG devem igualmente ajudar na identificação precoce de vítimas, bem como na prestação de apoio e assistência; reitera que os Estados-Membros devem garantir que as ONG sejam protegidas contra retaliações, ameaças e intimidações e, mais do que isso, sejam isentadas de ações penais, sempre que ajudem vítimas de tráfico de seres humanos em situação irregular;

86.

Exorta a UE, os Estados-Membros e a comunidade internacional a prestar especial atenção ao problema da prevenção e do combate ao tráfico de seres humanos em contextos de crise, nomeadamente de catástrofe natural e de conflito armado, a fim de diminuir a vulnerabilidade das vítimas aos traficantes e a outras redes criminosas; salienta que deve ser concedida proteção a todos aqueles que a ela têm direito, de acordo com as convenções internacionais e regionais;

87.

Salienta que as pessoas que — por motivos de mudança de clima súbita ou progressiva que afete adversamente as suas vidas ou condições de vida — são obrigadas a abandonar os seus lares habituais correm um risco elevado de se tornarem vítimas do tráfico de seres humanos; salienta que este tipo de mobilidade humana relacionado com as alterações climáticas tem uma forte dimensão económica, incluindo a perda dos meios de subsistência e reduções do rendimento dos agregados familiares, pelo que existe uma ameaça direta de as pessoas em causa se tornarem mais vulneráveis e suscetíveis de ser vítimas do trabalho forçado ou de escravatura;

A política da UE em matéria de tráfico de seres humanos no contexto das relações externas

88.

Reconhece e apoia o trabalho da Coordenadora da Luta Antitráfico da UE, destinado a melhorar a coordenação e coerência entre as instituições e agências da UE, e dos Estados-Membros com os países terceiros e os intervenientes internacionais, e insta a Coordenadora a continuar a desenvolver ações e medidas conjuntas concretas entre a UE, os Estados-Membros, os países terceiros e os intervenientes internacionais, a fim de estabelecer uma cooperação mais coerente e eficaz na criação de sistemas que permitam identificar, proteger e assistir as vítimas de tráfico, intensificar a prevenção do tráfico de seres humanos, aumentar as ações judiciais contra os traficantes e estabelecer uma rede capaz de responder às preocupações emergentes;

89.

Exorta a UE a envidar os esforços necessários, a nível internacional, para prevenir e reprimir o tráfico de escravos e para conseguir, progressivamente e o mais rapidamente possível, a abolição total da escravatura sob todas as suas formas;

90.

Considera fundamental que as estratégias de prevenção do tráfico de seres humanos abordem os fatores que o facilitam, bem como as causas e as circunstâncias desse fenómeno, e sigam uma abordagem integrada, congregando diferentes intervenientes, mandatos e perspetivas nacionais e internacionais; considera que as estratégias de prevenção devem incluir ações que visem combater a pobreza, a opressão, o desrespeito pelos direitos humanos, os conflitos armados e as desigualdades económicas e sociais, devendo destinar-se a reduzir a vulnerabilidade das vítimas potenciais, desencorajar a procura dos serviços das pessoas traficadas — que pode também ser considerada uma causa fundamental –, reforçar a educação pública e erradicar a corrupção entre os funcionários públicos; insta igualmente todos os Estados a implementarem de forma cabal as respetivas obrigações no âmbito do Protocolo de Palermo;

91.

Apela a todos os Estados-Membros para que ratifiquem todos os instrumentos, acordos e obrigações jurídicas internacionais pertinentes, designadamente a Convenção de Istambul, e para que intensifiquem os seus esforços no sentido de melhorar a eficácia, a coordenação e a coerência da luta contra o tráfico de seres humanos; incentiva a UE a exigir a ratificação de todos os instrumentos internacionais relevantes;

92.

Exorta os representantes da UE a votarem particular atenção ao tráfico de seres humanos no diálogo político da UE com os países terceiros, assim como através dos seus programas de cooperação e no âmbito dos fóruns multilaterais e regionais, designadamente através de declarações públicas;

93.

Insta a UE a rever os seus programas de assistência em matéria de tráfico de seres humanos, a fim de afetar o financiamento de forma mais orientada e de tornar o tráfico de seres humanos uma área de cooperação em si; encoraja, nesse contexto, o reforço dos recursos nos serviços que tratam das questões do tráfico de seres humanos nas instituições da UE; solicita à Comissão que reavalie regularmente a sua lista de países prioritários, incluindo os critérios de seleção, a fim de assegurar que eles reflitam as realidades no terreno e de os tornar mais e adaptáveis à evolução das circunstâncias e às tendências emergentes;

94.

Insta a Comissão e os Estados-Membros, aquando do reforço das medidas legais contra o tráfico de seres humanos, a alargarem igualmente a definição de tráfico de seres humanos mediante a introdução de novos meios de tráfico no seu âmbito;

95.

Insta a UE e os seus Estados-Membros a implementar as ações relativas à luta contra o tráfico constantes do atual Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia, de forma consentânea com a Estratégia da UE para a erradicação do tráfico de seres humanos;

96.

Solicita à Comissão que avalie a necessidade de uma eventual revisão do mandato da futura Procuradoria Europeia, para que a luta contra o tráfico de seres humanos seja integrada nas suas futuras competências;

97.

Solicita que se torne mais eficaz a política da UE contra o tráfico de seres humanos, fazendo com que esta seja integrada mais profundamente nas estratégias mais amplas da UE em matéria de segurança, igualdade entre homens e mulheres, crescimento económico, cibersegurança, migração e relações externas;

98.

Exorta todas as instituições da UE e os Estados-Membros a adotarem uma política coerente, tanto a nível interno como externo, conferindo aos direitos humanos, em consonância com os valores fundamentais da União, um lugar privilegiado nas relações da UE com países terceiros, e a utilizarem as relações económicas e comerciais, em especial, como um efeito de alavanca;

99.

Exorta a Comissão e os Estados-Membros a velarem por que os Direitos Humanos, a igualdade entre homens e mulheres e o combate ao tráfico de seres humanos continuem a ser o cerne das políticas de desenvolvimento da UE e das parcerias com países terceiros; insta a Comissão a introduzir medidas sensíveis às questões de género aquando da elaboração de novas políticas de desenvolvimento e da revisão das políticas existentes;

100.

Salienta que a emancipação económica e social das mulheres e das raparigas reduziria a sua vulnerabilidade à condição de vítimas e insta a Comissão a prosseguir a sua ação orientada para a integração da dimensão de género em todas as iniciativas ligadas ao desenvolvimento e a assegurar que, juntamente com os direitos das mulheres, esta permaneça em lugar de destaque na agenda do diálogo político com os países terceiros;

101.

Salienta a importância dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, em especial o objetivo 5.2 que insta à eliminação de todas as formas de violência contras as mulheres e as raparigas nas esferas pública e privada, incluindo o tráfico e a exploração sexual e de outros tipos;

102.

Insta a UE a apoiar os esforços envidados pelos países terceiros com o objetivo de reforçar a identificação, assistência e reintegração das vítimas e de aumentar o número de ações judiciais por tráfico de seres humanos, criando e aplicando legislação adequada e harmonizando a cooperação, as definições e os processos jurídicos, em conformidade com as normas internacionais;

103.

Insta a Comissão e os Estados-Membros a assegurarem que o pessoal responsável pela aplicação da lei, incluindo agências como a Frontex, a Europol e a EASO, bem como outros responsáveis suscetíveis de entrar em contacto com vítimas, ou potenciais vítimas, de tráfico de seres humanos, recebam formação adequada no domínio do tráfico de seres humanos para poderem lidar com essas vítimas numa perspetiva intersetorial, com ênfase para as necessidades especiais das vítimas do tráfico de mulheres, crianças e outros grupos vulneráveis, como ciganos e refugiados, e para a forma de dar incentivos e uma proteção adequada às vítimas do tráfico de seres humanos e a todos aqueles que denunciem os traficantes;

104.

Considera que a identificação das vítimas de tráfico provenientes de países terceiros tem de ser feita o mais a montante possível na rede e que, por conseguinte, haverá que redobrar esforços nas fronteiras para se identificar as vítimas, assim que entram na União; insta os Estados-Membros a cooperar com países terceiros na melhoria das orientações existentes, que podem ajudar os serviços consulares e as guardas de fronteiras na identificação das vítimas de tráfico de seres humanos, sublinhando, neste contexto, a importância do intercâmbio de melhores práticas, em particular no que diz respeito às entrevistas junto às fronteiras; sublinha igualmente a necessidade de facilitar o acesso das guardas de fronteiras e das guardas costeiras às bases de dados da Europol;

105.

Exorta os Estados-Membros a reforçarem a cooperação com os países terceiros com vista a combater todas as formas de tráfico de seres humanos, conferindo uma atenção especial à dimensão de género do tráfico de seres humanos no intuito de combater especificamente os casamentos de crianças, a exploração sexual de mulheres e jovens e o turismo sexual; insta a Comissão e o Serviço Europeu para a Ação Externa a intensificarem a atividade do Processo de Cartum, aumentando o número de projetos concretos a realizar e alargando a participação ativa a um maior número de países;

106.

Solicita que a Comissão, o Conselho e o SEAE, nas suas negociações de acordos internacionais, de readmissão ou de cooperação com países terceiros, coloquem a tónica na necessidade de os países terceiros lutarem eficazmente contra o tráfico de seres humanos, aumentarem o número de ações judiciais contra os criminosos e melhorarem a proteção concedida às vítimas;

107.

Insta a UE a focalizar eficazmente os seus esforços tanto na resolução do tráfico de seres humanos, como na luta contra o contrabando; exorta a UE e os seus Estados-Membros a investirem na identificação das vítimas de tráfico de seres humanos entre os refugiados e os migrantes ou entre as vítimas de violações e abusos no âmbito de operações de contrabando controladas por redes criminosas;

108.

Salienta a necessidade de trabalhos preparatórios e de formação para missões policiais civis internacionais, bem como de formação de diplomatas, oficiais de ligação e oficiais de cooperação nos domínios consular e do desenvolvimento, a fim de melhorar a identificação das vítimas de tráfico de seres humanos; considera necessária a formação destes grupos, pois são, frequentemente, o primeiro ponto de contacto para as vítimas do tráfico, e entende que cumpre tomar medidas destinadas a garantir que esses funcionários tenham acesso a material adequado para que possam informar as pessoas em risco de se tornarem vítimas de tráfico;

109.

Recorda que o lançamento, em 7 de outubro de 2015, da segunda fase da EUNAVFOR MED, também designada Operação Sófia, permite combater na prática o tráfico de seres humanos, ao autorizar a interceção, a busca, a apreensão e o desvio em alto mar dos navios e embarcações suspeitos de serem utilizados para o TSH; recorda que, até ao momento, foram interpelados 48 alegados passadores e traficantes, os quais se encontram nas mãos da polícia italiana; insta a UE a prosseguir e a intensificar as suas operações no Mediterrâneo;

110.

Insta a UE a encontrar soluções concretas para proporcionar aos migrantes e refugiados vias de entrada na UE que sejam legais, regulares, seguras e não deixem margem para a exploração; recorda aos Estados-Membros e à UE que devem cumprir o Direito internacional, incluindo o princípio da não repulsão, em todas as suas políticas e, em particular, nas migratórias; recorda que o Estado de acolhimento e o Estado de origem devem garantir o regresso em segurança e voluntário das vítimas de tráfico de seres humanos e propor-lhes alternativas jurídicas, caso o repatriamento represente um risco para a sua segurança e/ou a segurança da sua família; afirma que o Estado de acolhimento e o Estado de origem devem garantir as necessárias condições de segurança e reintegração das vítimas aquando do regresso;

111.

Insta a Comissão e os Estados-Membros a respeitarem a Carta das Nações Unidas e os princípios inerentes ao direito de asilo;

112.

Insta a UE a promover programas de apoio à inclusão dos migrantes e refugiados, com a participação dos principais intervenientes de países terceiros, e também de mediadores culturais, que sejam úteis para elevar o nível de sensibilização das comunidades para o tráfico e para as tornar mais resilientes à penetração da criminalidade organizada;

113.

Insta a Comissão e os Estados-Membros a desenvolver esforços para proteger e encontrar qualquer refugiado ou migrante desaparecido, em particular as crianças, após chegada a solo europeu;

114.

Congratula-se com a ação da Europol, nomeadamente no âmbito da base de dados «Focal Point Twins», destinada a detetar as pessoas que se deslocam a países terceiros com o objetivo de cometer abusos sobre crianças; insta os Estados-Membros a cooperarem com a Europol, assegurando um intercâmbio rápido e sistemático de dados;

115.

Recorda que, antes de concluir um acordo de liberalização de vistos, a Comissão tem de avaliar os riscos que o país terceiro em causa representa, nomeadamente em matéria de imigração irregular; reitera que as redes de tráfico também podem utilizar as vias legais de migração; solicita à Comissão que inclua a cooperação eficaz dos países terceiros em causa em matéria de tráfico de seres humanos nos critérios a cumprir para a celebração de qualquer acordo de liberalização de vistos;

116.

Refere que a UE necessita de uma abordagem legislativa vinculativa e obrigatória em matéria de reinstalação, tal como previsto na agenda da Comissão para o fenómeno das migrações; assinala que a admissão por motivos humanitários pode ser utilizada como complemento da reinstalação, a fim de conceder proteção urgente, amiúde numa base temporária e sempre que necessário, aos mais vulneráveis, como os menores não acompanhados, os refugiados com deficiência ou os que necessitam de evacuação médica urgente;

117.

Insta a UE a partilhar com os países terceiros a elaboração de um sistema normalizado de recolha de dados qualitativos e quantitativos e de análise do tráfico de seres humanos, a fim de desenvolver um modelo comum ou, pelo menos, comparável na UE e nos países terceiros com vista à recolha e análise de dados relativos a todos os aspetos do tráfico de seres humanos; salienta a necessidade de atribuição de fundos suficientes à recolha de dados e à investigação em matéria de tráfico de seres humanos;

118.

Incentiva a UE a desenvolver uma nova estratégia pós-2016 de luta contra o tráfico, com uma dimensão externa mais forte e mais orientada, que dê prioridade ao desenvolvimento de parcerias com a sociedade civil local dos países terceiros de origem, trânsito e destino, com os governos e o setor privado, bem como aos aspetos financeiros e económicos do tráfico;

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119.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) e às delegações da UE.


(1)  Textos Aprovados, P8_TA(2015)0470.

(2)  Vide p. 23 do relatório da Organização Internacional para as Migrações (OIM), intitulado «Counter Trafficking and Assistance to Vulnerable Migrants Annual Report of Activities 2011» («Combate ao Tráfico de Seres Humanos e Assistência a Migrantes Vulneráveis: Relatório Anual de Atividades de 2011»).


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