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Document 52010DC0676

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO Aplicação do Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE) (Texto relevante para efeitos do EEE)

/* COM/2010/0676 final */

52010DC0676

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO Aplicação do Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE) (Texto relevante para efeitos do EEE) /* COM/2010/0676 final */


[pic] | COMISSÃO EUROPEIA |

Bruxelas, 17.11.2010

COM(2010) 676 final

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

Aplicação do Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE)(Texto relevante para efeitos do EEE)

SEC(2010) 1391

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

Aplicação do Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE)(Texto relevante para efeitos do EEE)

INTRODUÇÃO

O estatuto das sociedades europeias («Regulamento SE»)[1] foi aprovado em 8 de Outubro de 2001, depois de mais de 30 anos de negociações no seio do Conselho. Permite a possibilidade de criação de uma nova forma jurídica denominada Sociedade Europeia, também designada por SE, da designação latina Societas Europaea . De acordo com os seus considerandos, o Regulamento SE tem por objectivo, entre outros, remover entraves ao agrupamento de sociedades de Estados-Membros diferentes, (…) permitir às sociedades com uma dimensão europeia a combinação, concepção e promoção da reorganização das suas actividades a nível comunitário e a transferência da sua sede para outro Estado-Membro, assegurando em simultâneo a devida protecção dos interesses dos accionistas minoritários e de terceiros, (…) fazer corresponder, tanto quanto possível, a unidade económica e a unidade jurídica da empresa na Comunidade, (…) permitir a criação e a gestão de sociedades de dimensão europeia, sem os entraves resultantes da disparidade e da aplicação territorial limitada do direito nacional das sociedades (…) e (…) permitir às sociedades de dimensão europeia a adaptação da sua estrutura organizacional e a escolha de um sistema de governação empresarial adequado que garanta uma gestão eficiente, uma supervisão correcta e a preservação do direito de envolvimento dos trabalhadores[2].

O Regulamento SE é complementado pela Directiva 2001/86/CE do Conselho, que trata o envolvimento dos trabalhadores nas SE («Directiva SE»). O prazo estabelecido para que a legislação nacional fosse adaptada à legislação europeia no que respeita às SE correu até 8 de Outubro de 2004, mas apenas 8 Estados-Membros cumpriram o estabelecido. Só no início de 2007 é que a Directiva SE se encontrava transposta em todos os Estados-Membros.

O artigo 69.º do Regulamento SE prevê que a Comissão apresente um relatório sobre a sua aplicação, incluindo, se adequado, propostas de alteração cinco anos após a sua entrada em vigor. A fim de reunir a informação necessária sobre a aplicação prática do estatuto de SE, a Direcção-Geral do Mercado Interno e Serviços da Comissão Europeia encomendou um estudo externo e consultou as partes interessadas no decurso de uma consulta pública e de uma conferência[3].

APLICAÇÃO DO ESTATUTO DE SE: INVENTÁRIO DAS SE

À data de 25 de Junho de 2010, encontravam-se registadas nos Estados-Membros da UE/EEE 595 SE. O número de SE aumentou de forma exponencial entre 2004 e 2008. Em 2009 foram criadas menos SE do que em 2008, mas em 2010 a tendência voltou a ser de crescimento do número de novas SE criadas. Foram registadas SE em 21 dos 30 Estados-Membros da UE/EEE, a grande maioria (aproximadamente 70%) na República Checa e na Alemanha. Muito poucas SE estão registadas nos Estados-Membros do sul da Europa, à excepção de Chipre.

O documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha o presente relatório contém informações pormenorizadas sobre o inventário das SE e das suas características, assim como sobre a legislação SE aplicável nos vários Estados-Membros.

PRINCIPAIS FACTORES E TENDÊNCIAS

Factores positivos e negativos na criação de uma SE

Os testemunhos das empresas indicam que, regra geral, a decisão de criar ou não uma SE depende dos objectivos de negócio específicos, ou seja, baseia-se num conjunto de razões relevantes para a situação específica de uma determinada empresa. Estas razões são variáveis e torna-se difícil identificar uma tendência geral aplicável a todas as empresas. Não obstante, algumas razões parecem ser, de modo geral, mais importantes do que outras, e algumas parecem assumir maior importância em certos Estados-Membros e em certos sectores. Algumas destas razões, classificadas pelas empresas como factores positivos ou negativos, são apresentadas em seguida.

A imagem europeia de uma SE é indicada como um dos factores positivos mais importantes. É especialmente atractiva para empresas que pretendem realçar a sua filiação europeia ou que desejam beneficiar de uma forma jurídica europeia, por ser mais conhecida do que as suas formas jurídicas nacionais, para penetrar nos mercados de outros Estados-Membros sem terem de criar filiais no estrangeiro. No entanto, a importância da imagem europeia é variável. É referida como uma vantagem especialmente pelas empresas de países pequenos, dos países da Europa Oriental, da Bélgica e dos países orientados para as exportações (como é o caso da Alemanha). Por outro lado, em alguns Estados-Membros, em determinados sectores, uma marca nacional é considerada mais interessante do ponto de vista comercial do que a marca europeia.

O carácter supranacional de uma SE é referido como uma possível vantagem nos processos de fusões transfronteiriças ou de reestruturação de um grupo (por exemplo, transformar filiais nacionais em sucursais da empresa-mãe). Em especial, ajuda a evitar a sensação de «derrota» nacional por parte da gerência e do pessoal da empresa absorvida ou das antigas filiais.

A possibilidade de transferir a sede para outro Estado-Membro é considerada um factor decisivo e uma verdadeira vantagem comparativa da SE em relação às sociedades nacionais. Na ausência de uma directiva relativa à transferência transfronteiriça da sede de uma empresa, a SE constitui a única forma jurídica que permite às empresas transferir a sua sede para qualquer outro Estado-Membro sem liquidação[4]. Segundo o apurado, esta possibilidade é especialmente atraente para as sociedades gestoras de participações sociais ( holdings ). Contudo, na prática, apenas um número limitado de SE transferiu a sua sede (49 à data de 25 de Junho de 2010).

A possibilidade de utilizar a forma de SE como meio de realizar uma fusão transfronteiriça foi considerada um factor determinante até à entrada em vigor da Directiva Fusões Transfronteiriças. Além disso, as disposições relativas à participação dos trabalhadores são referidas pelas empresas e pelos consultores jurídicos como mais flexíveis na dita directiva do que no estatuto das SE, embora isso seja contestado pelas organizações de trabalhadores.

Vários participantes na consulta pública indicaram o potencial das SE para a reorganização e simplificação da estrutura de um grupo , como factor positivo. Na sua opinião, a transformação numa SE, designadamente a conversão de sucursais em filiais, é especialmente atraente para empresas do sector dos seguros e das finanças. As vantagens referidas são o facto de haver uma única autoridade de supervisão (ao invés de várias, em todos os Estados-Membros onde a empresa tem filiais) e a maior facilidade de cumprimento dos requisitos de fundos próprios. No entanto, as vantagens de tal reestruturação na forma de uma SE não são evidentes (na medida em que também seria possível utilizando uma sociedade nacional), salvo se combinadas com outras vantagens, como a imagem europeia, o carácter supranacional da SE ou a possibilidade de transferência da sede.

Os participantes na consulta pública referiram igualmente as vantagens das SE em termos de financiamento (uma posição mais forte na negociação com a banca e em candidaturas a apoio financeiro da UE) e as regras flexíveis deste tipo de sociedade no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores nos Estados-Membros em que esta matéria é regulada por regras imperativas. Em relação a essa flexibilidade, tanto empresas como sindicatos referem que o estatuto de SE oferece a possibilidade de: i) negociar um modelo de envolvimento dos trabalhadores, ajustando-o assim às necessidades específicas de uma sociedade ou grupo, em lugar de ter de cumprir as regras nacionais imperativas; ii) ter uma mistura de representantes de vários Estados-Membros em vez de apenas um Estado-Membro (o que poderá ajudar a criar uma identidade europeia do trabalhador e constituir uma vantagem para grupos de dimensão europeia); e iii) reduzir a dimensão do conselho de supervisão para aumentar a sua eficiência. De acordo com o que foi referido, a forma de SE é por vezes utilizada para manter o mesmo sistema de envolvimento dos trabalhadores independentemente de um aumento do número de empregados[5].

Os custos de estabelecimento , a morosa complexidade processual e a incerteza jurídica , em conjunto com a falta de previsão e de experiência prática dos consultores e das autoridades públicas competentes são referidos como os principais factores negativos no que se refere à criação de uma SE . Exemplos bem conhecidos do custo elevado da constituição de uma SE são a Allianz SE e a BASF SE, cujos custos de transformação em SE ascenderam, respectivamente, a 95 milhões de euros e 5 milhões de euros. Abstraindo estes casos, os custos médios de constituição das SE inquiridas no estudo externo foram de aproximadamente 784 000 euros (incluindo os custos com impostos, aconselhamento jurídico, tradução e registo). Os custos globais de estabelecimento variam desde aproximadamente 100 000 euros até valores entre 2 e 4 milhões de euros.

A insuficiente sensibilização para as SE entre a comunidade empresarial, dentro e fora da UE, é tida como o problema mais significativo no funcionamento das SE . No momento de anunciar a adopção da forma de SE, a administração da empresa tem frequentemente de investir para explicar a natureza da SE aos seus parceiros comerciais (clientes, fornecedores, bancos, etc.) e trabalhadores.

Diversas empresas, consultores jurídicos e associações empresariais vêem as regras relativas ao envolvimento dos trabalhadores como um factor negativo, na medida em que, no seu entender, são complexas e morosas, especialmente nos Estados-Membros em que a legislação nacional não prevê um sistema de participação dos trabalhadores. Por vezes estas regras são consideradas desproporcionadas, nomeadamente se os trabalhadores envolvidos forem poucos. O requisito de que o registo de uma SE só possa ser efectuado no fim das negociações relativas ao envolvimento dos trabalhadores é por vezes também mencionado como um factor negativo importante, em especial por sociedades cotadas para as quais a segurança dos procedimentos e o tempo necessário para o registo são cruciais. No entanto, as organizações de trabalhadores não partilham destas opiniões.

Tendências na distribuição das SE

O estudo externo e os participantes na consulta e na conferência referem que é provável que a dimensão das empresas nacionais tenha algum efeito sobre a distribuição das SE. Defendem que os custos acrescidos (especialmente o estabelecimento de elevados requisitos mínimos de fundos próprios) e a complexidade da criação de uma SE, quando comparada com uma sociedade anónima, acabam por constituir um entrave em Estados-Membros onde as empresas nacionais são geralmente pequenas e médias empresas. A Polónia, Espanha, Portugal, Grécia e Itália são mencionados como exemplos de países em que esta situação poderia explicar em parte o número reduzido de SE. Um participante na consulta pública mencionou ainda uma correlação positiva entre o número de empresas multinacionais e o número de SE num determinado Estado-Membro.

O conhecimento e a sensibilização das comunidades jurídica e empresarial em relação às SE também parecem ter alguma influência. Os testemunhos sugerem que existem mais SE nos Estados-Membros onde a forma da SE foi promovida de forma activa, como é o caso da República Checa e da Alemanha, enquanto em países como a Itália ou a Espanha, onde a informação e o aconselhamento relativamente à forma da SE não está facilmente disponível, foram criadas muito poucas ou nenhumas SE. Poderá ter existido igualmente um efeito de espiral positiva: o aumento do número de SE num Estado-Membro capta o interesse de outras empresas para esta forma legal, o que resulta na criação de mais SE nesse país.

O estudo externo conclui igualmente que a implementação tardia da Directiva SE em alguns Estados-Membros pode ter tido um impacto ao nível da sensibilização e do número de SE nesses países[6].

Outra tendência é a de, em geral, terem sido criadas mais SE em países que apenas permitem o sistema dualista de organização empresarial do que em países que apenas permitem o sistema monista, com muito poucas a serem criadas nos países que já permitem ambos os sistemas. No entanto, de acordo com alguns dos participantes na consulta pública, a escolha de uma estrutura de administração desconhecida na legislação nacional onde a SE é registada pode causar incerteza jurídica ou dificuldades práticas.

No que se refere à correlação entre a distribuição da SE em diferentes Estados-Membros e as regras nacionais relativas à participação dos trabalhadores , as opiniões divergem. Enquanto o estudo externo e a vasta maioria dos participantes na consulta pública concordam, em geral, com a existência desta tendência[7], as organizações de trabalhadores e os investigadores especializados em direito laboral discordam desta ideia.

Os participantes na consulta pública mencionaram ainda outras explicações possíveis para a distribuição das SE na UE/EEE, em especial: i) a flexibilidade de certos aspectos da forma de SE comparativamente às formas jurídicas nacionais; ii) o valor diferenciado da marca europeia; iii) as diferenças no custo de estabelecimento e de funcionamento de uma SE; iv) os regimes fiscais dos Estados-Membros.

O número elevado de SE «de prateleira», ou sem existência económica, em alguns Estados-Membros, especialmente na República Checa e na Alemanha, também contribui para explicar o elevado número de SE nestes dois Estados-membros[8]. Segundo o apurado, a criação de SE sem existência económica por profissionais nestes países pode ser justificada pelo facto de aí ser comum um sistema de empresas sem existência económica disponíveis para venda[9] , que responde a necessidades de negócio específicas. De acordo com os participantes na consulta pública, as empresas compram SE sem existência económica sobretudo para poupar tempo e custos e para evitar um processo de constituição complexo e incerto. Vários participantes mencionaram que as SE sem existência económica também possibilitam a criação de uma SE sem ser necessário satisfazer uma onerosa exigência de carácter transfronteiriço[10] ou passar por negociações relativas ao envolvimento dos trabalhadores. A possibilidade de evitar requisitos significativos é especialmente importante para as empresas mais pequenas. Por outro lado, as organizações de trabalhadores manifestam a sua preocupação relativamente à possibilidade de as SE sem existência económica serem utilizadas para contornar as regras da Directiva SE sobre o envolvimento dos trabalhadores. Neste contexto, importa referir que existe falta de informação sobre muitas SE sem existência económica após a respectiva activação. Isto pode ser explicado, em parte, pelo facto de as contas anuais serem publicadas de forma retrospectiva. Outra explicação é o facto de algumas empresas, pela sua pequena dimensão, apenas estarem obrigadas a publicar uma forma simplificada do balanço e das notas explicativas. Segundo o apurado, em alguns casos, as contas anuais não estão disponíveis nos ficheiros de empresas, sem que exista justificação para tal.

PROBLEMAS PRÁTICOS NA APLICAÇÃO DO ESTATUTO DA SE

Com base na informação recolhida nas consultas com as partes interessadas, foram identificados diversos problemas na aplicação do estatuto das SE, tanto em termos de constituição como de funcionamento. No documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha o presente relatório é apresentada uma explicação mais detalhada dos problemas identificados nas consultas com as partes interessadas.

Criação de uma SE

O objectivo inicial do estatuto das SE era fornecer uma forma europeia para as empresas transfronteiriças de dimensão razoável já existentes, sem dificultar a criação de SE por parte das pequenas e médias empresas. Contudo, a conferência e a consulta pública demonstraram que as empresas, em particular as PME, consideram que as condições actuais de constituição são demasiado onerosas. Os custos de estabelecimento, a morosa complexidade processual e a incerteza jurídica do processo de constituição de SE , decorrentes sobretudo da falta de uniformidade do estatuto das SE e das múltiplas referências à legislação nacional, estão entre os mais importantes entraves que desencorajam as empresas de criar uma SE. As partes interessadas mencionam também as pesadas exigências de carácter transfronteiriço (em especial o requisito de que as empresas que pretendam criar uma SE tenham de ter tido uma filial ou uma sucursal noutro Estado-Membro durante pelo menos dois anos antes da criação da SE), os métodos limitados de criação de uma SE e os elevados requisitos mínimos de fundos próprios como obstáculos consideráveis.

No que diz respeito aos métodos limitados de criação , os participantes na conferência e na consulta mencionaram em especial a impossibilidade de criar uma SE directamente a partir de sociedades de responsabilidade limitada, através de fusão transfronteiriça ou transformação, e a impossibilidade de criar uma SE através da cisão de uma empresa existente como áreas onde se poderão contemplar determinados ajustamentos. A possibilidade de permitir a criação de uma SE através de cisão está relacionada com a questão do alargamento do conceito de fusão previsto no artigo 17.º, n.º 2, do Regulamento SE (cf. artigo 69.º, alínea b)). Um dos participantes na consulta alega que a cisão é um instrumento óbvio para as reestruturações, tanto no interior como para além das fronteiras de um Estado-Membro, e que a cisão de uma empresa transfronteiriça, através da qual se pudesse criar uma SE, seria mais fácil e menos morosa do que as alternativas já existentes[11]. Também foi argumentado que, apesar de não existir legislação a nível da UE relativamente às cisões de empresas transfronteiriças, a jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu no Processo Sevic (C-411/03) já tornou possível a cisão de empresas transfronteiriças quando as empresas envolvidas são regidas por leis de Estados-Membros diferentes. Por outro lado, o estudo externo alega que permitir a criação de uma SE através de cisão acabaria por dividir ainda mais a unidade económica e jurídica de um grupo de empresas, em vez de o simplificar[12].

Algumas partes interessadas (empresas, incluindo SE, consultores jurídicos e associações empresariais) pensam ainda que as regras de envolvimento dos trabalhadores das SE , em particular o processo de negociação relacionado com a criação de uma SE, são complexas e morosas. No entanto, de acordo com os sindicatos, estas negociações não são um ónus, mas sim um mecanismo necessário que permite um diálogo adequado entre a administração e os trabalhadores de uma empresa. Por outro lado, os sindicatos expressaram as suas preocupações relativamente ao facto das regras das SE poderem não estar completamente adaptadas a todas as situações. Em particular, o estatuto das SE não contém uma regra clara sobre o facto de se poderem ou não registar SE sem existência económica, uma vez que não existem negociações relativamente ao envolvimento dos trabalhadores, já que nem a SE nem as empresas participantes têm trabalhadores no momento da criação de uma SE desse tipo.

Vida de uma SE

Vários participantes na consulta pública consideram o requisito de que a sede e a administração central da SE estejam localizadas no mesmo Estado-Membro (ou, em alguns Estados-Membros, no mesmo local) um entrave na prática[13]. O estatuto prevê uma sanção severa (liquidação) se a SE não cumprir este requisito. Desde a adopção do estatuto das SE tiveram lugar desenvolvimentos significativos que alteraram a abordagem à questão da sede das empresas. A jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu, em particular, abriu caminho para a aceitação do princípio da separação entre sede e administração central na União Europeia[14]. Além disso, de acordo com algumas partes interessadas, o princípio da sede real é difícil de aplicar na prática num mundo moderno em que não é fácil identificar a localização da sede administrativa de uma empresa internacional, ou seja, o local onde são tomadas as decisões estratégicas. O princípio que estabelece que o direito comercial aplicável é determinado pela legislação do país onde se encontra localizada a sede da SE é bastante claro e fácil de identificar. Além disso, a possibilidade de separar a sede e a administração central de uma SE pode ser uma ferramenta atractiva para a simplificação da estrutura de um grupo[15] e poderá vir a ser um passo na direcção de uma melhor coincidência entre a unidade económica e a unidade jurídica dos grupos empresariais na União. O estudo externo favorece a separação, tal como os testemunhos das empresas, mas outras partes interessadas, designadamente alguns Estados-Membros e sindicatos, são de opinião contrária. Receiam, nomeadamente, que a possibilidade de separar a sede da administração central possa dificultar a aplicação do controlo fiscal devido à falta de transparência da informação sobre empresas registadas noutros Estados-Membros.

Alguns participantes na consulta pública mencionaram uma série de problemas práticos resultantes das diferenças das regras nacionais aplicáveis ao processo de transferência da sede de uma SE e de regras onerosas ou pouco claras relativamente à organização interna das SE. Os participantes na conferência sugeriram que o estatuto de SE deveria oferecer maior flexibilidade aos fundadores e accionistas na organização interna das SE, mesmo quando essa flexibilidade não esteja prevista para as empresas nacionais nos Estados-Membros onde fossem registadas as SE[16]. Isso reduziria também o número de referências à legislação nacional. Contudo, uma vez que iria resultar na entrada em concorrência directa da SE com as formas jurídicas nacionais, surgiram dúvidas quanto ao que se conseguiria obter a nível político sobre esta questão.

Várias partes interessadas indicaram diversos problemas de interpretação em relação à disposição do estatuto das SE que trata a conversão de uma SE existente numa empresa nacional .

Vários participantes na consulta pública e vários representantes de sindicatos presentes na conferência mencionaram ainda a falta de regras claras quanto ao envolvimento dos trabalhadores aquando da activação de uma SE sem existência económica ou da ocorrência de alterações estruturais após a criação da SE. Na opinião dos sindicatos, este facto resulta no risco de evasão às regras de envolvimento dos trabalhadores.

O estatuto das SE, no seu artigo 69.º, alínea c), prevê que a Comissão analise se é apropriado rever a cláusula de jurisdição constante do artigo 8.º, n.º 16, do estatuto das SE, em função de eventuais alterações futuras na legislação europeia ou nacional nos domínios abrangidos pela Convenção de Bruxelas de 1968 («Convenção»)[17]. Esta cláusula de revisão foi acrescentada para ter em consideração eventuais alterações necessárias às regras de jurisdição após a adopção do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000 («Regulamento Bruxelas I»), que veio substituir a Convenção. Esta cláusula foi necessária porque o Regulamento Bruxelas I, discutido ao mesmo tempo que o Regulamento SE, só foi adoptado depois de as discussões relativas ao estatuto da SE terem terminado. O artigo 8.º, n.º 16, do estatuto das SE prevê que, após a transferência da sede para outro Estado-Membro, se continue a considerar, no que respeita às suas actividades anteriores à transferência, que a SE tinha a sua sede no Estado-Membro onde foi registada antes da transferência. Esta regra permite que processos judiciais relativos a actividades da SE desenvolvidas antes da transferência sejam instaurados no Estado-Membro onde a SE estava registada na altura. Deve ser interpretada em conjunto com as normas de jurisdição aplicáveis, em particular os artigos 2.º e 60.º do Regulamento Bruxelas I, que permitem a instauração de processos judiciais contra uma empresa perante, entre outros, os tribunais do Estado-Membro onde a empresa tem a sua sede (registada). O artigo 8.º, n.º 16, alarga assim o âmbito de jurisdição dos processos judiciais contra uma SE em comparação com o que é possível ao abrigo do Regulamento Bruxelas I no caso de outros tipos de empresas. Tanto quanto é do conhecimento da Comissão, a regra do artigo 8.º, n.º 16, nunca foi aplicada na prática. Além disso, é difícil definir se a regra acrescenta algo às regras de jurisdição já existentes no Regulamento Bruxelas I, que já permitem que se interponham processos judiciais junto dos tribunais de um Estado-Membro onde, por exemplo, um contrato é cumprido ou são causados ou sofridos os danos. Não obstante, nesta fase a Comissão não vê qualquer razão para alterar a regra actual.

ENCARGOS ADMINISTRATIVOS

O Centro de Estudos da Política Europeia (CEPS) procedeu a uma medição[18] dos encargos administrativos decorrentes do Regulamento SE. De acordo com a medição efectuada, o Regulamento SE impõe encargos administrativos no valor de 5,2 milhões de euros anuais. Isto representa 0,04% dos 12,1 mil milhões de euros em encargos administrativos calculados para a área das contas anuais/direito das sociedades em Fevereiro de 2009[19]. Deve referir-se, contudo, que os encargos administrativos incluem o custo administrativo de todas as obrigações de informação exigidas, independentemente de estas obrigações serem ou não necessárias para a protecção dos interesses legítimos das partes interessadas. O Grupo de Alto Nível de Partes Interessadas Independentes sobre os Encargos Administrativos (HLG)[20] sublinha que quaisquer reformas futuras do estatuto das SE deverão também ter em conta a redução dos encargos administrativos. O grupo sugere que se considerem, em particular, as possibilidades de reduzir as obrigações de informação associadas à apresentação de relatórios, publicação de informação, utilização de peritos independentes e reuniões obrigatórias[21].

CONCLUSÃO

O estudo externo conclui que os objectivos iniciais do estatuto das SE foram atingidos até certo ponto, mas que a situação ainda poderia ser melhorada.

A Sociedade Europeia deu às empresas com uma dimensão europeia a possibilidade de transferirem a sua sede para além-fronteiras, de se reorganizarem e reestruturarem em melhores condições e de escolherem entre as diferentes estruturas de administração, garantindo, ao mesmo tempo, o direito de envolvimento dos trabalhadores e protegendo os interesses dos accionistas minoritários e de terceiros. A imagem europeia e o carácter supranacional das SE são também aspectos positivos.

No entanto, seis anos de experiência com o Regulamento SE mostraram que a aplicação do estatuto cria uma série de problemas de ordem prática. O estatuto das SE não prevê uma forma de SE uniforme em toda a União Europeia, mas sim 27 tipos diferentes de SE. O estatuto contém muitas referências à lei nacional e subsiste alguma incerteza relativamente ao efeito jurídico da legislação directamente aplicável e à sua articulação com a legislação nacional. Para além do mais, a distribuição irregular das SE na União Europeia revela que o estatuto não está adaptado à situação das empresas em todos os Estados-Membros.

Quaisquer considerações relativas a alterações ao estatuto das SE que visem solucionar os problemas práticos identificados por diversas partes interessadas deverão ter em consideração o facto do estatuto das SE resultar de um compromisso delicado assumido após longas negociações. A Comissão está actualmente a considerar potenciais alterações ao estatuto das SE com vista a apresentar propostas em 2012, se adequado. Quaisquer alterações, se vierem a ser propostas, terão de ser executadas em paralelo com uma eventual revisão da Directiva SE, que terá de ser sujeita à consulta dos parceiros sociais nos termos do artigo 154.º do Tratado. Em termos mais gerais, quaisquer medidas propostas pela Comissão na sequência do presente relatório serão sujeitas aos princípios da iniciativa «Legislar melhor», incluindo uma avaliação de impacto.

[1] Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE).

[2] Considerandos 1, 2, 4, 6, 7, 14 e 21 do Regulamento SE.

[3] O estudo externo realizado pela Ernst&Young («estudo da E&Y»), o relatório de síntese da consulta e a informação sobre a conferência de 26 de Maio de 2010 estão disponíveis em: http://ec.europa.eu/internal_market/company/se/index_en.htm.

[4] Todavia, o estatuto das SE exige que a administração central seja alterada juntamente com a sede, o que reduz a vantagem.

[5] Os sindicatos referem que em alguns casos, na Alemanha, determinadas SE foram criadas com o objectivo de manter o mesmo nível de participação dos trabalhadores no conselho de supervisão, embora os limites aplicáveis para uma empresa nacional (500 ou 2 000 trabalhadores) obrigassem à alteração da representação dos trabalhadores.

[6] Nos países que transpuseram a Directiva SE em 2006 ou posteriormente (i.e. Eslovénia, Grécia, Luxemburgo, Irlanda, Bulgária e Roménia) existem poucas SE.

[7] Esta tendência tem excepções, nomeadamente na Eslovénia (0), Hungria (3), Finlândia (0), Dinamarca (2) e Suécia (9), onde foram registadas muito poucas ou mesmo nenhuma SE desde 25 de Junho de 2010, apesar de estes países terem regras relativamente completas no que se refere à participação dos trabalhadores, enquanto que diversas SE foram registadas no Reino Unido (23) e em França (19), países com poucas ou nenhumas normas no que se refere à participação dos trabalhadores.

[8] No entanto, estes dois países têm também o número mais elevado de SE em funcionamento.

[9] Ao contrário do que acontece em França e Itália; onde, segundo os participantes na consulta pública, as empresas sem existência económica são praticamente desconhecidas ou não são utilizadas.

[10] Por exemplo, para evitar ter de satisfazer a exigência de carácter transfronteiriço para cada filial de um grupo que se transforma em SE.

[11] As alternativas são: i) cisão de uma empresa nacional e subsequente fusão transfronteiriça, que pode ser executada com base no Regulamento SE ou na Directiva 2005/56/CE e finalmente – se a fusão transfronteiriça for executada com base na Directiva 2005/56/CE – conversão da empresa adquirente numa SE, ou ii) cisão de uma empresa nacional seguida da conversão da empresa adquirente numa SE e da subsequente transferência da sede da SE.

[12] Além disso, nenhuma das SE entrevistadas pelos contratantes responsáveis pelo estudo externo e nenhum dos participantes na consulta apontou os métodos limitados de criação como um factor negativo.

[13] Ver o artigo 69.º, alínea d), do Regulamento SE.

[14] Ver processos Centros (C 212/97), Überseering (C 208/00), Inspire Art (C 167/01), SEVIC (C 411/03) e Cartesio (C 210/06).

[15] A SE poderia registar as suas filiais num determinado Estado-Membro, com todo o grupo a poder reger-se por um único regime jurídico de sociedade, tendo em simultâneo as administrações centrais de cada filial localizadas noutros Estados-Membros onde exerceriam de facto a sua actividade.

[16] Ver o artigo 69.º, alínea d), do Regulamento SE.

[17] Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e execução de decisões em matéria civil e comercial.

[18] http://ec.europa.eu/enterprise/policies/better-regulation/files/abst09_ceps_extension_en.pdf.

[19] Esta medição teve como base oito das Directivas mais onerosas na área. Ver http://ec.europa.eu/enterprise/policies/better-regulation/files/abst09_companylaw_en.pdf.

[20] O HLG foi criado para aconselhar a Comissão Europeia relativamente ao Programa de acção para a redução dos encargos administrativos na UE. Ver o artigo 2.º da Decisão 2007/623/CE da Comissão, de 31.8.2007.

[21] Parecer do HLG de 20 de Maio de 2010, parágrafo 30.

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